Buenas, flatouters! Tudo bem com vocês? Pra quem não me conhece, meu nome é Yuri, tenho 35 anos, moro na gringolândia, ops, na Serra Gaúcha e assim como vocês, sou fanático por este site que nos brinda todos os dias com conteúdo gearhead de qualidade e variedade sem igual.
O pessoal das antigas talvez se lembre que eu já estive por aqui para compartilhar outra experiência f*dástica, em 2014, quando alugamos um carro em Paris e devolvemos em Roma, rodando quase 4 mil km pelo Velho Continente e passando por nove países. Hoje estou de volta para lhes contar sobre a viagem de férias que eu e minha amada patroa, a Raquel, fizemos em agosto de 2016. Desta vez, começamos em Roma e terminamos em Mykonos, na Grécia, passando por trocentos lugares bacanas no caminho. Porém, não tivemos o tempo todo um carro à disposição, apenas uma parte dos nossos dias no Velho Continente foi percorrida dessa maneira. O que não significa que esta viagem tenha sido menos incrível que a anterior… e é isso que quero compartilhar com vocês agora.
Senta que lá vem história. Prontos?
O planejamento e o início da viagem
Em 2014, nós havíamos planejado toda a viagem em torno do roteiro que desejávamos fazer. Isso tornou tudo (tudo mesmo) muito mais caro do que o necessário. Lição aprendida, desta vez fizemos diferente: esperamos aparecer uma promoção realmente BOA de passagens para algum lugar do nosso interesse e só então começamos a pensar no roteiro a ser percorrido. Assim, de certa forma, esta viagem realizada em 2016 virou uma “continuação” da viagem de 2014 – ainda que sem querer, o planejamento acabou encaixando como se tivesse sido bolado dessa forma desde o início.
Novembro de 2015, semana de black friday, com aquelas promoções imperdíveis de “tudo pela metade do dobro”. Não esperava nada de muito interessante, até que fui checar meus e-mails e, incrédulo, topei com uma oferta bacana do Smiles (programa de fidelidade da empresa aérea Gol). Havia passagens de Porto Alegre para Roma por 60 mil milhas ida e volta por pessoa, voando Alitalia. Pareceu bem atraente – naquele mesmo e-mail, tinha uma oferta “promocional” de POA para Lisboa voando TAP por 90 mil milhas ida e volta por pessoa. As datas disponíveis eram muitas, então pensei na hora que essa seria uma ótima oportunidade de planejar as próximas férias.
Só tinha um problema… naquele momento, eu tinha apenas a metade das milhas necessárias, então precisaria juntar o restante de algum jeito. Comecei a catar outras promoções e com a ajuda valiosa do site Melhores Destinos, encontrei uma oferta de transferência de pontos do cartão de crédito para o Smiles com bônus de 70% e também por lá, achei um cupom de desconto para comprar milhas avulsas com desconto de 60%. Combinando tudo isso, pude comprar as milhas que faltavam e ainda sobrou uns trocados.
Consegui adquirir nossas passagens para viajar durante a segunda quinzena de agosto de 2016. Eram longos 9 meses de espera, mas valeu a pena: neste meio-tempo, fui montando os roteiros possíveis e monitorando ofertas de hoteis, de passagens aéreas pela Europa, de aluguel de carros e afins. Pensamos em várias opções: fizemos um roteiro apenas pela Itália, para conhecer alguns lugares novos e revisitar outros; pensamos também num roteiro entre a Alemanha e alguns países do Leste Europeu; cogitamos um roteiro que circulava toda a França… acontece que todos tinham algum inconveniente para executar: podia ser um custo extra proibitivo, ou tempo demais que seria gasto em deslocamento adicional, sem contar o risco de passar “rápido demais” por algum lugar por causa de um itinerário muito apertado, como aconteceu da última vez.
Ficamos nesse dilema, até que a esposa deu a ideia de irmos à Grécia e realizar um sonho que sempre tive desde criança, conhecer a Acrópole de Atenas. E não é que (mais uma vez) ela estava certa? Pesquisei passagens da Itália para Atenas e encontrei por uma bagatela voando EasyJet. Já a volta, da Grécia para a Itália (pois nosso voo de volta ao Brasil partia de Roma), achei preços razoáveis voando Vueling. Estas são duas das muitas companhias low-cost que operam por lá, que oferecem passagens relativamente baratas em troca de serviços quase nulos – você paga por quase tudo, desde o despacho de bagagem até a opção por poltronas reclináveis, por exemplo.
Um dos vários momentos de tensão, já no planejamento da viagem: quando você compra uma passagem aérea para um voo doméstico na Grécia e o comprovante vem escrito em… cirílico? Russo? WTF?!
No fim das contas, montamos um roteiro meio maluco, mas que fechou certinho com o que gostaríamos de fazer e estávamos dispostos a pagar. A única exigência é que teríamos de viajar com pouca bagagem, para não morrer com os custos de despacho a cada aeroporto. Era verão no Velho Continente, então resolvemos apostar e viajamos com uma única mala de mão para cada pessoa. Parece loucura, não? Depois falamos sobre isso novamente.
Repare no tamanho da garrafa de Coca-Cola de 1,5 litro comparada às malas…
Roteiro montado, aluguel de veículo reservado, hoteis reservados… tudo econômico e/ou custo benefício. Numa quarta-feira de manhã cedinho, meus sogros nos levaram ao Aeroporto Salgado Filho e…
FUZIMO DE BENTO! (de novo!)
Pois bem: embarcamos num voo da Gol para Guarulhos, onde fizemos conexão com o voo da Alitalia para Roma. O trajeto poderia ter sido melhor… quem quiser mais detalhes sobre isso pode perguntar na área de comentários. Dia seguinte, 8 da manhã (hora local) chegamos na Cidade Eterna e nos dirigimos ao nosso hotel.
Quando chegamos ao hotel, senti que tinha feito uma burrada. Sabe aquelas fotos bem produzidas que divulgam nos sites de reserva? Pois é, caí numa dessas armadilhas. O hotel era relativamente bem localizado (perto do Termini, o que facilitaria nosso deslocamento pela cidade), mas era um prédio velho de apartamentos, sendo que o “hotel” ocupava os dois ou três primeiros andares desse prédio.
