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Vuhl 05: um carro de track day feito no México | Lasanhas sem Fronteiras

Boa parte dos carros importados vendidos no Brasil vem do México, especialmente das quatro grandes marcas que operam no Brasil – Chevrolet, Fiat, Ford e Volkswagen. Na verdade a indústria automotiva mexicana é bem parecida com o que temos aqui, com muitas fábricas de companhias estrangeiras produzindo automóveis desenvolvidos lá fora.

Companhias locais surgem para ocupar nichos, um meio no qual é preciso se destacar ainda mais para sobreviver. No mercado de massa, certos erros e defeitos são tolerados em nome da necessidade e do baixo preço. Nos nichos geralmente é mais uma questão de desejo, e o preço não costuma ser o fator decisivo na hora da compra.

Em todo caso, fabricantes mexicanas de verdade são poucas (novamente, como acontece no Brasil). Hoje nós vamos falar de uma delas, e uma até que recente: a Vuhl, especializada em brinquedos de track day que, a exemplo do Caterham Seven e do Ariel Atom, podem ser chamados de qualquer coisa, exceto de brinquedos. Não é preciso ter dirigido um destes carros super-leves concebidos para acelerar no autódromo para sacar que eles são carros rápidos de verdade, feitos para quem realmente sabe o que está fazendo ao volante. Basta tê-los visto em vídeo.

onboard aí em cima faz parte do test drive que a Evo fez em 2016 com o Vuhl 05, criação da mexicana Vuhl. A empresa, fundada pelos irmãos Iker e Guillermo Echeverria junto com o empresário Alberto Chapa, tem sua fábrica na cidade de Querétaro, a cerca de 200 km da capital Cidade do México. Trata-se de uma companhia ainda mas recente que a última a aparecer na nossa seção “Lasanhas sem Fronteiras”: a Vuhl foi fundada em 2013.

De acordo com o site da Vuhl (que é todo em inglês), Vuhl quer dizer Vehicles of Ultra-lightweight and High Performance. Ou seja, tecnicamente a sigla deveria ser “VULHP”, mas a gente entende porque os caras quiseram deixar a coisa mais sonora. “Vuhl” parece uma palavra alemã, como “Röhrl”, e pronuncia-se “vul” mesmo.

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A Vuhl pode até ter nascido do sonho de um jovem garoto que queria construir seu próprio carro, mas ainda é jovem demais para ter uma história bonita e poética como outras fabricante de esportivos. Sua história, na verdade é bem mais direta: a Vuhl foi incorporada em 2013, com incentivos do governo mexicano e parcerias com grandes companhias, como Ford e Michelin. Não fica claro o modelo das parcerias, mas tudo bem – o business da Vuhl não nos interessa tanto quanto seus carros em si. Ou melhor: seu carro, porque até hoje só existe o Vuhl 05.

A ideia, desde o início, era oferecer um carro de track day nos moldes do Ariel Atom e do KTM X-Bow: uma máquina leve e frugal, com motor razoavelmente potente e dinâmica voltada para o circuito, oferecendo velocidade e uma pilotagem crua, direta. E não ficar apenas no México – até porque o maior mercado para este tipo de carro é a Europa, com foco no Reino Unido. Tanto que em diversas fotos de divulgação o Vuhl 05 tem o volante do lado direito.

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A adaptação para se adequar às leis de trânsito britânicas se faz necessária porque, apesar de ser um carro bastante minimalista, o Vuhl 05 é legalizado para rodar nas ruas. Assim, ele tem um para-brisa removível; um defletor aerodinâmico para desviar o fluxo de ar em alta velocidade do rosto do piloto; faróis e lanternas; e sujeitou-se a todos os testes necessários para receber o sinal verde das autoridades. O que é algo complicado de se conseguir sem apoio de gente importante, como governos e gigantes da indústria.

O Vuhl 05 começou a ser desenvolvido em 2008 e foi apresentado em 2013 durante um evento no Royal Automobile Club, um dos points mais importantes da comunidade automobilística londrina. Foi uma forma de colocar o nuevo superdeportivo mexicano em evidência logo de cara. O fruto de cinco anos de desenvolvimento foi mantido em absoluto sigilo até o momento da apresentação.

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Sir Stirling Moss foi um dos presentes na apresentação do Vuhl 05 em Londres, em 2013. Foi uma de suas últimas aparições em público

Para a Vuhl era importante oferecer um rival à altura dos já citados Ariel Atom e KTM X-Bow, além do BAC Mono ou até mesmo do Caterham Seven, embora este seja bem mais old school que os outros.

