“A vitória mais importante é aquela que ainda está por vir”– passional, combativo e de temperamento comparável ao rosso corsa que tinge seus carros, a alma de Enzo Ferrari se funde ao espírito do esporte a motor. Apenas na Fórmula 1, são quase 950 grande prêmios disputados e 227 vitórias, sem contar os inúmeros campeonatos de turismo e de protótipos. Se listar dez dos mais importantes pilotos da Ferrari foi uma tarefa árdua e injusta pelas inevitáveis exclusões, não teria como ser diferente ao listarmos dez das corridas mais marcantes da Scuderia Ferrari. Acelere conosco nesta reportagem e depois diga nos comentários qual prova em sua opinião foi a mais marcante da história do cavallino rampante!
Ferrari 70 anni di emozioni
Esta é a quarta e última matéria (veja a primeira / segunda / terceira) de uma série sobre alguns dos momentos mais marcantes dos 70 anos da Ferrari – um oferecimento Relógios Scuderia Ferrari, vendidos no Brasil exclusivamente pela Vivara em lojas físicas ou no e-commerce. Dica: comprando um relógio Scuderia Ferrari, você ganha um chaveiro oficial. Confira as regras da promoção no site da Vivara.
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Dial com acabamento rosso remetendo ao conta-giros de Ferrari como a 488 GTB. Pulseira em couro com Scudetto gravado em alto relevo e costuras vermelhas, remetendo aos bancos de alguns modelos. Grafismo dos números utilizados pela Scuderia Ferrari. Caixa 45 mm | Resistência 5 ATM | Datador e Cronógrafo.
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Modelo 830389 | R$ 1.150,00
Dial com acabamento negro remetendo ao conta-giros de Ferrari como a 458 Italia. Pulseira em couro com Scudetto gravado em alto relevo e costuras vermelhas, remetendo aos bancos de alguns modelos. Grafismo dos números utilizados pela Scuderia Ferrari. Caixa 45 mm | Resistência 5 ATM | Datador e Cronógrafo.
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Modelo 830390 | R$ 1.350,00
Variante com pulseira em aço inoxidável e tema “murdered out”, todo negro, apenas arrematado com alguns detalhes em vermelho. Dial com acabamento remetendo ao conta-giros de Ferrari como a 458 Italia. Grafismo dos números utilizados pela Scuderia Ferrari. Caixa 45 mm | Resistência 5 ATM | Datador e Cronógrafo.
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Modelo 830393 | R$ 1.250,00
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Corpo a corpo (Gilles Villeneuve, Dijon, 1979)
Um dos duelos mais eletrizantes de todo o automobilismo sequer valia uma vitória – e nenhuma diferença isso fez na obra. No topo do pódio, Jean-Pierre Jabouille conquistava em sua terra natal a 1ª vitória de um F1 turbinado, com o igualmente francês Renault RS10 (que, de quebra, usava pneus Michelin e combustível Elf). As condições eram perfeitas para uma dobradinha com o companheiro de equipe René Arnoux, que estava determinado a fazer a máxima festa francesa – mas no meio do caminho e para a felicidade da história da Fórmula 1, havia Gilles Villeneuve e sua Ferrari 312T4. E, como vimos no post anterior desta série, Villeneuve era a síntese da competitividade e da passionalidade: nada feliz por ter perdido a liderança da corrida para Jean-Pierre e sofrendo com o desgaste de seus pneus, ele não estava nada disposto a perder mais essa posição.
O resultado desta equação foram duas voltas finais absolutamente épicas. Arnoux tinha mais potência e pneus em melhores condições, então tudo o que Gilles tinha em mãos para segurar sua posição era o arrojo: frear no limite do traçado defensivo e não dar espaço. Mas na volta 78, René faz uma ultrapassagem sem defesa possível: no meio da reta dos boxes. Villeneuve tenta espremer Arnoux por fora na freada da primeira curva, mas pouco ajudou. Agora o canadense teria de ir além do limite.
