FlatOut!
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Técnica Zero a 300

1.100 cv, 11.000 rpm: ouça o ronco e conheça os detalhes técnicos do motor V12 do Aston Martin Valkyirie

Estamos vivendo o fim de uma era. Com as leis para emissões de poluentes cada vez mais rígidas, os motores naturalmente aspirados de alto desempenho estão muito próximos da extinção. Já estamos acostumados com a ideia, na verdade, e conhecemos os benefícios da sobrealimentação, como menor consumo de combustível e mais torque em baixas rotações. Mas há uma parte de nós que sempre irá lamentar o fim da aspiração natural, de sua sonoridade e de sua capacidade de atingir rotações obscenas.

Talvez seja por isso o Aston Martin Valkyrie se tornou um dos projetos mais reverenciados e aguardados do momento. Apesar do conjunto híbrido, a Aston dispensou o turbocompressor em seu motor V12 de 6,5 litros. É bem provável que ele seja o último suspiro dos motores naturalmente aspirados de alta performance.

Mas “suspiro” definitivamente não é a melhor palavra para descrever o som do motor Cosworth desenvolvido para o Valkyrie. Há algum tempo a Aston Martin divulgou nas redes sociais um teaser com o ronco do V12 do Valkyrie e, naturalmente, ficamos boquiabertos. Só que a gente pode encarar aquilo como um pequeno aperitivo do que temos agora –um vídeo bastante detalhado a respeito do motor, feito pelo canal Carfection. Nele, Henry Catchpole conversa com Bruce Wood, diretor técnico da Cosworth, e descobre alguns detalhes bastante interessantes a respeito do motor. E é nosso dever destrinchá-lo para vocês – um tópico de cada vez.

 

Emissões

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Ouvindo o ronco do motor V12 girando no limite, fica difícil imaginar que ele não começou sua vida como um V12, e sim como um quatro-cilindros. Foi uma forma de acelerar o processo de desenvolvimento do motor – a Cosworth calculou um prazo de 12 a 13 meses entre o início do projeto e a conclusão do primeiro protótipo funcional do V12. Então, em vez disto, eles pegaram um quatro-cilindros já existente, eliminaram um cilindro e desenvolveram para ele um cabeçote com as exatas especificações previstas para o V12, porém com três cilindros.

Entre cinco e seis meses depois, a Cosworth tinha um três-em-linha completo que, na prática, era 1/4 do motor V12 que está hoje no dinamômetro de bancada da companhia – e estava perfeitamente encaixado no regulamento europeu para emissões de poluentes. “Desta forma”, comenta Wood, “tivemos certeza de que seríamos capazes de cumprir as metas de emissões e de desempenho, sem a necessidade de retornar à prancheta de desenho e realizar todas as simulações de combustão outra vez”.

Desta forma foi possível, por exemplo, estabelecer o uso de quatro catalisadores – um para cada três cilindros – que foram desenvolvidos a partir da peça empregada no primeiro motor.

 

Motor como componente estrutural

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Wood fala, então, sobre o fato de o motor ser utilizado como componente estrutural – como nos carros de Fórmula 1. Ele deixa bem claro que o conjunto mecânico é a única coisa que liga as porções dianteira e traseira do carro. Para isto, foi necessário dar bastante atenção às tampas de válvulas. Se, nos motores comuns, seu principal propósito é justamente cobrir as válvulas, no Valkyrie elas possuem o papel fundamental de ligar o motor ao monocoque de fibra de carbono, e transferir toda a carga do carro em movimento – o que inclui a torção da estrutura e também os efeitos da carga aerodinâmica – para a parte mais rígida do motor, entre os cabeçotes e o bloco. Em um monoposto esta tarefa é um pouco mais fácil porque a estrutura é mais estreita.

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Como o Valkyrie tem dois lugares e, por isto, é consideravelmente mais largo, as tampas de válvula foram projetadas com suportes para o motor. Com os pontos de fixação mais afastados entre si, o processo de desenvolvimento dos suportes foi bastante delicado porque eles precisavam dar espaço para os radiadores, visto que eles ficarão posicionados entre os suportes e os coletores de escape.

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Da mesma forma, toda os os movimentos da suspensão traseira, especialmente nas curvas, geram uma carga que é transferida para a parte traseira do motor através da transmissão. Ela também exigiu suportes rígidos na parte inferior, na base do bloco — que, por si só, também teve seu desenho afetado pela disposição de outros elementos do carro e pelo próprio design aerodinâmico do carro, que usa enormes canais de escoamento na traseira , como os difusores traseiros – que são tão grandes que foi preciso desenvolver bombas minúsculas para o sistema de lubrificação por cárter seco.

