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Automobilismo Car Culture

A história da foto: “O Finlandês Voador”

Já faz algum tempo que não ouço a expressão “voando baixo”. Lembra dela? A gente dizia que alguém passou “voando baixo” quando estava muito rápido — especialmente se fosse em uma disputa de pista. Não sei se ela saiu de moda, mas nunca mais a ouvi. O que sei é que ela me vem à mente sempre que vejo esta imagem aí de cima. Mika Häkkinen realmente voando baixo no circuito de rua de Adelaide, na Austrália, em 1993.

Um carro de Fórmula 1 moderno, completamente no ar, é uma imagem rara de se ver — os saltos foram muito mais comuns até o fim dos anos 1970, quando surgiram os carros de efeito solo, que precisam ficar o mais próximo possível do chão e podem se tornar incontroláveis ao passar por ondulações e saliências. Desde então as superfícies dos circuitos se tornaram extremamente suaves e os saltos foram substituídos por sacolejos e eventuais raspagens do fundo do carro no asfalto.

Em 1993, portanto, um carro de Fórmula 1 só tirava as rodas do chão durante um acidente — como aconteceu com Christian Fittipaldi, no GP da Itália daquele ano. A poucos metros da linha de chegada, Christian tenta uma ultrapassagem sobre seu companheiro de equipe, Pierluigi Martini, que acaba fazendo uma manobra de defesa desastrosa, praticamente jogando o carro sobre o de Christian, causando a decolagem e um looping completo do brasileiro que, felizmente, aterrissou sobre as rodas e saiu ileso.

O voo de Mika Hakkinen, contudo, não teve nada a ver com um acidente. Tanto que ele se classificou em quinto e abandonou a corrida várias voltas depois desta decolagem, por problemas nos freios. O que aconteceu ali foi um erro do finlandês.

O próprio Mika Hakkinen contou os detalhes daquele momento há alguns anos, em uma entrevista à imprensa britânica. Tudo começou justamente por causa do avanço técnico dos carros. Em 1993, eles tinham suspensão ativa, ABS, acelerador eletrônico, direção assistida e, por isso, estavam mais rápidos do que nunca.

E esse foi o problema: ao se aproximar da curva de acesso à reta Brabham, a Brewery Corner, Mika deveria dar um toque no freio para transferir peso à dianteira, aumentar a aderência e poder afundar o acelerador na saída, enquanto a traseira era domada pelo controle de tração. Contudo, este movimento exige o traçado ideal. Naquela volta, Mika errou o traçado, tocando a zebra na entrada, o que o fez perder a aderência da dianteira necessária para contornar a curva de pé embaixo.

Ao perceber que o traçado havia sido comprometido, Mika decidiu reduzir ao máximo e matar a curva. Só que, no meio do caminho, ele percebeu que a zebra da saída era mais alta do que ele lembrava. Para não acertar a zebra de lado, ele manteve o carro reto e passou por ela com a frente do carro. E foi assim que surgiu o “finlandês voador”.

Só que a foto não teria existido sem o outro lado dela: o fotógrafo Mark Sutton. Você já ouviu falar dele: praticamente todas as grandes fotos da F1 dos anos 1980 e 1990 foram feitas por ele, assinadas com o nome de sua agência, a Sutton Images.

Sutton foi um dos amigos que Ayrton Senna fez na Inglaterra antes de chegar à Fórmula 1, quando Sutton ainda era um fotógrafo iniciante. São deles as fotos do carro de F3 de Senna sobre o carro de Martin Brundle, na disputa pelo título da F3 em Oulton Park, em 1983. Senna foi um de seus primeiros clientes e foi por meio dele que Sutton começou a se destacar de verdade e começou a construir sua carreira na F1.

Em 1993 Sutton já era um dos grandes fotógrafos da Fórmula 1. E não por acaso ele estava na Brewery Corner, a curva rápida que dava acesso à maior das retas do circuito de Adelaide.

“Era um dia quente e ensolarado em Adelaide, e eu estava fotografando na Brewery quando vi o carro de Mika na minha direção, passando sobre a zebra, então fiz vários disparos seguidos. Só precisei de cinco quadros. Um deles tem Mika batendo na zebra, em outro ele já está no ar, e no outro ele está aterrissando. Nenhum fotógrafo conseguiu isso”, contou Sutton ao site britânico Motorsport. “O carro estava a meio metro do chão e a imagem estava muito nítida, apesar da velocidade relativamente baixa do obturador”, completou.

Depois do vôo, Mika teve de entrar nos boxes para trocar a asa dianteira, que se quebrou com a queda. Hakkinen voltou para a pista e continuou até a volta 28, quando um problema nos freios o tirou da prova. No ano seguinte, Hakkinen teve um problema nos freios novamente: uma das rodas traseiras travou e o carro girou em direção ao muro, batendo de lado e encerrando a prova do finlandês na 76ª de 81 voltas.

Em 1995, Hakkinen decolou novamente em Adelaide, mas desta vez, acertou uma barreira de pneus a 200 km/h, naquele que foi o acidente mais grave de sua carreira, que quase lhe custou a vida.