E foi o que ele fez na penúltima volta, conseguindo o improvável: frear tão tarde a ponto de superar a vantagem de potência do Renault. Ninguém esperava. A reação de cabeça de Arnoux deixa clara a sua perplexidade. A traseira da Ferrari balança para todos os lados nos “esses”, brigando com o resto de aderência de seus pneus. O sangue de René ferve: ele praticamente toca o transeixo da Ferrari. E isso era só o começo. Metade da última volta foi feita lado a lado entre os dois carros, ignorando os limites físicos da pista, trocando de posições cinco vezes e tocando rodas nada menos que sete vezes, de acordo com declaração de Arnoux para o jornalista Russell Atkins em 2011. Mesmo tendo perdido, René se orgulha de ter tido esta batalha. Quem não o faria?
A Vitória Impossível (Tazio Nuvolari, Nürburgring, 1935)
28 de julho, 1935. Nürburgring, Alemanha. Estamos em pleno III Reich. Uma tropa de oficiais do Führer estava entre os 300.000 presentes no local, esperando por uma dominação completa dos alemães na prova. Não sem razão: seus carros eram os mais potentes e avançados, recebendo farto investimento do governo. Os três Mercedes-Benz W25 (8 cilindros em linha, 3.990 cm³ e 375 cv) e os quatro Auto Union Tipo B (V16, 4.950 cm³, 375 cv) tinham 110 cavalos de vantagem sobre os datados Alfa Romeo P3 (8 cilindros em linha, 3.167 cm³) de Enzo Ferrari – lembrando que de 1929 até 1939, a Scuderia Ferrari era uma equipe que competia com os carros da Alfa e ainda não fabricava seus próprios.
Num circuito com amplitude de altitude de 300 metros e cheio de trechos de alta, incluindo uma reta de mais de dois quilômetros, o resultado com tanta diferença técnica seria previsível: os alemães venceram os oito Grands Prix anteriores e em casa não seria diferente. Mas aquele dia foi tudo menos previsível. Tazio Nuvolari foi o responsável por aquilo que ficou conhecido na época como A Vitória Impossível. Foi uma superação completa: na largada (o grid foi definido por sorteio), Tazio saiu mal e caiu da segunda para a quinta posição – catalisador de uma sequência de voltas voadoras em derrapagem controlada, técnica de pilotagem cuja criação Enzo Ferrari atribui a Nuvolari. Lembre-se de que, por muitas décadas, nada separava os pilotos de árvores e colinas no Nordschleife.
Na parada para reabastecimento, já liderando a prova, sua equipe quebrou o gatilho da bomba de reabastecimento, forçando a um procedimento manual que o fez perder um caminhão de tempo e várias posições. Nuvolari voltou e superou os alemães na pista novamente, um a um, deixando um comboio de oito Mercedes e Auto Union para trás – parte deles tendo problemas nos freios e nos pneus, incluindo Manfred von Brauchitsch, que perdeu tudo na última volta. A certeza do triunfo dos alemães era tão grande que a organização da prova sequer tinha trazido os discos com os hinos dos outros países.
La Prima Vittoria (Franco Cortese, Roma, 1947)
“No IX GP de Roma, a primeira vitória da nova Ferrari 125 pilotada por Cortese”. Foram estas as palavras escolhidas pelo jornal Motor de 1º de junho de 1947 para registrar o momento histórico em que um carro batizado com o nome de Enzo Ferrari venceu pela primeira vez.
Apesar do nome Grande Prêmio, o GP de Roma era uma típica corrida de carros esporte da primeira metade do século 20, sem nenhum monoposto alinhado, como se tornaria o padrão após 1950 com a criação da Fórmula 1. A prova fora disputada em 25 de maio de 1947, exatamente duas semanas após a estreia da Ferrari 125S, uma barchetta de dois lugares equipada com um V12 de apenas um litro e meio, desenvolvido pelo mestre Gioacchinno Colombo.
Ao volante estava Franco Cortese, o primeiro piloto da Ferrari como construtora. Ele já havia pilotado a 125S na primeira corrida do carro, uma prova no Circuito de Piacenza na qual o carro teve um problema na bomba de combustível e abandonou a três voltas do fim, entregando a vitória para Guido Barbieri, com um Maserati 1500.
