Uma das maiores mágoas que a gente tem com a Ford é a ausência dos Escort de tração traseira no Brasil. O sucesso do Chevrolet Chevette não nos deixa dúvidas: o Escort Mk1, lançado na Europa em 1968 e fabricado até 1975, poderia ter sido o Chevette da Ford, e se tornado tão popular entre os entusiastas quanto compacto de origem Opel.
É só ver a quantidade de project cars feitos com base no Escort Mk1 na Europa, e em especial no Reino Unido, onde a Ford tem um grande número de admiradores muito dedicados. Quer ver só? Saca este projeto aqui
Não dá para perceber logo de cara, mas com uma olhada mais minuciosa nota-se que se trata de uma carroceria de fibra de vidro – uma “bolha”, se quiser dizer assim. Mas é uma bolha muito bem acabada, que não faria feio em uma réplica de visual mais civil.
A carroceria é fornecida por uma empresa chamada Old Ford Autos, que vende carrocerias de fibra de vidro para os Escort Mk1 e Mk2. Os painéis de porta têm estrutura interna e podem receber até mesmo vidros elétricos, enquanto os para-lamas podem ter o visual original ou ser alargados como nos Escort que competiam em ralis. É uma boa forma de montar um “Escort” sem sacrificar um exemplar original, e também o tipo de coisa que gostaríamos de encontrar com mais facilidade por aqui – embora todos saibamos que os trâmites de montar uma carroceria de fibra sobre um chassi tubular e regularizar toda a sua documentação são bem mais trabalhosos no Brasil do que no Reino Unido.
Enfim, divagamos. Até porque este Escort Mk1 não é um carro de rua. Trata-se de um projeto até antigo, iniciado em 2012, mas a gente ainda não tinha topado com ele. Gostamos porque: 1) é um belo uso para uma carroceria de fibra de vidro e 2) o motor escolhido é um dos mais incríveis que poderiam ter sido usados.
O carro foi montado pelo inglês Lloyd Wright para participar de provas de time attack – sozinho na pista, volta cronometrada, pau nas cabritas, o que acaba gerando todo tipo de configuração interessante. No caso deste carro, a estrutura tubular foi montada sob a carroceria de fibra de vidro para garantir um peso de ridículos 700 kg. E Lloyd ainda colocou o painel de instrumentos original do carro e até revestimentos de porta, que dão um contraste bacana com as travessas da estrutura tubular expostas do lado de dentro do Escort.
A montagem do carro ficou por conta da preparadora britânica SHP Engineering, que executou o projeto em conjunto com a Radical Performance Engines. A primeira cuidou de todo o serviço de pintura, montagem, finalização e acerto de suspensão/freios; a segunda, como você já deve ter deduzido, cuidou do motor.
O chamado RPE RP-V8 é composto por dois cabeçotes com comando duplo de Suzuki Hayabusa montados em um bloco projetado especialmente para a aplicação, separados por um ângulo de 72 graus. O virabrequim é plano, o que ajuda o motor a girar bem alto – coisa de 10.500 rpm –, e a alimentação fica por conta de um sistema de injeção eletrônica com corpos de borboleta individuais. O motor é oferecido com deslocamentos entre 2,6 litros e 3,2 litros. No caso do Escort de Lloyd, trata-se de um V8 de 2,8 litros capaz de entregar 460 cv e 34,5 mkgf de torque. Em um carro de 700 kg, é claro que o resultado é devastador.
O motor é moderado por uma transmissão sequencial de seis marchas Quaife 69G, acionada por alavancas atrás do volante. A suspensão traz braços triangulares sobrepostos nas quatro rodas, e os freios são a disco da Wilwood com pinças de seis pistões na dianteira.
É preciso garimpar um pouco, mas dá para encontrar vídeos de Lloyd acelerando seu “Escort” em circuitos como Snetterton e Oulton Park. No vídeo abaixo dá para ver como o setup do carro é agressivo: a carroceria praticamente não rola nas curvas e a traseira apresenta uma leve tendência a escorregar, freada pelo grip monstruoso (gerado, em parte, pelo downforce do kit aerodinâmico).
Mesmo que não seja um Escort de fato, sem dúvida é um projeto admirável.