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Automobilismo Zero a 300

Os detalhes da corrida em Ayrton Senna derrotou os campeões da F1 em Nürburgring – e o vídeo na íntegra!

O principal legado da trilogia “De Volta Para o Futuro” foi mostrar como os eventos e decisões tomadas no passado moldam e alteram a realidade do presente. Pensando dessa forma, o acidente quase fatal de Niki Lauda em Nürburgring ganha uma relação direta com o dia em que Ayrton Senna provou pela primeira vez ao mundo que era um potencial multicampeão.

Isso aconteceu em 1984, um mês antes do lendário GP de Mônaco. Mas o pano de fundo desta história começou oito anos antes, em 1º de agosto de 1976. Apesar das preocupações com a segurança no circuito de 23 km, os pilotos decidiram todos alinhar no grid e largar para o 38º GP da Alemanha, em Nürburgring Nordschleife. James Hunt assumiu a pole com Niki Lauda ao seu lado. Patrick Depailler alinhou seu Tyrrell de seis rodas atrás de Hunt, Hans-Joachim Stuck ficou atrás de Lauda, e na terceira fila ficaram Clay Regazzoni e Jacques Laffite.

O tempo seco havia virado ao contrário no sábado, e continuou chuvoso no domingo. Os pilotos largaram quase todos com pneus de chuva, exceto Jochen Mass, que corria em casa e esperava que o tempo secasse. Na largada Regazzoni saltou de quinto para primeiro, deixando Hunt e Lauda para trás. O britânico acabou segurando a segunda posição, mas Lauda perdeu posições para para Mass e Laffite.

Ao final da primeira volta a chuva já havia cessado e a pista estava seca. Lauda entrou nos boxes, trocou os pneus e saiu em ritmo forte para recuperar o tempo e as posições perdidas. Logo depois da primeira dobra à esquerda antes da Bergwerk, sua Ferrari 312 T2 escapou para a direita e rodou batendo em um banco de terra. O carro voltou para a pista já envolto em chamas. Guy Edwards, que o seguia, conseguiu desviar, mas Harald Ertl e seu bigode estiloso não. Em seguida Brett Lunger também acertou a Ferrari.

Os três imediatamente pararam seus carros e correram para socorrer Lauda. Arturo Merzario viu o caos infernal, parou sua Wolf e juntou-se ao trio. Juntos eles conseguiram arrancar Lauda da Ferrari retorcida e queimada. Apesar de consciente, a situação de Lauda era gravíssima, e ele foi levado de helicóptero à Trauma Clini em Ludwigshafen, na época o melhor centro médico para tratamento de queimaduras da Alemanha. Nas semanas seguintes ele se viu à beira da morte, mas acabou se recuperando e voltou a correr após seis semanas.

O mesmo não aconteceu com Nürburgring. Depois de quase perder Niki Lauda, a Fórmula 1 finalmente percebeu que o circuito era longo demais para que um atendimento de emergência pudesse ser eficiente e o GP da Alemanha passou a ser disputado no Hockenheimring.

O acidente de Lauda causou a transferência do GP da Alemanha para Hockenheim, e a transferência motivou os gestores de Nürburgring fazer algo para trazer de volta o GP de Fórmula 1. Esse algo era um novo circuito. E esse novo circuito levou Senna ao seu primeiro triunfo entre os grandes nomes da F1.

Modificar o Nordschleife não era uma opção, não apenas pelo fator histórico, mas também devido ao altíssimo custo de uma reforma completa. O Südschleife parecia uma alternativa mais sensata (e barata), uma vez que já estava parcialmente abandonado.

Grand-Prix-Strecke Nürburgring_Heli-Samstag_2792_Urner_Copyright Nürburgring Betriebsgesellschaft mmbH

Os projetos para um novo circuito começaram em 1978, mas só começaram de fato em 1982. A construção levou menos de dois anos, e usou partes do Südschleife e um pequeno trecho do Nordschleife em seus 4.556 metros de extensão. A inauguração aconteceu em um sábado, 12 de maio de 1984, com uma corrida realizada em parceria com a Mercedes, que estava lançando seu novo 190E 2.6-16, o modelo de homologação para o DTM.

