Dizem que a forma mais barata e fácil de colecionar automóveis é comprando miniaturas – e, de fato, é possível juntar um belo acervo de Hot Wheels pagando uns R$ 10 por cada unidade. No entanto, há quem leve este hobby mais a sério: as miniaturas 1:18 incrivelmente detalhadas da Autoart, por exemplo, partem de R$ 1.500 no Brasil.
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Hoje, porém, vamos falar de uma coleção de miniaturas diferente: a coleção de Ferrari de Milan Paulus, um entusiasta que mora na República Tcheca e, desde 2008, dedica todo seu tempo livre a construir réplicas em escala 1:6 de todos os monopostos com os quais a Scuderia competiu na Fórmula 1 de 1957 para cá. É uma premissa bem simples, mas a tarefa em si não poderia ser mais complexa: todos os carros são feitos de papel.
O vídeo abaixo foi feito em 2018, e mostra o ateliê de Paulus – que também é o lugar onde ele mantém a coleção exposta, em estantes feitas sob medida. É o tipo de coisa que nos faz pensar “como não vimos isto antes?”, mas nunca é tarde para apreciar boa arte.
https://www.youtube.com/watch?v=FFlAO5d4v6A
Paulus conta que constrói modelos de papel desde os sete anos de idade – seu primeiro foi uma réplica do Austin blindado de Lênin, e depois ele começou a montar os esquemas que vinham em revistas para crianças. Aos 12 anos, Paulus descobriu a Fórmula 1 – e a Scuderia Ferrari – graças a Niki Lauda, seu grande ídolo. Mais especificamente, graças à Ferrari 312T2 na qual Lauda sofreu seu terrível acidente no GP da Alemanha de 1976, em Nürburgring Nordschleife. Paulus diz que a 312T2 sempre será sua Ferrari de Fórmula 1 favorita, pois salvou a vida de Lauda. “Esse carro tinha estrutura de aço e carroceria de alumínio. Se fosse como um Lotus, com monocoque e painéis estruturais, Lauda certamente teria morrido”.
É interessante que Paulus cite a estrutura do carro como principal razão para que a Ferrari 312T2 seja sua favorita. Isto porque as suas réplicas (falar “miniaturas” não parece justo) não retratam apenas a carroceria dos carros, mas também simulam seu método de construção e, claro, reproduzem todos os componentes – motor, suspensão, freios e interior. Não são apenas cascas de papel sobre uma base genérica. E, mesmo se fossem, já seria um belo trabalho.
Isto porque o nível de detalhes, em todos os elementos de todos os carros, é impressionante – não há nenhum atalho, nada que tenha sido feito para ganhar tempo ou facilitar o trabalho. Cada curva da carroceria, cada componente aerodinâmico está ali. Por baixo dela, pode-se ver o chassi, os braços e molas da suspensão (uma das poucas peças que não são feitas de papel, mas de metal), o motor e o câmbio. Os componentes que se soltam nos carros de verdade também se soltam nas réplicas e, ao ver uma delas desmontada, é fácil esquecer qual é a matéria prima.
Paulus usa folhas de papel mais grossas – cartolina e papelão, este geralmente usado como camada protetora em embalagens industriais. Primeiro, Paulus faz os moldes, depois corta as peças e monta a estrutura básica. Depois, para dar rigidez, ele aplica uma camada de gesso – é ela que vai receber a pintura e o acabamento, incluindo os emblemas, nomes dos pilotos e marcas dos patrocinadores. Nos carros mais modernos, há também adesivos para imitar o padrão da fibra de carbono.
Segundo Paulus, sua parte favorita é o motor – especialmente nos carros mais antigos, onde a mecânica e todos os periféricos ficavam quase totalmente expostas. Paulus gosta de atentar-se aos detalhes: cabos, reservatórios, radiadores, coletores de admissão e escape, carburadores e corpos de borboleta, estão presentes. No entanto, Paulus tem o cuidado de recriar o motor mesmo que ele não fique exposto – até porque, em alguns carros, ele é um componente estrutural.
Paulus não se atém a uma ordem específica para fazer seus carros – atualmente, há cerca de 60 modelos prontos, dos 102 que a Ferrari fez até 2019. Seu plano é construir 104 réplicas, incluindo os carros que competirão em 2020 e 2021 e, obviamente, ainda não foram feitos pela Scuderia.
O detalhe: embora trabalhe com modelagem em papel há décadas, ele só começou a construir réplicas das Ferrari de Fórmula 1 em 2008. Ao olhar para as paredes de seu ateliê, forradas com monopostos Rosso Corsa, a impressão que fica é que se trata de um trabalho de décadas. Mas não é à toa: não raramente, Paulo se dedica a dois ou três carros ao mesmo tempo.
E ele não costuma usar esquemas técnicos ou blueprints dos carros, com todas as dimensões e detalhes. Paulus não fala inglês, e isto o limita na hora de encontrar informações – é mais fácil encontrar fotos, que são sua maior referência.
E é na Internet que Paulus expõe seu trabalho: há uma página com mais de 1.000 fotos detalhadas, de todos os carros, no Facebook. Seu projeto mais recente foi a Ferrari 412 T2, de 1995, conduzida por Jean Alesi e Gerhard Berger. A 412 T2 foi o último carro com motor V12 a vencer uma corrida pela Scuderia – o GP do Canadá de 1995. Aliás, coincidentemente, foi exatamente nessa corrida que Rubens Barrichello, na época piloto da Jordan, chegou em segundo colocado pela primeira vez na carreira.
O sonho de Paulus é conseguir reconhecimento com o acervo que já lhe tomou todo o tempo livre nos últimos 11 anos – ele espera que a Ferrari tome conhecimento da coleção e, quem sabe, compre todos os carros. Honestamente, este é o tipo de coisa que jamais venderíamos, mesmo que fosse para a própria Scuderia.