Às vezes gostar de carros e corridas é difícil, sabe por que? Por que a gente não consegue decidir qual é nossa categoria favorita do automobilismo. Temos a Fórmula 1, as subidas de montanha, o WRC (especialmente o Grupo B, não é?), o Grupo C de Le Mans… e foi esta última que brilhou na 73ª edição do Goodwood Members Meeting que, como você sabe, aconteceu no último fim de semana.
Agora você vai poder assistir toda a demonstração que os monstros de Le Mans fizeram na propriedade de Lord March. E, se você acha que os homens de sorte ao volante destas máquinas as pouparam, bem… não foi o caso.
O Grupo C foi uma categoria de protótipos criada pela FIA em 1983 e extinta em 1993. Por dez anos, fabricantes de automóveis e equipes particulares de todo o planeta desenvolveram carros com a mais alta tecnologia disponível na época… que não era muita. Não existiam computadores capazes de realizar simulações aerodinâmicas sofisticadas, as regras era fexíveis a ponto de cada equipe escolher a configuração mecânica dos carros — o que resultava em uma bela variedade de estilos e roncos de motor — e os bólidos eram rápidos, muito rápidos.
Campeonatos de endurance como o World Endurance Championship (WEC) e o World Sportscar Championship (WSC), além de competições menores, como o Europeu de Endurance, empregaram as regras do Grupo C. Com isto, havia protótipos correndo o ano todo — o que, somado à brutalidade dos carros, ajudou a transformar o Grupo C em uma categoria quase tão popular quanto a Fórmula 1 na época.
Sendo parte do Mundial de Endurance, a corrida mais importante do Grupo C era, sem dúvida, Le Mans. A corrida francesa tem uma história que beira os 100 anos, mas seu auge, para boa parte dos fãs, foram os anos 1980 e 1990, quando os protótipos eram capazes de chegar perto dos 400 km/h nos seis quilômetros da Hunaudières, a longa reta de La Sarthe que antecede a famosa curva Mulsanne.
Isto foi o suficiente para você entender por que o Grupo C era animal? Sim? Mas você não iria sacrificar sua produtividade para assistir ao vídeo abaixo, com a demonstração dos protótipos no 73MM na íntegra, iria?
Mesmo assistindo por streaming o encontro foi impressionante. Bem, imaginamos que seja mesmo impossível esquecer a sensação de estar a poucos metros de verdadeiros monstros como o Sauber C9 que venceu em 1989; o Peugeot 905; os Jaguar XJR-9, XJR-11 e XJR-12 com as clássicas cores da Silk Cut, e o Nissan R90CK, um dos últimos esforços da marca japonesa no Mundial de Endurance.
Também estiveram no Circuito de Goodwood carros menos conhecidos, mas igualmente incríveis — por exemplo, o Lancia-Ferrari LC2. Decorado com a clássica pintura da Martini Racing, o protótipo competiu em 51 corridas e conquistou três vitórias ao longo de quatro anos (1983-1986).
Como o nome diz, ele foi feito em conjunto entre as duas fabricantes italianas: a Lancia projetou e construiu a carroceria, enquanto a Ferrari forneceu o motor — no caso, o V8 de três litros oferecido na Ferrari 308, porém com deslocamento reduzido para 2,6 litros e a adição de dois turbocompressores KKK para entregar nada menos que 720 cv.
É uma pena que nomes lendários como os Porsche 956 e 962 — que, juntos, garantiram seis vitórias consecutivas para a Porsche em Le Mans (1982-1987), ficaram nos boxes e não foram esticar as pernas na pista. Também sentimos falta do Mazda 787B e seu enxame de abelhas furiosas na forma de um motor rotativo Wankel de 2,6 litros, quatro rotores e quase 800 cv, mas não se pode ter tudo, não é mesmo?
No início da década de 90, a FIA mudou as regras do Grupo C e estabeleceu que os motores deveriam ser todos iguais — os V8 de 3,5 litros usados na Fórmula 1. O problema era que estes motores eram caríssimos, o que tirou boa parte das equipes independentes da jogada. Com apenas equipes de fábrica no grid, o Grupo C acabou perdendo popularidade, e foi extinto em 1992.
Por sorte, existem eventos como o 73MM, que permite que estes carros saiam para esticar as pernas como se deve e lembrem ao mundo o quanto eles eram incríveis.