Por alguma razão, superesportivos não são meu tipo de carro favorito. Gosto de carros mais humildes, mais pé-no-chão. Sei apreciar esportivos e supercarros, admiro muitos deles, mas nunca pensei muito sobre qual deles compraria caso pudesse. Nunca pensei muito porque, bem, seria um Porsche 911. Disso eu tenho certeza.
Por quê? É uma pergunta interessante, porque eu nunca dirigi um 911, sequer sentei em um. Muito menos guiei outros esportivos “de verdade” para saber qual seria o melhor ou pior, na verdade. Mas tenho certeza que compraria um Porsche 911. Provavelmente um Carrera básico, preto com interior preto, motor flat-six de três litros biturbo de 370 cv, câmbio manual de seis marchas, tração traseira. Zero a 100 km/h em 4,6 segundos, precisa mais? Certamente teria diversão garantida para o resto da vida e jamais precisaria comprar nenhum outro esportivo.
Como eu sei disso? Eu não sei, na verdade. Mas sei que meu esportivo favorito é o Porsche 911, mesmo sem jamais ter guiado um 911 ou qualquer outro esportivo. E sei que sou só mais um nas estatísticas.
Por que a Porsche atrai tanta gente? É simples: carisma e eficiência. O Porsche 911, com sua silhueta característica, seu pedigree real e comprovado ao longo de décadas de sucesso nas pistas e o ronco borbulhante do motor com cilindros opostos, é um carro instantaneamente reconhecível e dono de um legado mais do que consistente em mais de meio século de história.
Graças a isto tudo, a Porsche construiu uma imagem muito forte. E isto fica evidente quando vemos quantos vídeos bacanas a fabricante e os fãs já fizeram.
Por que estou citando exatamente os vídeos? Porque há alguns dias, um comercial feito por um fã da Porsche rodou pela internet e fez muita gente pensar: “cara, é por isso que eu gosto tanto da Porsche” enquanto limpava uma lágrima que escorria pelo canto do olho. É de arrepiar.
“Eu sentava no banco do carona, vendo cada movimento que você fazia. Por colinas e cidades. Vales sem nome. Você dirigia, eu olhava”. O pai dirigia um Porsche 911 clássico dos anos 60, aparentemente. O filho dirige um Porsche Cayman (pois é, sequer é um 911), e seu pai já não está mais entre nós. Mas, através das lembranças ligadas ao Porsche, ele sente que seu pai está ali com ele, acompanhando sua vida. “Sente ao meu lado, pai. Eu dirijo, você olha.”
Não fica difícil associar a conexão emocional feita entre passado e presente: um Porsche pode trazer boas lembranças, e além de carregar sua própria história, acaba carregando também memórias afetivas. Bem, ao menos foi nisso que eu pensei quando vi o vídeo. Vale lembrar: este não é um comercial feito pela Porsche, mas não nos surpreenderíamos se fosse. É um conceito que cai bem à marca, e nos ajuda a entender como a marca consegue conquistar mesmo quem jamais conduziu um de seus carros. O apelo emocional convence.
Pensando nisso, separei outros vídeos épicos da Porsche, feitos pela marca ou não. Alguns são emocionantes, alguns são bem sacados, enquanto alguns são apenas épicos, mesmo.
“Speechless”
Um dos mais recentes traz Mark Webber e Walter Röhrl (saca o nível dos pilotos de teste da Porsche) ao volante do recém-lançado 911 GT2 RS, um monstro com motor 3.8 biturbo de 700 cv, tração traseira e 6:47,3 em Nürburgring.
O carro tem amortecedores magnéticos, aerodinâmica retrabalhada, interior aliviado de fábrica (e, ainda assim, pode vir com ar-condicionado e sistema de som premium) e um ronco absurdo. Depois de acelerar no belo circuito francês de Paul Ricard, Webber e Röhrl ficam sem palavras, de tão bom que o carro é. Que não ficaria? Simples, eficiente, genial.
O garotinho na concessionária
Este aqui é um clássico. Em 2004, época do lançamento da geração 997 do 911, a Porsche sabia que havia acertado ao abandonar o arrefecimento a ar e o projeto usado desde 1963. O pessoal de Stuttgard cravou: o 997 é o melhor 911 que a gente já vez, e vai transcender gerações.
Como eles passaram esta mensagem no comercial? Colocando um garotinho desatento na sala de aula porque um 911 passou na rua. Depois da aula, o garoto vai até uma concessionária Porsche e pergunta pelo novo nine-eleven. O vendedor o convida para entrar no carro e, depois de fantasiar por alguns momentos, o rapazinho sai, pede um cartão de visitas e diz: “te vejo daqui a uns vinte anos”. Lembra do que eu disse? Você não precisa ter guiado um Porsche para querer ter um.
“Old school, new thrill”
Por mais que o recordista de Nürburgring seja o 911 GT2 RS, tenho certeza de que muitos concordam que o lançamento mais legal da Porsche nos últimos tempos foi o 911 R, edição limitada com o motor naturalmente aspirado do GT3 RS, de quatro litros e 500 cv, câmbio manual de seis marchas, peso aliviado e visual até que civil. Nós mesmos o chamamos de “sonho purista” e, bem, é verdade.
