Olá, galera do FlatOut! Meu nome é Ricardo Martins de Souza, tenho 35 anos e estou muito feliz de dividir minha história automobilística com vocês. Atualmente eu possuo três carros: um Vectra CD 2004 , uma VW Brasilia 1976 completamente original e um Opala Comodoro 1989, do qual sou segundo dono e que está comigo desde 2002. Uma relação que completa 13 anos em 2015 e que está em fase final de construção pra ser um Strip Car for Street Use. Mas antes de falar da atual configuração, deixa eu contar como é que cheguei em tal nível de doideira a ponto de montar um motor que usará apenas metanol, com hardblock e pneus slick pra andar nos fins-de-semana.
A primeira “mexida” que eu realizei num carro foi a adoção de um coletor de escape esportivo 4×1 em um Chevette SL 86, o primeiro carro que possuí. Tudo bem, achei que isso seria suficiente para conseguir andar junto com o Gol 1.8 álcool do meu vizinho. Tremendo engano. Depois disso acabei realizando um projeto mais audacioso: a troca do motor quatro-cilindros por um seizão do Opala 76.
Foi a pior coisa que eu fiz. A troca ficou uma droga. O “sujeito”, que se dizia mecânico, montou um motor e uma suspensão dianteira praticamente novos, mas que nunca funcionaram direito. Dos males o menor, foi o melhor curso de mecânica que eu fiz, já que na época comprei todas as peças e participei de absolutamente todo o processo.
Depois disso passaram por minhas mãos mais alguns carros até comprar o atual Comodoro, isso em 2002. Vou contar aqui toda a história de preparação pela qual ele passou, e principalmente, o que eu aprendi com cada uma delas e que acredito deva ser útil para alguns que pretendem fazer alterações similares.
Necessidade de Revisão e a Quebra do Diferencial
A primeira coisa que aprendi, logo que comprei o carro e que aconselho a todos que comprarem um carro usado por mais excelente que o aspecto do veículo seja e com menor quilometragem que esteja: faça uma revisão mecânica. O carro que comprei, isso em 2002, foi retirado zero quilômetro pelo mesmo cara que estava me vendendo. Na época ele estava pedindo R$6.500,00 num Comodoro 1989, seis-cilindros original a álcool, quatro portas, completo (-ar), com CD Player Pioneer instalado na GM e um jogo de rodas Santa Matilde. Quem é opaleiro entende o que isso significa.
Tenho arquivado absolutamente tudo que foi feito no carro, além de possuir todos os manuais originais. Tinha algumas multas por excesso de velocidade e o saldo final foi de R$5.2800,00. Levando em conta que recorri e consegui abater algumas multas o carro me custou ao final R$5.800. Nada mau.
Ele tinha pouco mais de 60.000km, o que para um carro com 12 anos era muito bom. Aparentemente estava tudo em ordem e uma volta com o carro confirmou isso. E o meu erro foi ter acreditado. Na segunda volta com o carro o motor superaqueceu. Com estava bem próximo de casa, parei, esperei um pouco e voltei para a garagem. Quando levei na oficina o diagnóstico: uma junta e três parafusos do cabeçote quebrados. Acho que até fiquei no lucro, pois foi “só” isso. Aproveitei para dar um passe no cabeçote aumentando a taxa de compressão além de uma geral de verdade, trocando algumas mangueiras, regulando válvulas, trocando o óleo e outras coisas. Também instalei uma admissão com aquecimento completo (e não só abaixo do carburador, como no original) e um carburador DFV446.
Quando fui buscar o carro para levar para casa, na primeira esquina, quebra o diferencial. O Braseixos original com relação 2,73 foi completamente destruído. Eu sequer tive tempo de fazer um burn-out de teste. Bom, já que estava do lado da oficina voltei pra lá e deixei ele mais um tempo até conseguir um substituto. Foi colocado um “Daninha”, o Dana 30, original dos Opala mais antigos e com relação 3,54, que era utilizado nos motores quatro-cilindros e que no seis-cilindros deixa o carro bem mais esperto. No final das contas eu acabei realizando a primeira etapa de preparação do carro com a adoção de um carburador maior, mais taxa, aquecimento na admissão e uma relação mais curta. O carro ficou EXCELENTE e compensou todo o estresse e o investimento. Para quem tem poucos recursos e quer um carro esperto e com um consumo bem aceitável (andando devagar fazia 6,5km/l na cidade). Aconselho tais modificações.