O bairro era espécie de “Chinatown” de Roma. Nosso recepcionista e o staff do hotel eram orientais (que tinham um sotaque bem forte no inglês) e foram bem atenciosos e cordiais no atendimento – até aí, nada a reclamar. O problema foram as instalações: o quarto nem de longe parecia com as fotos da divulgação. Tinha muita sujeira, cheiro de mofo, enfim, um legítimo muquifo (e pior é que nem foi lá tão barato assim). Bom, cagada feita, ao menos eram somente duas noites por lá. Vida que segue…
A famosa Via dei Fori Imperiali, com o Coliseu ao fundo
Em Roma, pulamos as atrações mais famosas e fomos conhecer o que não tínhamos visto da última vez: a Piazza del Popolo, os jardins da Villa Borghese, o Castel Sant’Angelo (imperdível!), a Fontana di Trevi (que estava em reforma em 2014). Tudo a pé e de metrô, naturalmente. Passamos novamente pela Cidade do Vaticano, pelo Fórum Romano, pelo Coliseu… e o fato de não termos de enfrentar filas gigantescas ajudou muito, aproveitamos bastante nossa estadia por lá.
Fontana di Trevi
Piazza del Popolo
Castel Sant’Angelo, com sua vista panorâmica espetacular
Uma minúscula parte dos Jardins da Villa Borghese
Dois dias depois, pegamos um trem para Nápoles. Três horas de viagem e nos hospedamos num hotel Ibis Styles, logo ao lado da estação ferroviária, onde descansamos um pouco – uma excelente opção de hotel, aliás, que compensou o stress que passamos na hospedagem em Roma.
Mais tarde, fomos conferir a “melhor pizza do mundo”. Certamente vocês já devem ter assistido, ou ao menos ouvido falar, do filme “Comer, Rezar, Amar”, com Julia Roberts, durante o qual a personagem passa uma temporada pela Itália comendo, e comendo bem. Pois então, fomos até La Antica Pizzaria da Michele, onde foram rodadas algumas cenas do filme, enfrentamos uma muvuca que só italianos poderiam decifrar…
Um exemplo de fila organizada à napolitana
…para só depois disso conseguir uma mesa e então, foi isso que nos serviram por lá:
Quase deu pra fechar o buraquinho da cárie
Pois é, a tal pizza existe e deve mesmo ser a melhor do mundo, porque o troço é inacreditável: extremamente saborosa, com uma massa bem fininha, diferente de qualquer pizza que eu já tinha experimentado antes. E não custa nenhum absurdo de caro – aliás, a comida em Nápoles é mais barata do que no resto da Itália – e a porção é individual!
No dia seguinte, acordamos cedo e fomos conferir as ruínas de Pompeia. Uma hora de trem até lá e muita, mas muita caminhada para conferir o lugar. Para quem curte história e arte, é imperdível.
Um pouco do panorama de Pompeia, com o Vesúvio ao fundo
Em um dos portões de acesso, há esta exposição de algumas das vítimas da fúria do Vesúvio, que riscou Pompeia do mapa
Final da tarde, voltamos a Nápoles e para não perder o resto do dia, espichamos até o Castel San Telmo, uma legítima fortaleza medieval no topo da montanha incrustada na cidade.
Haja ângulo pra pegar o castelo inteiro… e pernas pra subir a rampa até o topo
De maneira geral, a cidade de Nápoles nos deixou uma impressão estranha. O aspecto da cidade é de prédios antigos, gente mal-encarada, trânsito pra lá de caótico (sério, Roma parece a Escandinávia perto do que a gente viu por lá – pior que isso, só a Cidade do México, mas isso é história pra outro relato). Sem contar que os próprios funcionários do hotel nos deram alguns avisos sobre como se portar na cidade, para não dar mole. Já viu né? No fim das contas, não tivemos tempo – nem coragem, admito – de explorar a cidade mais a fundo. Se tivéssemos tempo, além da cidade propriamente dita, talvez espichássemos até a Ilha de Capri ou para a Costa Amalfitana, que fica perto dali, mas não deu para encaixar no roteiro, porque já na madrugada seguinte, pegaríamos nosso voo da EasyJet para Atenas.
Chegando à Grécia
Demorou pra cair minha ficha, mas estávamos na Grécia, o berço da civilização. Pra mim, foi um sonho realizado – e eu não imaginava que seria tão bacana quanto foi.
Só acreditei quando vi de perto
O Aeroporto de Atenas deixou uma ótima primeira impressão – tudo moderno, limpo e organizado, herança das obras para as Olimpíadas de 2004 no país. Pegamos um metrô para o centro da cidade, descendo na estação da praça Syntagma (pronuncia-se “zín-dág-má”) e pegando um segundo trem até a estação de Metaxourgeio (pronuncia-se “mêta-csúr-guio”). A segunda boa impressão foi causada pelo metrô da capital: tudo modernizado, trens novinhos, estações ridiculamente limpas e conservadas – algumas delas eram mais caprichadas do que o saguão do Salgado Filho em Porto Alegre. Vejam só:
Infraero, aprenda como é que se faz
Chegamos então ao Hotel Cosmos (finalmente um nome grego que eu consigo falar sem travar a língua). Apesar do aspecto antigo, o quarto e o hotel como um todo não nos pareceram tão ruins. Quanta ingenuidade… mas como chegamos cedo na capital grega, não perdemos tempo e logo tratamos de sair para explorar a cidade. Compramos o passe turístico de dois dias no Athens City Sightseeing – um dos vários ônibus “hop on/hop off” que te permitem conhecer a cidade em um circuito de pontos de interesse. Muito útil para quem tem roteiros apertados como o nosso (apenas dois dias inteiros para conhecer a cidade), pois te leva direto de um ponto de interesse a outro. Nosso passe também permitia passar pelas praias nos arredores de Pireu, onde fica o Porto de Atenas. Vale o passeio, a orla é bonita e bem arborizada.
O passeio no ônibus começava pelas praias de Pireu e depois cruzava vários pontos de Atenas
Depois de um primeiro dia extremamente produtivo – conhecemos quase a cidade inteira com o busão – pegamos o metrô para Metaxourgeio e voltamos tarde da noite para o hotel. Jantamos ali perto mesmo e fomos para o quarto, para tomar um bom banho e cair na cama – ou ao menos pensávamos que seria assim.
O que encontramos foi um chuveiro com cortina mofada, um aparelho de ar condicionado que não funcionava (e fazia uns 35 graus naquela noite) e uma cama que tinha o formato convidativo de colher de sopa. Sabe aquele colchão que te incentiva a ficar bem junto com a patroa? Então…
Programa Fome Zero à grega
Na manhã seguinte a uma noite meio mal dormida, tomamos um café reforçado na padaria gigantesca que tinha ali perto (que tinha um nome bem apropriado: Bread Factory) e tomamos o metrô para conferir a maior atração de Atenas, a Acrópole. Peguei uma hora e meia de fila só para comprar os nossos ingressos, depois subimos uns 3500 degraus até chegar ao topo da “cidade antiga”, mas valeu demais a pena. Ter visto o Partenon logo ali, na minha frente, foi um negócio que eu nunca imaginei que poderia realizar. Ficamos cerca de três horas explorando o local, batendo perna e caindo o queixo.
