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As versões especiais e fora-de-série do Chevette no Brasil

O Chevette é uma instituição brasileira. Eu sei que ele é originalmente um projeto global nascido na Alemanha, mas além de ter estreado primeiro no Brasil, também foi nestas ruas e estradas que ele alcançou sua popularidade máxima, tornando-se o líder nacional de vendas.

Depois da decadência natural de um projeto nascido nos anos 1970, ele acabou substituído pelo moderno Corsa como modelo de entrada da Chevrolet no Brasil e começou a descer morro dos carros usados, que dá acesso à rua dos carros velhinhos, antes de subir a ladeira dos carros antigos e voltar a ser desejado pelo público — agora em busca de um clássico nacional para alimentar o saudosismo sobre rodas.

Nesse meio-tempo, o Chevette também se tornou a resposta certa para quem procurava uma base acessível e confiável para um projeto de tração traseira — algo como o Escort MkI para os britânicos.

Produzido entre 1973 e 1994, o Chevette também passou boa parte de sua trajetória brasileira sem a concorrência de modelos estrangeiros, pois as importações foram proibidas entre 1976 e 1990. Foi o período mais prolífico das modificações “fora-de-série” e o Chevette, claro, acabou sendo base para estas conversões e transformações.

 

As séries especiais

Chevette País Tropical

A primeira série especial do Chevette é também a mais rara de todas: a série País Tropical. Lançada em 1976 e vendida somente entre janeiro e junho daquele ano, ela teve pouquíssimas unidades produzidas e menos ainda sobreviventes.

A questão é que a versão era voltada ao público jovem e inspirada pelo relançamento de “País Tropical” de Jorge Ben (Jor) naquele mesmo 1976. A versão se diferenciava das demais pela decoração mais despojada, com faixas adesivas nas laterais, rodas de aço mais largas com pneus maiores — as mesmas 13×6 do modelo GP, feitas pela Rodabras — pintadas e sem calotas, retrovisor esportivo (também o mesmo do GP) e um toca-fitas AM/FM da Nissei, novidade na época, com ligação estereofônica, que acompanhava uma cassette do álbum “Tropical” de Jorge Ben.

O Chevette País Tropical foi oferecido em praticamente todas as cores do catálogo da GM na época: bege Copacabana, verde ouro, preto formal, laranja bronze, prata inca, azul clássico e branco Everest. Nos carros bege Copacabana e laranja bronze, o interior era marrom, enquanto nos carros das demais cores o interior era preto.

As rodas e faixas também variavam de acordo com a cor da carroceria: no carro bege Copacabana as faixas e rodas eram laranja bronze — e nos carros laranja bronze as rodas e faixas eram o inverso, bege Copacabana. No carro verde Ouro as rodas e faixas eram cinza, nos carros azul clássico as rodas e faixas eram brancas, nos carros preto formal as rodas e faixas eram prateadas e nos carros branco Everest as rodas e faixas eram pretas.

Estima-se que menos de 2.000 unidades tenham sido produzidas, o que por si o tornaria raríssimo, visto que o Chevette teve mais de 1.500.000 unidades no Brasil. O problema é que o País Tropical, por se diferenciar apenas por itens estéticos, era um carro fácil de ser descaracterizado.

Afinal, imagine um retrovisor quebrado facilmente substituído por outro mais simples, as rodas de tala larga substituídas pelas rodas menores para reduzir o custo de troca de pneus e o desgaste das faixas adesivas ao longo dos anos eram suficientes para acabar com a exclusividade do carro. Como identificar um deste se nem mesmo pela plaqueta ele era diferenciado? Por um detalhe quase invisível: o recorte dos alto-falantes.

Como era o único Chevette com som estéreo de fábrica, ele tinha a base metálica do tampão traseiro recortado de fábrica para os dois alto-falantes, assim como as grades de proteção dos cones dos alto falantes, que eram exclusivas do modelo.

 

Chevette Jeans

A segunda das três séries especiais do Chevette chegou em 1979, já após o facelift do modelo que deu a ele a dianteira do Chevette americano. Como a série anterior, ela também era voltada ao público jovem e apelou à moda da época para atrair esse público: o blue jeans.