Fase 2: Turbo Mal Projetado
Nunca fui muito fã de carro turbo. Não tenho nada contra, só prefiro a pancada imediata do aspirado. Mas na época (em 2005) meu irmão tinha dois Subaru Impreza 4×4 Turbo, que ele usava na rua e em track-days. Isso me animou a turbinar o Opala, no motor original mesmo, com mais taxa e pouca pressão. Foi a pior ideia que eu tive.
O problema não foi montar um Opala turbo, mas montar do jeito que foi montado. Apesar do “preparador” escolhido ter uma certa experiência com esse tipo de preparação, ele não conhecia nada do motor seis cilindros. O carro ficou uma m****. Foi escolhida uma turbina Garret 42/48 e um carburador 2E. Tudo errado. É óbvio que a turbina e o carburador não estavam adequados ao tamanho do motor. Pra resumir, com 0,6 de pressão eu apanhava de AP 2.0 original. Vergonhoso. Essa fase me encheu em pouco mais de três meses, e retirei tudo o que tinha colocado. O kit, é óbvio, não interessou ninguém, e tirando a turbina e o carburador todo o resto foi para o lixo.
Fase 3: A Alegria do 4 Polegadas
Depois da decepção com o turbo prometi a mim mesmo que iria sossegar. Essa promessa durou um ano, mais ou menos, e eu resolvi fazer o que todo dono de Opala deveria fazer: montar um motor 4 polegadas (o diâmetro dos cilindros, 101,6 mm) utilizando o pistão do motor quatro cilindros. Se você tem algum tipo de receio com esse tipo de preparação, pode esquecer. Tudo aquilo que te falam sobre fragilidade e superaquecimento… é mentira. Se todo o processo for bem executado, por pessoas qualificadas, fica melhor que o original em todos os aspectos: potência, torque e consumo.
Foram então instalados os pistões e um comando nacional, bem pacato, mas um pouco mais agressivo que o comando original do carro. Esse motor foi montado no final de 2005, início de 2006 e ficou até 2010 sofrendo bastante na minha mão. Já que tinha tirado o motor fora uma remontagem completa seria realizada (tuchos, juntas, comando, bronzinas, bomba de óleo, etc). Não foi realizado nenhum tipo de trabalho de alívio de volante e virabrequim, até por que a proposta era um motor com maior torque. Entretanto, foi adicionada uma polia do tipo dumper. Acredito que essa seja uma das modificações mais importantes a se realizar em um motor seis-cilindros com apelo de maior performance. Como o virabrequim é muito longo e possui muita massa presa a sua porção posterior, em comparação a porção anterior da peça, a polia reduz significativamente a torção e a vibração que poderiam ser geradas em altas rotações. Continuava com o carburador DFV446 sem problemas para alimentar, rodando com um carburador à gasolina acertado no álcool e com bomba mecânica de combustível original. Foi só alegria.
Acabei achando a lista de peças e serviços de quando fiz o motor e por curiosidade corrigi os valores pela inflação do período (ô tempo ocioso, rsrsrs). O valor aproximado para fazer tal serviço hoje seria de R$5.169,00.
Fase 4: Um Aspirado de Verdade Andando Na Terra
No início de 2007 tive a oportunidade de montar um motor realmente preparado, apesar de ter usado ele 100% do tempo na rua. Um outro cliente da oficina onde até então meu carro era montado, estava vendendo um conjunto de comando (ISKY525B 278×278), tuchos e cabeçote com uma preparação média. A peça tinha sido rebaixada, e em meu motor que usava pistões planos, rentes ao bloco rendeu aproximadamente 11:1 de taxa. As molas foram substituídas por um conjunto de molas com maior pressão, porém eram molas simples. Estou até agora tentando lembrar o nome delas, mas está difícil. As válvulas de admissão foram substituídas pelas válvulas da Chevrolet Blazer e todos os dutos foram aumentados e equalizados em banco de fluxo.
A DFV446 recebeu borboletas de 39,5mm (as originais, senão me engano, possuem 35mm), o afogador foi desativado e toda a tampa recebeu um trabalho de polimento para retirada dos cantos. Além disso, foi utilizado um coletor de escape dimensionado, desses comuns, vendidos em qualquer local, do tipo 6×2 com canos acabando em um abafador antes do eixo traseiro. Como o motor permitia maiores “abusos”, resolvi no início de 2007 participar do Campeonato Paranaense de Arrancada na Terra, que acontecia aqui na região metropolitana de Curitiba em distância de 201m.