A prova foi batizada como Mercedes Race of Champions porque, para pilotar os carros, a Mercedes convidou uma série de estrelas da F1 e do automobilismo alemão. Jack Brabham, Phil Hill, Denis Hulme, Niki Lauda, Jody Sheckter, Keke Rosberg, John Surtees, James Hunt, Alan Jones, John Watson, Stirling Moss, Carlos Reutemann, Alain Prost, Elio de Angelis e Emerson Fittipaldi eram os pilotos de F1. Manfred Schurti, Udo Schuetz, Hans Herrman e Klaus Ludwig, todos pilotos de protótipos, eram os convidados alemães.

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A corrida teria apenas 12 voltas, e seria disputada com carros mecanicamente idênticos e originais de fábrica, com o motor 2.3 16v com cabeçote Cosworth produzindo 186 cv. A única alteração feita foi a instalação de gaiolas de proteção e a única diferença ente eles seriam as cores: uns dourados, outros pretos (na verdade uma cor tradicional da Mercedes chamada “blauschwarzmetallic“, que pode ser traduzido como “preto azulado metálico”).

Semanas antes do evento, contudo, houve uma mudança: Emerson Fittipaldi participaria do Pole Day da Indy 500 de 1984 nos EUA, e não poderia disputar a corrida amistosa. Em seu lugar, Emerson recomendou que convidassem Ayrton Senna. Outra casualidade que favoreceu a história.

Para a maioria dos pilotos a corrida era apenas um encontro divertido com velhos companheiros, mas para o novato brasileiro de 24 anos, que entrara na Fórmula 1 havia dois meses, a possibilidade de superar grandes nomes do automobilismo em uma corrida com carros idênticos poderia ser uma grande chance de testar a si mesmo e aparecer para o mundo das pistas.

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Também foi o primeiro encontro e o primeiro confronto de Senna e Prost. O francês chegaria ao aeroporto de Frankfurt meia hora depois do brasileiro, e por isso ficou combinado que os dois iriam juntos até Nürburg. No caminho eles conversaram e se deram bem, mas Senna se afastou brevemente quando Prost conquistou a pole.

E em uma daquelas situações que o universo conspira a favor de certos acontecimentos, chovia na hora da largada em Nürburg. Senna largou em segundo, e logo despachou Prost com sua típica manobra de ultrapassagem, na qual posicionava o carro de forma que o rival causaria um acidente caso não aliviasse a defesa.

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Prost aliviou – pela primeira e única vez, vide Suzuka em 1989. Senna assumiu a ponta e lá continuou praticamente a corrida toda, mesmo com a perseguição implacável de Lauda e seu motor fumegante nas últimas voltas da prova.

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Depois de 12 voltas Senna completava a corrida em primeiro lugar, com 1,38 segundo de vantagem sobre bicampeão Niki Lauda (que ganharia seu terceiro título naquele ano). A volta mais rápida ficou com Alan Jones, no 11º giro, com 2:12,50 e uma média de 121,371 km/h. Prost acabou em 15º depois de sair da pista, e Elio de Angelis terminou em último, perdendo uma eternidade nos boxes após uma pancada leve.

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Veja como foi a prova praticamente na íntegra — o vídeo começa logo após a largada, mas exibe a corrida inteira, incluindo a rodada de Prost e os reparos no carro de Elio de Angelis.

No pódio Senna estava radiante e dizia: “Agora sei que posso ganhar”. Sua personalidade metódica certamente lhe colocara um peso imenso nas costas que desapareceu com esta vitória aparentemente simples, mas importante para a auto-estima do brasileiro. Como prêmio pela vitória, Senna ganhou um exemplar do 190E 2.3-16.

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Seu desempenho na corrida desviou a atenção dos grandes ídolos da época – Lauda, Rosberg e Prost – e lhe rendeu até mesmo uma recomendação a Enzo Ferrari, indicada por John Surtees. O inglês escreveu em um bilhete destinado ao comendador:”Para colocar sua equipe em ordem, seria preciso o piloto certo. Você deveria chamar Senna”.

Siegerehrung auf dem Eröffnungsrennen Nürburgring, 1984

Como se sabe, o convite de Enzo nunca aconteceu. No mês seguinte, Senna voltaria a encantar o mundo sob a chuva do Principado de Mônaco, uma história que todos nós conhecemos bem. O que nos leva a pensar se a corrida em Nürburgring, contra os maiores nomes da F1, debaixo de chuva, não teria dado a Senna a auto-confiança necessária para seu desempenho obstinado no principado.

Seria outra casualidade que favoreceu a história?