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Note a relativa simplicidade da estrutura, onde é possível ver claramente as linhas do radiador, “as paredes” de alumínio e a gaiola que incului os santantônios e os suportes do motor

No entanto, outro objetivo era que o carro fosse mais acessível, o que levou à opção por uma estrutura do tipo box frame de alumínio em vez de um monocoque de fibra de carbono – ou seja, ele está mais para Ariel Atom e Caterham Seven do que para BAC Mono e KTM X-Bow, embora seu visual diga o contrário.

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Os painéis da carroceria são feitos de plástico reforçado, ainda que se possa pagar mais caro por painéis de fibra de carbono. O visual lembra o de um supercarro em miniatura sem teto e sem para-brisa fixo – algo como uma super barchetta, de certo modo. O formato grade dianteira lembra muito a peça do Peugeot 208, porém com acabamento mais simples, sem cromados. Já a seção em preto que percorre todo o perímetro do carro e o desenho das lanternas traseiras dão ao Vuhl 05 um quê de mini-Koenigsegg. É um carro bonito e bem acabado, sem dúvida.

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O interior, como é de se esperar em um esportivo de pista que pesa só 715 kg, é bastante espartano, com cluster digital, fibra de carbono exposta no painel e nos bancos, um volante simples revestido de camurça e um console central estreito. Nele há alguns botões e interruptores para faróis, buzina, pisca-alerta e outras funções básicas, e mais abaixo fica a alavanca (sem coifa) do câmbio manual de seis marchas fornecido pela Ford.

Trata-se do mesmo câmbio usado pela última geração do Ford Focus RS, exceto que neste caso a potência vai para as rodas traseiras através de um diferencial sem blocante. O motor é uma versão de dois litros e 290 cv do motor turbo Ecoboost da Ford, que também gera 42,8 mkgf de torque. Sua relação peso/potência é de 2,46 kg/cv – consideravelmente melhor que a do Porsche 911 GT3 RS, que pesa exatamente o dobro (1.430 kg) e tem 520 cv, ou seja, tem 2,75 kg/cv. É, meus amigos.

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De acordo com a Vuhl, o 05 é capaz de ir de zero a 100 km/h em 2,8 segundos, com velocidade máxima de 245 km/h. E tem mais: em 2016 foi apresentada no Goodwood Festival of Speed, no Reino Unido, o Vuhl 05 RR – e você sabe o que acontece quando a letra “R” aparece ao lado do nome de um carro, não sabe? O Vuhl 05 RR tem um Ecoboost de 2,3 litros ainda mais potente do que o motor usado no Focus RS, com 390 cv; pesa 640 kg graças à carroceria de fibra de carbono e aos parafusos de titânio (que, sozinhos, economizam mais de 4,5 kg); e é capaz de ir de zero a 100 km/h com velocidade máxima de 260 km/h.

Na avaliação da Evo, que citamos mais cedo, é dito que o Vuhl 05 é um diamante bruto. Graças a seu baixo peso, à suspensão muito bem ajustada e à força do motor Ecoboost, o Vuhl é um carro muito rápido e, graças à ausência de equipamentos, para-brisas e um teto, a experiência de condução é bastante crua. O 05 é um carro com perímetro bem “quadrado”, com menos de quatro metros de comprimento e quase dois metros de largura, além de 2,3 metros de entre-eixos – visto de cima.

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Eles criticam, porém, a ligeira falta de comunicatividade da direção e a ausência de um diferencial de deslizamento limitado – medidas que, corrigidas, poderiam evitar algumas escorregadas e permitir que o piloto alcançasse todo o potencial sugerido pelo projeto.

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O site da Vuhl foi atualizado pela última vez em fevereiro de 2018, falando sobre a Race of Champions (ROC), corrida de “all-stars” entre pilotos de Fórmula 1, vencedores da Indy 500 e nomes de outras categorias, como o WRC. O Vuhl 05 foi pilotado por David Coulthard, Petter Solberg, Helio Castroneves, Tom Kristensen e Juan Pablo Montoya. Coulthard foi o vencedor.

Vê-se que os mexicanos estão conseguindo seu espaço no nicho dos track day toys, e é bem possível que eles fiquem por aí mais alguns anos, ao longo dos quais certamente aperfeiçoarão a receita. Será que podemos arriscar e dizer que a indústria automotiva brasileira pode aprender com isto?

Sugestão do leitor Fabrício Sabino Silva