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Técnica

Os detalhes técnicos e a história do V8 318 LA dos Dodge Charger e Dart nacionais

Caros amigos, é um prazer estar de volta com vocês! Vamos dar continuidade ao especial Dart Sharpening, no qual estamos detalhando uma série de macetes técnicos sobre os Dodge Charger e Dart nacionais – cujo conhecimento pode ser estendido a uma série de outros carros de outras marcas, também.

Segue o resumo da ópera: na primeira parte, falamos sobre a importância de se reforçar o monobloco com os subframe connectors e sobre os sistemas de direção e de suspensão dianteira. Na segunda parte, demos uma série de dicas sobre o diferencial traseiro – entre relações e sistemas autoblocantes – e a suspensão traseira de feixes de molas. Na terceira parte, destrinchamos as opções de embreagem e de caixas de câmbio (duas, três, quatro, cinco e seis marchas!).

Hoje nós vamos começar a falar sobre o coração mecânico dos Dodge V8: o famoso 318 LA. Prepare o seu café, recline-se na poltrona, boa leitura – e prepare-se para sujar as mãos de graxa.

 

Overengineering e as origens

Vamos começar com as origens do nosso querido 318, pois a história nos permite entender algumas de suas características construtivas. A Chrysler sempre teve uma boa mistura de ousadia nos seus projetos, mas sempre trabalhando com margens enormes de segurança – superdimensionamento. Ou seja, ao mesmo tempo que fazia um Hemi revolucionário, este mesmo revolucionário era pesado (excesso de material, tanto nas paredes de componentes estruturais como o bloco e os cabeçotes, como nas peças móveis) e o próprio excesso de sobremedidas de segurança acabava agindo como um limitador do próprio desempenho do motor.

Nos anos 50 recebemos diversos motores V8 modernos, com válvulas nos cabeçotes (mas comando no bloco), alguns com um único eixo de balancins em cada cabeçote e outros com 2. Os últimos tratados como Hemi e os primeiros como poliesféricos, ou simplesmente Poly. Abaixo temos um Hemi 331.

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Os Hemi vinham com câmaras de combustão hemisféricas e pistões normalmente cabeçudos. Os Poly vinham com câmaras de combustão em forma de cunha e pistões planos ou cavados, mas nunca com altura positiva. Ainda que fossem até bem avançados para seu tempo, os poliesféricos sempre ficavam com a pecha de motores comuns, mundanos, não afeitos a performance. O desenho do cabeçote tinha as válvulas não alinhadas em um mesmo plano geométrico e isso ajudava no fluxo dos gases. Só para termos uma dimensão real do que isto significa, lembramos que apenas no final dos anos 60 a Ford lançou seus preciosos motores Cleveland, que dispunham de tal tecnologia. A GM, ao contrário, teve a mesma tecnologia disponível em seus motores a partir de 1958, com o advento dos motores W, V8 big block com deslocamento de 348 e 409 cid (nota: caso você queira saber a diferença entre um big e um small block, recomendamos a leitura do nosso dicionário muscle car: leia aqui a parte 1 e aqui a parte 2).

Mas os motores, contudo, eram fundidos ainda seguindo os métodos mais arcaicos nos anos 40 e inicio dos 50. Só que nos anos 50 aconteceu um fato que veio a mudar muito o projeto e fabricação de motores V8 nos EUA.

 

Invertendo a lógica

Como sabemos, em um motor V8 a parte alta do bloco, onde ficam os cilindros, é muito mais larga que a base do bloco, onde ficam os mancais fixos e a linha de eixo. Este fato acabava ditando que as partes baixas do bloco fossem mais robustas, de modo que ao correr o metal derretido dentro do molde, o peso deste metal derretido não esmagasse o molde de fundição, sempre feito em argila e inutilizasse o esforço de fundição.

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Do mesmo jeito que nascemos de cabeça para baixo, saindo a cabeça primeiro, ainda que o V8 trabalhe com a abertura do V para cima, não seria obrigatoriamente necessário que fosse fundido desta forma. Então um cara genial chamado Ed Cole e sua magnifica turma de engenheiros na GM vislumbrou uma forma de fundir motores maiores em moldes menores e mais simples: para isso, os mesmos deveriam ser fundidos com o molde invertido, de forma oposta àquela em que o motor é usado e funciona normalmente.

