Os detratores do automóvel costumam compará-lo com uma arma. Sem surpresa nenhuma, tal analogia não agrada muito aos entusiastas – para que um carro se torne uma arma, ele precisa estar nas mãos de quem queira usá-lo como uma arma. É como uma agulha de tricô. Ou um castiçal (na biblioteca, nas mãos do coronel Mostarda).
No entanto, vez ou outra as fabricantes decidem dar nomes de armas a seus carros. Não apenas armas de fogo – armas brancas, também. E não é difícil deduzir o motivo: armas podem ser artefatos letais nas mãos erradas (em proporção muito maior do que os carros, aliás), mas também podem representar força, velocidade e habilidade. Não precisam ser armas de verdade, ou mesmo versões estilizadas delas. Elas nem precisam aparecer: bastam seus nomes.
Um dos exemplos mais óbvios é o Lamborghini Espada. Ok, talvez não seja tão óbvio porque o Espada não é o mais conhecido dos Lamborghini, mas todo mundo sabe o que é uma espada: uma lâmina longa, que pode ser usada com uma ou duas mãos, e existiu em diversas formas e versões ao longo da história da humanidade.
O Espada foi lançado cinco anos depois do primeiro Lamborghini, que se chamava 350 GT, e foi um dos que deram início à tradição da marca de batizar seus carros com nomes relacionados aos touros e touradas. “Espada”, no caso, é a espada que os toureiros usavam para matar os touros durante as corridas. E ele também foi o primeiro Lamborghini de quatro lugares.
Outros nomes são mais específicos, e é deles que vamos tratar neste post – e também falar um pouco sobre as armas que inspiraram cada um.
Vamos começar com as armas brancas – armas que não são de fogo.
Oldsmobile Cutlass
O carro: o Oldsmobile Cutlass foi um modelo bastante longevo na linha da General Motors, sendo produzido sem interrupções de 1961 a 1988, ao longo de cinco gerações. A mais conhecida dela sem dúvida é a terceira, que foi vendida entre 1968 e 1972 – a era de ouro dos muscle cars. Nesta época, o Cutlass usava a plataforma A da GM, compartilhada com o Pontiac GTO e o Chevrolet Chevelle. O maior motor era um V8 big block de 455 pol³ (7,5 litros) que, nas versões mais potentes, chegava perto dos 400 cv.
Entre 1982 e 1986, o nome Cutlass também foi usado como submarca dentro da Oldsmobile. Por exemplo, a versão da Olds para o Chevrolet Monte Carlo se chamava Cutlass Supreme, e foi fabricada até 1997.
A arma: cutlass, em inglês, quer dizer “alfange”, que pode ser uma foice usada para ceifar cereais ou cortar ervas, também chamada “gadanho”. Como arma de verdade, uma cutlass é uma espada curta, curvada, feita para ser usada com uma única mão e dotada de uma guarda para as mãos.
Dodge Dart
O carro: o Dodge Dart começou a ser vendido em 1960 e, na época, era um pouco menor que os full size da Dodge, com o intuito de ser uma opção mais barata. Nas gerações seguintes, ele assumiu proporções mais compactas – só mesmo nos EUA para um carro de quase cinco metros de comprimento e 1.600 kg ser considerado compacto. Nos EUA, ele foi fabricado até 1976, permanecendo até 1981 nas linhas de montagem da Chrysler do Brasil.
Houve, ainda, o Dodge Dart lançado em 2013 e descontinuado em 2017, desenvolvido em parceria com a Fiat. Ele trouxe de volta o nome Dart 35 anos depois, e foi o primeiro sedã compacto da Dodge desde que o Dodge Neon saiu de linha em 2005.
A arma: o dardo (dart em inglês) é uma das armas mais antigas da humanidade – já foram encontrados restos de dardos utilizados no período Paleolítico, entre 18.000 e 16.000 a.C., e eles eram muito presentes nos exércitos da antiguiadade e da idade média. Os dardos usados como arma costumam ser longos e quase sempre possuem rêmiges – elementos aerodinâmicos que ajudam na estabilidade do projétil. Os dardos são considerados uma versão primitiva das flechas.