Um pouco da Acrópole de Atenas
Saímos de lá, batemos um sanduba num restaurante nas proximidades e fui abordado por uma menina pedindo “moedinhas”. Até quem pede esmola tá preparado para o turismo: disse para a guria que eu não tinha moedas (pior é que não tinha mesmo) e ela, sem pensar duas vezes, me disse que tinha troco… só faltou oferecer a maquininha para passar o cartão. Acabei comprando um sanduba para ela também e seguimos adiante.
Enfim, tínhamos metade da tarde disponível e não queríamos voltar para o hotel, apesar do cansaço. Pegamos novamente o bus turístico e ficamos passeando pela cidade mais uma vez. Quando começou a anoitecer, fomos conferir o bairro de Monastiraki e voltamos para o bairro de Plaka, próximo à Acrópole, que é uma região cheia de bares, restaurantes, lojinhas, onde só se pode trafegar a pé. São dois bairros fantásticos, que convidam a um souvlaki com uma cerveja bem gelada.
Monastiraki e Plaka, excelentes para um happy hour
Quase meia noite, ainda estávamos na Plaka – e o lugar continuava fervilhando em turistas curtindo a noitada. Resolvemos pegar o metrô para voltar ao hotel. Inicialmente tivemos um pouco de receio de assaltos ou coisa do tipo, mas ao chegar à estação Akropoli, vimos mais um pouco de arte grega – extraída diretamente das ruínas da Acrópole – e encontramos trens movimentados, mas que não nos despertaram qualquer tipo de medo, ao contrário: o povo grego no geral é bastante cordial e solícito, especialmente com os turistas.
Chegamos no hotel precisando de um bom banho e uma boa noite de sono – claro que não foi possível, considerando a cama-colher que nos esperava. Mas o melhor é que naquele momento (passava da meia-noite) descobrimos que naquele estabelecimento, “o serviço de quarto é opcional, deve ser solicitado com antecedência e só é oferecido dia sim, dia não”. Traduzindo: toalhas fedidas estavam nos aguardando. Pior: o ralo daquele chuveiro com cortina mofada estava entupido, então se você desse mole, pegava frieira a granel. Tivemos que tomar banho pendurados nas bordas do espaço reservado ao chuveiro e nos secar com as toalhas de rosto que ainda não havíamos usado. Resumindo: estávamos num muquifo ainda pior que o de Roma.
Por sorte, o dia seguinte já era o dia de pegarmos a estrada. Fizemos check-out da espelunca que nos abrigou naquelas duas noites e tomamos nosso rumo em direção ao aeroporto.
A epopéia do aluguel do carro
Durante o planejamento da viagem, pesquisei e optei por reservar um carro “econômico” através do site Expedia, que me ofereceu os veículos da locadora U-Save em Atenas – esse nome já dá a letra de como as coisas funcionam. O serviço escolhido era do tipo “meet & greet”, no qual uma van da locadora te busca no aeroporto indicado e te leva até o local onde está o carro. Na devolução do veículo, você devolve o carro no aeroporto, onde já estarão te esperando.
Em Atenas, o preço da passagem de metrô entre quaisquer estações é fixo em €1,40 por pessoa. A exceção é o Aeroporto: caso você esteja chegando ou saindo da capital, você deverá adquirir um bilhete especial que custa €10 – sim, é caro. Se você tentar burlar essa regra e um fiscal te pegar, a multa é de 60 vezes o valor da passagem devida (faça as contas: 60 x €20,00 = muito mais do que estaríamos dispostos a gastar). Para duas pessoas, tem um descontinho e sai por €18. Na chegada, não tínhamos escolha – pagamos os €18 e seguimos até o nosso destino.
Porém, no dia que tínhamos de retirar o carro que alugamos previamente, resolvemos assumir nossa descendência italiana e fomos mão-de-vaca. Ao invés de ir até o aeroporto e morrer com mais €18, pedimos para o recepcionista do hotel ligar para a locadora e acertar que a van deles nos buscasse na estação de metrô em Koropi, a última antes do aeroporto. Desta forma, pagaríamos apenas os €2,80 para chegar até lá, a van nos buscaria e retiraríamos o carro normalmente. Combinamos com o pessoal da locadora que ao chegar na estação, ligaríamos para eles nos buscarem por lá. Assim partimos e pegamos o metrô para Koropi. Fácil, né?
Calma, cara-pálida. Chegamos em Koropi e… estávamos no meio de uma auto-estrada, numa estação que não tinha NADA, nenhum cazzo de telefone público para usar, nenhuma alma caridosa que falasse inglês (e é claro que eu não falo grego) e meu celular não funcionava (ah, o tal de roaming internacional…). Ficamos vagando por lá durante uns 20 minutos pensando no que fazer além de me atirar nos trilhos, até que encontrei um segurança da estação, que por sorte falava inglês.
O cara foi a nossa salvação. Expliquei a furada que nos enfiamos e ele prontamente ligou do celular dele para a locadora para avisar que estávamos lá. Não apenas isso, ele nos acompanhou até a van chegar – e olha, demorou mais de uma hora e meia. Nesse tempo, conversamos bastante e o cara me contou que lutou no Afeganistão, que tinha mulher e dois filhos e que já tinha viajado ao Rio de Janeiro e tinha um carinho todo especial pelo Brasil – tivemos mais essa sorte. Ofereci uma gorjeta por toda a ajuda, ele recusou veementemente e acabou aceitando só um café mesmo, pois estava ali “por boa vontade de nos ajudar”. Ingrato eu, não lembro o nome do rapaz, mas foi um amigo que nós não esperávamos encontrar num momento tão estranho.
Enfim, chegou a van, fomos buscar nosso veículo alugado. Naquela ocasião, minha reserva era de €27 por dia por uma “viatura econômica”. Cheguei lá e descobri que minhas opções seriam um “Hyundai Atos ou similar” – sendo que o “similar” era outro Hyundai Atos, que nem estava mais lá porque já tinha sido alugado.