Ou seja, os motores Chevrolet V8 começavam a ser produzidos tendo seus blocos fundidos de cabeça para baixo. Parece uma coisa óbvia e simples, mas ao verificarmos todos os motores feitos antes e depois deste evento, a diferença é enorme. Motores feitos por técnicas de fundição modernas são necessariamente menores e mais leves que seus pares feitos antes desta inversão.
Assim, depois dos Polys, que ainda eram fundidos em posição normal, e eram genericamente conhecidos no final dos anos 50 por motor A, ficava óbvia a necessidade de um motor mais moderno na Chrysler, fundido pelos novos métodos. Nesta época, os “A” estavam presentes em todas as divisões do grupo Chrysler, em três deslocamentos: 277, 301 e 318 polegadas cúbicas; os Hemi de 1ª geração tinham sido aposentados e os big block começaram a chegar em 1958.

 

Nasce a família de motores LA, dos nossos Dodge small block

Em 1964 finalmente viemos a ter o novo motor Chrysler, conhecido genericamente como motor LA – Low A – que inicialmente foi oferecido com deslocamento de 273 polegadas cubicas e logo após em 318 polegadas também. Nascia assim o motor do nosso Dodge Dart, três anos antes do carro que somente seria lançado da forma que o conhecemos em 1967.

Alguns comentários genéricos que podemos fazer: o bolt pattern, o desenho da interface motor-câmbio, era o mesmo dos antigos A, ambos diferentes dos big blocks B e RB. Contudo, a distância da flange de montagem do volante no virabrequim era diferente entre os A e os LA e mesmo dos polis e hemis antigos. Tirar um e por o outro, ainda que todos tenham o mesmo bolt pattern, não é direto, portanto.

Abaixo é possível ver que o bloco do motor LA (foto da esquerda) termina na linha de centro do virabrequim: não há nada abaixo da linha de centro associado ao bloco do motor. Já nos B/RB (foto da direita), o bloco se prolonga muito além da linha de centro do virabrequim. Isso aumenta enormemente o peso do bloco, ainda que seja relativamente mais vantajoso por oferecer maior rigidez à parte de baixo do bloco, fazendo qualquer movimento das capas dos mancais fixos imensamente mais difícil.

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O LA da foto está com um virabrequim original de 360, com os mancais fixos rebaixados da medida original do 360 para a do 318. Com pistões de 3,910” se obtém 350 polegadas cubicas. Se abrir o bloco para 4” de diâmetro usando os pistões originais de 360, chegamos nas mesmas 360 polegadas do 360 original. Para quem tem um carro relativamente original, ou placa preta e quer um pouco mais de potência e torque sem alterar demais o comportamento do motor e sem precisar usar muito comando, esta opção de aumentar o deslocamento de 318 para 360 no bloco nacional original é viável e tranquila de se fazer.

Algumas peças como tampa da distribuição, tuchos, corrente e eixo de manivelas eram intercambiáveis entre A e LA, mas no geral eram motores bem distintos.

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Este motor LA nasceu sem muitas pretensões esportivas, ainda que em 1964 era vendido um Dart ainda dos modelos anteriores, early A body, que tinha uma versão bem apimentada com carburador quadruplo, tuchos mecânicos, comando brabo, mais taxa que entregava 275 cavalos brutos.

 

Características do nosso 318 LA

O motor que viemos a receber aqui no Brasil era sempre equipado com tuchos hidráulicos e balancins de aço estampado não ajustáveis. O motor tem lubrificação forçada, bomba de óleo de engrenagens acionada por um eixo, que por sua vez é acionado pelo eixo comando de válvulas. Originalmente rendia de 198 a 215 cavalos e entregava pouco mais de 40 quilos de torque. Os pistões originais eram sempre cavados, ainda que os dos Chargers R/T fossem ligeiramente mais altos que os dos Darts e de utilitários: a diferença era boa para passar dos 7,5/1 originais para 8,4/1 de taxa de compressão nos R/Ts.