 

Baixo peso a todo custo

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Sem dúvida uma das peças mais bonitas do motor do Aston Martin Valkyrie é o plenum da admissão. A fibra de carbono exposta com um padrão quadriculado, contudo, não é o único material utilizado nele: foram várias camadas de fibra de carbono, uma trama do tipo honeycomb de alumínio e mais fibra de carbono – algo necessário por conta da altíssima pressão do ar dentro do plenum, mas que não se vê olhando por fora.

Wood comenta que o departamento de engenharia responsável pelo desenho da peça teve muito trabalho para que ela pesasse o menos possível. Para eles, idealmente o plenum não deve ter nenhum tipo de verniz transparente, pois a camada de verniz pesa 80 gramas – para os engenheiros, um peso extra desnecessário. Por conta disto, o tratamento com verniz será opcional no Valkyrie. Não é algo que fará diferença na performance do carro, mas é justamente este tipo de atenção aos detalhes uma das coisas que separam o Valkyrie de um supercarro comum.

A questão do peso, na verdade, foi uma das grandes sacadas. Segundo Wood, foi estabelecida uma meta de 200 kg – algo extremamente ambicioso, e no fim das contas o V12 pesa cerca de 2 kg a mais (o peso exato ainda não foi divulgado). Era esta a ideia: estabelecer uma meta um pouco além do que os engenheiros seriam capazes de cumprir. A lógica é simples: caso a meta fosse 210 kg – o que seria bem mais fácil – com certeza o motor teria um pouco mais que 210 kg. Como a meta era de 200 kg, o peso do V12 acabou ficando consideravelmente abaixo de 210 kg.

 

Os materiais

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Embora o V12 do Aston Martin Valkyrie seja uma verdadeira demonstração do nível altíssimo da engenharia da Cosworth, houve uma preocupação importante com os materiais. Embora seu regime de funcionamento seja digno de um carro de competição – estamos falando de mais de 11.000 rpm no limite –, o Valkyrie foi projetado para ser um carro de rua, capaz de rodar normalmente na cidade e de fazer viagens (se os seus donos realmente o farão, é outra história).

Assim, em vez de adotar ligas metálicas exóticas e carbono-cerâmica, por exemplo, a Cosworth optou por materiais mais convencionais de alto nível – em alguns casos, favorecendo a durabilidade em detrimento do baixo peso. Por exemplo, o cabeçote é de alumínio fundido – porém, é o mesmo tipo de alumínio utilizado em espaçonaves, um material tão caro que nem mesmo carros de Fórmula 1 o empregam, embora os benefícios em termos de durabilidade sejam indiscutíveis. Válvulas e bielas são de titânio, mas os casquilhos são revestidos com polímero de carbono – consideravelmente mais resistente do que as peças convencionais de liga de alumínio.

Outro exemplo é a embreagem – em vez do carbono, como nos carros de competição, a Cosworth optou pelo aço sinterizado – ou seja, moldado a partir do material em pó, que então é aquecido e pressurizado para tomar ficar rígido e tomar a forma do molde. O resultado foi uma embreagem mais pesada, porém mais resistente e durável – e também melhor ajustada para condições do mundo real – ou seja, com um funcionamento mais suave, pois as embreagens de carbono utilizadas em carros de corrida “são como botões de liga/desliga”, de acordo com Wood.

 

1, 2, 3, testando

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Fazendo concessões e compromissos, o pessoal da Cosworth conseguiu não apenas criar o motor mais leve e potente possível (são 1.136 cv, sem contar o motor elétrico) como também estender ao máximo sua vida útil – algo crucial em um motor cujos pistões chegam a percorrer, em seu movimento, entre 25 e 26 metros por segundo. É a mesma velocidade da Fórmula 1.

A ideia é que o V12 seja capaz de rodar 100.000 km antes de ser enviado de volta à Cosworth para ser recondicionado. Para tal, a sede da companhia em Northampton, no Reino Unido, foi dividida em três setores de testes: um para calibrar o nível de emissões do motor, um para realizar medições de desempenho, e um para realizar testes de durabilidade. Este último, no momento, é o mais importante – os testes de emissões e de desempenho já estão praticamente concluídos, mas é preciso ter certeza de que o V12 durará, de fato, 100.000 km. Para isto, é realizado um teste de durabilidade no qual o motor é ligado e funciona sem parar por 220 horas. Este tempo equivale a 100.000 km em condições normais, tanto de uso em vias públicas quanto na pista, incluindo circuitos com  Nürburgring e Silverstone.

Até agora foram feitos dois testes como este, e serão realizadas mais sessões nos próximos meses para garantir que o motor funcione sem problemas quando chegar às ruas.