Em cada feriado prolongado as notícias das polícias rodoviárias não são muito animadoras: aumento do número de carros, motoristas ansiosos e muitas vezes despreparados, acidentes e estatísticas trágicas. As mortes como sempre, são atribuídas ao “excesso de velocidade”. Mas como já falamos por aqui, a velocidade sozinha não mata ninguém, ela só agrava uma situação de risco que foi ignorada.
Uma dessas situações é a não utilização dos cintos de segurança — em especial no banco traseiro —, algo que a fiscalização eletrônica ainda não consegue flagrar.
Os cintos de segurança tornaram-se obrigatórios nos carros nacionais a partir de 1968, mas sua utilização só passou a ser exigida por lei em meados dos anos 1990 e reforçada pelo novo Código de Trânsito, publicado em 1998. A fiscalização intensa nos primeiros anos e a subsequente conscientização sobre os riscos de não se usar o cinto fizeram com que o ato se tornasse natural para os novos motoristas.
Contudo, o uso dos cintos no banco traseiro ainda não se tornou um hábito natural como nos bancos dianteiros. Em parte por causa da falta de fiscalização intensiva — ainda que a obrigatoriedade esteja prevista desde 1998 pelo Código de Trânsito —, em parte por causa da falta de conscientização.
Pode reparar: afivelar o cinto no banco de trás é quase uma ofensa a alguns motoristas e o gancho para piadas intermináveis sobre sua coragem e hombridade. É como se o passageiro prevenido estivesse prevendo um acidente catastrófico e não apenas cumprindo uma regra de segurança tão básica quanto dirigir de olhos abertos. Claro: isso só acontece quando os cintos traseiros não estão escondidos embaixo do assento ou atrás do encosto, afinal, eles só incomodam, não é?
Há ainda quem pense que o fato de haver dois encostos de banco logo à frente dos passageiros de trás os protege de ser atirados pelo para-brisa, ou quem ache que o fato de a traseira estar menos exposta a impactos os cintos não são necessários. Logicamente isso não poderia ser mais equivocado. Por quê? É o que veremos a seguir.
Como o cinto de segurança te protege?
Os institutos de segurança de todo o mundo, como o IIHS, dos EUA, e o ADAC, da Alemanha, estimam que o simples uso do cinto pode reduzir o risco de mortes em acidentes em até 45%. Mas como pode uma simples tira de tecido ser tão eficiente para salvar vidas?
Quando você está sentado em um carro em movimento, parece que o seu corpo e o carro são um só objeto, mas na realidade essa impressão é causada pelo fato dos dois objetos estarem se movendo na mesma direção e à mesma velocidade.
Se o carro bater em algum obstáculo, ele irá parar, mas seu corpo tende a continuar em movimento até que encontre um obstáculo que o faça parar. É a velha inércia, a Primeira Lei de Newton, que você aprendeu assistindo ao Mundo de Beakman ou na Ciranda da Ciência.
Esse obstáculo pode ser o banco da frente, o para-brisa, o retrovisor interno, ou o muro onde o carro no qual você estava dentro bateu. Ou então, você pode ser parado por um cinto e uma bolsa inflável, dois dispositivos planejados absorver a inércia do seu corpo da forma mais segura e menos dolorosa possível. Claro, a explicação pode ser resumida em: o negócio te amarra no banco e impede que você bata com a cara no painel ou saia voando do carro.
Os cintos de segurança apesar da aparente falta de elasticidade, cedem minimamente na hora em que seu corpo é projetado para a frente para que você não seja parado de forma tão abrupta como o carro — se fossem inflexíveis, os cintos causariam o mesmo efeito de bater o peito em uma barra de ferro. A elasticidade do cinto absorve a força do impacto do seu corpo contra ele pois a força é usada na deformação elástica do cinto (ele estica e volta ao normal).
Além disso, eles abrangem uma grande parte do seu corpo (toda a sua cintura e todo o seu tronco) de forma que a força da inércia não se concentre em apenas uma área pequena — como aconteceria com a sua cabeça contra o vidro dianteiro, ou com a cabeça do seu filho contra o banco de trás. Aqui a explicação é simples: a pressão é inversamente proporcional à área de contato. Quanto mais largos os cintos, menor será a pressão que seu corpo irá aplicar sobre eles — é o mesmo princípio da cama de pregos dos faquires.