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Este motor obviamente tem apenas duas válvulas por cilindro e os pistões originais são feitos por fundição com limitadores de expansão internos em aço. As bielas eram encontradas em três tipos distintos: um tipo para pinos flutuantes a ser usada nos motores de utilitários com virabrequim forjado, outro modelo flutuante para os motores veiculares dos primeiros anos e por fim uma biela para pino prensado a ser usada nos últimos anos nos motores automotivos.

Sobre as combinações de bielas e virabrequins:

Carros de passeio: bielas forjadas (até 1977 eles usavam pinos de pistão flutuantes e no fim da produção eram montados prensados, com interferência) e eixos de manivela feitos de ferro nodular.

Veículos utilitários e Comerciais: bielas forjadas (sempre com pinos flutuantes) e eixos de manivela forjados durante a gestão Chrysler. Na fase VW, ambos passaram a ser como nos carros de passeio, com virabrequim fundido.

Detalhe importante: as bielas para eixo forjado eram significativamente mais leves que as de veículos de passeio, que usavam eixo de ferro nodular. Logo, se for usar um eixo forjado, devemos usar as bielas originais dele, e no caso dos eixos de ferro nodular, independentemente do tipo de pinos prensados ou flutuantes, devemos usar as bielas corretas. Ambas possuem o mesmo peso e ambas são bem mais pesadas que as dos comerciais de eixo forjado.

Para se trocar as bielas de um motor para o outro ou mesmo usar bielas sinterizadas de motor Magnum em motor LA se faz necessário rebalancear o virabrequim. Obviamente este assunto vai ser detalhadamente discutido na seção de preparação, mas uma coisa é definitiva: rebalancear motor original com peças originais é desperdício de tempo e de dinheiro, fora o risco de um balanceamento mal feito arruinar algo que está funcionando direito. Ou seja, se vai retificar ou refazer um motor em que as peças originais não vão ser trocadas – ou mesmo no caso dos pistões, se os substitutos tiverem o mesmo peso, nada a fazer – remonta original. E se tiver alguma diferença de peso em pistão, há tolerância? Sim, há tolerância, e ela é de cerca de 50 gramas por pistão. Se você for retificar um motor V8 qualquer e os pistões novos forem até 50 gramas mais leves ou pesados que os originais, não há necessidade de rebalancear o conjunto todo.

Mas vamos com calma aqui. O próximo capitulo desta série, que será dedicado à preparação de motores Mopar, tratará de balanceamento de virabrequins de motores automotivos, com uma ênfase toda especial em motores em V. Como e por que fazer, como evitar rebalancear, o que é seguro, possível, desejável e o inaceitável e errado. O que se faz e suas consequências. Eixo, bielas, pistões, volantes, dampers, embreagens, tudo relacionado a balanceamento de motores. Aguardem!

Os motores 318 de utilitários a álcool tinham diferenças significativas e interessantes quando comparados aos veiculares a gasolina. Tínhamos um pistão completamente plano, com maior altura de compressão, e a câmara de combustão dos cabeçotes era menor, reduzida dos 63 cm³ normais para apenas 55 cm³. Com isso, a taxa de compressão ficava próxima dos 10/1. Em 1986 viemos a ter outro motor com câmaras ainda menores, de 45 cm³, que aumentavam ainda mais a taxa, fazendo passar de 11/1.

Tudo isso muito de interesse acadêmico, já que hoje já está difícil de se conseguir estas peças e mais a frente, no capitulo de preparação tudo isto vai ser longamente explicado e detalhado.

 

Preparando o cabeçote. O seu cabeçote

Neste texto vamos tratar de alguns macetes bacanas para uma retífica correta em um 318 V8, sem se afastar muito da originalidade e sem modificações extensas (ainda). Este post não se destina exclusivamente a ensinar a alguém que nunca montou um motor a fazer um 318 direito e fácil de primeira sem sofrer muito. Ainda que os LA originais, junto com os Ford Windsor (que conhecemos tão bem em nossos Mavericks V8 e em boa parte dos Galaxies) sejam os oito cilindros mais fáceis de se fazer, começar retificando um V8 sem nunca ter feito outro serviço de retifica ou montagem de motor não é algo exatamente recomendável.