Nope…
Eu sabia que esse era o veículo de referência, mas sabendo que essa rácola esse modelo saiu de linha já faz alguns anos, pensei que pudesse ser um Hyundai i10 ou algo do tipo. Não era… o que me esperava era um Atos mesmo, e bem surrado. Óbvio que a patroa se recusou a rodar quase 1000 km com aquela ranharia, aí me pus a negociar com o gerente da agência.
Inicialmente, pedi se era possível um upgrade. Ofereceram um Fiat Grande Punto (igual ao nosso Punto brasileiro) por €30 por dia. Olhei pro carro, tinha um discreto amassadinho que começava no pára-lama dianteiro esquerdo e terminava no pára-choque traseiro. Pedi por outras opções, tinha um Seat Ibiza por €40 por dia, mas já estaria “reservado para outro cliente” (aham, sei).
E eis que olhando melhor, encontro essa belezinha aqui:
Yeah!
Um belíssimo Mazda MX-5 Miata azul metálico, da geração NB. Imediatamente, meu gene gearhead ligou o alerta e me mandou negociar. Pedi o preço por dia: €60. Mais do que o dobro do que eu havia planejado. Recusei, com aperto no coração, para não comprometer demais o orçamento.
Voltei a negociar pela locação do Seat Ibiza. O carrinho branco estava novinho – tinha menos de 2 mil km rodados no odômetro. O gerente fez jogo duro e não quis me liberar esse “upgrade”. Em determinado momento, o cara percebeu que estávamos com (muito) pouca bagagem e começou a conversa:
– Ei, quanto você está disposto a gastar para sair com o Mazda?
Olhei para a esposa e concordamos em oferecer no máximo o que pagaríamos pelo Seat.
– €40 por dia é o nosso limite – respondi.
– Feito, pode levar.
Quase não acreditei. Contive a euforia, assinei a papelada e fui inspecionar o carrinho. Bonito, lindo e joiado, mas tinha um monte de detalhes na lataria – registrei todos antes de sair para evitar stress na devolução. Abrimos o porta-malas e vimos um latifúndio de espaço, onde mal cabia uma ou outra mala média. Pensei na hora: “fodeu, não vai caber a bagagem”. Nesse momento, coloquei a primeira mala, coloquei a segunda, mexe daqui, aperta dali, amassa um pouco, atravessa as malas, até que a tampa fechou!
Tudo certo, GPS instalado, bagagem armazenada e saímos de Miata da locadora, deixando aquele Hyundai no lugar de onde espero que ele nunca saia. Quando dobrei a esquina da locadora, olhei pra Raquel e caímos na gargalhada! Aquele carrinho era fantástico, eu sempre babei pelo MX-5 mas nunca tinha tido a chance de dirigir um daqueles. Então, estávamos com um carrinho totalmente gearhead, conversível, com tração traseira e um motor 1.8 de 130cv à disposição em pleno verão grego. Não dava para ficar melhor do que aquilo.
Sol no rosto e brisa nos cabelos rumo ao Peloponeso
Para quem, como eu, nunca tinha tido a chance de dirigir, sequer de entrar em um MX-5, aquilo era (mais) um sonho realizado.
A primeira impressão, confesso, foi de clausura: a capota fechada reforçava essa sensação, apesar do couro caramelo do interior dar uma arejada no ambiente. O carro é bem pequeno, chegamos a ter dificuldade para encontrar um porta-copos ali dentro (eram apenas dois no console entre os bancos, logo acima do túnel central da transmissão). Apesar do aperto, conseguimos encaixar quase toda a bagagem no porta-malas minúsculo do carrinho (lembra que eu falei que uma das melhores coisas que poderíamos ter feito era viajar somente com a bagagem de mão? Então…), mas naturalmente algumas coisas tinham que nos acompanhar na cabine – câmera, carteira e documentos, bebida e comida pra viagem, o livro-guia e outras coisas desse tipo.
Assim já é legal…
Depois de encontrar o lugar certo para cada coisa, prendi o GPS no para-brisa, me acomodei no banco inteiriço (que por sinal tem uma ergonomia bem bacana, te acomoda como se fosse uma roupa que você veste) e comecei a admirar um pouquinho os detalhes do interior: conjunto Nardi Torino com volante, manopla do câmbio e freio de mão em madeira; vidros, espelhos, travas elétricas, ar-condicionado, direção hidráulica – o kit dignidade não apenas era completo, mas também estava todo lá e funcionava (importante frisar isso, porque depois do que eu vi naquela locadora essa seria uma dúvida bem pertinente).
Dei a partida e veio aquele ronco suave mas encorpado do motor 1.8 16v. Ajustei os espelhos, pisei na embreagem (um pouco pesada, provavelmente devido aos 13 anos de uso do carro que depois descobri ser ano 2003), engatei a primeira das cinco marchas (ah, aquele câmbio justinho, os engates precisos, o curso bem curto… que espetáculo) e saímos para a estrada.
Inicialmente, resolvemos não baixar a capota – eram cerca de 14:00 e o sol estava de rachar. Acabou sendo uma boa ideia até mesmo para conhecer melhor o carrinho e no fim das contas os primeiros quilômetros foram feitos na clausura e com o ar ligado. Descobrimos um carro que não era lá tão silencioso – afinal de contas, a capota é de tecido – mas nada de insuportável. A ergonomia ao volante é perfeita, ou muito perto disso – todos os comandos estão à mão e você se acostuma rapidinho com a vida divertida que ele te oferece. Divertida mesmo: No primeiro pedágio, tive que me esforçar para alcançar o dinheiro à operadora, pois o carrinho é baixinho feito um kart. Me senti um idiota naquela hora e a operadora do pedágio ficou rindo dos meus esforços, mas faz parte da brincadeira.
Painel voltado ao motorista, do jeito que tem que ser
O Miata é interessante porque parece que trata bem qualquer motorista que goste de dirigir, seja num ritmo mais calmo (geriátrico, alguns diriam) ou mais animado. O motor 1.8 tem torque suficiente para não pedir marcha o tempo todo, então enfrentar algum trânsito urbano não foi uma tarefa tão complicada quanto pode parecer. Da mesma forma, quando precisava de força para uma ultrapassagem, bastava baixar da quinta para a quarta que o carro embalava legal para a manobra.
Mas é a partir dos 4000 RPM que o carrinho acorda, o ronco fica mais alto, a adrenalina sobe e quando você percebe, está empilhando marcha atrás de marcha na maior empolgação. Some aí a suspensão firme, o entre-eixos curto e a distribuição de peso de 50%-50% em um carro de tração traseira e você tem um conjunto matador. E eu já mencionei que o fato dele ser conversível deixa tudo ainda mais interessante?
