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Tiago e seu Fiat Uno 1.5 R frente alta | FlatOut Classics

O quadro FlatOut Classics se dedica ao antigomobilismo e aos neocolecionáveis (youngtimers) estrangeiros e nacionais, dos anos 20 ao começo dos anos 2000. Carros originais ou preparados ao estilo da época.
São matérias especiais, feitas para serem saboreadas como as das clássicas revistas que amamos.
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Uma paixão difícil de explicar

Nos últimos anos o Fiat Uno tornou-se uma espécie de ícone da Internet. Se você frequenta as redes sociais, em especial o Facebook, deve ter visto até mesmo alguns amigos não-entusiastas ou não-gearheads compartilhando memes do “Fiat Uno com escada no teto”. Isto, para mim, só prova o carisma do Uno. Que, não deve ser segredo para ninguém, é meu carro brasileiro favorito.

Tentar explicar o que me atrai tanto no Fiat Uno é simples e complicado ao mesmo tempo. Simples porque é fácil listar as razões técnicas: é um carro leve, econômico, com boa ergonomia, barato de manter e barato de cuidar. E complicado porque, bem… é algo que vai além disso. Do ponto de vista entusiasta, as razões técnicas que acabei de citar fazem do Uno apenas uma excelente ferramenta de locomoção. É difícil explicar que, mesmo existindo carros mais potentes, mais modernos, mais equipados e mais seguros, não consigo encontrar tanto prazer na condução de outro carro. E nem precisa ser um Uno esportivo – o simples Mille que uso rotineiramente para andar na cidade e viajar é, para mim, o melhor carro que posso ter.

Mas este post não é sobre mim. É sobre o Uno 1.5 R de Tiago Giusti – e, vejam só: enquanto eu conversava com ele sobre o carro, descobri que pensamos da mesma forma. Ele também sofre para explicar a paixão que sente pelo Uno. Mas, ao fim do nosso papo, consegui entender perfeitamente.

Coisa de família

Uma coisa que eu percebi: quem gosta do Uno gosta de verdade – não é mera afeição. É paixão, mesmo. E geralmente vem de família – acho que gosto tanto do Fiat Uno porque meu pai teve três, e eu aprendi a dirigir em um ELX 1995. Coincidentemente, Tiago, que mora em São Bernardo do Campo (SP), também aprendeu a dirigir em um ELX – mas em um 1994. É como se apaixonar por alguém no ensino médio – você pode até amar outras pessoas depois, casar e construir uma vida. Mas sempre vai pensar em como seria se você tivesse engatado em um relacionamento com aquele alguém especial. A diferença é que, bem, você sempre pode comprar um Uno… mesmo que tenha outros carros.

Tiago conta que o fato de ter aprendido a dirigir em um Uno marcou muito para isto. E é coisa de família – no início da década de 1990, seu pai tinha um Uno, e mais quatro tios também tinham os seus. “E meu primo também teve um Uno CS 1988 marrom, com motor 1.3 a álcool, e saíamos bastante com ele”. Dá para entender, não dá? Geralmente, quando alguém gosta bastante do Uno, o motivo é a convivência.

As lentes rosadas da nostalgia

Ao todo, Tiago já teve quatro exemplares do Fiat Uno, de todas as eras: um Fire 2004, um Sporting 2012, e dois R. O primeiro R foi um MPI 1992, Azul Caribe, que logo deu lugar ao exemplar em questão. “Eu havia comprado o MPI havia pouco tempo mas, quando vi o 1988 Azul Itapema anunciado, não aguentei: tive que comprar.” Os uneiros que estão lendo isto já devem ter sacado o motivo.

“Era este o que eu mais procurava, por ser da primeira safra. A frente alta e o painel satélite são o ponto alto”, diz Tiago, citando talvez as duas características mais admiradas pelos fãs do Uno. Mas não é só isto. “Costumo dizer que a linha 1987/88 do R são o puro sangue dos esportivos Fiat”, explica Tiago. “Não são tão eficientes quanto os injetados, mas têm toda a nostalgia, pelo motor a álcool e pelo afogador.”

