A Alfa Romeo está de volta. Há alguns anos, quando o 4C foi anunciado, a gente já disse isso. Afinal, um cupê pequeno de motor central-traseiro com o cuore sportivo na dianteira é algo que todo entusiasta já quis um dia. Acontece que o 4C, bem ou mal, é um carro de nicho — nada muito diferente do estonteante 8C Competizione, ainda que bem menor e mais barato.
Dá para dizer que o 4C foi um belo ensaio, mas o mundo ainda estava sedento por um Alfa Romeo de tração traseira produzido em massa, como nos velhos tempos. Um sedã com motor potente, um belo ronco e dinâmica empolgante seria perfeito. E foi exatamente isto que a Alfa quis nos dar com o Giulia. Será que eles conseguiram?
Para começar, “nos dar” é modo de dizer: se não há previsão de que o Giulia seja oferecido no Brasil nem mesmo em suas versões mais comportadas, com o Giulia Quadrifoglio Verde (ou simplesmente “QV”), não há porque esperar que seja diferente. Só que seu desempenho é de interesse geral de entusiastas do mundo todo, você não concorda? É por isso que, agora, com as primeiras impressões da imprensa internacional publicadas, parece uma boa hora para fazermos mais uma das nossas já tradicionais meta-avaliações e contar para você o que o pessoal lá fora achou do novo Alfa Romeo.
Quer dizer, quando falamos em “o pessoal lá fora”, estamos falando dos britânicos: por enquanto, só os europeus tiveram acesso ao Giulia para avaliação — os EUA e o resto do mundo vão ter que esperar mais um pouquinho. Mas já deu para ter uma bela ideia.
Por enquanto, a Alfa Romeo só permitiu que os veículos de imprensa testassem o carro na pista de testes da Fiat, em Balocco, na Itália. Foi o suficiente, no entanto, para causar uma impressão bem sólida e recorrente: o Alfa Romeo Giulia QV é uma meio que uma Ferrari de quatro portas que, ao que tudo indica, vai se sair bem na briga contra o BMW M3 e o Mercedes-AMG C63, seus maiores rivais declarados. A gente não precisa de uma declaração direta por parte da Alfa Romeo para saber que é exatamente isto que os italianos querem: o porte do carro, a configuração mecânica e até seu design deixam isto bem claro.
A gente já devorou todas as fotos e vídeos disponíveis na internet, mas dá para falar mais um pouquinho sobre o visual do Giulia QV: ele tem uma dianteira imponente, com faróis afilados e uma cara de bravo que causou um pouco de estranhamento no início, mas não precisamos de mais que algumas semanas para aprender a apreciá-la. O resto dos traços do carro ecoam os modelos mais recentes da Maserati, como o Ghibli — especialmente nas colunas C e nas lanternas traseiras. Um pouco mais de personalidade não faria mal, claro, mas a semelhança está longe de ser um defeito.
É preciso fazer uma observação sobre as rodas de 19 polegadas: elas têm desenho inédito, naturalmente, mas são claramente inspiradas no passado recente da Alfa Romeo, trazendo elementos circulares como as que equipavam as versões mais apimentadas do 156.
Falando nele: de acordo com a Autocar, o Giulia “não tem o mesmo visual compacto e elegante do 156, mas é menor e mais compacto que seus rivais”. Eles dizem que a versão a diesel pesa menos de 1.400 kg sem fluidos, o que é impressionante para a categoria. Neste quesito, o QV também não decepciona: são 1.524 kg do italiano contra 1.560 kg do BMW M3 e 1.730 kg do Mercedes-AMG C63. Ponto para o Alfa — que ainda tem distribuição de peso de 50/50. Parte disso se deve ao emprego de fibra de carbono nos componentes aerodinâmicos, no teto e no capô.
Abrindo a porta, a impressão é tão boa quanto do lado de fora: o painel é muito bem desenhado e foi bastante elogiado pela Car Magazine: “ainda que o Audi A4 saia na frente em termos de qualidade no interior, o Alfa Romeo é mais estiloso, muito melhor acabado que o Jaguar XE e bem mais espaçoso”. Já Ollie Marriage, do Top Gear, foi mais cauteloso:
Se você fizer uma comparação direta com o A4 ou o Série 3, o Giulia não é tão bem construído por dentro, os plásticos não se tocam com a mesma precisão milimétrica e dá para perceber que eles são mais finos quando se bate neles de leve. Mas, quer saber? É o Alfa mais bem construído em que eu já entrei, provavelmente tão bem montado quanto um Jaguar XE e, crucialmente, a qualidade é somente um elo um pouquinho mais fraco em uma corrente muito forte.