Agora… é bom que sua esposa esteja ciente dessas características do carro ao sair para uma viagem mais longa com ele. A mesma suspensão que garante sorrisos para quem dirige pode se revelar bem cansativa em trajetos mais longos. Além disso, o aperto na cabine pode ser um problema relevante se os ocupantes tiverem o mau costume de levar muita tralha consigo (tipo umas quatro garrafas de bebida, uma sacola cheia de salgadinhos e lanches, nécessaires, bolsas, mochilas etc). O Miata não é desconfortável, longe disso, mas não espere um Toyota Corolla, macio, silencioso e sonolento, aqui o jogo é outro.
Na auto-estrada, saindo de Atenas em direção a Corinto
Fizemos cerca de 110 km rumando em direção ao Istmo de Corinto, para acessarmos a península do Peloponeso. O Istmo de Corinto é obra humana, um canal de 6,3 km de extensão construído em 1893 que “rasga” a península do Peloponeso. Foi construído com o objetivo de encurtar a navegação entre o Golfo de Corinto e o Golfo Sarônico – antes do Istmo, os navios precisavam contornar toda a península do Peloponeso para alcançar a outra ponta.
Bungee jump aqui é fichinha
Nesse lugar, paramos para almoçar e conferimos um pouco do Istmo – trata-se de uma garganta através da qual passam navios cargueiros e onde alguns aproveitam para fazer bungee-jump. Barriga cheia, já eram umas 15:00, baixamos a capota e seguimos viagem.
Aliás, baixar a capota do Miata é simples, totalmente old school: solte as duas travas que prendem a capota às colunas A, abra o zíper que mantém o vidro traseiro no seu lugar e por fim, dobre a capota até o seu lugar atrás dos bancos. Para fechar, é só fazer o processo inverso. Nada de capota elétrica aqui – só a partir da geração NC.
De capota baixa TUDO fica melhor!
Àquela altura, o sol já estava menos forte e pudemos começar a curtir o barato do roadster. O comportamento dinâmico do carro (exemplar, diga-se de passagem) quase não muda – mas a experiência sensorial é totalmente diferente, a sensação de liberdade é enorme, você passa a ouvir tudo o que acontece ao seu redor, o sol e o calor já não são empecilho… enfim, é um negócio que vicia mesmo.
Mais uns 60 km e chegamos a Nafplio, uma cidade litorânea muito convidativa. Chegamos e fizemos check-in no Dias Hotel Boutique, que ficava num prédio restaurado dentro do bairro histórico da cidadezinha, ao qual só se pode acessar a pé. Deixamos o Miata ali perto e levamos nossa bagagem ao hotel. Descobrimos que acertamos em cheio, o hotel era simplesmente espetacular, foi um prêmio depois do perrengue de Atenas.
Inicialmente, imaginávamos que seria apenas um local estratégico para uma fazer uma parada e descansar, então uma noite apenas no hotel seria suficiente para explorar a cidade e seguir adiante. Saímos caminhar para conhecer o lugar naquele final maravilhoso de tarde. As fotos falam por si só:
Não dá vontade de ir embora
Sério, deveríamos ter deixado um tempinho a mais para curtir esse lugar. Praias lindíssimas e o centro histórico é extremamente agradável, ainda mais à noite – jantamos uma belíssima travessa de frutos do mar com salada grega, com direito a um gelato italiano de sobremesa (aliás, o melhor gelato italiano que provamos foi lá, em Nafplio, Grécia). Na manhã seguinte, tomamos um café da manhã maravilhoso no hotel (que possivelmente tenha sido o melhor de toda a viagem, aliás) e saímos para passear mais um pouco. Lugarzinho espetacular, deu pena de ir embora.
A noite de Nafplio pede um passeio sem pressa
Almoçamos ainda em Nafplio, saímos da cidade pouco depois do meio-dia, abastecemos o Miata e pegamos a estrada.
Destino: Archaia Olympia
Nosso próximo destino era a cidade histórica de Olímpia, ou melhor, a “velha Olímpia”, como diz o nome oficial. Foram cerca de 180 km, dos quais uns 60 km na autoestrada (com pedágio, mas com sinalização e asfalto excelentes) e o restante numa estrada vicinal, pois queríamos fugir dos caminhos óbvios (traduzindo: rodovias nas quais você vê muito pouca coisa interessante), então resolvemos encarar um caminho de serra pela cidade de Vytina.
Em meio às montanhas do Peloponeso
Esses últimos 120 km foram bem peculiares. Inicialmente, pegamos uma estrada de mão dupla, com asfalto apenas razoável – que nos trouxe lembranças bem vivas do Brasil, aliás – até os arredores de Kaloneri. Daí em diante, pegamos uma estrada bem estreita, costeando um penhasco, na qual mal passava um carro por vez, mas ainda de mão dupla, com direito a alguns veículos dos moradores da região estacionados nas beiradas. Foi meio tenso, mas confesso que foi divertido!
Infelizmente, neste trecho nós ficamos sem bateria na câmera e no celular também… pequena falha de planejamento, mas o mapa e o Street View acima dão uma ideia da brincadeira. Pior é que o trajeto era espetacular, mas as únicas imagens que ficaram com a gente foram as das nossas lembranças mesmo. Faz parte…
Chegamos em Archaia Olympia perto das 15:00. Deu pra ver que nosso ritmo foi geriátrico, curtindo o caminho, né? A cidadezinha histórica é minúscula, rapidamente encontramos o Hotel Kronio. Outro hotel bem honesto, com instalações bem cuidadas, local para estacionar e próximo a todas as atrações do lugar.
Na prefeitura da cidadezinha, a bandeira do Brasil hasteada junto à bandeira grega e dos Jogos Olímpicos, fazendo referência aos Jogos Rio 2016
A senhora que nos recebeu no hotel (descobri depois que era a mãe do proprietário) não falava muito bem o inglês, mas além de grego ela falava… francês! Por sorte, eu tenho uma certa obsessão por idiomas, então, depois que ela nos instalou no nosso quarto, ela perguntou:
– De onde vocês são mesmo?
– Do Brasil – respondi, arranhando meu idioma napoleônico.
– Hum… interessante, falam francês no Brasil? – disse, curiosa.
Dei uma risada e expliquei que sou eu que gosto de aprender outros idiomas mesmo. Merci beaucoup, au revoir e vamos ao parque histórico da cidade. Deu tempo de conhecer o museu e as ruínas dos primeiros Jogos Olímpicos, imperdível para quem curte história como a gente.
