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Project Cars Project Cars #05

Project Cars #05: uma pequena aula sobre cálculos de coletores e sistemas de escape

Olá, galera do Flatout! Primeiro, me desculpem pela demora com o segundo post. Agradeço a participação de vocês no primeiro e gostaria de dizer que a equipe gostou muito de todos os elogios, criticas, dúvidas e sugestões! Acredito que o Project Cars tem conseguido aliar paixão e conhecimento de uma forma muito interessante, e a participação de vocês contribui bastante para que haja esse clima. Queremos que essa interação continue!

Bom, pensei em continuar esse nosso bate-papo falando de algo que normalmente é de grande interesse para nós: o sistema de escape. Seja pelo som, pela performance ou até pela beleza, acredito que esse assunto desperta o interesse de todos que se dizem gearheads. E a questão é que o sistema de escape envolve bem mais do que um ronco hipnotizante ou um tubo de grande diâmetro. Mas, para que possamos começar a falar disso, gostaria de falar um pouco sobre motores de forma geral.

 

Simplificando um pouco as coisas

A engenharia por trás de um motor a combustão é absurda e não daria para falar de forma detalhada em um post, mas vamos simplificar a situação e buscar a essência da coisa. De forma simples, eu vejo assim: um motor é basicamente um eixo sobre o qual é aplicada uma força que provoca nele um movimento de rotação. O eixo a que me refiro é o virabrequim e, em um motor a combustão, a força aplicada é resultado da combustão da mistura ar-combustível. Porém, como os movimentos realizados pelo virabrequim e pelo pistão são de naturezas diferentes, existe um terceiro componente que se encarrega de convertê-los: a biela.

Dito isto, gostaria de relembrar dois conceitos a respeito da dinâmica de rotações (já adaptados ao caso de um motor a combustão). O primeiro: Potência = Torque x RPM. O segundo: Torque = Força x Raio. Então de forma simples, para que se gere potência, o ideal é que eu tenha mais torque e mais rotações. Normalmente por questões de durabilidade, espaço físico e custos é necessário que se defina uma prioridade. Mas o que quero é que vocês se atentem a esses conceitos.

Se nós focarmos na força que gera o torque, perceberemos que para conseguir aumentar sua intensidade é necessário que a energia liberada pelo processo de combustão seja maior. Uma das formas de se conseguir isso é adicionando mais reagentes ao processo, de forma balanceada. Mas, “socar” combustível la dentro é fácil, o negócio é ter oxigênio suficiente para queimá-lo de forma eficiente.

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E é justamente aqui que entra a importância dos coletores. Uma das coisas que influenciam o fluxo de ar é o diferencial de pressão criado no cabeçote. Quanto maior o diferencial, maior o fluxo. Por isso quando preparamos um cabeçote, por exemplo, é necessário que saibamos não só o quanto obtivemos de fluxo máximo mas também em qual diferencial de pressão isso foi medido. Visto isso, uma das coisas mais importantes na preparação de um motor aspirado é conseguir gerar um grande diferencial de pressão. Uma das formas de se obter isso é gerando uma pressão positiva no sistema de admissão e uma pressão negativa no sistema de escape, aproveitando isso no momento que ocorre o overlap (falaremos disso a seguir).

 

Sistema de escape: alguns parâmetros importantes

Feita esta introdução, podemos focar no coletor de escape. Quando a válvula de escape se abre os gases resultantes da combustão saem rapidamente pelos dutos de escape, mesmo antes do pistão iniciar o movimento de subida. Isto é chamado de blowdown e ocorre devido à pressão no cilindro, após a combustão, ser consideravelmente maior do que a pressão no sistema de escapamento. Quando ocorre o blowdown, é gerado um pulso de pressão positiva no sistema de escapamento. Quando este pulso encontra uma mudança na seção transversal do tubo (em uma dada proporção) ou a atmosfera (que seria uma mudança de sessão tendendo ao infinito) ocorre um fenômeno de reflexão de onda. Este pulso de pressão é refletido como um pulso de pressão negativa que agora viaja de volta em direção a válvula de escape.

A partir disso, temos uma questão importante para o dimensionamento do sistema de escape: Qual deve ser o momento em que esse pulso de pressão negativa deve chegar na válvula de escape para que ele ajude a limpeza dos cilindros e ainda contribua para o enchimento com mistura nova (aumentando, consequentemente, a eficiência volumétrica naquele momento)? E a resposta é: overlap.