Nas ruas de Roma, contudo, a história foi diferente: diante de quase 60.000 pessoas que se reuniram em frente às Termas de Caracalla, uma construção levantada pelos romanos no século III e ao redor da qual foi formado o circuito do Grande Prêmio, Cortese foi impecável do início ao fim e, desta vez sem problemas mecânicos, venceu a prova devolvendo o troco a Barbieri e seu Maserati.
A primeira glória na Fórmula 1 (González, Silverstone, 1951)
Dizer que a construtora Ferrari e a Fórmula 1 nasceram quase juntas não é exagero: a primeira Ferrari de todas, a 125 MM, data de 1947, enquanto a primeira corrida da primeira de todas as temporadas da Fórmula 1 foi realizada em 13 de maio de 1950. Como vimos aqui e na matéria sobre os pilotos mais importantes da Scuderia, a Ferrari já tinha fama nos Grands Prix – o próprio Enzo já era destaque nos anos 1920 –, mas como equipe, usando carros da Alfa Romeo. A partir de 1947, a Scuderia só competiria com seus próprios carros.
A primeira temporada foi dominada pela Alfa Romeo de Juan Manuel Fangio e Giuseppe Farina, mas os pilotos da Ferrari, Alberto Ascari e Luigi Villoresi, não raro se classificavam entre as cinco primeiras posições e deram muito trabalho aos ex-colegas e agora rivais do cuore sportivo. E havia motivação extra além dessa, pois, com a inauguração da Fórmula 1 como um campeonato organizado, passava a existir também uma competição entre os pilotos, e não apenas entre as equipes.
A vitória veio no ano seguinte, na quinta das oito etapas da temporada de 1951. Parecia que aquela seria mais uma competição dominada pela Alfa, com Juan Manuel Fangio vencendo três provas pela equipe, mas a Ferrari reagiu no Grande Prêmio da Grã-Bretanha, que foi vencido por José Froilán González. E isto era especialmente curioso pois, assim como Fangio, González era argentino. Nos treinos de classificação, um bom presságio: conquistou a pole-position com um segundo de margem. Foi a primeira pole da Ferrari na história da Fórmula 1.
No entanto, a corrida não foi tão fácil: González e Fangio brigaram ferozmente pela liderança por 90 voltas no circuito de Silverstone, alternando posições incontáveis vezes. Mas foi González quem assumiu a liderança definitiva – e apenas 51 segundos depois, sua Ferrari 375 F1 cruzou a linha de chegada. E deu início a uma era na Fórmula 1.
A vingança vem a cavalo (Bandini-Amon, 24h de Daytona, 1967)
Entre 1960 e 1965 a Ferrari havia sido imbatível nas principais corridas de endurance do planeta, especialmente nas 24 Horas de Le Mans, onde a Scuderia venceu cinco anos consecutivos. O sucesso contínuo da Ferrari levou a imprensa da época a apostar em um domínio italiano que se estenderia por toda a década.
Nem tanto: logo o sexto ano foi terrível para a Scuderia. A Ford desenvolvera o GT40, que não havia se saído muito bem no ano anterior, mas com as evoluções decorrentes conquistou os três primeiros lugares nas 24 Horas de Daytona, nas 12 Horas de Sebring e nas 24 Horas de Le Mans, interrompendo a sequência de vitórias da Ferrari nas provas de endurance de forma embaraçosa. Sendo uma equipe garagista e independente no pós-guerra, a Ferrari não tinha muito o que fazer contra os milhões de dólares que Henry Ford II estava despejando em sua aventura nas pistas.
A Ferrari, aliás, já estava fazendo algo impressionante ao desenvolver ao mesmo tempo seus grand tourers V12, um carro de F1, um carro de F2 a Dino 246GT e ainda o novo 330 de endurance. Até mesmo Stirling Moss, na época já aposentado, se pronunciou a respeito da investida milionária da Ford, dizendo que era triste ver um verdadeiro competidor como Enzo Ferrari superado por uma grande fabricante interessada apenas em marketing.
