Os motores sobrealimentados vieram para ficar, e parece que a cada dia temos uma nova evidência de que isto não é tão ruim. Por exemplo: os motores de quatro cilindros que hoje atingiram um patamar inimaginável há alguns anos. É comum ver motores de dois litros saindo de fábrica com 300 cv ou mais, como é o caso da maioria dos hot hatches médios vendida atualmente.
Dito isto, tais motores são plenamente capazes de entregar ainda mais potência – exceto que, por questões de custo, confiabilidade e emissões, as fabricantes não abusam desta capacidade. Além disso, ainda que seja meio que senso comum que um carro de tração dianteira com mais de 300 cv traga poucos benefícios na prática, devido à limitação de tracionamento (não só em arrancadas, mas em saídas também em saídas de curva), ultimamente este limite têm se tornado flexível, graças às assistências eletrônicas e à complexidade que os mapeamentos de hoje permitem: é possível, por exemplo, limitar a pressão de turbina por marcha. Desse modo, as primeiras marchas primeiras marchas ficam mais dóceis e aproveitam melhor a força do motor, enquanto nas marchas de velocidade se tem pressão plena, conseguindo o melhor dos mundos. É por isso que existem as preparadoras.
Pegue a alemã Pogea Racing, por exemplo. O Fiat 500 Abarth vendido na Europa agora entrega até 180 cv em seu motor 1.4 MultiAir turbo ao sair da fábrica, na versão 595. Se, por um lado, 180 cv já são um número bem interessante para um motor de deslocamento tão baixo (mesmo a versão vendida no Brasil, com 160 cv, já é bem divertida), por outro lado é possível aumentar este número ainda mais, se você tiver coragem — e bons engenheiros.
Foi esta a ideia da Pogea, que deu ao 500 Abarth nada menos que 410 cv. Tem noção do que é isto? O hot hatch italiano preparado pelos caras entrega nada menos que 292 cv por litro! De acordo com a companhia, o chamado Project Ares é fruto de quatro anos de desenvolvimento, durante os quais “nem um parafuso permaneceu intocado”.
A mudança começa por fora: para-choque dianteiro e traseiro foram substituídos por peças de fibra de carbono exposta, bem como o capô, os para-lamas e as saias laterais. A fibra de carbono também aparece no spoiler do teto e nas capas dos retrovisores, e ajudou a reduzir o peso do carro de 1.035 kg para 977 kg, com tanque cheio e sem motorista. Os para-lamas também foram alargados em 48 mm cada, a fim de acomodar as rodas de 18×8” (desenvolvidas in house pela Pogea) calçadas com pneus Michelin Pilot Sport de medidas 215/35.
Ao abrir o capô, porém, é que se vê o principal: o motor de 1,4 litro foi completamente retrabalhado, com bloco reforçado (provavelmente com uma girdle plate, uma placa estrutural na parte inferior que conecta as paredes do bloco e os mancais, aumentando a resistência à torção do bloco com a força imposta pela turbina), pistões forjados, bielas do tipo H-Beam (mais leves e resistentes, indicadas para motores que produzem bastante torque em baixas rotações), taxa de compressão reduzida para 8,9:1 (originalmente são 9,8:1) e uma nova junta do cabeçote, que teve os parafusos de expansão trocados por prisioneiros.
Este foi usinado em CNC e o motor teve os dutos de lubrificação e arrefecimento ampliados para aumentar sua eficiência, recebeu coletores de escape menos restritivos, um virabrequim reforçado, radiador de óleo, um turbocompressor maior, comandos de válvulas com perfil mais agressivo e ECU do motor reprogramada. O motor também ganhou novas velas e corpo de borboleta de 70 mm em vez dos 52 mm originais. Segundo a Pogea, sete turbos e três sistemas de injeção diferentes foram testados, e o carro ainda passou por 12.000 km de testes, de modo a assegurar sua confiabilidade.
O resultado: 410 cv a 6.400 rpm e 45,3 mkgf de torque a 3.350 rpm. E a Pogea Racing é bem clara ao afirmar que só realiza as modificações em carros equipados com o câmbio manual de cinco marchas. Isto porque eles também desenvolveram upgrades para o câmbio a fim de torná-lo capaz de suportar a potência extra: a carcaça é reforçada, assim como a embreagem e as engrenagens da 3ª, da 4ª e da 5ª marcha, e um radiador para o óleo do câmbio também foi instalado. Além disso, a alavanca teve o curso reduzido, e o eixo dianteiro recebeu um diferencial de deslizamento limitado.
Com isto, o 500 Abarth “Project Ares” é capaz de chegar aos 100 km/h em 4,7 segundos, com velocidade máxima de 288 km/h. A própria Pogea admite que o carro poderia ter uma aceleração melhor caso os pneus não derrapassem tanto na arrancada…
De qualquer forma, para melhorar também a dinâmica do carro nas curvas, a Pogea Racing instalou amortecedores KW, ajustáveis em altura, carga, compressão e retorno, além de juntas do tipo uniball. A cambagem da suspensão também é regulável. O eixo dianteiro foi reforçado, foram instaladas barras entre as torres na dianteira e na traseira, e adotada uma nova barra estabilizadora. Já os freios receberam discos de alumínio (de 322 mm na dianteira, perfurados e ventilados), linhas de aço inox e novas pinças e pastilhas.
É claro que o lado de dentro também recebeu tratamento especial: bancos concha, todos os plásticos revestidos com couro ou Alcantara (usando, de acordo com a Pogea, materiais encontrados nos Porsche, Audi e Lamborghini), sistema de som Pioneer, subwoofers, câmera de ré e cluster de instrumentos digital usado no 500 Abarth 2017.
É claro que tudo isto tem um preço. De acordo com a Pogea, as modificações custaram cerca de € 62 mil (por volta de R$ 210 mil em conversão direta), sem contar o preço do carro, que na Europa fica em torno de € 19 mil (R$ 65 mil). Contudo, a companhia diz que o valor do kit parte de € 58,5 mil (R$ 198 mil) na configuração básica, que inclui uma versão de fibra de vidro do body kit. Eles também dizem que é possível adquirir apenas as modificações mecânicas, o que diminui o preço para € 21 mil (R$ 71 mil). Tudo isto com o valor do carro incluso, e com garantia de um ano para motor e câmbio.
Caso se interesse, você vai ter que correr: a Pogea Racing diz que a produção será limitada a cinco veículos, sendo que o carro cinza das fotos é um deles. Só mais quatro serão feitos, para garantir a exclusividade do projeto.