E por falar em recomendável: prezados leitores, percam amor a alguns dinheiros e comprem livros como How to Rebuild Your Small Block XXX (nada de pornografia, troque os “X” pelo deslocamento, camarada!) e depois de lê-los bem, cate os How to Hot Rod Your Small Block XXX. Estes livros são sensacionais, baratos e cobrem muito do que você precisa saber antes de começar. Para finalizar, faça a pós no Mopar Engines, o mais importante, descabelante e estarrecedor de todos.

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Todos estes livros são preciosos e devem ser adquiridos e lidos com muito carinho, pois fazem toda a diferença no caminho entre o sucesso e o fracasso.

O maior objetivo deste capitulo é dissecar alguns truques não contados, algumas dicas que descobri me lascando todo sozinho, mais um detalhe ou outro que não se acha escrito por aí.
E como eu já me lasquei mesmo, quero sinceramente que você, estimado leitor, se lasque por outros motivos para descobrir outras coisas que eu não sei, não pelas mesmas coisas que eu mesmo já sofri para aprender. Vamos ser criativos pelo menos!

Alguns conceitos básicos devem ser entendidos aqui: em se tratando de projeto e concepção dos motores Dodge, muito do que foi feito obedecia a parâmetros e a matérias que eram disponíveis na época do projeto. Muitas dessas coisas, parâmetros, lubrificantes, combustíveis e materiais acabaram se modificando, não sendo mais disponíveis. Isso nos leva a pontos nos quais devemos eventualmente abandonar soluções originais e partir para outras mais modernas pela simples impossibilidade de manter tudo como era lá atrás. Não é criticar gratuitamente ou se achar a ultima bolacha do pacote por ter descoberto um truque ou outro. Muito do que se faz hoje não tinha como ter sido feito na época. Apenas isso.

 

Lubrificação, juntas e gaxetas

A primeira coisa que me vem à cabeça e por se tratar de um item muito simples, devemos dar uma olhada na vedação do mancal traseiro do motor. Originalmente era feita nos EUA com um vedador acrílico bipartido. Aqui tivemos uma gaxeta feita com fibras de amianto que atendia minimamente ao propósito de vedar o eixo contra vazamentos de óleo.

Colocar um vedador tipo gaxeta de amianto em si já é algo como uma tarefa não exatamente simples que possa ser feita por qualquer pessoa não treinada. E para completar o quadro, o uso de amianto foi proibido. Ou seja, mesmo querendo, não rola mais. O que temos como opção são cordas de sisal impregnadas de grafite, que ainda que relativamente eficientes, são ainda mais difíceis de instalar que as antigas de amianto, e qualquer inabilidade ou erro de instalação servem como desculpa a um belo vazamento. Outra opção seria o uso de gaxetas de fibra de kevlar, que chegou a ser tido como uma opção boa, mas não é também.

Ou seja, definitivamente temos que considerar como única opção apenas o uso de vedadores acrílicos importados, que funcionam imensamente bem e são relativamente simples de se instalar. É só limpar bem o canal dele e instalar sem nenhuma outra providencia, entendendo obviamente que se algum iluminado tiver feito rosca esquerda na área do mancal traseiro do virabrequim o mesmo estará inevitavelmente perdido e deverá ser substituído por outro original que não tenha sido modificado. E de quebra nem são caros e podem ser comprados avulsos em importadores de peças sem nenhuma dificuldade. Não fica muito melhor ou mais fácil que isso, não é mesmo?

Juntas ainda são facilmente conseguidas, sejam importadas ou alguma remanescente de estoque antigo nacional. Claro que com o detalhe da gaxeta ser substituída por vedador acrílico faz todo sentido comprar juntas importadas de marca bacana que já vem com o vedador. Originalmente as juntas do coletor de admissão eram do tipo steel shim, de aço estampado, que eram adequadas ao coletor de admissão original feito em ferro fundido. Se o plano for usar coletor de admissão de alumínio, devemos obrigatoriamente usar juntas de admissão de material composto, na medida em que as steel shim não são adequadas aos coletores de alumínio. Um dos motivos é corrosão, pela dissimilaridade entre os metais alumínio e ferro fundido e a presença de liquido refrigerante, normalmente água comum, além da menor capacidade vedante da junta steel shim. Outra coisa legal de se fazer na montagem é eliminar as réguas de borracha originais ou de cortiça que normalmente recebemos nos jogos de junta e usar apenas silicone tipo elimina-junta nas partes dianteira e traseira do vale do motor onde se assenta o coletor de admissão. A utilização da borracha de silicone permite uma vedação bem homogênea e eficaz.