Talvez você não saiba, mas as calças jeans não eram exatamente populares no Brasil antes da segunda metade dos anos 1970. Foi justamente nesta época que elas começaram a se popularizar por meio de marcas como Staroup, US Top além da clássica Lee — esta importada e bem mais cara.

Diante dessa tendência indumentária jovem (pra usar um vocabulário coroa), a Chevrolet pegou o Chevette L 1979, trocou o tecido cotelê dos bancos por um revestimento jeans — com bolsos e tudo. O tecido fibroso está nos bancos e nas portas, que também tem um bolso semelhante aos bolsos traseiros das calças.

A personalização continuava com os para-choques que trocavam o cromado pelo preto fosco, e nos adesivos “JEANS” nas laterais. Só isso. O restante era exatamente igual ao Chevette L regular — incluindo o motor 1.4 de 60 cv.

A oferta de cores também era limitada por questões de preço, já que ele era o segundo modelo mais barato da linha, superando apenas o Especial, que era a versão voltada a frotistas e setores públicos. As únicas três cores oferecidas eram branco Everest, prata inca e azul Iguaçu metálico.

Como o Chevette País Tropical, o Chevette Jeans também teve um número incerto de unidades vendidas e produção limitada a um único ano-modelo. E também como o País Tropical, ele era um carro facilmente descaracterizável: os para-choques cromados eram mais baratos de repor e os bancos de tecido cotelê eram mais baratos que o jeans original. Bastava um pequeno esbarrão no trânsito e o desgaste dos bancos para que o Jeans se tornasse um L comum.

Isso também torna fácil de se recriar o Chevette Jeans, então a única pista é o código de identificação do carro iniciado com 5C, que era o usado nos Chevette L. Infelizmente, se alguém usar um Chevette L para recriar o Jeans, será praticamente impossível distinguir a recriação de um original.

 

Chevette Ouro Preto

Esta última versão do Chevette saiu em 1982, último ano antes do facelift definitivo do Chevette, que daria a ele a cara que o acompanharia até o fim da linha em 1994. Diferentemente das anteriores, a pegada do Chevette Ouro Preto era oferecer mais refinamento que os Chevette convencionais.

Muito dele vinha do SR, como o motor 1.6 com carburador de corpo duplo e 80 cv, o volante e o quadro de instrumentos. Os grafismos dos instrumentos, porém, eram exclusivos do Ouro Preto. Quem também era emprestado do SR era o para-choque dianteiro e o acabamento inferior da dianteira.

Na prática, era um SR sedã, porém sem a pegada esportiva do SR — tanto que vinha com as rodas de aço estampado básicas, apenas com pintura dourada para se diferenciar dos demais.

A oferta de cores, apesar de ser um modelo de topo, era limitada ao preto formal e ao dourado caramelo, e a versão era totalmente desprovida de cromados. Nos dois carros as maçanetas eram pretas, assim como os retrovisores.

Não havia filete nas borrachas dos vidros e até mesmo os parafusos de rodas eram pintados de preto.

Não se sabe exatamente quantas unidades foram produzidas, mas desta vez eles eram identificados pela plaqueta, com numeração exclusiva da versão. Ainda que fossem descaracterizados, portanto, eles podem ser identificados pelo número do chassi e pelo nome na documentação do carro.

 

GMC 500

Ela não era uma série especial propriamente dita, mas uma variação destinada ao mercado estrangeiro que acabou vendida por aqui e, por isso, tem ares de série especial — o que justifica sua inclusão na lista.

A GMC 500 era o nome internacional da Chevy 500, que era vendida em diversos países sul-americanos como Argentina, Uruguai e Equador. A picape era baseada na versão DL da Chevy 500, a mais luxuosa oferecida por aqui.

Isso significa que ela vinha com bancos de veludo (um belo veludo, por sinal…), revestimento das portas com o mesmo material combinado a vinil, e tinha o mesmo quadro de instrumentos do Chevette DL, com mostradores retangulares e relógio digital. Por fora, as rodas eram de aço estampado, e ela se diferenciava das demais pelos adesivos laterais que, mais tarde, seriam adotados na versão brasileira.