Por isso também alguns fabricantes começaram a desenvolver os cintos infláveis, que se enchem de gás como os airbags no momento do impacto, aumentando a área de retenção do corpo em até cinco vezes em relação aos cintos comuns — o que significa que você sairá menos dolorido e ainda mais protegido.
Não é só para a frente!
Embora o cinto de segurança passe a impressão de que só serve para te impedir de bater a cabeça no vidro (e de pegar algo no porta-luvas durante uma aceleração) ele também impede seu corpo de ser projetado para todos os lados e até mesmo de ser arremessado pelas aberturas do carro.
É por esse motivo que muita gente acha que os cintos são dispensáveis no banco de trás — afinal, os bancos de frente teoricamente impedem que os passageiros saiam voando pelo para-brisa, mas o negócio vai muito além disso.
Em primeiro lugar por que um passageiro grande e pesado sem cinto de segurança pode ser arremessado contra o encosto dos bancos, esmagando os ocupantes da frente do carro. Em 2013 um contrabandista morreu esmagado por 500 kg de maconha que estavam soltos no banco traseiro depois de bater o carro em uma árvore. Claro, estamos falando de 500 kg de carga, mas a árvore é um obstáculo estático, então a velocidade resultante é a velocidade do carro mais zero. Quando você anda a 120 km/h e bate de frente com um caminhão a 90 km/h, a resultante é 210 km/h. Nesse caso não é preciso tanto peso solto para esmagar o banco da frente e reduzir ainda mais as chances de sobrevivência.
E não é só isso: muitos carros modernos têm sistemas multimídia no encosto dos bancos, que não absorvem os impactos como um banco acolchoado e ainda têm telas de cristal líquido, com elementos cortantes — que sempre devem ficar bem longe dos seus olhos.
Mesmo que você esteja andando tranquilamente pelas ruas do seu bairro, sempre existe a possibilidade de algum irresponsável furar a preferencial e acertar a lateral do seu carro, o que poderia arremessar os passageiros pela janela. Você também pode ter um pneu estourado na entrada de uma curva a 100 km/h e acabar capotando o carro. Se o vidro traseiro se quebrar Durante uma rolagem, um passageiro solto dentro do carro fica como um cubo de gelo em um liquidificador sem tampa: ele pode bater nas paredes ou simplesmente sair voando pela abertura.
Embora a traseira seja aparentemente mais protegida que a frente do carro, os vidros laterais geralmente não são laminados e podem se quebrar com a simples torção da carroceria. Em um capotamento o passageiro solto pode acabar com alguma parte do corpo para fora da janela e sofrer algum tipo de mutilação.
E por último, o cinto de segurança é indispensável para a eficácia do airbag — de cortina, inclusive. As bolsas infláveis são projetadas levando em consideração a retenção do ocupante do carro pelo cinto de segurança — em especial a tira sub-abdominal. Por ter uma inflação violentíssima, os airbags podem até causar sérios ferimentos nos ocupantes sem cinto de segurança.
Em 2008, o Dr. William F. Donaldson III da Universidade de Pittsburgh publicou uma pesquisa que estudou 12.700 pacientes com lesões vertebrais decorrentes de acidentes com carros equipados com airbags entre 1990 e 2002. O estudo concluiu que, dos 5.500 dos pacientes que tiveram lesões cervicais (nas vértebras do pescoço até a base dos ombros) 54% não usavam cintos de segurança, o que significa que o airbag sozinho não é suficiente para salvar vidas ou evitar lesões gravíssimas, que podem te deixar sem movimentos nas pernas ou tetraplégico.
Por fim, é bem provável que você vá pegar a estrada nos próximos dias, quando o trânsito tem uma combinação potencialmente perigosa de excesso de carros, pressa, distração consumo de álcool, motoristas inexperientes nas estradas, ultrapassagens e conversões em local proibido. Por isso, o FlatOut recomenda fortemente que você se proteja de todas as formas possíveis.
Claro, você certamente já evita beber ao dirigir, redobra a atenção no trânsito, mantém pneus calibrados e em bom estado, farois regulados e tudo mais. Mas, por favor, não esqueça de conferir se os passageiros estão com o cinto. Esse não é apenas um problema deles: você pode ser multado e, na pior das hipóteses, perder para sempre alguém querido. Tome por hábito perguntar se todos estão de cinto antes de arrancar. Queremos todos de volta.