Ah, os anos 90! Dizem que é por causa dos ciclos da moda que certas tendências de vinte e poucos anos atrás estão voltando à tona na música, na moda e na cultura pop. E é claro que isto inclui os carros – basta ver como alguns modelos da década de 1990 começaram a acumular valor nos últimos tempos. Ou como a gente anda falando bastante da década de 1990 aqui no FlatOut…
Lembra do Salão do Automóvel de 1992, que mostramos aqui há alguns dias? Pois então: enquanto os brasileiros estavam começando a conhecer os carros importados de perto, o mundo acabava de ganhar aquele que, para muitos, ainda é o supercarro definitivo: o McLaren F1.
Se você acompanha nossas páginas, sabe muito bem que tem um lugar muito especial no nosso coração para o McLaren F1 – já explicamos por que ele é fantástico, deixamos que Gordon Murray explicasse por que ele é fantástico e, mais recentemente, tivemos mais uma prova do quanto ele é fantástico ao assistir ao vídeo de seu recorde de velocidade, registrado em 1998: 386,1 km/h. Fantástico.
Mas nada devia ser tão fantástico quanto a entrega do seu McLaren F1 novinho em folha. Naquela época, não havia a internet para esmiuçar cada aspecto de um superesportivo – hoje, dezenas de comparativos em vídeo e reviews detalhadíssimos permitem que você tenha noção de como o McLaren P1 anda, mesmo que jamais tenha visto um deles de perto. Você pode ouvir o ronco do motor, observar cada ângulo da carroceria e destrinchar fichas técnicas mesmo que sequer considere a possibilidade de, um dia, colocar um hipercarro híbrido de quase 1.000 cv na garagem.
As coisas eram diferentes na época do McLaren F1, porém. E não estamos falando apenas do motor V12 naturalmente aspirado, da tração traseira, do câmbio manual e do visual limpo da carroceria. Tudo era bem diferente.
Como a Internet já existia, mas ainda não era difundida comercialmente, as concessionárias não se importavam caso você levasse uma câmera para filmar o momento da entrega do seu carro – ainda que o fato de você ter pago pelo menos US$ 815 mil certamente lhe garantisse certas liberdades.
Em tempo: em valores atuais, US$ 815 mil equivalem a US$ 1,4 milhão (R$ 4,4 milhões), ou pouco mais que os US$ 1,15 milhão (R$ 3,6 milhões, sem impostos e taxas) que a McLaren pedia pelo P1 na ocasião do lançamento, em 2013.
O vídeo foi publicado no YouTube pelo usuário Dan Kennedy e, aparentemente, ele é o cara que aparece no vídeo filmado por sua esposa. O casal comprou um McLaren F1 laranja, com detalhes laranja no interior, e parece realmente empolgado com sua nova aquisição. Na verdade, é a esposa quem parece mais animada – ela exclama o tempo todo o quanto o carro é bonito e o quanto seu marido fica bonito ao lado do carro. Os dois parecem bem felizes juntos, e examinam cada detalhe do carro guiados pelo funcionário da loja.
Ar-condicionado, vários alto-falantes, couro, fibra de carbono, acabamento de primeira, isolamento acústico para lá de eficiente, etc, etc, etc
É uma ótima oportunidade para, mais uma vez, constatarmos o quanto o McLaren F1 era inovador. Não é como se eles tivessem visto fotos do carro, recebido um release por email e soubessem tudo o que o carro tinha antes de ir até a concessionária e comprar seu exemplar. Se você era um milionário, a decisão era tomada depois que você lia as revistas, conversava com seus amigos milionários e ouvia, bem, o seu coração. Não podia contar com a opinião daquele jornalista automotivo no Twitter e nem entrar em um fórum para pedir opiniões de gente que sequer conhecia fora da Internet. Até porque a Internet nem existia direito, lembra?
Aliás, a Internet havia acabado de nascer: a rede mundial de computadores foi “inaugurada” oficialmente e aberta para o púbico no dia 6 de agosto de 1991, pouco mais de 25 anos atrás. O McLaren F1 foi lançado no dia 28 de maio de 1992, em Mônaco. E ninguém cobriu o evento em tempo real no Instagram.
Curiosidade: ele era quase igual aos primeiros protótipos, exceto por detalhes como os espelhos retrovisores, que deixaram o topo das colunas A e assumiram uma posição mais tradicional; e a ausência de pisca-piscas dianteiros.
O F1 ajudou a estabelecer as tendências de design para a década que acabava de começar, e ainda trouxe recursos que só seriam vistos nas ruas muitos anos depois, como os repetidores dos pisca-pisca nos retrovisores, a estrutura e carroceria de fibra de carbono e navegação GPS. O casal se surpreende com cada descoberta – abrir as portas para cima, topar com três lugares, o do motorista no centro, uma tela com um mapa e um sistema de som que avisa se o volume está aumentando ou diminuindo em vários idiomas. Veja só, tem ouro no cofre do motor! Onde vão as malas? Ah, tem compartimentos nas laterais! Com malas feitas sob medida! E eles em viram o kit de ferramentas de titânio (que tem 1/3 do peso das ferramentas de aço) revestido com nitreto de titânio que fica na dianteira. Aliás, compilamos várias minúcias do F1 neste post.
E tem mais: naquela época, a McLaren era um nome muito forte. Ayrton Senna era o ídolo de toda uma nação depois de conquistar seu terceiro título pela equipe britânica de Fórmula 1. Que ricaço perderia a chance de ter um dos pouco mais de 100 carros de rua feitos pela mesma companhia?
O marido decide sentar no posto do motorista, que fica no meio, como nos carros de corrida. Gordon Murray acreditava que esta era a solução perfeita, pois otimizava a posição de pilotagem e ainda permitia dois lugares extras, um de cada lado. O volante é removido para que o rapaz possa se acomodar mais facilmente, e a mulher fica assustada: “onde está o volante, por que fizeram isto?” O funcionário explica e fica tudo bem.
Quem se encantava e decidia comprar um McLaren F1 ainda levava para casa um catálogo absurdamente caprichado a respeito do superesportivo. Capa dura, papel brilhante e 72 páginas com fotos e ilustrações do processo de desenvolvimento do carro, suas funções principais, o modo como a aerodinâmica atuava sobre a carroceria e outros aspectos. Um destes catálogos está anunciado no eBay pelo equivalente a R$ 2,9 mil.
Gordon Murray foi uma das pessoas que se recusaram a abandonar o mullet nos anos 90
Ao que parece, o casal teve um relacionamento muito feliz com o carro. O vídeo abaixo foi carregado na mesma conta, e mostra que o rapaz não perdeu tempo em mostrar para a esposa que, no fim das contas, o que ele realmente gostava no F1 era seu V12 de 6,1 litros e 636 cv.
Antes que a gente esqueça…
Sabe quem também comprou um McLaren F1 novinho em folha? Elon Musk, o fundador da Tesla e principal embaixador dos carros elétricos na atualidade. Olha só ele, magricelo e com um terno gigante, falando a respeito de sua mais nova aquisição.
Uma curiosidade apenas: assim como Gordon Murray, o criador do F1, Elon Musk é sul-africano, e comprou seu exemplar em 1999, zero quilômetro, logo após vender sua empresa de conteúdo para a internet, a Zip2, por US$ 22 milhões – US$ 31 milhões, ou R$ 96,8 milhões, em dinheiro de hoje.