Mas Enzo Ferrari estava obstinado a recuperar seu lugar no topo em 1967 e para isso deu liberdade total para o jovem Mauro Forghieri desenvolver aquele que se tornaria o protótipo mais icônico da Ferrari, a 330 P4. Era o mesmo carro da temporada anterior, porém com algumas poucas modificações para torná-lo mais competitivo. O V12 de quatro litros ganhou um novo sistema de injeção e novos cabeçotes, aumentando a potência de 420 para 450 cv.
O câmbio ZF 593, um dos maiores problemas da Ferrari em 1966, foi substituído por uma caixa feita pela própria Scuderia, e o carro ganhou rodas Campagnolo de magnésio calçadas em pneus Firestone ainda mais largos que os Dunlop. No limite de seu orçamento, a Ferrari só podia produzir dois destes novos carros para competir contra seis Ford GT40. A solução foi fazer um terceiro carro mais simples, com carburadores em vez de injeção mecânica, que foi usado pela equipe NART, de seu importador americano, Luigi Chinetti, e ficou conhecida como Ferrari 412 P.
A primeira oportunidade de dar o troco nos americanos seria em seu próprio território: as 24 Horas de Daytona de 1967. Para garantir que a vingança funcionasse, Enzo Ferrari até mesmo negociou com a Firestone o financiamento de uma série de testes nos EUA no final de 1966.
No sábado, 4 de fevereiro de 1967, precisamente às 15:09, as duas Ferrari P4 alinhavam em Daytona com Lorenzo Bandini e Chris Amon no carro #23, e Ludovico Scarfiotti e Mike Parkes no carro #24. Ao lado, a 412P dividida entre Pedro Rodriguez e Jean Gichet no #26.
A corrida ao longo de duas voltas no relógio seria contra não apenas os seis Ford GT40 MkII, mas também contra os Porsche 906 e os Chaparral 2D e 2F. Logo nos primeiros minutos de corrida o Chaparral 2F de Phil Hill assumiu a ponta e estabeleceu um ritmo muito superior ao dos rivais com uma pequena ajuda da downforce produzida pela asa traseira de seu Chaparral.
Logo atrás, os Porsche e os Ford alternavam as posições seguintes volta após volta. Um dos GT40, pilotado por Mario Andretti e Richie Ghinter tinha como objetivo estabelecer um ritmo forte para forçar os carros que vinham logo atrás. As Ferrari não caíram na armadilha e mantiveram um ritmo próprio, como se estivessem correndo outra corrida. Enzo sabia muito bem que para terminar em primeiro, primeiro você tem que terminar a prova.
A estratégia começou a se mostrar certeira a partir do anoitecer: Phil Hill, que liderava a prova com folga em seu Chaparral acabou se acidentando após perder aderência na entrada da Curva 6. Ele conseguiu levar o carro aos boxes e os mecânicos até chegaram a consertá-lo, mas ao voltar para a pista ficou claro que não seria possível seguir em frente. Às 19:15 ele abandonou a prova.
Depois foram os Ford GT40: o carro de Andretti/Ghinter começou a apresentar problemas no câmbio, o que lhes custou a segunda posição. O mesmo problema aconteceu com o GT40 de Peter Revson e Mark Donohue. Ao início da madrugada as três Ferrari ocupavam as três primeiras posições, sempre mantendo seu ritmo constante e sem grandes problemas.
Na ponta estava a 330 P3 de Mike Parkes e Ludovico Scarfiotti, seguidos pela P4 de Chris Amon e Lorenzo Bandini. Em terceiro estava o último dos Ford GT40, de Dan Gurney e A.J. Foyt. Gurney e Foyt até chegaram a ameaçar as Ferrari mas, adivinhe só, o câmbio começou a apresentar problemas e o carro teve que ir para a garagem, perdendo tempo demais para ameaçar a Ferrari. A Ford até conseguiu manter um dos seis GT40 na pista, o carro de Bruce McLaren e Lucien Bianchi, mas eles já estavam longe demais dos líderes para esboçar uma reação a tempo.
Com quatro horas para acabar a prova a liderança estava com a P4 de Amon/Bandini, que impôs uma vantagem de 16 km da P4 de Parkes e Scarfiotti e de 160 km em relaçao à Ferrari 412P de Rodriguez/Guichet. A vantagem era tão grante que os pilotos reduziram o ritmo para conservar os carros e assim se mantiveram até o tremular da bandeira quadriculada.
