“Para meu alívio, o juiz decidiu a meu favor. Então eu saí do tributal só com o meu nome. Ah, e dois Jaguar que ganhei de presente. É engraçado vendo hoje: sem dinheiro para comer, para o aluguel ou qualquer necessidade. Sem saber como pagar as contas, mas com dois Jags!”
Esse é um trecho da autobiografia de Tina Turner, “My Love Story”, publicada em 2018. No livro, a cantora conta como foi o processo de divórcio de seu primeiro marido, Ike Turner e encerra o capítulo com esta citação acima. Tina acabou se desfazendo dos carros, afinal, os dois Jags só serviriam a ela para vender e juntar uma grana até sua vida pessoal voltar aos eixos.
Como mencionado mais acima, os dois Jags foram dados de presente a Tina em momentos diferentes, por pessoas diferentes. O primeiro deles era um XJ6 branco, que ela ganhou em 1970 do cantor Sammy Davis Jr. como um presente de agradecimento por ter feito um show com ele em Las Vegas. Sammy havia pensado em um Mercedes, mas a assistente pessoal de Tina disse a ele que ela era mais chegada nos carros ingleses. No outro dia, em frente ao hotel, estava parado um Jaguar XJ6 branco, agora pertencente a Tina Turner.
Em sua autobiografia, Tina conta que foi esse carro que despertou nela a paixão por carros velozes. Ela já gostava de carros e gostava de dirigi-los desde os anos 1960, quando circulava pelos EUA em um Cadillac Eldorado dourado com o teto marrom (infelizmente não há fotos desse carro disponíveis). Em uma entrevista à Audi Magazine, em 2010, Tina conta que nunca gostou de viajar de avião e que sempre preferiu viajar de carro pois tinha seu próprio espaço, pois o carro era “uma extensão de sua casa”. Curiosamente, Tina escolhia os carros pelos faróis (provavelmente se referindo à “cara” do carro) e pelas rodas, que, segundo ela, precisavam ser bonitos.
O segundo Jag foi um XKE, a versão americana do E-Type. Ele foi um presente de seu marido Ike, mas a própria Tina foi buscá-lo na concessionária em 1973. Na entrevista à Audi Magazine ela relembra o momento:
“Tive um Jaguar para duas pessoas. Eu mesma peguei na concessionária. Ele tinha um 12-cilindros e enquanto voltava para casa, diante do pôr-do-sol, eu me senti realmente livre. Soa um pouco brega, mas foi uma sensação maravilhosa.”
Anos mais tarde, em seu livro, Tina contou com mais detalhes como isso aconteceu:
“Nunca vou esquecer do momento em que sentei ao volante e saí da concessionária. Era tarde e tinha um pouco de neblina quando saí com aquele belo Jaguar prateado pela Wilshire Boulevard. Até onde me lembro, não havia mais ninguém na rua — somente eu, dirigindo com as janelas abertas, me sentindo fabulosa.
Ainda consigo ouvir o som do motor, o ronco que sinalizava que ele estava pronto para me levar para qualquer lugar que eu quisesse… eu sabia que nunca ia chegar à velocidade máxima, mas ainda tenho aquela descarga de adrenalina que os amantes de carros experimentam.”
Durante o processo de separação, Tina iniciou sua carreira solo, fazendo shows discretos em clubes e hotéis, num estilo que hoje conhecemos como “flashback” — aqueles shows com apelo nostálgico, para lembrar os bons e velhos tempos.
As coisas começaram a mudar em 1983, quando ela conseguiu um contrato com a gravadora Capitol Records e lançou uma versão do já clássico “Let’s Stay Together” de Al Green. A música explodiu e, com o sucesso repentino, ela conseguiu um contrato para gravar um novo disco. Começava ali a segunda carreira de Tina Turner, agora como uma superestrela da música e não mais a ex-esposa de Ike Turner.
Tina emplacou uma série de sucessos do seu primeiro álbum solo, Private Dancer, coroado com três prêmios no Grammy, incluindo o prêmio de melhor gravação do ano. No ano seguinte, 1985, ela foi convidada para estrelar “Mad Max Além da Cúpula do Trovão” (Mad Max Beyond Thunderdome, 1986), que foi aclamado pelo público e pela crítica, assim como o desempenho de Tina como atriz.
No filme Tina volta a exercitar seu gosto pelos carros: ela é Aunty Entity (ou Titia Entity, na tradução brasileira), a governadora do povoado de Bartertown e antagonista de Mad Max. A personagem circula pela terra arrasada do universo de Mad Max em um carro pós-apocalíptico que é movido (na ficção) por uma turbina e um motor sobrealimentado. O carro usado nas filmagens era funcional, e tinha um motor de combustão convencional e um câmbio automático porque Tina não dirigia carros manuais. Sim: ela mesma dirigiu o carro e não usou dublês na maior parte das cenas em que aparece dirigindo no filme.
Àquela altura, sendo uma das artistas mais populares e bem-sucedidas do planeta, além de uma atriz carismática e admirada, Tina já dirigia seus carros pelas ruas. Um deles era um Mercedes 280 GE 1985— sim, um G-Wagen com motor 2.8 de seis cilindros e 156 cv e câmbio automático, claro.
O carro mais interessante de sua garagem, contudo, veio em 1995: um Lamborghini LM-002, o “Lambo do Rambo”. Na época, Tina já havia conhecido seu segundo marido, o executivo da indústria musical Erwin Bach. Ele comprou o carro para a esposa e levou o carro a uma empresa chamada Bale Motorsport para fazer uma conversão para automático — visto que a Lamborghini não fazia esse tipo de coisa na época.
Talvez por uma questão de confiabilidade, em vez de adaptar um câmbio automático ao V12 Lamborghini, o carro teve transplantado todo o conjunto mecânico de um Mercedes E500 — um V8 de cinco litros e 369 cv, com câmbio automático de quatro marchas.
Além do swap de motor e câmbio, o carro ainda recebeu um sistema de áudio premium de 1.100 watts da Blaupunkt e um enorme quebra-mato na dianteira. Tina gostava de dirigir o carro no Sul da França, na charmosa e elegante “Côte d’Azur”. O carro permaneceu com o casal até 2008, quando foi comprado por uma loja alemã especializada em carros raros e colecionáveis.
Tina também teve um segundo Mercedes G-Wagen nos anos 1990, quando voltou às paradas de sucesso com a trilha sonora do filme 007 Contra Goldeneye, de 1995, com uma regravação de “Let’s Stay Together” e com um dueto com o cantor italiano Eros Ramazzotti.
Mais recentemente, Tina parece ter optado por modelos da Audi para seu uso pessoal. Na entrevista de 2010 à Audi Magazine, ela conta que em uma viagem de Paris a Nice, enfrentou uma nevasca “tão forte que os limpadores nem davam conta”, mas o fato de ter tração integral a ajudou a seguir em frente. “Somente nós e os caminhões estávamos andando”.
Em seus últimos anos de vida, Tina trabalhou em um musical biográfico, em sua autobiografia e na gestão de seu legado. Em 2021 ela foi incluída no Rock ‘n’ Roll Hall of Fame como artista solo e passou seus últimos dias em sua casa, na Suíça, ao lado do marido. Ela morreu ontem, 24 de maio, de causas naturais aos 83 anos. Tina é frequentemente considerada a “Rainha do Rock ‘n’ Roll” e uma das maiores cantoras de todos os tempos. E como vimos, também uma grande apreciadora dos automóveis.
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