A venda local começou em 1992 e se estendeu até 1995, quando a picape saiu de linha para dar lugar à sua sucessora, a Pickup Corsa.

 

Os fora-de-série

Chevette Silpo Bi-Albero

Fender flares, aerofólio, faróis quadrados do Kadett alemão e rodas Cruz-de-Malta davam ao Chevette Silpo Bi-Albero visual que misturava esportivo de rua europeu com carro de competição. O Chevette Silpo, é obra do preparador Silvano Pozzi, fundador da Silpo, companhia que atuava como assistência técnica autorizada para os carburadores Weber.

A base do Chevette Silpo era seu cabeçote com comando de válvulas duplo, que era estava mais para um projeto pessoal de Pozzi do que um produto oferecido por sua empresa. Nos anos 70, Pozzi leu sobre os Opel Kadett equipados com duplo comando no cabeçote que estavam se popularizando na Europa e resolveu fazer um Chevette (que é a versão brasileira do Opel Kadett C) nestes moldes.

Juntando o conhecimento técnico que tinha e os recursos disponíveis na época, projetou um cabeçote com comando de válvulas duplo. Sendo italiano radicado no Brasil, Pozzi batizou o cabeçote de “Silpo Bi-Albero” — de Bi-albero di came a testa (árvore de cames dupla no cabeçote, em italiano).

O motor preparado por Pozzi tinha o comando duplo e cilindrada ampliada para 1.600 cm³ (naquela época, o motor do Chevette ainda era o 1.4). Não se sabe ao certo qual foi o ganho de potência, mas estima-se que o motor desenvolva cerca de 90 cv. A alimentação do motor é feita por uma dupla de carburadores Weber de corpo duplo. Dizem que, ao todo, cinco Chevette foram equipados com o comando e, destes, só o famoso Chevette azul sobreviveu.

O motivo pode estar em uma descoberta recente do MAO: o cabeçote de comando duplo foi fundido pela Scorro, mas é apenas uma adaptação feita sobre o cabeçote original do Chevette — a base foi mantida e somente uma nova “gaiola” foi feita para os comandos duplos. Desta forma, as velas continuavam na lateral da câmara de combustão, e não no centro, que é o principal benefício do comando duplo.

Na prática o “bi-albero” servia apenas para modificar o cruzamento dos comandos (graus de sobreposição da abertura e fechamento das válvulas), o que não trazia ganhos significativos de potência como um cabeçote DOHC legítimo poderia trazer.

 

Chevette Envemo

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Pouco se sabe sobre as modificações estéticas do Chevette Silpo, mas aparentemente elas foram inspiradas nos Chevette da Envemo — isso se não forem as próprias modificações que a Engenharia de Veículos e Motores fazia no Chevette. O exemplo mais conhecido deles é o kit inspirado no Chevrolet Camaro de segunda geração, lançado em 1970.

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Apresentado em 1974  no Salão do Automóvel, o chamado Chevette Envemo tinha uma grade externa saliente para o radiador, que como no Camaro (que, ironicamente, mudou naquele ano) ficava entre dois pequenos para-choques dianteiros; molduras nos faróis pintadas na mesma cor do carro, em vez de pretas como no Chevette original; e uma régua entre as lanternas traseiras.

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Havia a opção por um spoiler na traseira, splitter frontal e alargadores nos para-lamas. Tudo indica que a  Envemo forneceu este kit para o Chevette Silpo Bi-Albero, e provavelmente também foi a responsável por ampliar o deslocamento do motor para 1,6 litro – serviço que realizava sob encomenda e aumentava a potência do motor para cerca de 84 cv.

Depois, em 1976, a Envemo lançou outra modificação para o Chevette: o Minuano. A versão era inspirada pelo Kadett Aero vendido na Alemanha, basicamente um Chevette com o teto tipo targa, meio-conversível.

