Cores neon, com tons de roxo, rosa, laranja, azul e vermelho, fomas geométricas, imagens pixeladas. Referências nada a toda a mídia oitentista. Batidas eletrônicas pulsantes, graves pronunciados e artificiais, e muitos, muitos sintetizadores. Se você se manteve ligado na cultura pop atual pelos últimos anos, sabe onde podemos encontrar tudo isto: no retrowave, também conhecido como synthwave ou outrun electro.
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O gênero da música eletrônica é dedicado a resgatar a estética e a atmosfera da “década perdida” acabou se tornando, para muitos, quase um estilo de vida, transcendendo a música e se tornando o culto a tudo o que vem dos anos 80. Séries de TV, filmes e games oitentistas se tornaram a principal inspiração de muitas séries de TV, filmes e games na virada da década, e é muito fácil citar exemplos: o filme Drive, de 2011, com Ryan Gosling no papel de um motorista de aluguel habilidoso e sentimental; Stranger Things, a série da Netflix inspirada pelas histórias de Stephen King que estreou em 2016 e vai ganhar sua terceira temporada em julho de 2019; e Drift Stage, game para PC totalmente inspirado na cultura dos anos 80, em especial os clássicos de corrida para arcade. E todos estes são embalados pela nostalgia do retrowave.
Você não precisa passar muito tempo exposto ao retrowave para sacar que a cultura automotiva também exerce forte influência no gênero. É fácil entender o motivo: os carros de uma determinada década são uma boa forma de compreendê-la, pois eles acabam refletindo, de diferentes formas, as características daquele período. Seja através de suas linhas, seja por seus recursos técnicos, ou até mesmo graças às fotos de divulgação e comerciais dos carros. Ou seja: se a proposta do retrowave é resgatar a estética dos anos 80, inevitavelmente os automóveis dos anos 80 são usados para construir esta estética. É só pensar na importância que os carros têm em alguns filmes da época, como o DeLorean de “De Volta para o Futuro” ou o KITT de “A Super Máquina”. Ou na trilha sonora de OutRun, clássico da Sega para arcades e Mega Drive cuja trilha sonora até ajudou a batizar o gênero.
Se até algumas décadas atrás, o rock and roll e suas vertentes eram a escolha número 1 na hora de montar uma playlist para ouvir no carro, hoje em dia muitos se renderam ao retrowave – falo por experiência própria, como adolescente que cresceu ouvindo hard rock e heavy metal e hoje não passa um dia sem sua dose diária de sintetizadores. Aliás, também não é por acaso que a trilha sonora do nosso quadro FlatOut Midnight (ainda não se inscreveu no canal do FO! no Youtube?) é quase 100% composta de retrowave.
Foi pensando nisso, e também ouvindo sugestões de vocês, que decidimos retomar nossa série de playlists para ouvir no carro – ou Músicas para Guiar – com uma seleção especial de retrowave/synthwave/outrun electro que você confere a partir de agora.
Home – “Resonance”
A maioria dos produtores de retrowave são caras normais que adotam pseudônimos misteriosos – alguns parecem até nomes de bandas, mesmo que sejam projetos solo. É o caso do Home, cujo nome verdadeiro é Randy Goffe. O norte-americano é conhecido por seu synthwave mais etéreo e atmosférico, meio melancólico, com traços de vaporwave – outro gênero moderno da música eletrônica inspirado no passado, porém com mais foco na década de 1990. Dá para dizer que seus sons são mais tranquilos e “viajados”, porém todos são igualmente pegajosos.
Se você é do tipo que não sai da Internet, deve ter ouvido alguma coisa do Home nos vídeos de Simpsonwave que explodiram em popularidade nos anos 2000, e misturam clipes de “Os Simpsons”, efeitos de VHS, filtros bastante saturados e retrowave ou vaporwave, criando uma verdadeira nostálgica.
Kavinsky – “Testarossa Autodrive”
O DJ francês Vincent Belorgey, mais conhecido como Kavinsky, consolidou-se como um dos maiores nomes do retrowave no início da década com sua música mais obscura, densa, frénetica e cheia de referências à década de 80. “Testarossa Autodrive” faz parte do álbum OutRun, de 2013, que é meio conceitual e conta a história de um jovem que morreu em um acidente de carro em 1986, ao volante de uma Ferrari Testarossa, e retorna à vida em 2006 como um produtor de música eletrônica.
Seu som mais conhecido, porém, talvez seja “Nightcall”, que toca na cena de abertura do filme Drive e faz parte de uma minoria de canções do retrowave que contam com vocais. A faixa conta com a participação da brasileira Luísa Lovefoxxx, ex-Cansei de Ser Sexy.
