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Como funcionam os freios de carbono cerâmica – e como a Porsche quer torná-los acessíveis

Em 1976 Gordon Murray estava procurando uma forma de tornar os carros da Brabham mais competitivos quando percebeu que, se conseguisse discos de freio mais leves, ele poderia não apenas melhorar o desempenho de frenagem pela dissipação do calor, mas também melhorar a aceleração e a dinâmica do carro em si, uma vez que teria menos massa não suspensa.

O problema era como reduzir a massa dos discos de freio. Eles eram pesados por um bom motivo: resistir às altas temperaturas sem deformações e com desgaste baixo o suficiente para resistir ao longo das provas.  O uso de alumínio nos discos de freio já havia sido experimentado desde os anos 1950 e até funcionava em carros mais mundanos, mas com ponto de fusão aos 660º graus, os discos de alumínio simplesmente derreteriam ao longo de uma corrida de F1.

A solução, como tantas outras na história do automóvel, estava nas máquinas voadoras: em 1969 o Concorde se tornou o primeiro avião comercial a atingir velocidades supersônicas, e seu desenvolvimento trouxe recursos inéditos às indústria aeronáutica. Entre estes recursos estavam os freios de carbono (sem cerâmica), criados justamente para reduzir o peso do Concorde e também otimizar sua frenagem nas aterrissagens. Graças a eles, o Concorde ficou 540 kg mais leve do que ficaria com freios convencionais, e podia aterrissar em pistas de, no mínimo, 1.800 m.

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A solução estava ali, mas Gordon Murray não podia simplesmente telefonar para a Michelin e pedir discos de Concorde para seus Brabham, então em um experimento inicial ele simplesmente pediu discos com inserções de carbono na pista metálica, e instalou pastilhas de cerâmica nas pinças.

Não deu muito certo: José Carlos Pace arrebentou seu BT-45 a 290 km/h no GP da Áustria, depois que o superaquecimento do conjunto literalmente ferveu o fluido, deixando o brasileiro praticamente sem nenhuma ação de frenagem.

Apesar do acidente o desenvolvimento continuou, até que em 1979 a Brabham usou fibras de carbono como elemento estrutural em discos de cerâmica, mais ou menos como o ferro no concreto armado, combinado a pastilhas de freio de cerâmica. Desta vez funcionou, e logo no início dos anos 1980 as demais equipes já estavam usando os discos de carbono-cerâmica.

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Agora… normalmente quando falamos em cerâmica, imaginamos materiais como a cerâmica de barro e argila ou porcelana. A definição de cerâmica, contudo, vai bem além disso: é qualquer material inorgânico não-metálico, duro e resistente à compressão, porém pouco resistente à tração e ao corte por molde. Mas acima de  tudo, são materiais capazes de resistir a altíssimas temperaturas, entre 1.000ºC e 1.600ºC. É isso que os torna apropriados para o uso automobilístico de alto desempenho.

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Como você já deve saber, os freios reduzem a velocidade do carro pressionando as pastilhas contra os discos, gerando atrito que transforma a energia cinética em energia térmica. E embora as ligas metálicas usadas nos discos de freio (com ferro, grafite, silício e carbono) suportem bem as altas temperaturas das frenagens de alta velocidade, elas também são muito boas em conservar calor, e isso afeta a eficiência da frenagem porque a temperatura faz decair o coeficiente de atrito das pastilhas e dos discos, além de ajudar a superaquecer o fluido de freio por convecção.

O maior problema da popularização do disco de carbono-cerâmica é o fator impeditivo universal: custo. Discos de carbono-cerâmica são caros de fabricar, e por isso também são caros para comprar. Por esse motivo sua aplicação geralmente é reservada a superesportivos ou, no máximo, como equipamento opcional de versões de alto desempenho de modelos mais convencionais, como o Mercedes E63 AMG, ou o Porsche Cayenne. Também há a questão da necessidade de atingir uma temperatura ideal para que eles comecem a ganhar eficiência — normalmente entre 400º e 600º.

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A questão da temperatura pode ser contornada com o uso de pastilhas de compostos que produzem atrito suficiente em baixas temperaturas. Já o problema do custo está começando a ser resolvido, e uma das propostas para isso são os novos freios “PSCB” da Porsche, que foram lançados em dezembro no Cayenne.

Eles não são discos de carbono-cerâmica, na verdade. São discos de ferro fundido, mas a pista do disco (que é a parte onde as pastilhas tocam o disco) é revestida de um composto chamado “carboneto de tungstênio”, que por acaso é um tipo de cerâmica — daí seu nome Porsche Surface Coated Brake, ou “freio de superfície revestida da Porsche”.

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Normalmente você não consegue aderir o carboneto de tungstênio a uma superfície de aço granular/ferro fundido, mas a Porsche descobriu que ao criar uma camada galvanizada, o material cerâmico aderia ao disco… se eles usassem um processo de borrifação de oxicombustível em velocidades altíssimas.

Esse material, o carboneto de tungstênio, foi descoberto no início do século 20, e era conhecido como “wie Diamant“, do alemão “como diamante” — que deu origem ao termo vídia das brocas e cortadores de azulejos e vidros. É um material extremamente duro, chegando a ser dez vezes mais duro que o ferro fundido (aço granular) e preserva as características dos discos de cerâmica, uma vez que, quimicamente, trata-se de uma superfície cerâmica, capaz de manter um alto coeficiente de atrito em altas temperaturas.

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Como se não bastasse, a Porsche diz que os discos duram mais que os discos comuns — cerca de 30% mais que similares de ferro, mesmo com o revestimento de carboneto de tungstênio medindo apenas 0,1 mm de espessura. Esse é o nível de dureza do material. Outra vantagem, é que ele não depende das pastilhas específicas para discos de carbono-cerâmica, embora exija pastilhas especiais cujo composto não é divulgado pela Porsche. Mesmo assim, o conjunto custa 1/3 do preço dos discos de carbono-cerâmica — cerca de 3.000 euros, em vez de 10.000.

Apesar do grande avanço em desempenho e custo, a Porsche acredita que o auge dos freios de carbono cerâmica ainda está distante, uma vez que o sistema de freios dos carros deverá mudar significativamente à medida em que os carros elétricos se popularizarem. Ao menos temos uma alternativa mais barata até isso acontecer.