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As modificações estéticas eram realizadas a partir da coluna B: os vidros laterais traseiros eram menores, e o vigia traseiro dava lugar a uma capota removível de lona.

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Por último, quando o Chevette foi atualizado pela última vez, nos anos 1980, a Envemo também criou um kit estético para esta reestilização.

Desta vez, o conjunto dava a ele uma dianteira com grade plástica e dois pares de pequenos faróis retangulares, para-choques de fibra de vidro bem mais pronunciados que os originais, um pequeno spoiler traseiro e frisos laterais combinando com os para-choques.

 

Chevette 1700-C

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Entre 1976 e 1978, a concessionária paulistana Convel ofereceu o Chevette 1700-C que, como o nome dizia, tinha motor de 1,7 litro, que podia ser alimentado por um par de carburadores Weber com 40, 44 ou 48 mm de diâmetro. Além disso, era instalado um comando de válvulas de maior graduação, e coletores de admissão e escape redimensionados.

O Chevette 1700-C era capaz de chegar aos 160 km/h e modificações estéticas que incluíam a remoção dos cromados da carroceria, teto solar, rodas Cruz de Malta e revestimento de couro no interior.

 

O Chevette-Lotus

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Este é um dos projeto mais míticos do período no Brasil. Luiz Dränger, veterano engenheiro, nos anos 1970, preparou um Chevette praticamente zero-quilômetro com um cabeçote de duplo comando da Lotus.

Depois de uma viagem a Londres, Dänger trouxe de lá, comprado diretamente com a Lotus, um motor 1600 “big valve”, com o tal comando duplo no cabeçote, dupla carburação e 140 cv. O motor, capaz de alcançar as 7.800 rpm, foi instalado por Toni Bianco e transformou o Chevette no esportivo que ele nunca foi no Brasil.

Motor Lotus no Chevette

O carro ainda recebeu rodas de tala 5,5, mais largas, pneus Pirelli Cinturato. Por dentro, apenas um volante Motolita e um marcador de temperatura e pressão do óleo no lugar do medidor de combustível.

O resultado, segundo o relato de Bob Sharp no site Autoentusiastas, era um carro capaz de chegar aos 100 km/h em 7 segundos, com máxima de 206 km/h. Infelizmente o carro se perdeu no tempo — não se sabe onde ele está hoje em dia, ou mesmo se ainda existe.

 

Chevette Summer Luxo

A concessionária Dipave, de Curitiba/PR, foi uma das que entraram na onda das conversões. A partir de 1981, a revendedora ofereceu o Chevette Summer Luxo, versão conversível do Chevette que foi vendido esporadicamente até o fim daquela década.

Para remover o teto, eram realizados esforços estruturais e o bocal do tanque de combustível era deslocado para a traseira, entre as lanternas, já que a coluna “C” era eliminada. Era possível optar por bancos reclináveis, revestimento de couro, vidros elétricos, para-brisa com faixa degradê.

 

Avallone TF

Ok, eu sei que ele não parece um Chevette. Mas acredite, por baixo deste MG TF brasileiro há muita coisa do Chevette. Na verdade, diria até que sem o Chevette, não haveria Avallone TF.

Criado por Antônio Carlos Avallone, dono de uma fabricante de carrocerias que levava seu sobrenome, o Avallone tomava do Chevette os dois eixos o motor e a suspensão, tudo montados em um chassi do tipo escada com travessas que formam um “Y” para acomodar o conjunto mecânico.

A carroceria era fiel à do esportivo britânico MG TF – por isto seu nome – era fiel ao mesmo até no layout do conjunto mecânico. Isso o diferenciou drasticamente do MP Lafer, réplica do MG TD (antecessor do MG TF) que conservava o motor traseiro do Fusca, no qual era baseado, e tornou o Avallone mais valorizado que o rival.

A Avallone ainda faria o 6R, que indicava “6 rodas”. Não porque ele tinha um dos eixos duplicado, mas por que ele tinha dois estepes — um posicionado em cada lado do cofre do motor. Assim, as quatro rodas de uso mais os dois estepes totalizavam… seis rodas.