A categoria escolhida foi a Standard 6 e 8, onde era permitido trabalho livre de motor e cabeçote, porém com apenas um carburador. O carro ainda andava de DFV446 e sem blocante no diferencial. Imagina como era arrancar com um carro de 1.300kg, na terra e tracionando em uma roda só. Resultado: ganhei algumas etapas e consegui ser campeão Paranaense de 2007 na categoria. Detalhe: todos os outros andavam de Webber 40 ou 44, com diferencial blocado e motores bem mais “fuçados”. Andei também em uma Prova em Paranaguá, litoral paranaense, pela mesma categoria. Apesar de ter apenas 2 competidores, ganhei também! Foi aí que aprendi uma coisa importante sobre arrancada. Potência não é tudo. Uma melhor relação de transmissão e uma tocada correta é muito melhor do que a potencia por si só. Acabei no final de 2007 blocando o diferencial e andando na ultima etapa com ele blocado. E é claro, na rua também!
Fase 5: 4 Polegadas Aspirado Nitro e carburador Holley 750cfm
Ainda em 2007 conheci o atual preparador do meu carro, o Andrey Jasper, da Jasper Motor Garage. Dentre seus 15-20 carros Andrey possui um dos Street/Strip mais bacanas que eu já vi: um Maverick 75 com cara de carro de coleção, mas que arranca as rodas meio metro do chão e vir os 402m nos 10s baixos… com gasolina de posto!
Bom, a ideia que o Andrey me deu foi bastante fora do comum. Montar uma Holley Quadrijet 750cfm Street Performance num motor seis cilindros. Quadrijet no 6 cilindros? Tá louco!? Como é que você vai acertar isso? Um carburador à gasolina andando no álcool? Isso nunca vai funcionar! Pelo menos é o que todo mundo dizia.
No final das contas o acerto foi muito simples, feito em apenas um dia. E o carro ficou absolutamente liso. Sequer existia injeção de gasolina para partida a frio. Em dias frios (mas tinha que estar muito frio) eu injetava com um frasco um pouco de gasolina no carburador ainda com o carro desligado e batia uma única vez na chave. Pronto, estava na marcha lenta. Detalhe, eu utilizei uma admissão fabricada pela Engine, na qual existe aquecimento. O carro andava gelado o tempo todo. Novamente o acerto foi o que determinou a qualidade do funcionamento do motor. A única mudança no carburador foi a adoção de redutores de venturi nas bocas (4 x 44mm) do primeiro estágio (era um carburador mecânico, sem afogador).
Mas a brincadeira não acabou por aí. Três meses depois cheguei na oficina com o carro e um kit nitro Sniper e a coisa estava ficando cada vez mais séria. Foram adicionados 70hp no final do curso do acelerador. Novamente o que mais ouvi era que o motor iria explodir. Como assim utilizar nitro em um motor 4 polegadas? Não iria sobrar nada! Não foi o que aconteceu… ainda bem! O carro ficou realmente estupido. Acredito que tinha pouco menos de 300cv (com o nitro acionado), não mais do que isso. Mas era extremamente divertido. E eficiente.
Para se ter uma ideia, andei em duas ou três etapas da Desafio 201m, no Autódromo Internacional de Curitiba, evento dedicado exclusivamente a veículos de rua. Com um tempo de 2,2-2,3s nos 60 pés (horrível!) o carro com nitro virava constantes 8,6s nos 201m. Um tempo bem respeitável para um carro aspirado, utilizando álcool, e que ia e voltava rodando para o evento. Nesse ponto o povo deve estar se perguntando: que câmbio você estava usando? O original! Completamente!! E nunca, absolutamente nunca incomodou. O grande segredo é utilizar uma embreagem original de qualidade (Sachs ou Luk) e uma tocada menos agressiva, literalmente cuidando do câmbio. Hoje o câmbio não é mais utilizado, mas está guardado aqui em casa, perfeitinho.
Cheguei a levar o carro para uma prova de 402m no Festival Brasileiro de Arrancada em Curitiba. O carro fez o tempo de 13,1s com o escape até a traseira do carro (exigência do regulamento). Achei bem razoável… mas insuficiente. Gearhead é uma droga mesmo. Até aqui corria tudo bem e o carro evoluía constantemente. Nesse momento decidi montar o que sempre sonhei: um motor apenas aspirado mas no #tudoquidá. E essa foi uma fase com três momentos bem distintos. A euforia de um seizão apirado, a quebra completa de um motor e o renascimento para o projeto atual. Mas conto isso no próximo post. Abraço a todos.
Por Ricardo Souza, Project Cars #154