Overlap nada mais é do que a superposição das válvulas de admissão e escape exatamente no final do ciclo de escape e início do ciclo de admissão. Neste momento é possível aproveitar essa pressão negativa gerada no escapamento para criar um maior diferencial de pressão entre o cilindro e a admissão e ajudar no enchimento dos cilindros. E, se eu tenho mais oxigênio entrando, posso também colocar mais combustível e contribuir para uma maior liberação de energia na combustão.

Neste vídeo feito pela fabricante de comandos Comp Cams, eles conseguem demonstrar no vídeo o overlap além de outras características de um comando

Então, a primeira coisa que fazemos é definir o momento ótimo para que isso ocorra. Para isso eu devo me atentar a três coisas: a velocidade da onda, o espaço que ela percorrerá e também o tempo necessário para percorrer este espaço.

A velocidade é algo difícil de se influenciar, pois depende apenas das propriedades do meio, como temperatura, densidade dos gases etc. O tempo é o meu alvo, de acordo com uma rotação pré-determinada eu tenho o tempo exato do período de overlap (quanto maior a rotação menor o tempo de duração de overlap).

A partir disso, o único fator que eu realmente consigo controlar é o comprimento do tubo, que é o espaço que a onda deve percorrer. Ou seja, se a velocidade é uma constante e o tempo é determinado de acordo com a faixa de rotação do motor que estou privilegiando, o que eu devo fazer é definir o comprimento do tubo para que a onda chegue de volta a válvula de escape exatamente no momento do overlap.

 

Objetivo

Antigamente, quando este estudo foi desenvolvido, os profissionais se preocupavam basicamente em definir uma rotação alvo e trabalhar em função dela. Acreditava-se que a reflexão de onda acontecia somente no encontro do pulso de escape com a atmosfera e por isso teria que se definir um só comprimento para o tubo.

DCF 1.0

Mais tarde, com o desenvolvimento desta teoria constatou-se que mudanças na seção do tubo em uma determinada proporção também eram capazes de gerar essa reflexão de onda. Dessa forma é possível criar várias reflexões ao longo do sistema de escapamento, cada uma com foco em um certo regime de trabalho. É por isso que em alguns motores de Fórmula 1 aspirados nota-se uma variação na seção do tubo ao longo dos coletores, como podemos ver no vídeo a seguir:

Fazendo um certo benchmark, nós da Apuama também iremos utilizar este método. Desta forma poderemos trabalhar não em função de uma rotação específica mas em função de uma faixa, que será a mais utilizada. Gostaria muito de colocar alguma imagem do projeto em CAD do nosso coletor de escape, mas ainda estamos terminando os desenhos para poder iniciar a fase de simulação e construção dos coletores.

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Devido alguns problemas no processo de produção, acabamos adiando esta parte do projeto e nos preocupamos com a construção do resto do carro antes. Mas fiquem tranquilos, de acordo com meu planejamento o próximo post será sobre os coletores de admissão, e juntamente a ele tentarei colocar imagens do coletor de escape para que vocês possam ver o resultado final disso tudo.

Como muitos de vocês que lêem este post agora, sou um grande admirador de Ayrton Senna e o tenho como referencial em muitas coisas. Uma vez vi um vídeo do Mika Hakkinen falando a respeito dele, e ele disse que o grande diferencial dele era sua preocupação com os detalhes. Como disse no primeiro post, acredito que o mesmo é válido para carros de corrida, os verdadeiros diferenciais se encontram nos detalhes, no equilíbrio de tudo.

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Com o sistema de escape não é diferente. Espero que possa ter passado um pouco do que está envolvido em tudo isso, existem algumas coisas a mais que também estão relacionadas a este assunto como o próprio escoamento dos gases de escape, formas de manipular os picos de pressão e depressão obtidos e o arranjo dos coletores, mas daria assunto para mais alguns posts e acho que ja estou no limite!

Obrigado mais uma vez pela atenção ao conhecer um pouco mais da nossa história! Gostaria de informá-los que estamos pensando em prestar consultoria para entusiastas em alguns projetos pessoais, com o fim de arrecadar dinheiro para podermos melhorar nosso carro. Se algum de vocês tiver interesse, por favor, curta nossa página no Facebook e mande uma mensagem a respeito disso. Grande abraço e até a próxima!

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Por Guilherme Oliveira, Project Cars #05

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