Um ponto que eu sempre recomendo muita atenção é no sistema de lubrificação. Vou fazer um parênteses aqui para mostrar 2 fotos de capas de mancal traseiro de motor Chevrolet v6 ou v8 bloco pequeno. Na foto à esquerda, a peça original. Veja que o furo que leva o óleo ao bloco é seco, furado reto na superfície onde ele se inicia.

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Não parece muito mais legal, com uma dinâmica de escoamento do fluxo de óleo bem mais fácil? O retrabalho foi feito com uma esmerilhadeira reta normal, pedrinha abrasiva e alguma paciência. Na verdade tem ganho, mínimo, digamos coisa de no máximo 5% de acréscimo, mas tem. Acontece que o local onde o furo vai no bloco tem o mesmo diâmetro e tudo vai bem a partir deste ponto. É algo simples de fazer para quem monta um motor com esmero em uma bancada, mas não tão simples pelo beneficio que produz para ser feito para motores normais em uma linha de montagem. Mas isso é Chevy e o assunto aqui não é Chevy.

E nos nossos Dodges não é tão simples assim.

Na foto abaixo, o esquema das galerias na parte traseira do motor. O óleo que vem da bomba vai ao compartimento do filtro e volta filtrado e pressurizado para lubrificar o motor. Todos os dutos têm cerca de meia polegada de diâmetro.

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Legal e simples, mas tem uma pegadinha aí: a bomba de óleo tem uma saída de cerca de 9 mm bem como a capa do mancal no furo de transferência do óleo da bomba para o resto do motor. Isso é ruim porque primeiro se perde velocidade ao aumentar o diâmetro do duto bem como facilita perda de pressão. Pondo isso de forma bem clara, você usa uma bomba cuja saída é de cerca de 9 mm, 3/8” ou menos, joga essa saída em um duto com cerca de 9 mm também, mas isso tudo vai a um motor em que todos os dutos de lubrificação tem cerca de meia polegada de diâmetro, quase 13 mm. Então, decidi que seria no mínimo desejável alargar os furos de todos os dutos, de descarga da bomba e da capa do mancal traseiro para pelo menos 11 mm ou algo próximo a 7/16” de diâmetro.

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À esquerda, o original e à direita, como deve ficar depois de pronto

E este é o ponto mais importante: pegue a capa do mancal original e a carcaça da bomba de óleo a ser instalada e abra os furos para 11 mm ou 7/16” como no desenho abaixo. Na bomba de óleo é muito simples, é uma peça onde o furo é relativamente curto e não tem muito como errar. Cuidado apenas com a superfície onde a bomba encosta na capa do mancal, se arranhar ou marcar pode haver alguma dificuldade posterior com vedação. Já a capa do mancal pede muito cuidado para que não se abra o duto para o alojamento da bronzina. Qualquer funcionário de retifica ou torneiro com alguma experiência faz isso sem muito rolo.

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Recapitulando: a saída da bomba original normalmente é bem estreita, com cerca de 9 milimetros, menos de 3/8”. É perfeitamente possível alargá-la para pelo menos 7/16”, 11,11mm que produz um aumento da seção transversal do duto de cerca de 63mm² para um valor próximo a 95mm². O aumento aqui é de 32mm², cerca de 50% de acréscimo na seção transversal do duto. E o duto do bloco, com cerca de 13mm tem 132 mm² de seção. Antes pulava de 63 para 132, agora vai de 95 para 132, diminuiu muito a diferença.

A capa do mancal traseiro deve ser retrabalhada com muito cuidado, na medida em que um alargamento mal feito vai enfraquecê-la na área próxima a bronzina e causar deformação, ou mesmo numa situação limite, se o furo atingir a superfície usinada, a perda da capa. Mas de toda forma também temos como obter algum ganho ali. O que se deseja é ter mais fluxo de óleo lubrificante ao motor sempre, e este fluxo extra é absolutamente necessário e benéfico em altas rotações.