AMC Javelin
O carro: O Javelin foi o pony car da AMC, companhia que rivalizava com as três grandes de Detroit especialmente nos anos 60 e 70. Lançado em 1968, foi fabricado até 1974, e nos dois primeiros anos 1968 e 1969) tinha um estilo bem próprio, com grandes para-choques cromados na dianteira e na traseira, contrastando com as peças mais discretas do Mustang e do Camaro, por exemplo.
O AMC Javelin usava motores V8 próprios da AMC. Sua versão mais interessante data de 1971: o chamado Go Package (ou so Go Pac) incluía um V8 de 401 cm³ (6,6 litro) com carburador de corpo quádruplo e 355 cv. O Javelin é o modelo mais querido pelos fãs da AMC.
Javelinas da Roma Antiga
A arma: a javelina (javelin em inglês) é um tipo de lança feita para ser atirada manualmente, e diferencia-se do dardo por ser mais fina, dotada de uma ponta de metal e desprovida de rêmige. Na Idade Média, contudo, havia máquinas feitas especialmente para lançar javelinas muito maiores ou muito pesadas para humanos.
Reliant Sabre e Scimitar
O carros: o Reliant Sabre Four/Sabre Six (dependendo da quantidade de cilindros do motor) foi produzido por apenas três anos, entre 1961 e 1963. Era um cupê pequeno, de dois lugares, com capô longo e traseira curta. O motor quatro-cilindros era um Ford de 1,7 litro e 73 cv, enquanto o seis-em-linha deslocava2 2,6 litros para entregar 110 cv.
O Reliant Scimitar veio depois, em 1964, com exatamente o mesmo chassi e o mesmo seis-em-linha de 2,6 litros. No entanto, ele tinha formas mais modernas, com três volumes bem definidos, superfícies lisas e proporções mais harmônicas. Mas a gente gosta mesmo do Scimitar GTE, que foi lançado em 1968 e trouxe a carroceria shooting brake – uma espécie de perua de duas portas com teto longo, chegando até a extremidade traseira. O Scimitar GTE foi fabricado até 1986, com pequenas mudanças ao longo dos anos.
Sir Christopher Lee durante sua ordenação como Cavaleiro pelo Príncipe Charles. Este é um dos usos do sabre hoje em dia
As armas: o sabre (sabre no Reino Unido e saber nos EUA) é uma espada curva que surgiu no Oriente Médio, com lâmina curvada e corte em apenas um dos lados. Acredita-se que sua introdução no Ocidente ocorreu no século 17, através dos turcos. O sabre também é frequentemente associado às Guerras Napoleônicas no fim do século 18. No fim do século 19, duelos com sabre em academias militares deram origem a esporte que hoje conhecemos como esgrima, que foi incluído entre as modalidades olímpicas em 1896. As espadas usadas em uniformes de oficiais do exército também se chamam sabres, embora não sejam curvos.
Já a cimitarra (scimitar em inglês) é como chama-se as espadas usadas pelos cavaleiros e cameleiros da Pérsia, sendo popular no século 16.
Sunbeam Rapier
O carro: o Sunbeam Rapier é o modelo mais antigo desta lista. Ele foi lançado em 1955 grupo britânico Rootes, no sul da Inglaterra, e era um pequeno sedã de duas com motor quatro-cilindros de 1,3 litros. Inspirado pelos Studebaker da época, ele de fato lembrava um mini-rabo-de-peixe americano. Em 1967, a Chrysler comprou o Grupo Rootes, que se transformou no braço europeu da gigante americana. O Sunbeam Rapier continuou sendo fabricado até 1976.
A arma: e voltamos ao início. Lembra do Lamborghini Espada sobre o qual falamos no início deste post? Pois rapier é o nome em inglês para a espada ropera, lâmina fina e pontiaguda usada pelos toureiros para matar os touros nas touradas.