O museu e um pouco do sítio arqueológico de Olímpia, palco dos primeiros Jogos Olímpicos da história
Na volta, paramos em um restaurante da avenida principal, pedimos duas porções de gyros com aquela cervejinha gelada e partimos para o hotel descansar. Foi legal porque chegamos no nosso quarto ao entardecer, então deu tempo de ir a um mercadinho ali perto, compramos mais algumas cervejas e salgadinhos (tudo muito diet, percebam) e curtimos o pôr-do-sol da sacada do nosso quarto. Uma noite por lá é bem adequado, dá tempo de conhecer todo o museu e o parque histórico com calma e era isso, pois na cidade não tem muito mais o que fazer.
Da planície ao litoral, do litoral à montanha: o caminho até Delphi
Manhã seguinte, tomamos outro café da manhã bem saboroso, pedimos umas dicas de roteiro para o gerente do hotel e deixamos Archaia Olympia rumo a Delphi. Para chegar lá, seriam uns 240 km, passando pela ponte que liga o Peloponeso à Grécia continental, na cidade de Patras. O caminho até Patras foi um tanto convencional, sem grandes atrações, numa estrada de mão dupla na maior parte do caminho. Perto de Patras, começamos a pegar um trecho duplicado e estranhamente, até ali, nenhum pedágio – nos dias anteriores, pegamos algumas cobranças, sempre ao redor dos €4 ou €6, dependendo do local.
Chegamos na famosa Ponte Charilaos Trikoupis, com seus 2.880m de extensão – é a segunda maior ponte estaiada do mundo.
A ponte que liga o Peloponeso à Grécia continental
Chegamos do outro lado e o que nos esperava? O primeiro pedágio do trajeto. E que pedágio: €14 de uma vez só. Seguimos adiante e resolvemos parar para almoçar no litoral, na cidade de Nafpaktos.
A praia de Nafpaktos é bem convidativa para uma cerveja e um petisco à beira mar
O sol forte do meio-dia nos desencorajou a viajar de capota baixa dali em diante, mas não poderíamos perder a chance de fazer um pequeno book do Miata, pra ter nas recordações:
P*** carrinho divertido!
Saímos de Nafpaktos mais ou menos às 14:00 e continuamos nosso trajeto para Delphi. Pegamos um trajeto que costeava o litoral, com algumas imagens que ficaram gravadas nas nossas mentes, até a cidade de Itea.
Estrada costeira, túnel, descida, subida de montanha… teve de tudo
A subida de Itea e Delphi tem um pequeno trecho de serra. E que trecho… tive boas recordações do Passo dello Stelvio, ainda que em doses menores. Aproveitei que eu já estava um pouco mais íntimo do Miata e dei umas boas esticadas na subida, fazendo algumas curvas um pouco mais animadas, e foi aí que me apaixonei de vez pelo carrinho (e tomei uma olhada feia da esposa). Cada curva que eu esperava sentir o carro saindo de dianteira, ao contorná-la, se traduzia em um comportamento neutro, sem sacolejos, no máximo dando uma escapadinha de traseira quando você provoca o pedal do acelerador. E dá-lhe sorrisos: “Quando eu voltar pra casa, preciso achar um desses pra mim”, foi o que pensei na hora.
Muitas curvas e algumas esticadas depois, chegamos em Delphi. A cidade é bem pequena, incrustada no meio da montanha, e consiste de meia dúzia de ruas em paralelo que oferecem todos os atrativos que não o sítio arqueológico local. Encontramos rapidamente o Nidimos Hotel, que prometia quartos com uma vista espetacular. E dessa vez não teve enganação não, a vista do nosso quarto era realmente deslumbrante!
Sem enganação dessa vez!
Pra completar, o hotel tinha garagem coberta sem custo adicional e o staff do hotel nos presenteou com sorvete e água mineral no check in. Recomendadíssimo, fomos muito bem atendidos e tivemos uma ótima noite de descanso por lá.
Delphi é famosa pelo seu sítio arqueológico – como toda a Grécia, aliás – e como nós chegamos relativamente cedo – cerca de 16:30 – deu tempo de ir conferir o museu e o sítio no mesmo dia. Tudo fica muito perto, então fomos a pé até essa atração. O museu tem algumas peças impressionantes retiradas do sítio que fica logo ao lado – mais uma vez, é imperdível para quem curte história.
Um pouco do museu de Delphi
Conferido o museu, fomos ao sítio. As ruínas ficam na encosta da montanha – assim como a cidade inteira, na verdade – então foi necessário caminhar e subir bastante para conhecer todo o local – que é impressionante, diga-se de passagem. Conseguimos chegar ao topo da montanha ao entardecer.
O sítio arqueológico de Delphi tem monumentos como o Templo de Atena e o Oráculo, entre muitos outros
Terminamos a visita, paramos em um restaurante no centro da cidade, pedimos uma pizza e uma cerveja bem gelada (como sempre… tô notando um padrão aqui). Passeamos mais um pouco pelas lojinhas locais e fomos descansar – o dia seguinte seria de mais um trecho de estrada para devolver o carro e seguir adiante.
Devolvendo o Miata e seguindo adiante
Na manhã seguinte, tomamos nosso café (outra vez, muito saboroso – acertamos em cheio nos três hoteis que paramos durante o trecho com o carro) e seguimos viagem rumo a Atenas. Naquele dia, nosso roteiro era devolver o Miata (com dor no coração) e pegar o voo para nosso próximo destino.
Pegamos a estrada mais ou menos às 9:00 e tínhamos de devolver o carro antes das 12:00, de acordo com o contrato do aluguel. Nosso GPS indicava em torno de 180 km de estrada, mas não indicava quantos pedágios pegaríamos pelo caminho. E meus amigos… foram vários. Até chegar aos arredores de Atenas, havíamos pego pelo menos três pedágios – e ainda faltavam uns 60 km até o aeroporto, onde devolveríamos o carro.
Depois de morrer com uns €20 nesses pedágios, parei para abastecer e reprogramei o GPS para encontrar rotas alternativas. Achei uma rota que passava por dentro das cidades da região metropolitana de Atenas. Pensei comigo mesmo: se é para gastar em pedágio então vamos por um caminho diferente, afinal, a estrada em que estávamos era a mesma que pegamos quando saímos de Atenas.
Congestionamento aqui, semáforo ali, túnel ali adiante, fomos cortando as cidades conforme o GPS nos guiava. Em determinado momento, quando a sinalização local começava a indicar a rota para o Aeroporto, eu tive aquela sensação de déjà-vu, uma certa familiaridade.