Bancos concha de fibra de carbono: serious business
É aí que entramos no mérito de o Giulia QV ser uma “Ferrari de quatro portas”. Segundo a Car, não é só jeito de falar: o time de engenharia responsável pelo carro foi liderado por Philippe Krief, o cara por trás da Ferrari 458; e o motor V6 biturbo de 2,9 litros é um parente direto do V8 da família F154 encontrado na 488 GTB e na California T.
A Alfa Romeo não é muito clara a respeito disso, limitando-se a dizer que o motor foi “inspirado pela Ferrari”. Isto, contudo, é uma questão de hierarquia: a FCA não quer prejudicar a exclusividade da Ferrari dizendo que emprestou um de seus motores para um sedã (não importa o quanto ele seja bom), mas a real é que, na prática, trata-se de um V8 de 3,9 litros com dois cilindros a menos. Os números não mentem: ambos os motores têm 487,5 cm³ por cilindro e compartilham as mesmas medidas de curso e diâmetro.
Claro, isto não quer dizer que a os motores são idênticos no aspecto técnico: a Alfa Romeo decidiu usar um virabrequim cruzado, mais simples, o que torna o carro menos girador: o limite fica pouco abaixo de 7.000 rpm. A potência máxima de 509 cv chega às 6.500 rpm, com o torque de 61,2 mkgf entre 2.500 e 5.500 rpm. É o bastante para chegar aos 100 km/h em 3,9 segundos, com máxima de 307 km/h. Nada mau, nada mau mesmo!
Câmbio manual, só nos EUA
Os exemplares testados pelos britânicos usam uma caixa automática de oito marchas fornecida pela ZF, à qual o Top Gear não economiza elogios:
A caixa de oito marchas da ZF é brilhante — as trocas são instantâneas como em um câmbio de dupla embreagem, acoplando no exato momento em que você pede por elas, e as enormes aletas são fáceis de usar apesar de serem montadas na coluna. Várias outras companhias usam esta caixa mas, em termos de aplicação esportiva, gostamos mais dela aqui do que em qualquer outro lugar.
A força é levada até as rodas traseiras por um cardã de fibra de carbono e um diferencial com vetorização de torque total — ou seja, conforme a necessidade, até 100% do torque pode ir para uma única roda. Em outros mercados, a Alfa Romeo oferecerá versões com câmbio manual de seis marchas e tração integral, mas o Reino Unido só terá a caixa automática de oito marchas, mesmo.
Mas afinal, como o carro anda fora de uma strip de arrancada? A resposta geral: suficientemente bem para ameaçar o reinado dos alemães. É unânime a impressão de que a Alfa Romeo achou o equilíbrio perfeito entre precisão e complacência. A influência da Ferrari é clara na relação direta da caixa de direção e no acerto da suspensão (braços triangulares sobrepostos na dianteira e multilink na traseira): o carro é muito ágil ao apontar nas curvas, mas não as rodas de trás não sentem a mesma urgência em escorregar.
O Alfa é mais fácil de guiar, mas recompensa quem sabe o que fazer com ele — especialmente com o seletor “DNA” no modo Race, exclusivo do QV, que desliga todas as assistências eletrônicas. As outras versões, que trazem apenas os modos Drive, Natural e Advanced Efficiency — este último, priorizando a economia de combustível. Os amortecedores ajustáveis são controlados separadamente.
O veredito geral é o de um carro com muito, mas muito potencial. Ele é mais leve que os rivais, anda tanto quanto eles e o acerto dinâmico em pista não deixa nada a dever. E a Alfa Romeo já prometeu que o preço do Giulia QV ficará no mesmo patamar do BMW M3 — ou seja, £ 60 mil, ou R$ 300 mil em conversão direta, no Reino Unido. Uma certeza a gente tem: este carro ainda vai dar muito o que falar.