Posso afirmar que, por tudo o que vi e medi, seria até possível tentar abrir tudo a ½” e equalizar tudo, mas entendo que o risco de danificar a capa do mancal é bem grande a ponto de não recomendar e o ganho já possível de obter apenas com a mudança de 9 para 11 mm. Lembrando que em um motor 360, em que o alojamento da bronzina é bem maior que o do 318, ao fazer esta modificação, deve-se ter mais cuidado ainda.

Aqui neste ponto, uma vez explicada a dinâmica e o objetivo desta modificação faço três observações bem explicitas:

1) Não basta apenas calçar a válvula de alivio de pressão da bomba de óleo para ter mais pressão ou maior volume de óleo. Fica evidente que a pressão de trabalho original, de 80 psi ou 5,5 kfcm² é alta o suficiente para que, caso seja aumentada, tenhamos riscos reais de se ver filtros de óleo explodindo – os melhores não aguentam muito mais de 100/110 psi. Logo, não adianta apenas aumentar a pressão, é preciso de maior seção transversal nos dutos para termos maior volume útil de óleo no sistema todo.

2) Como eu já escrevi aí em cima, este texto é de preparação de motor original ou pouco modificado para uso urbano. Não de pista. Sabemos todos que existe outra forma de armazenar óleo em um motor de combustão interna que é diferente do original e se chama cárter seco. Cárter seco é algo muito mais complexo e elaborado que o sistema original e exatamente por isso não rola a gente pensar em por um para usar num carro normal de rua. O cárter seco, seu uso, princípios e funcionamento vai ser detalhado no próximo capitulo, o final que trará de preparação pesada de motor.

3) Mas por que escrevo isto tudo? Simples, em todos os livros sérios de preparação de Dodge, especialmente nas bíblias da Mopar, se fala em uma alternativa ao sistema de lubrificação original que passa por secar as galerias de tuchos, que nos motores tratados tem também a função de alimentar os dutos que levam óleo aos cabeçotes e ao virabrequim. Este sistema modificado é algo race only, não adequado a um motor urbano. Nele, como os tuchos rodam lubrificados apenas pelas sobras de óleo que escorrem de volta dos cabeçotes, sem pressurização das galerias e alojamentos onde trabalham, deixando a lubrificação forçada que evita desgastes entre os tuchos e suas sedes no mínimo bem comprometida. Com este adendo, deixo que este sistema vai ser detalhado e pormenorizado com benefícios e malefícios devidamente esclarecidos no próximo capitulo.

Outro item importante a ser verificado com muita atenção ao se refazer um 318 original é o trem de válvulas. Inicialmente alguns conceitos: o sistema original é o que se chama de net lash. Não há previsão ou meios de se ajustar a folga das válvulas. Inclusive este conceito de folga precisa ser bem esclarecido: é folga negativa ou pré carga nos tuchos hidráulicos. O projeto original do motor, que usa balancins de aço estampado em um eixo de aço endurecido é feito de modo que, ao ser montado na fábrica, os componentes tenham dimensões suficientes e necessárias a causar pequena compressão nos tuchos quando as válvulas estiverem fechadas. Ou seja, pré-carga, que permite ao sistema trabalhar sem barulhos ou folgas indesejadas.

De posse desta informação, fica a pesquisa inicial: o motor trabalhava sem ruídos de válvulas antes da desmontagem? Caso afirmativo, todo cuidado com peças, de preferencia se denominando qual cabeçote estava de qual lado do motor, já que por serem iguais são intercambiáveis entre si, qual eixo de balancins e quais balancins estavam em qual posição e na hora da retifica, quando for fazer o serviço de recondicionamento do cabeçote é muito importante que o funcionário da retifica entenda que a altura relativa das válvulas deve ser preservada. Se as sedes forem muito retificadas, se as válvulas afundarem muito no cabeçote depois da retífica das sedes e eventual retífica das válvulas caso não se faça a substituição das mesmas, a pré-carga vai ser comprometida. Se substituir as sedes de válvulas, caso as válvulas ficarem baixas demais, vai ter barulho porque a pré-carga não vai ser atingida. Ou seja, é de fundamental importância que a altura relativa das válvulas no cabeçote original seja mantida.

