É difícil não ser passional ao fazer uma lista de carros italianos emblemáticos — dá vontade de colocar todos, esta é a verdade. No entanto, precisamos escolher apenas um punhado deles e, para isto, pedimos a ajuda dos leitores. Vamos à primeira parte da lista com as respostas, amici?
Lancia Stratos
Nem sempre o nome mais votado é o que melhor responde a uma pergunta do dia, mas é mais ou menos este o caso aqui — afinal, como é que um carro como o Lancia Stratos não estaria nesta lista? A Lancia, por si só, já é uma das marcas mais italianas de todos os tempos, e o Stratos foi uma de suas maiores lendas. Claro, antes do Stratos, havia outro Lancia de rali — um belo cupê com nome de mulher (na verdade era o nome de uma via Romana, mas preferimos ver como nome de mulher): o Fulvia. Mas o Stratos foi o primeiro Lancia a dominar o recém-criado Campeonato Mundial de Rali, o WRC.
O Stratos era um esportivo de motor central-traseiro com formato de cunha e linhas desenhadas por ninguém menos que Marcello Gandini, do estúdio Bertone. Para quem não lembra, este foi o cara que desenhou o Lamborghini Miura e o Countach. E só estes argumentos já seriam suficientes para garantir seu nome nesta lista.
Mas tem mais: seu motor era o V6 Dino, desenvolvido pela Ferrari para sua linha de esportivos “de entrada” de mesmo nome. Ele tinha 2,4 litros com comando duplo nos cabeçotes (que eram e alumínio), bloco de ferro fundido, 65° entre as bancadas de cilindros, taxa de compreção de 9,0:1. Na Ferrari Dino 246 ele entregava 195 cv a 7.600 rpm, e no Stratos de rua era exatamente a mesma coisa. O câmbio era manual de cinco marchas — e cada troca de marchas exigia uma carícia na coxa esquerda do navegador. Porque um carro não é verdadeiramente italiano se não tiver algumas peculiaridades, não é mesmo?
E o Stratos era um grande carro de rali, conquistando nada menos que 11 vitórias nos três anos em que o carro foi campeão (três em 1974, quatro em 1975 e 1976), e mais sete até 1981. Além disso, pouco menos de 500 exemplares de rua foram fabricados. Bonito, sonoro, vencedor e raro — como não incluí-lo aqui?
Ferrari F40
Se o nome Ferrari é sinônimo de esportivo italiano, F40 é sinônimo de Ferrari — ao menos no imaginário popular, visto que existem diversas Ferrari muito diferentes conceitualmente. Mas é justamente o fato de a F40 ser um supercarro com motor V8 biturbo de 2,9 litros e 485 cv, nenhum item de conforto com exceção do ar-condicionado e desempenho que foi referência até a chegada de um certo McLaren F1: 0-100 km/h em 3,8 segundos, máxima de 323 km/h e uma trilha sonora que faz até o maior discípulo de Carroll Shelby admitir que turbos são bacanas.
Mas não é só isto: a F40 foi o último carro feito pela Ferrari que teve o envolvimento de Enzo no processo de criação e construção. E ela nasceu nas pistas — na verdade, nos ralis, quando o Grupo B foi cancelado em 1986 e a Ferrari não tinha o que fazer com os cinco protótipos da 288 GTO Evoluzione que haviam sido construídos.
Tudo isto conspirou para que a F40 fosse, literalmente, um carro de corridas com uma placa na frente e outra atrás. E isto é de importância tremenda para sua imagem como o carro que representa a Ferrari: ainda que, atualmente, os supercarros de Maranello utilizem tecnologia de vanguarda para serem os mais velozes e capazes do mundo, as raízes da companhia estão na Scuderia Ferrari, uma equipe de garagem que só começou a fazer carros de rua para poder manter-se nas pistas.
Se Enzo Ferrari pudesse, teria evitado este primeiro passo com toda a certeza. E a F40 foi a última grande prova disto.
Alfa Romeo 33 Stradale
Um dos primeiros posts do FlatOut, lá em dezembro de 2013, foi uma ode ao Alfa Romeo 33 Stradale. É um carro relativamente obscuro, com DNA nas pistas, e uma verdadeira lenda entre os entusiastas — e só os mais entendidos. Mas nós gostamos tanto dele que dedicamos uma matéria inteira a um carro absurdamente lindo, mas que talvez só tivesse apelo àqueles que gostam verdadeiramente de carros e respiram combustão 24 horas por dia, sete dias por semana.
A Alfa Romeo é outra marca italiana até a medula, tanto que vamos elucubrar um pouco mais a respeito ainda nesta lista. Na verdade, vamos até nos adiantar e dizer que este pode ser o Alfa Romeo mais bonito de todos os tempos. E, como os esportivos e bólidos italianos valorizam igualmente estética e desempenho, nada mais natural que o Alfa Romeo 33 Stradale ser dotado de um conjunto mecânico à altura de seus visual. Vamos tomar a liberdade de transcrever parte de nosso post sobre ele para explicar melhor.
A receita do 33 Stradale é como uma bela macarronada (só para cair no clichê italiano): simples e saborosa. Basta pegar um carro de corridas — nesse caso o Autodelta Tipo 33 da divisão de corridas da Alfa — e trocar sua carroceria por algo que faça o trânsito parar e seja o centro das atenções.
