Carros de grande importância histórica costumam seguir dois caminhos: ou desaparecem por décadas, como aconteceu com o último Opala; ou recebem tratamento mais que especial de sua fabricante. No caso do Fiat 147, foi um pouco das duas coisas: a primeira unidade produzida não desapareceu e nem foi abandonada por aí, mas também não foi mantida pela Fiat em seu acervo para marcar o início de sua atuação no País.
A Fiat chegou ao Brasil em julho de 1976, com uma missão bem definida: produzir um carro popular para brigar com caras como o VW Fusca e a Brasilia, além do Chevette — os carros pequenos mais vendidos do Brasil na época. Para isto, ele contava com soluções que já eram comuns na Europa, mas ainda não existiam no Brasil.
Seu projeto foi herdado do Fiat 127, que foi lançado em 1971 na Europa e rapidamente tornou-se um dos carros mais vendidos do Velho Continente — na verdade, ele foi o mais vendido em 1975, com 500 mil unidades emplacadas. Boas características de seu projeto foram passadas ao 147: motor dianteiro transversal (primeiro em um carro nacional), suspensão independente nas quatro rodas (cujo bom comportamento transformou o 147 em referência no quesito), estepe no cofre do motor (liberando espaço no porta-malas), excelente aproveitamento do espaço interno (era mais amplo que o Fusca, mesmo que fosse 40 cm mais curto e tivesse entre-eixos 18 cm menor) e coluna de direção articulada, garantindo mais segurança ao motorista em caso de colisão frontal.
Além disso, em um aspecto, o 147 era até mais avançado que o 127: seu motor era totalmente novo, projetado por Aurelio Lampredi. O projetista famoso por seu trabalho na Ferrari criou um motor compacto, de 1.049 cm³ com comando no cabeçote acionado por correia dentada e 48 cv líquidos. Parece pouco, mas era suficiente para puxar com dignidade os menos de 800 kg do hatchback. Aliás, em 1979, este mesmo motor se tornaria o primeiro movido a álcool do Brasil.
Claro, foi uma receita aperfeiçoada com o tempo: o tamanho diminuto e a aparência frágil fizeram com que os consumidores enxergassem o 147 com certa reserva em um primeiro momento. Não demorou muito, contudo, para que ele fosse aceito pelo mercado — principalmente na virada da década de 1980, seu auge nas vendas. No fim das contas, algumas das soluções aplicadas no 147 continuam sendo vistas até hoje.
Obviamente, esta história toda teve um início — o primeiro Fiat 147 fabricado no Brasil, 40 anos atrás. Como já dissemos, normalmente estes carros costumam ficar com a fabricante, seja pelo valor histórico, seja para realizar testes, ou para as duas coisas. No caso do 147, a Fiat fez diferente e decidiu sortear o carro entre suas concessionárias, que eram 50 na época. Assim, sem cerimônia, o Fiat 147 de chassi nº 0000001 foi parar na revendedora Milocar, no Rio de Janeiro/RJ.
Como Jaime Bouéri, atual presidente do 147 Fiat Clube RJ, contou em 2013, a concessionária fez questão de manter o carro em seu showroom pelas últimas quatro décadas. Sua primeira saída aconteceu no último dia 16 de maio em um evento organizado pelo Clube. Além de marcar o aniversário da comunidade de proprietários, o evento também serviu para comemorar antecipadamente os 40 anos de atuação da Fiat no Brasil — a data oficial é 9 de julho, dia da inauguração da fábrica em Betim/MG.
O evento reuniu centenas de proprietários e contou com a participação de outros clubes dedicados a modelos da Fiat — Uno, Marea, 500, Tempra e Tipo também estiveram presentes. O ponto alto da reunião, contudo, foi a carreata liderada pelo 147 nº 0000001. O colega Henrique Rodriguez, do Primeira Marcha, estava lá e filmou parte do passeio no banco do carona do Fiat 147 GL 1977 de Bouéri.
Dá para ver que o carro está muitíssimo bem conservado e aparentemente com boa saúde, apesar dos pouco mais de 10 km marcados no hodômetro. Dá para imaginar o arrependimento da Fiat em ter passado o carro para uma de suas concessionárias — tanto que, de acordo com Bouéri, dez anos mais tarde a fabricante tentou reaver o carro, oferecendo até mesmo uma cegonha carregada de Fiat Elba 0km. A proposta foi recusada, o que conseguimos entender perfeitamente.
Enfim, esta é a história do primeiro Fiat 147 vendido no Brasil. Fique agora com uma seleção de fotos do evento, que estão disponíveis também na fanpage do 147 Fiat Clube RJ.