Disse para Raquel: “esse lugar não me é estranho…” e mal tive tempo de terminar a frase, quando dobrei uma esquina e vi o escritório da locadora onde pegamos o Miata! No susto, fiz uma manobra meio brusca – também conhecida como barbeiragem – e subi a uns 30 km/h na calçada para entrar no estacionamento da locadora. Entregamos o Miata, não nos cobraram nenhuma taxa extra e o gerente da locadora nos levou até o aeroporto naquele Seat Ibiza novinho. No fim das contas, chegamos cedo até demais e passamos a tarde inteira enfurnados no saguão esperando nosso voo, que saía às 17:30 para a deslumbrante ilha de Santorini.
Comprovante de compra em cirílico, nome do destino em grego… #oremos
Gringos sendo gringos em Santorini
Pegamos o voo da empresa grega EllinAir, chegando às 18:30 em Santorini. Nosso hotel ficava na praia de Kamari, não oferecia serviço de transporte e todos os táxis e shuttles de passageiros pediam nada menos que €20 para nos levar até lá. Conferi no mapa (de papel mesmo) e a distância era de uns 2 km apenas! Outra vez, a nossa descendência italiana falou mais alto e resolvemos ir a pé até o hotel, afinal, seria uma horinha de caminhada, talvez menos (saca gringo pão-duro? Então…)
Quanta ingenuidade. O mapa mostrava a distância entre o aeroporto e o hotel, OK, mas não dava para ir a pé! A rota que eu achava que poderíamos tomar era interrompida por um belo paredão e a menos que fizéssemos rapel para subir, não dava para passar. Resultado: começamos a caminhar para achar o caminho que nos levasse até Kamari e… contornamos o maldito aeroporto inteiro. Façam as contas: o avião que nos trouxe até a ilha era um Boeing 737, a pista devia ter uns 3 km de extensão e nós tivemos de contornar todo o aeroporto. Sem contar que teve um grego num Fiat Seicento bem surrado que nos encontrou pelo caminho e pediu €15 para nos levar dali até nosso hotel – e o cara não falava inglês. Declinei da oferta (sabe-se lá que encrenca iríamos nos meter), ele continuou nos “seguindo” por um tempo, pra ver se mudávamos de ideia, até que foi embora. Aqueles €20 pelo shuttle me pareceram tão baratinho depois dessa…
Enfim, algumas decisões idiotas depois, chegamos a Kamari mais ou menos 22:00 (sim, perdemos a nossa primeira noite inteira caminhando por Santorini). Aí descobrimos que a nossa pousada, tecnicamente chamada Sunflower, havia trocado de nome havia pouco tempo e ninguém tinha ouvido falar desse novo nome por lá. Por sorte, no comprovante de reserva, havia referência ao nome “Sideris”, que era o nome anterior, aí sim uma senhora de outra pousada entendeu aonde estávamos tentando chegar. Ela gentilmente nos ofereceu água gelada (apenas imagine o estado de conservação dos dois patetas, que estavam caminhando havia umas quatro horas com bagagem a tiracolo) e telefonou para o gerente da nossa pousada para ele nos buscar por lá. Imagino que ele tenha se negado a nos buscar num primeiro momento, pois a senhorinha que nos acolheu deu uns berros – em grego, claro – com ele ao telefone. O fato é que uns 20 minutos depois, apareceu o cara no seu Opel Corsa e nos levou até a pousada.
Chegamos lá, o quarto era bem ruim – recuerdos de Atenas – mas por sorte, ficaríamos apenas duas noites e eles concordaram em nos alocar em um quarto melhor. A pousada era bem chinfrim – novamente, as fotos enganaram bastante: o ar condicionado não funcionava no nosso quarto e o chuveiro não tinha box nem cortina, fazia uma molhaceira que só vendo – mas pelo menos havia uma piscina, que foi muito bem aproveitada naquele calor. A praia de Kamari tem muitos bares e restaurantes, mas devido ao cansaço, nessa primeira noite nós apenas compramos comes e bebes no mercadinho local e voltamos à pousada para comer e descansar.
A praia de Kamari é uma região de preços menos exorbitantes do que a média de Santorini
Na manhã seguinte, aprendemos a lição e alugamos um Fiat Panda por €30 a diária. Valeu cada centavo – a ilha é bem extensa e é impossível explorá-la a pé, o transporte público por meio dos ônibus locais é meio caótico e por aí vai.
Um breve momento #euchegolá
Aproveitamos que acordamos bem cedo e fomos curtir a ilha. Fomos ao porto antigo, depois às outras regiões da cidade de Thera – uma espécie de capital de Santorini, o maior povoado de lá. A área central é uma muvuca completa, ruas estreitas, trânsito em mão dupla (inclusive de ônibus), lojas e restaurantes pra todo lado – mas a atração maior é o visual da encosta da montanha mesmo, um lugar onde qualquer foto vira cartão-postal. Almoçamos num McDonald’s local para ganhar tempo e continuamos a nossa bateção de pernas.
Um pouco do visual de Thera, a “capital” da ilha, e do porto antigo
Conhecemos Perissa, a praia de areia preta que na verdade são sedimentos vulcânicos, seguimos adiante até Akrotiri e voltamos à região norte da ilha, desta vez pela estrada ao leste da ilha.
As praias de Akrothiri e de Perissa, com sua “areia preta”, que na verdade são sedimentos vulcânicos (tecnicamente, Santorini inteira é um vulcão em atividade, ainda que parcialmente submerso pelo mar e cuja última explosão aconteceu há muito tempo)
Àquela altura, já estava chegando o fim da tarde e não poderíamos perder o pôr-do-sol em Oia, que é mais um dos cartões-postais da ilha. As fotos falam por si:
Faltou câmera e fotógrafo pra registrar o que é esse negócio…
Santorini é aquele tipo de lugar onde qualquer foto que você tirar é de cartão-postal. Apesar da quantidade pornográfica de turistas que invadiam a ilha naquele dia, que literalmente se empoleiravam em qualquer lugar para conseguir o melhor ângulo, conseguimos curtir cada minuto por lá.
Literalmente, uma multidão de turistas empoleirados para ver o pôr-do-sol… ou para se esconder dele debaixo de uma burca verde, ocupando o lugar de quem estivesse procurando por um espacinho no melhor lugar para se assistir ao evento. #semnoção
Então, à noite voltamos para Kamari, devolvemos o Panda e jantamos uma bela porção de souvlaki e moussaka com salada grega, para encerrar nossa breve passagem por esse lugar de sonho.