E claro, que com essas considerações, rebaixar cabeçote com vistas a aumento de taxa em motor original é fortemente desaconselhável pelos motivos expostos. Primeiro se deve sempre considerar o aumento de taxa pelo uso de pistões mais altos. Com os combustíveis disponíveis hoje é perfeitamente seguro andar com o motor a 10/1 de taxa na gasolina mesmo sem a ajuda de uma injeção eletrônica. Simples, eficaz, sem efeitos colaterais.

Um detalhe mínimo que causa boa dor de cabeça: os furos de lubrificação que ficam na parte inferior das flautas precisam posicionados de forma a ficarem apontando para o lado de fora do cabeçote, mas para baixo. Se você montar invertido e eles ficarem para cima não vão lubrificar direito, se ficarem para baixo mas o eixo estiver 180° errado e eles ficarem apontando para dentro do motor, a lubrificação será comprometida também: haverá desgaste prematuro e aí meu caro, perde-se o eixo e os balancins. Toda atenção na hora de remontar o eixo dos balancins e os balancins no motor é pouco. Ainda mais se você usar um comando mais esportivo, ainda que hidráulico.

 

Dicas extras

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Mais alguns conceitos pertinentes. Comando hidráulico usado para ser remontado com tuchos usados: apenas se os tuchos estiverem em perfeito estado, sem desgaste apreciável. No ato da desmontagem, o mesmo cuidado com a numeração e ordenação das peças do trem de válvula precisa ser seguido nos tuchos. Ou seja, não é possível misturar um tucho para que ele passe a trabalhar acionado por outro ressalto do eixo comando de válvulas. Se o comando estiver perfeito mas os tuchos necessitarem de substituição, ok, tuchos novos em um comando usado.
Por fim, o obvio, comando novo apenas e exclusivamente com tuchos novos, e de preferencia da mesma marca e tipo do fabricante do comando. No entanto se por algum motivo você ligou o motor, precisou desmontar por algum motivo e não marcou posição, é possível retirar a memória dos tuchos, bastando uma folha de lixa fina (grão mais grosso que 600 nem pensar), molhada com óleo fino ou querosene, fazendo uma movimentação suave em forma de 8 até que a base do tucho esteja novamente fosqueada como se o tucho novo fosse. Evidentemente isso só funciona em tuchos realmente quase zero km, com um mínimo de uso. Rodou alguns milhares de quilômetros? Já era, tucho novo.

Buchas do eixo comando de válvulas devem sempre ser conferidas, e medida a folga existente entre o eixo e as buchas. Se for verificada a folga de até 0,1 mm e se for ser mantido o mesmo comando, nenhum problema, podemos deixar. Se a folga for maior é recomendado a substituição das buchas ou bronzinas do eixo comando de válvulas, operação a ser feita em uma retífica por profissional capacitado, na medida em que é uma operação que implica no uso de ferramentas adequadas tanto para a retirada quanto para a instalação das novas buchas. Com o detalhe técnico que uma vez retirada a bucha perde a interferência e não pode ser remontada novamente. As cinco buchas são de diferentes dimensões entre si e as posições relativas às mesmas devem ser rigorosamente observadas. Se for instalar um comando novo, o mesmo comentário vale: até 0,1 mm passa, mais que 0,1, instale buchas novas.

O acionamento do eixo comando de válvulas se dá por uma corrente e duas engrenagens. Na desmontagem do motor para eventual retífica sempre acabamos por substituir o conjunto por desgaste natural. O sistema original emprega engrenagens e corrente feita por pequenos pedaços de chapa de aço sobrepostos e ligados por pinos. Temos outros métodos como correntes com roletes, que são algo mais precisas que este sistema original e que se possível escolher, devemos sempre optar pelas correntes roletadas. As do tipo true roller são melhores que as roller simples. Uma marca de excelente reputação é a Cloyes True Roller. Uma boa limpeza é primordial na hora da montagem, na medida que há alguma interferência das engrenagens nos eixos virabrequim e comando de válvulas. Limpeza e lubrificação facilitam a instalação, que deve ser feita de forma gradual mantendo o paralelismo das engrenagens e da corrente.