A vitória da Ferrari foi uma vingança friamente calculada de Enzo Ferrari: três carros italianos (com o novo câmbio italiano feito pela própria Ferrari) deram um show de confiabilidade, regularidade e velocidade no quintal da Ford. Uma resposta à altura da provocação da Ford — e feita com muito menos dinheiro e mais paixão.
Dança na chuva (Michael Schumacher, Catalunha, 1996)
Já se sabia que a temporada de estreia de Schumacher na Ferrari não seria boa. Sua ida e de todo o staff técnico que o assessorava na Benetton – incluindo Ross Brawn – era justamente o plano de ressurreição da escuderia, que não conquistou nenhuma vitória entre 1991 e 1993 e apenas uma por ano em 1994 e 1995. Título? O último tinha sido em 1979, com Jody Scheckter. O F310, carro de 1996, era um projeto inacabado aerodinamicamente: a equipe investiu muito tempo na mudança de powertrain, abandonando os V12 em prol dos V10, mais econômicos (o que permitiria tanques menores) e que permitiriam melhor balanço dinâmico. Ninguém esperava muita coisa em 1996.
Mas, da mesma forma, ninguém esperava o GP da Espanha daquele ano. O dia começou extremamente chuvoso, mas havia a possibilidade da chuva parar durante a prova. Schumacher colocou todas as fichas na mesa e requereu à sua equipe um setup completo de chuva: carga de suspensão mais macia, altura sensivelmente maior, muita asa, menos bloqueio no diferencial, geometria conservadora. Seria uma ignorância, contudo, atribuir esta performance épica de Michael apenas à regulagem do monoposto: quem assistiu a prova viu o alemão desenhar um traçado diferente dos demais. Todo piloto profissional sabe o que fazer na chuva: cruzar o traçado emborrachado para não andar sobre ele, buscar entradas de curva tardias para ter saídas retas. Em muitas delas, contudo, Schumacher fez completamente por fora. Sua leitura de superfície estava em outra categoria em relação aos demais do grid. E, de forma muito parecida com Senna, Michael tinha enorme sensibilidade para procurar o limite de aderência com o pé direito na chuva: sua Ferrari dançava com sutileza a todo instante nas saídas de curva, sempre procurando o limite extremo de grip.
Não é que ele estava mais rápido que os outros: foi um massacre. No começo da prova, ele era dois segundos por volta mais rápido que o líder Jacques Villeneuve (Williams). Pouco tempo depois, estava na casa de 4 s mais rápido que todos os outros – repito, quatro segundos por volta. Em seu segundo pit-stop, ele estava 90 segundos adiante. Um minuto e meio. Nem mesmo uma largada problemática e uma trinca severa no coletor de escape, que surgiu na metade da prova e consumiu parte desta vantagem, foi capaz de impedir sua primeira vitória pela Ferrari. James Robinson, um dos engenheiros sênior da Williams, cumprimentou publicamente a performance.
O mais longo dos dias (Hill-Gendebien, Le Mans, 1958)
O ano de 1958 trouxe mudanças importantes no regulamento do Mundial de Carros Esporte (WSC). Não apenas por causa da tragédia das 24 Horas de Le Mans de 1955, mas também por conta da triste ocorrência na edição de 1957 da Mille Miglia (veja mais abaixo). Os carros agora não podiam ter motores de mais de três litros, e era este o deslocamento do motor V12 da Ferrari 250 TR/58 de que Olivier Gendebien e Phil Hill dividiram. A equipe de Enzo Ferrari, porém, mantinha-se competitiva para a disputa em La Sarthe – que também tinha como favoritas as britânicas Aston Martin e Jaguar, bem como a Porsche.