Mykonos e o retorno à vida real
Na manhã seguinte, pegamos um ônibus até o novo porto de Santorini, onde tomaríamos o ferry boat para Mykonos, nosso último destino desta viagem. A viagem entre as duas ilhas, com uma escala em Paros, levou cerca de 3 horas que passaram muito rapidamente. Os ferries são gigantescos, levam cerca de 300 passageiros e uma quantidade razoável de veículos, com todo o conforto.
Falta de espaço aqui não foi um problema
Chegando a Mykonos, nosso hotel tinha serviço de transporte do porto até a chora, a capital da ilha. Nosso hotel era incrustado no meio da cidade, onde praticamente não se permite o tráfego de veículos. Felizmente, era um estabelecimento excelente, que oferecia um quarto espaçoso o suficiente, limpo e com cama e banho de qualidade. Como chegamos no início da tarde, pudemos conhecer toda a área da capital da ilha a pé, com calma, passando pela Little Venice e pelos moinhos de vento:
A capital da ilha de Mykonos é tão bela quanto agitada, especialmente à noite
Para se deslocar entre as várias praias da ilha, as opções são semelhantes às que se encontra em Santorini – carros estão disponíveis para locação, mas o pessoal costuma alugar mais scooters e principalmente quadriciclos por lá. Para quem tem um tempinho adicional para conhecer a ilha, vale a pedida.
A noite na ilha é agitadíssima – Mykonos é um lugar para ver e ser visto, um local de festa e curtição, que tem forte rivalidade com a ilha espanhola de Ibiza. Souvenirs como camisetas e bonés com frases do tipo “Mykonos fucks Ibiza” eram bem comuns por lá. O forte do lugar é a vida noturna, sendo destino confirmado para quem quer aquelas festas que duram dias a fio. As praias mais famosas da ilha talvez sejam Paradise Beach, que atrai o público mais jovem e baladeiro, e a gay-friendly Super Paradise. De maneira geral, a ilha tem muita hype e como consequência, tudo é muito caro, disputado e movimentado por lá.
O dia seguinte seria nosso último dia das nossas férias propriamente ditas. Resolvemos relaxar e para isso, procuramos a praia mais light que pudéssemos encontrar. Fomos indicados a conferir Ornos, que seria uma enseada com perfil mais familiar. Chegamos na praia umas 10 da manhã, alugamos duas espreguiçadeiras à beira-mar e assim passamos nosso dia inteiro, de papo pro ar.
Pra encerrar a jornada com chave de ouro, um merecido descanso à beira-mar em Ornos
Almoçamos por lá, tomamos nossas cervejas geladas e ao final da tarde, retornamos para nossa pousada. À noite, um último passeio pela noite da chora, jantamos e encerramos por ali. No dia seguinte, pegamos nossas coisas e começamos nossa jornada de volta ao Brasil: primeiro, de Mykonos a Roma, depois, Roma ao Rio de Janeiro e finalmente, do Rio a Porto Alegre.
Epílogo
De volta à vida real, em casa, voltei ao trabalho e a única coisa que ficava martelando na minha cabeça era: “eu quero um conversível para este verão!”. Nem que fosse um projetinho com princípio, meio e… sem fim, como bem sabemos. Pensei num Escort XR3 ou Kadett GSI precisando de um talento, pensei em alguma maconha francesa, pensei em Audi 80 Cabrio, pensei em BMW E36 Cabrio, pensei em Alfa Spider – estes últimos me pareciam sonhos um tanto distantes devido ao valor de compra e de manutenção – enfim, pensei em muita coisa, mas não passava disso.
Até que um dia, lá por dezembro de 2016, navegando pelos classificados, encontrei um 206CC vermelho, ano 2008, lindíssimo nas fotos e no estado geral. Mostrei pra patroa, que deu um sorriso e me disse: “tu quer comprar?”, simples assim. Do alto da minha surpresa, disse para ela não brincar com meus sentimentos (modo emo ON), porque isso é feio que nem tirar doce de criança. E ela confirmou, disse que desde que fosse algo dentro da realidade, sem grandes extravagâncias, ela topava uma empreitada dessas!
Com a carta de alforria em mãos, comecei a pesquisar com mais intensidade. Achei uns XR3, outros GSI, todos precisando de atenção e algum investimento. Novamente a esposa me surpreende: “ah não, se é pra comprar um carro que vai ter que gastar dinheiro só pra poder sair na rua, então gasta um pouco mais e compra algo melhor. Por que tu não procura um Miata de uma vez?”
Depois que eu recobrei a consciência, não perdi tempo e comecei a procurar por um Miata pra chamar de meu. Bom, essa é uma história que vou inscrever na próxima leva de Project Cars, mas já deixo um spoiler pra vocês:
OH YEAH, BABE
Bottom line
Lembra que eu comentei sobre a bagagem? Pois é, passamos 15 dias viajando com aquelas duas malinhas, deu para levar alguns souvenirs pra casa e ainda sobrou um pouquinho de roupa limpa! Claro, o fato de termos viajado no verão ajudou bastante – muita roupa leve e fácil de dobrar, além de termos podido lavar roupa à noite e deixar secando durante a madrugada, ou seja, planejamento é tudo, meus caros. Sem contar a enorme vantagem que tivemos ao não perder tempo despachando malas e esperando para retirá-las na esteira.
Nessa jornada maluca, aproveitamos cada minuto ao máximo. Óbvio que algumas decisões que tomamos poderiam ter sido melhores – especialmente em alguns hoteis, definitivamente tem economias que não valem a pena – mas no geral, esta viagem foi simplesmente inesquecível. Difícil dizer qual foi mais marcante, se foi esta ou a viagem de 2014.
A Itália é a velha bota que todos conhecemos: comida farta e saborosa, muita história pra contar, paisagens magníficas e um povo sarcástico às vezes até demais. Já a Grécia… definitivamente, é o país do qual mais sinto saudades. Tem tudo por lá: história, montanha, praia, cidade, campo, um povo extremamente cordial, comida maravilhosa… e no fim das contas, planejando direito, o custo para visitar o país e suas atrações não é tão diferente de outros destinos bem mais frequentados por nós, brasileiros. E se você curte história, não tem destino mais impressionante (Roma que me perdoe, mas Atenas é inacreditável. Talvez o Egito ofereça algo do mesmo nível, um dia a gente vai pra lá e eu volto pra contar).
Espero que tenham gostado do meu relato – como sempre, um tanto extenso! – e qualquer dúvida ou comentário, fique à vontade para escrever aí embaixo. Grande abraço a todos!