De fato, o Uno 1.5 R original não era um carro forte – o Sevel de 1,5 litro com carburador e comando simples no cabeçote desenvolvia 85 cv a 6.000 rpm e 12,9 kgfm de torque. A seu favor, porém, ele subia de giro rápido e tinha a suspensão muito bem acertada – além de pesar apenas 920 kg. Ele ia de zero a 100 km/h em 12,4 segundos e tinha máxima de 163 km/h. Mas o fato de ser um carro muito orgânico, sem filtros, e suas dimensões reduzidas, garantiam uma sensação de velocidade bem acentuada. E uma condução divertidíssima, como qualquer um que tenha acelerado um Uno (do jeito certo, claro) pode atestar.

Novamente, podem existir carros mais velozes, mais potentes, mais lendários – nem precisam ser mais modernos. Mas, uma vez que o Fiat Uno te conquista, fica difícil admitir que outros carros, talvez, possam ser melhores…

Uma compra certeira

Tiago se deu bem: seu 1.5 R, comprado em 2018, havia passado os dez anos anteriores nas mãos de um dono cuidadoso, que por sua vez já havia pego o carro em boas condições. Quem já tentou encontrar um R todo original e bem preservado sabe que isto é difícil de achar – muitos proprietários fizeram a conversão para a “frente baixa” ainda na década de 1990, quando descobriram que era muito fácil promover o facelift por conta própria. E, quando isto não ocorre, o carro simplesmente está cansado demais, ou muito rodado.

No geral, o estado do carro era muito bom. Não foi preciso restaurar, apenas refazer a pintura na tonalidade original, pois a mesma estava queimada. Os itens de acabamento que faltavam foram garimpados – poucos, para falar a verdade – e, por dentro, apenas o revestimento dos bancos dianteiros foi refeito, pois estava desgastado. Mas a padronagem é igual à de fábrica.

O resultado é um carro visivelmente alinhado e íntegro, com tudo no lugar, incluindo faixas e emblemas, a icônica tampa traseira em preto fosco, os desejados faróis auxiliares (e não de neblina, como muitos pensam) Cibié Serra II, e as calotas – que são mais raras e cobiçadas que as rodas de liga leve de 13 polegadas. Não há muito mais o que comentar quanto a isto, francamente.

“Defeitos” que amamos

Atualmente, o 1.5 R é o único antigo de Tiago – um carro “para curtir em um fim de semana de sol, sábado de manhã, com o carro limpinho”, simples assim. E talvez seja esta a magia dos R: eles podem não ter o desempenho mais explosivo entre os esportivos da década de 1980, mas eles são simplesmente deliciosos de guiar pelo que oferecem. Na opinião pessoal de Tiago, tem a ver com a excelência do projeto. “É um carro gostoso de dirigir até hoje, diferentemente de outros carros de 30, 40 anos atrás.”

Mas a paixão se estende para os outros Fiat. “Além do ELX, também teve uma 147 City 86, que meu pai usava para trabalhar. Aquela terceira marcha, e o trambulador sambando, me ensinaram e marcaram muito”, diz Tiago, nostálgico. “Você tinha que procurar a terceira, e engatar no tempo certo! São os defeitinhos dos Fiat que a gente aprende a gostar.”

E é por isso que, além do Uno, Tiago procura um 147 – talvez uma das primeiras picapes, o modelo carinhosamente apelidado “saboneteira” por causa da caçamba curta; ou um 147 Rallye. Ambos para manter originais. Nem todo mundo entende esse meu gosto”, diz Tiago, bem humorado. E passamos mais algum tempo falando sobre os Fiat de que gostamos.

Nem todo mundo entende, mas eu entendo, Tiago. Eu entendo!