A Porsche batizou o 911 R em homenagem a um clássico de 1967. O 911 R construído há 50 anos era um especial de homologação com painéis de fibra de vidro na carroceria, interior aliviado (não havia sequer maçanetas) e a remoção de diversos itens de acabamento, como as lanternas traseiras padrão (que foram substituídas por outras menores circulares) e as grades da buzina, para reduzir peso. O resultado: um carro de 800 kg, ou 230 kg a menos que um 911 comum. Com isto, tornou-se o Porsche 911 mais leve já feito pela fabricante até então. Foram fabricados 23 exemplares, todos eles com motor flat-6 de dois litros e 210 cv.
Ao colocar os dois juntos no mesmo vídeo e deixar que a gente veja e ouça os dois em uníssono, a Porsche mostrou que o 911 não mudou tanto assim, filosoficamente falando.
“911? Não, 111”
Um dos primeiros veículos feitos pela Porsche foi o trator P111 Diesel, que foi projetado por Ferdinand Porsche em 1934 (e, acredite, tinha motor traseiro nos primeiros esboços!) mas só começou a ser produzido depois da Segunda Guerra Mundial. Nos últimos dez ou quinze anos, o interesse dos colecionadores pelo P111 começou a crescer, e a própria Porsche decidiu começar a valorizar este momento agrícola de sua história.
Como? Mostrando que, ao menos em tese, o P111 é um Porsche como todos os outros. Neste vídeo do ano passado, um senhor liga para uma concessionária para agendar uma revisão em seu trator. “Sim, um Porsche 111”, ele diz. A atendente pergunta: “Ah, 911?”, e ele devolve: “Não, 111”.
O P111 também teve destaque quando a Porsche decidiu se despedir da Audi quando a rival abandonou o WEC, o Campeonato Mundial de Endurance. Em 2014, com o retorno da Porsche a Le Mans, a Audi pegou seu R18 e fez um vídeo no qual o protótipo saía de Ingolstadt e ia até Stuttgart, em frente à fábrica da Porsche (ultrapassando um trator Porsche no caminho), e escrevia welcome back (“bem-vindos de volta”) com os pneus no asfalto – um legítimo desejo de boas vindas, com um toque de provocação. Ou vice versa.
O gancho é justamente o trator Porsche que o Audi R18 ultrapassa no vídeo de 2014. Anos depois, o tratorista ouve no rádio a notícia de que a Audi deixará as 24 Horas de Le Mans. Prontamente, ele dá meia volta e retorna a local onde a Audi deixou as marcas de pneu dois anos atrás e faz uma pequena alteração na frase: welcome back (bem-vindos de volta) vira come back (“volte”). A Porsche deseja que a Audi volte a Le Mans um dia, para que as duas companhias tornem a se enfrentar na corrida mais importante do calendário.
James Dean encontra Donald Turnupseed
Este vídeo não é exatamente sobre um Porsche, mas traz a participação de um: um Porsche 550 Spyder caracterizado como o “Little Bastard” de James Dean. O icônico ator americano morreu em 1955, ao volante de seu Porsche, em um cruzamento em uma rodovia da Califórnia. James seguia para Salinas, na Califórnia, quando um Ford Tudor que vinha no sentido contrário realizou uma conversão para a esquerda. Nenhum dos motoristas viu o outro, e o Porsche acabou se chocando com o Ford violentamente. James Dean sofreu diversos ferimentos, incluindo uma fratura no pescoço, e morreu no local.
O motorista do Ford, Donald Turnupseed, só deu uma entrevista desde o acidente, e foi no dia seguinte. Depois disto, manteve uma vida discreta, evitando investidas de fãs de James Dean que o acusavam de ter matado seu ídolo e também especulações a respeito do acidente. Turnupseed morreu em 1995, de câncer no pulmão.
Neste curta-metragem, feito em 2011 pela produtora Parker Ellerman, os “fantasmas”de Dean e Turnupseed se encontram, e finalmente têm tempo de “se conhecer”. Turnupseed pede desculpas por ter acabado antes da hora com a vida de Dean, e Dean também pede desculpas por sua morte ter mudado tanto a vida de Turnupseed. É um vídeo simples, porém muito forte, e tocante para qualquer um que conheça a história de James Dean.
Os especiais de Magnus Walker
Magnus Walker, britânico radicado nos EUA, é um dos colecionadores de Porsche mais conhecidos do mundo, e não é à toa. Além de sua figura inconfundível, com barba, dreadlocks, flanela xadrez e boné, ele tem um belíssimo acervo de Porsche modificados e originais, é dono de uma das marcas mais adoradas pelos entusiastas e sabe curtir seus carros como se deve. Prova disso são seus vídeos da série “Outlaw”, nos quais ele simplesmente dirige pelas ruas de diversas cidades à noite, sem falar nada, deixando que apenas a música mecânica deixe seu recado (ainda que exista música de fato em alguns momentos).
Magnus já fez vídeos em Los Angeles, Tóquio, Miami e Bathurst, além algumas outras cidades. Todos eles são igualmente bons de se assistir e te fazem querer sair acelerando por aí à noite, mesmo sem rumo, mesmo que seu carro não seja um Porsche.
Na maioria das vezes, ele usa seu famoso Porsche 911 “277”, inspirado nos carros que a fabricante de Stuttgart colocava para correr no fim dos anos 1960. De vez em quando, porém, ele escolhe outro Porsche – sempre com motor arrefecido a ar, vale lembrar. Podíamos passar uma noite toda ouvindo seu ronco tranquilamente.