Mas a edição de 1958 das 24 Horas de Le Mans castigou o asfalto e os mais de 150 mil espectadores com 15 horas seguidas de chuva. Os cockpits se tornaram banheiras – imagine então a condição de visibilidade pelas viseiras encharcadas e engorduradas de óleo…
Ao longo da prova, os rivais foram caindo um a um: Stirling Moss, da Aston Martin, liderava a prova com quase 2 minutos de folga, quando uma biela colapsou. Os Jaguar de Duncan Hamilton e Jean-Marie Brussin se acidentaram. A batida de Brussin, infelizmente, foi fatal. Hamilton topou com uma barra panhard perdida na pista, foi ajudado por dois espectadores e continuou na prova. A pilotagem suave e com ritmo forte na chuva de Hill em sua Ferrari foi o que fez a diferença na hora de superar Hamilton às 2:30 da manhã, para não mais perder a liderança.
A escolha pela 250 TR/58 foi feita pelo próprio Enzo Ferrari e mostrou-se acertada: além da vitória com dez voltas de vantagem sobre o Aston Martin que chegou em segundo (305 voltas no total), Mike Hawthorn foi o responsável pela volta mais rápida na corrida, cumprida em 4:08.
Além do limite (Andretti-Giunti-Vaccarella, 12h de Sebring, 1970)
Na década de 1970, a Ferrari era a única equipe que fornecia algum desafio à Porsche e à Ford. Boa parte disto tinha a ver com o desempenho da Ferrari 512S, o protótipo que Ignazio Giunti, Nino Vaccarella e Mario Andretti, guiaram até a vitória nas 12 Horas de Sebring, segunda etapa do Mundial de Endurance de 1970. Quer dizer, originalmente era uma dupla – Mario Andretti só entrou depois. Mas como assim?
Na verdade, quem largou na ponta e dominou por boa parte da corrida foi a dupla formada por Mario Andretti e Arturo Merzario, na Ferrari 512S #19. As investidas do Porsche 917K de Jo Siffert e Pedro Rodriguez não foram suficientes para tirá-lo da primeira posição, mas problemas com o carro, sim – faltando pouco menos de uma hora para o fim da corrida. Àquela altura, a 512S de Jacky Ickx e Peter Schetty (#20) também já havia abandonado a prova, de forma que apenas a Ferrari #21 de Ignazio Giunti e Nino Vaccarella estava em condições de terminar a corrida.
Faltando menos de meia hora para o fim da prova, o chefe de equipe Mauro Forghieri não teve dúvidas e colocou Mario Andretti, seu piloto mais veloz, ao volante. Foi certeiro: o carro, que estava na terceira colocação e uma volta atrás de Jo Siffert em seu Porsche, conseguiu descontar a volta e estava engolindo toda a diferença em relação ao 917K, que acabou abandonando pouco tempo depois com problemas em um cubo de roda. Com este abandono, quem assumiu a liderança foi Peter Revson, colega de Steve McQueen na equipe Solar Productions ao volante do Porsche 908 (algo surpreendente, pois este carro era da categoria de três litros) –mas Andretti o alcançou minutos depois, ultrapassando-o em pista.
Tudo resolvido? Nada feito. Na entrada da última volta, Andretti entra nos pits para um splash ‘n go forçado, pois sua Ferrari estava tão sem combustível que já estava começando a falhar. O Porsche 908 o ultrapassa novamente. Michael sai ensandecido dos boxes, atravessando sua 512S para uma flying lap arrasadora e conquistando a vitória nos últimos metros.
Glória e tragédia (Taruffi, Mille Miglia, 1957)
“Mille Miglia” arredondava para cima: a corrida de longa duração disputada na Itália passou por exatamente 992,332 milhas (ou 1.597,004 km) de vias públicas entre Bréscia, capital da província de mesmo nome, e Roma, a capital da Itália. Como de costume, era uma corrida contra o relógio, com um carro largando por minuto. Os números de cada carro marcavam o horário de saída. Taruffi, portanto, largou às 5:35 da manhã.
E foram os italianos que dominaram a linha de largada: apenas Ferrari e Maserati levaram suas equipes de fábrica para aquela que seria a terceira etapa do WSC, com quatro carros cada uma. A Ferrari atacou com cinco carros: quatro protótipos, com Piero Taruffi, Wolfgang von Trips, Peter Collins e Alfonso de Portago ao volante; e um GT, a 250 GT LWB Scaglietti de Olivier Gendebien. Já a Maserati passava por uma fase ruim: dos quatro pilotos que levou à Mille Miglia, apenas dois – Stirling Moss e Jean Behra – representavam algum risco para a equipe de Maranello.
