Os fãs de filmes de heróis certamente lembrarão de Gene Hackman como o Lex Luthor da primeira grande produção hollywoodiana com o Super-Homem, de 1978. Se você é um entusiasta, contudo, você deve lembrar de Gene Hackman pela cena de perseguição de “Operação França”, uma das mais realistas e inconsequentes e perigosas da história do cinema — e que teve Gene Hackman ao volante do carro na maior parte da gravação.
Na cena, Hackman usa um Pontiac Le Mans novinho (o filme é de 1971) para seguir os criminosos que estavam no metrô, em um trecho em que os trilhos ficam elevados sobre a rua. Como a cena foi gravada em uma locação real — uma antiga linha do metrô de Nova York entre o Brooklin e Manhattan —, era preciso reproduzir o tráfego real e normal da região. Por isso, não foi possível aumentar a velocidade do carro com truques de edição — somente uma das câmeras, afixada ao para-choque dianteiro do carro, é que teve esse efeito, obtido pela redução da taxa de quadros por segundo. Gene Hackman, que dirigiu o carro na maior parte da gravação, teve que acelerar realmente a velocidades entre 110 km/h e 140 km/h.
Claro, as partes mais perigosas foi coordenadas pelo lendário piloto-dublê Bill Hickman, que também dirigiu o Pontiac em três manobras ensaiadas — o desvio de uma mãe com um carrinho de bebê, com uma colisão contra uma lixeira na sequência, uma passagem por um cruzamento sem frear, e uma entrada na contra-mão. No restante do tempo, era Gene Hackman quem estava ao volante do carro — incluindo em algumas das batidas que foram deixadas na edição final da cena, uma delas, um abalroamento lateral por um Ford Torino branco.
Além de entrar para a história como uma das maiores perseguições do cinema em todos os tempos, o filme também rendeu a Gene Hackman o primeiro de seus dois Oscars, e o prêmio de melhor ator no BAFTA e no Golden Globes. Apesar da habilidade exibida ao volante do Pontiac nas gravações, Hackman só se interessou mesmo pelos carros depois de participar de um desafio beneficente promovido pela Toyota nos anos 1970 e 1980, o Toyota Pro/Celebrity Racing.
O evento era uma corrida de 10 voltas disputada entre pilotos profissionais e celebridades em carros da Toyota, e era uma das atrações do GP do Oeste dos EUA em Long Beach. Hackman correu pela primeira vez em 1977 e ganhou a corrida na categoria das celebridades em 1980.
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Depois disso, ele começou a participar das corridas do Sports Car Club of America (o SCCA). Primeiro ele entrou na escola de pilotagem de Bob Bondurant, pilotando um Fórmula Ford, e depois foi para a equipe de Dan Gurney disputar provas de endurance. Ele chegou a ser escalado para correr as 24 Horas de Daytona em 1978 e 1981, mas desistiu pouco antes da corrida.
Em 1983 ele finalmente estreou em Daytona ao volante de um Toyota Celica de 300 cv da equipe de Dan Gurney, dividindo o carro com dois pilotos japoneses — Masanori Sekiya e Kaoru Hoshino. Apesar da experiência da equipe na prova, o trio abandonou depois de 118 voltas devido à quebra da transmissão. Naquele mesmo ano, Hackman ainda disputaria as 6 Horas de Riverside, terminando a prova em um bom 16º lugar dentre 56 carros.
No ano seguinte, Hackman voltou às pistas, mas agora com um Mazda RX-7 da equipe Preston & Son dividindo o volante com Whithney Ganz, mas uma quebra os tirou da prova e eles terminaram em 56º lugar entre 81 carros. Como no ano anterior, Hackman voltou às 6 Horas de Riverside com o mesmo RX-7, mas a dupla terminou em último lugar. Ele ainda seria escalado para disputar as 24 Horas de Daytona em 1985 e 1987, mas acabou desistindo.
Mais tarde, Hackman revelou que não estava disposto a encarar o calendário do automobilismo por muito tempo. Entrevistado sobre sua carreira nas pistas pelo Los Angeles Times, em 1988, ele disse: “A certa altura eu me perguntei: Será que sou bom nisso? Ganhei algumas corridas e achei que conseguiria, mas aí percebi que não estava levando tão a sério quanto necessário, e que se eu não podia me comprometer a correr 15 a 18 corridas por ano, eu não conseguiria competir em nível profissional. Seria, no máximo, um piloto razoável.”
Em uma entrevista a Emmett White, da revista americana Road & Track nos anos 1990, Bob Bondurant disse que, de todas as celebridades a quem ele ensinou a arte da pilotagem, Gene Hackman foi o mais impressionante. Segundo ele, Hackman tinha uma mentalidade do tipo “ganhe ou bata tentando ganhar”, totalmente comprometido com a corrida.
Na entrevista ao Los Angeles Times, Hackman ainda foi questionado sobre preferir a pilotagem ou a atuação: “Eu pensei um pouco sobre isso”, respondeu. “Acho que não ficaria no automobilismo. Não acho que tenho personalidade para ser um piiloto profissional de verdade. Você pode até aprender algumas técnicas de pilotagem, pode aprender mecânica, mas tem uma coisa que ninguém pode te ensinar: o instinto assassino. Você precisa ser muito competitivo. Tem que estar sempre no limite. Os bons pilotos têm isso”. Bob Bondurant, na já mencionada entrevista à Road & Track, disse que Gene Hackman tinha esse instinto.
Em outra ocasião, nas 24 Horas de Daytona de 1983, a mesma pergunta, à qual ele respondeu: “Eu me considero um bom ator e um piloto bom-pra-ruim, então eu fico com a atuação.” Quem sabe o que ele teria conseguido nas pistas se não fosse um cara tão modesto? Teríamos ganhado um grande piloto ou perdido um excelente ator?