Myrone – “Touge Run”
Diversificando um pouco a lista, temos o guitar hero moderno Myrone. O jovem norte-americano conseguiu notoriedade ao compor a trilha sonora de Drift Stage. O arcade de corrida retrô é um dos mais hypados games de corrida dos últimos tempos, com gráficos tridimensionais pixelados, cores vibrantes e um elenco automotivo que inclui Lotus Esprit, BMW M1, DeLorean DMC-12, Ferrari Testarossa e Toyota AE86 – todos eles devidadamente disfarçados de carros genéricos, para evitar problemas legais. O game está em Acesso Antecipado no Steam, mas já faz alguns meses que os desenvolvedores não atualizam a página. O que é uma pena.
https://www.youtube.com/watch?v=ZxdSMax8w5E
O barato da música de Myrone é a variedade de influências que ele usa para formar um som bastante coeso. A base é o synthwave, mas há elementos de vaporwave, pop, rock, heavy metal, e outros gêneros, sempre com melodias de guitarra para lá de criativas e absurdamente pegajosas. Para esta lista, optei por um de seus sons mais interessantes – “Touge Run”, claramente inspirada por outro gênero de música eletrônica comumente relacionado aos carros, o Eurobeat, popularizado pela série de animes e mangás Initial D. É uma música perigosíssima de se ouvir em uma boa rodovia, pode ter certeza.
effoharkay – “slipstream (pool smell)”
Este aqui, pessoalmente, é um dos meus itens favoritos da lista. E também faz parte da trilha sonora de um game: Slipstream, que foi lançado no ano passado e homenageia de forma sincera o icônico Top Gear do Super Nintendo. Gráficos com sprites em 2D de verdade(você não vai encontrar um polígono à vista!), jogabilidade simples e intuitiva são seus trunfos –além da trilha sonora de “effoharkay”, compositor americano que se especializou em trilhas sonoras de games retrô.
A levada atmosférica e tranquilizante da música é excelente para um relaxante passeio de carro à noite, e te leva instantaneamente para o fim dos anos 80. Mesmo que você sequer tivesse nascido ainda.
Carpenter Brut – “Turbo Killer”
Nem todo retrowave, porém, quer te deixar viajando em uma onda nostálgica. Alguns produtores apostam em uma levada mais agressiva, violenta e distorcida para evocar os filmes de ação, ficção científica e horror dos anos 80 – muitos dos quais adotavam uma abordagem mais distópica, imaginando como seria o mundo após o apocalipse, como Blade Runner ou mesmo “O Exterminador do Futuro”. Se você curte este tipo de coisa, certamente vai apreciar o barulho de Carpenter Brut, pseudônimo do francês Franck Hueso. Com uma batida mais rápida, de 120 bpm, sintetizadores distorcidos e melodias cheias de groove, Carpenter Brut consegue te colocar em um universo paralelo onde os anos 80 continuaram por séculos. Com direito a alguns carros bem interessantes no clipe – Chevrolet Corvette C3, Ford Mustang, Lamborghini Miura e Countach e até um Mercedes-Benz 600 Pullman.
Lazerhawk – “King of the Streets”
Outro representante deste lado mais dark do retrowave é Lazerhawk, embora ele aposte menos na distorção e na agressividade e prefira usar melodias e texturas para obter o resultado nostálgico e, ao mesmo tempo, cheio de energia de sua música. “King of the Streets”, do álbum Skull and Shark, de 2013, é um excelente exemplo – que fica ainda mais atraente para os entusiastas ao usar cenas do remake de 1997 de Vanishing Point, com Viggo Mortensen no papel principal.
Tokyo Rose – “Midnight Chase”
Os mais atentos identificaram a Ferrari Testarossa branca imediatamente – ela talvez seja o carro símbolo do retrowave. Tokyo Rose, cujo nome verdadeiro é desconhecido, é um produtor americano que lança tracks de retrowave desde 2014, e jamais escondeu sua inspiração pelo trabalho de Kavinsky. Isto fica evidente pela atmosfera da track, embora o trabalho de Tokyo Rose seja um pouco mais “comercial” – se é que isto é possível no Retrowave.
Quem acompanha o FlatOut Midnight desde o primeiro episódio também vai lembrar que usamos o Tokyo Rose como trilha sonora para o Nissan Silvia com motor 1JZ. O artista foi bastante gentil em permitir o uso da track.
Power Glove – “Vengeance”
Quem assistia a Sessão da Tarde na década de 1990 certamente vai lembrar do filme “O Gênio do Vídeo Game”, ou The Wizard, de 1989. Produzido pela Nintendo, o filme era praticamente um comercial para um acessório chamado Power Glove, uma luva que permitia controlar os personagens de um game com os movimentos da mão. Foi esta a inspiração do produtor Power Glove, que é claramente inspirado por trilhas sonoras de games da época em seu som.
Perturbator – “Humans Are Such Easy Prey”
Perturbator é outro produtor que investe mais pesado no lado mais obscuro do Synthwave, com fortes influências estéticas e sonoras das vertentes mais extremas do heavy metal, e inspirado por trabalhos de ficção científica e horror da década de 1980. Os sintetizadores são distorcidos e criam riffs que poderiam muito bem ter sido compostos por uma banda de death metal, porém são acompanhados por batidas, graves e efeitos artificiais futuristas, com uma aura cyberpunk.
Miami Nights 1984 – “Accelerated”
Pelo nome do projeto, Miami Nights 1984, ficam claras a inspiração e a proposta do produtor Michael Glover, que de tão obcecado pelo synthwave e pelos anos 80 fundou o selo Rosso Corsa Records, do qual fazem parte artistas como Lazerhawk e Mitch Murder – viu só como os carros fazem parte da identidade do retrowave? “Accelerated” tem tudo o que uma boa track de outrun electro precisa ter: baixo sintetizado, tempo de 120 bpm, muitas texturas sonoras e uma melodia bem grudenta. Tudo isto com um DeLorean todo trabalhado no neon acelerando por uma cidade retrofuturista deserta.
Tentei colocar bastante variedade nesta lista, passeando por diferentes formas de executar o synthwave. Espero que tenham curtido, e não se acanhem em postar suas sugestões nos comentários!