Como em 1967 você não podia simplesmente inserir um algoritmo em um computador e esperar uma prensa estampar algumas chapas de alumínio para formar todas essas curvas voluptuosas, cada um dos dezoito Alfa 33 Stradale teve que ser modelado à mão. Por serem feitos à mão os modelos eram todos diferentes em alguns detalhes. Os primeiros modelos tinham faróis duplos, enquanto os últimos usaram um farol de luzes simples. Outro detalhe que os diferencia são a posição e o número de limpadores de para-brisa.
Olhando pelo retrovisor, você não enxerga muito do mundo exterior, mas é compensado pela bela imagem do V8 de apenas dois litros, com curso curto (78 mm x 52,2 mm), um dos fatores que o permitia girar até 10.000 vezes por minuto. Esses motores também foram feitos à mão, então a potência máxima é diferente em cada uma das 18 unidades produzidas. O primeiro Stradale, por exemplo, produz 243 cv a 9.400 rpm, enquanto o modelo da foto abaixo fica nos 230 cv a 8.200 rpm. Esse modelo mais “amansado” precisava de apenas 5,5 segundos para ir de zero a 100 km/h e chegava aos 260 km/h. Imagine como era o ronco de dentro da cabine.
Ainda estamos tentando imaginar, pois infelizmente o Alfa Romeo 33 Stradale é nada mais que uma fervorosa paixão platônica. Ao menos existe a internet para saciar um pouco de nossa vontade, não é?
Pagani Zonda
Antes de tudo: isto é uma foto mesmo, e não um render de Project Cars
Ainda que seu criador, Horacio Pagani, tenha nascido na Argentina, e que seus motores venham da Alemanha, fornecidos pela AMG, o Pagani Zonda é fabricado no interior da Itália e totalmente merecedor de um lugar nesta lista. E não é só isto.
E também não apenas o fato de que ele tem dezenas de versões diferentes, a maioria delas feita sob medida — algumas, depois de a produção já ter sido oficialmente encerrada (porque, à moda italiana, Pagani tem regras bem rígidas, porém é dado a exceções). A produção à moda antiga, artesanal, também não é a única razão.
E não é só porque o Pagani Zonda é uma verdadeira afirmação estética, com visual tão marcante e único que manteve-se essencialmente igual ao longo dos doze anos que se passaram desde a primeira aparição pública do Zonda, lá em 1999, quando ainda tinha um V12 Mercedes-Benz de seis litros e 394 cv.
Aliás, o V12 alemão é a marca registrada do Zonda, que em sua configuração mais potente desloca 7,3 litros e entrega 760 cv a quase 8.000 rpm. Apesar da origem de seu motor no entanto, o Zonda tem 12 cilindros, como manda a tradição italiana. E tem mais uma coisa.
Acima de tudo, o Pagani Zonda é um atestado de que Horacio Pagani é um italiano de alma. Ele fundou sua própria companhia depois de ir para a Itália com a cara e a coragem, pedir emprego a Enzo Ferrari e ser recusado, ser contratado pela Lamborghini, convencê-los a usar fibra de carbono em seus carros, discutir com a chefia, pegar a autoclave (equipamento usado para curar a fibra de carbono) que comprou com seu próprio dinheiro e ir construir seus próprios supercarros. À típica maneira italiana, ele colocou uma ideia na cabeça e resolveu tudo do seu jeito. Ah, e você realmente deveria conferir (ou reler, por que não?) esta história em detalhes neste post.
Fiat 500
Como já dissemos, os italianos sabem muito bem como fazer carros pequenos. E, se fosse para citar só um, obviamente escolheríamos o Fiat 500. Na verdade, Fiat Nuova 500, porque o 500 orginal parecia uma mistura de calhambeque com Mickey Mouse. Tanto que, na Itália, seu apelido era “Topolino”, nome do camundongo da Disney na península em forma de bota.
Era por causa dos faróis, ao menos no primeiro caso
O Fiat 500 é muito lembrado por ser o carro que ajudou a motorizar a Itália depois da Segunda Guerra Mundial. Isto é verdade — tanto ele quanto o Isetta, que é outro atestado à capacidade dos italianos de fazer bons carros pequenos. No entanto, ele nem foi o primeiro carro feito pela Fiat com este fim: em 1949, quando finalmente havia certa estabilidade econômica depois do conflito, a Fiat lançou o 500C, nada menos que um enjambre feito sobre o antiquado Topolino, que datava de 1936.
O verdadeiro novo 500 era um carro conceitualmente diferente. Além de ter um visual muito mais harmônico, ele era um carro muito mais leve, tinha motor traseiro (um dois-cilindros a ar de 13 cv) e espaço interno melhor aproveitado. Havia até uma versão perua, com entre-eixos 10 cm mais longo para garantir mais espaço para as pernas dos ocupantes dos bancos de trás, além de um porta-malas maior.
O novo 500 era barato, prático, econômico e absurdamente carismático — a receita ideal para um popular italiano bem sucedido. Tanto que permaneceu em linha até 1975 sem maiores alterações além de um motor um pouco (bem pouco, mesmo) mais potente.