Para facilitar as coisas para Enzo, as Maserati abandonaram a prova logo no início por problemas mecânicos. Com isto, Taruffi conseguiu vencer ao completar a distância de 992 km em 10 horas, 27 minutos e 47 segundos a uma velocidade média de 94,841 km/h. Três minutos depois, veio o colega de equipe von Trips, enquanto Gendebien – o único dos três a levar um navegador, Jacques Washer – foi o terceiro. Vitória tripla da Scuderia!
Mas a comemoração teve um gosto bastante amargo.
Pouco mais de 60 minutos depois de largar, o pneu dianteiro do carro de Affonso de Portago explodiu. Ele perdeu o controle, acertou um poste de luz e também alguns dos espectadores. Resultado: dez mortos (cinco deles, crianças) e outros 20 feridos. Tanto Portago quanto seu navegador Edmont Nelson faleceram instantaneamente no local. A tragédia levou o governo da Itália a decretar o fim da Mille Miglia como competição e a proibir qualquer atividade automobilística nas estradas do país por muito tempo. Assim, a edição de 1957 foi a última da lendária competição de velocidade, e a Ferrari foi a última vencedora. Desde 1982, contudo, a Mille Miglia voltou a ser realizada, só que como uma prova de regularidade de clássicos.
Rito de passagem (Rubens Barrichello, Hockenheim, 2000)
O sábado havia sido um desastre. Barrichello chegara à Alemanha assistindo a briga pelo campeonato do quarto lugar na classificação, a 20 pontos do líder Schumacher. Os treinos da manhã foram apenas razoáveis, com o quarto melhor tempo, seis décimos atrás do alemão. Para piorar, na classificação da tarde o F1-2000 teve problemas elétricos e impediram que Rubens conseguisse algo melhor que um 18º lugar no grid de largada. Com praticamente tudo perdido, ousar demais na estratégia deixa de ser fator de risco. Rubens sugeriu largar com menos combustível e usar os pit stops para ao menos terminar entre os seis primeiros e beliscar alguns pontos.
No domingo a história começou a mudar antes mesmo da largada: Jenson Button teve um problema com a partida de seu carro e largou do fundo do grid. Um a menos pela frente. Na primeira curva da prova Schumacher e Fisichella bateram e abandonaram. Menos dois. Com o carro mais leve, e três carros a menos à sua frente, Barrichello terminou a primeira volta na décima posição.
Mas isso foi só o começo de um espetáculo de pilotagem. Na 15ª volta Rubens já estava em terceiro, atrás apenas das McLaren de Mika Hakkinen e David Coulthard. Hora de reabastecer e trocar pneus. Entrou nos pits, saiu em sexto e logo subiu para quinto quando algo improvável aconteceu: um ex-funcionário insatisfeito da Mercedes-Benz invadiu a pista para protestar contra a fabricante alemã. A invasão acionou o safety-car e Barrichello colou na dupla da McLaren. Na relargada, Jean Alesi e Pedro Paulo Diniz bateram e trouxeram o safety car de volta à pista. Nova relargada, o tempo fecha, a chuva cai. Com 33 voltas, Hakkinen e Coulthard logo entram nos pits para trocar os pneus, apostando na parada de Barrichello em seguida.
Só que a parada não aconteceu. A chuva não foi forte nem suficientemente extensa para encharcar os 6,8 km do traçado antigo de Hockenheim, e por isso somente parte da pista estava molhada. Rubens, agora liderando, decidiu apostar nos slicks para as 12 voltas seguintes. Um risco grande que ele se dispôs a encarar.
Trazendo o carro com cuidado — e causando crises de ansidedade até mesmo no mais tranquilo dos torcedores — Barrichello entrou na penúltima volta com 11,4 longos segundos de vantagem sobre Mika Hakkinen. Depois de sair do fundo do grid, Barrichello recebia a bandeira quadriculada sete segundos e meio antes do finlandês, conquistando a primeira de suas 11 vitórias com uma combinação admirável de talento, estratégia e uma pitada de sorte.
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