Uma peça inerente é a trava de chapa que limita o movimento longitudinal do comando, e que é presa no bloco do motor por 4 parafusos. A tão importante peça deve sempre ser inspecionada com vistas a prevenir ou verificar a existência de algum desgaste que indique uma condição de anormalidade. A chapa é feita de aço carbono de alto teor e é endurecida. Os parafusos que a prendem no bloco são de aço de maior resistência também. Um detalhe legal é que esta peça também veda as duas galerias de óleo que fazem os tuchos hidráulicos funcionarem e isso ajuda na hora de limpar completamente o bloco e as galerias de óleo do motor.

O compensador harmônico deve ser detalhadamente inspecionado quanto à integridade do elemento de ligação, a borracha que é vulcanizada e que mantem o anel de inércia preso ao cubo. Se a borracha estiver desgastada, haverá indicio de movimentação do anel de inércia, que pode ser facilmente verificado tanto na desmontagem quanto na montagem do motor, verificando o alinhamento da marca referente ao ponto morto superior e a posição do pistão do cilindro numero 1, que deve estar realmente no PMS. Caso não haja coincidência, a substituição é mandatória. O compensador harmônico dos 318 e dos Magnum 5.2 são ambos neutros, não há contrapeso neles e inclusive é possível usar o do Magnum no LA. Lembrando, contudo, que há uma pequena diferença na furação da polia de acessórios: no Magnum os seis furos são simetricamente distanciados e no LA cinco dos furos o são e um é fora.

O volante motor usado nos Dodge de passeio tem cremalheira de 130 dentes e usa embreagem de 10” ou 10.4”. Tem o mesmo padrão de furação dos 5.2 Magnum, podem ser usados em ambos os motores e tem balanceamento interno. No caso dos Magnum existem cavas ou cortes para funcionar como roda fônica para o sensor de posição do virabrequim, assim se injeção eletrônica não for prioridade é possível usar por exemplo um volante saído de uma picape Ram Magnum 5.2 em um Dodge Dart com motor original 318 e vice-versa.

Vale lembrar que o cárter tem desenho diferente na capa do mancal traseiro e não é intercambiável. Se for usar um motor Magnum em um Dart por exemplo, vai ser necessário um cárter adequado ao carro, ou vai precisar pegar o cárter do carro, cortar a parte próxima a capa do mancal traseiro e soldar outra retirada de um cárter original de motor Magnum. E claro que fazer esta solda já crítica na parte traseira do cárter implica em ter boa dose de certeza do que está sendo feito: a chance de terminar com um cárter torto e vazando óleo é real. Dica boa é fazer a solda com o motor se possível desmontado e o cárter já aparafusado no bloco antes de soldar, uma vez que aparafusado vai empenar muito pouco e é possível manter os pedaços devidamente alinhados para não ter problemas posteriores. Não é algo exatamente fácil de se fazer.

Um cárter originalmente usado em um Dart norte americano anos 70 com motor 360 LA serviria na medida que a capa do mancal traseiro dos LA 360 é igual a de todos os Motores Magnum 5.2 e 5.9. Fica a dica para quem for fazer e tiver condições de importar um novo cárter que é bem mais interessante que tentar soldar um usado antigo.

A tampa da corrente é compatível, contanto que se entenda que as dos motores Magnum não permitem o uso de bomba de gasolina mecânica e exigem o uso da bomba d’agua original dos motores Magnum – que tem furação diferente das tampas/bombas d’agua dos LA. Neste caso não será possível montar o excêntrico da bomba de gasolina mecânica também por falta de espaço.
Vamos ficando por aqui, o plano deste texto é ser um auxílio na montagem. Não vai substituir o How to Rebuild Your Small Block Mopar, mas vai ser um bom adendo ao que você vai encontrar nele. Algumas destas dicas entendo serem bastante úteis, especialmente o detalhe da modificação no sistema de lubrificação, capaz de atender tanto o motor original quanto um já modificado para maior performance.

No próximo capitulo, teremos uma boa ênfase em balanceamento e mais informações e dicas de como tirar todos aqueles cavalinhos que ficam escondidos no motor, com modificações possíveis e seus resultados e implicações. Até lá!

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