Olá, pessoal do FlatOut! Meu nome é Régis Vasconcellos, tenho 32 anos, sou engenheiro civil e arquiteto e moro em Porto Alegre/RS. Sou proprietário de um Ford Escort Mk4 2.0i XR3 conversível 1989/1990 vermelho. Opa! Os puristas ou com conhecimento na área já devem estar falando que não existiu Escort 2.0 conversível, muito menos injetado nos anos de 1989 e 1990. Pois digo-lhes: estão corretos!
Antes de mergulharmos no projeto — que, não foi apenas uma preparação, e sim uma reforma com preparação — vou falar um pouco sobre como o Escort entrou na minha vida.
Minha relação com o Escort conversível começou muito cedo. No final da década de 1980 eu já era uma criança vidrada em carros e o Escort sempre me despertou um interesse especial através do modelo esportivo XR3, com sua imagem fortemente vinculada ao Ayrton Senna, protagonista de muitas campanhas publicitárias da Ford na época.
A figura do Escort conversível entrou em minha mente por um desejo de criança. Lembro-mede ficar observando os carros passando na rua em frente à casa da minha avó e sempre falava pra ela “Vó, olha lá um Escort convencido!¨ E minha avó me prometeu que, assim que eu fizesse 18 anos, me daria de presente um Escort conversível para que eu a levasse para passear com seus cabelos ao vento. A cena foi marcante na cabeça de um ¨pequeno gearhead¨ que ali se formava. Por infortúnios da vida, minha avó adoeceu e infelizmente não pode ver nem realizar o sonho do neto. Prometi que, assim que tivesse condições, realizaria esse grande sonho, que também se converteria em homenagem à saudosa avó.
A COMPRA IMPULSIVA E EMOCIONAL
O tempo foi passando e eu sempre estive de olho nos conversíveis à venda na região. Em março de 2007 me atirei e comprei um Voyage Los Angeles 1984 muito inteiro para tentar revender e fazer uma grana em cima no início do boom de valorização da linha Gol/Parati/Voyage esportivos. Infelizmente vi que ser comerciante de veículos não é minha praia e que deveria enfim realizar meu sonho comprando o XR3 e, para isso, me desfazendo do Voyage.
Com a falta de carros interessantes na região de Porto Alegre, eu e dois grandes amigos, também gearheads, Átalo e Gustavo, subimos a Serra Gaúcha de Voyage rumo à Caxias do Sul decididos a voltar com algum Escort conversível. Hoje eu consigo dimensionar o absurdo que fiz na época por comprar um Escort cegamente, sem o mínimo de conhecimento sobre o carro. Não sabia nada e só queria me desfazer do Voyage colocando o sonho sem teto na garagem!
Chegamos a uma loja e lá estava o dito cujo. Faróis opacos, sem faróis de milha, sem spoiler dianteiro, sem compressor do ar condicionado, capota estranha mas com sistema eletro-hidráulico funcionando. No interior, bancos com furos, pedaleiras e manopla do câmbio que tirariam qualquer gearhead do sério… pronto! Não me perguntem, mas era esse! Não sei por que, mas era! Indescritível a sensação de descer a BR116 com o velho carro novo!
Não vou entrar em detalhes sobre a história do modelo Escort XR3 Conversível que já foi muito bem descrita pelo amigo Germinal, proprietário do ProjectCar #45 e pode ser vista no seu quarto post.
O meu conversível Mk4 é o número KG 09667, contagem esta que começou no número zero em 1985 nos Mk3. Este número foi zerado a partir do lançamento dos Mk5 em 1992 modelo 1993. A título de informação, foram produzidos aproximadamente 2.500 Mk3, 12.500 Mk4 e 3.500 Mk5 conversíveis no Brasil.
Aqui começa essa longa história de sete anos. Chega de dissertação e vamos ao projeto!
SURPRESAS E PROBLEMAS
Ao pegar o carro, notei que havia uma alteração legalizada em seu documento. Seu motor foi alterado para gasolina e apareceram descritos 110cv no campo da potência, sendo que a fábrica divulgava 105cv com álcool e 99cv com gasolina para os motores AP 1.8S na época. Investigando mais a fundo, descobrimos que o motor havia sido trocado por um AP 2.0 gasolina que, possivelmente, pela sua numeração e peças internas, provinha de um VW Santana ou Quantum Sport.
Neste primeiro post quero apresentar alguns problemas que encontrei no meu automóvel e que também são crônicos do modelo juntamente com as soluções adotadas. Será um post crítico e desmotivante, mas acalmem-se, pois primeiro vem a tempestade, depois, a bonança! Nos segundo e terceiro posts tratarei das melhorias que implementei no carro e do grande upgrade mecânico realizado nestes últimos dois anos.
Muitas das intervenções e reparos que fiz foram graças a informações obtidas dentro do fórum Escort Clube, com os grandes amigos que fiz ao longo desse período lá dentro. Carros não são nada sem amigos. Gearheads não vivem sozinhos na natureza! Recomendo a todos que procurem páginas e fóruns relativos ao modelo que se goste, pois, apesar da aparente falta de profundidade,ainda há muita informação útil e válida na internet, além de grandes pessoas dispostas a auxiliar.
A TROCA DA CAPOTA
90% das pessoas que vêm conhecer meu carro iniciam a conversa com a célebre pergunta que aterroriza todo dono de carro conversível: ¨Entra água?¨ Verdade seja dita: se tens um carro conversível que hoje não entra água por algum ponto na capota, amanhã vai entrar, isto é fato! A capota original do Escort XR3 conversível era feita na Karmann Ghia, em material tipo lona e com costuras eletrônicas (fusão à quente). Segundo informações que colhi com conhecidos que trabalharam na montadora, a Ford considerava que a vida útil da capota do Escort seria de três anos em média por causa do clima tropical na maior parte do Brasil.
A capota do meu Mk4 já não era mais original. Ela era feita com costura comum e já havia se retraído nas laterais, formando um arco sobre os vidros. Parado não entrava água, porém andando era o drama! Infiltrava água com frequência na junção entre a capota, a coluna A e a porta, diretamente sobre as coxas do motorista e do passageiro. Em Porto Alegre não existem profissionais qualificados para fazer tal substituição. As capotas que vi por aqui eram de péssima qualidade. Diante da demanda, reunimos um grupo de amigos do Escort Clube e pagamos passagens e estadia para um capoteiro de São Paulo vir substituir dez capotas de Escort em dez dias, em maio de 2010.
A denominada ¨Maratona das Capotas¨ foi um sucesso. As capotas adquiridas nesta ocasião não tinham a mesma qualidade das originais, apresentando costura comum, porém tornou-se uma boa solução, com valor acessível para quem mora em regiões sem este tipo de serviço e está com sua capota ruim.
Desejo muito um dia levar meu carro até São Caetano do Sul/SP, em um profissional que adquiriu o maquinário da Karmann Ghia e faz capotas com solda eletrônica, mas é uma viagem onerosa e até mesmo castigaria bastante o carro neste longo e perigoso percurso. Um dia, com tranquilidade para ir e voltar, quem sabe…
O SISTEMA ELETRO-HIDRÁULICO DA CAPOTA
Sempre digo que tive muita sorte em ter comprado um conversível com a capota elétrica original pois, na emoção da compra, pouco dava bola se o carro tinha esse item tão legal e cômodo. Eu queria era um Escort conversível de qualquer jeito!
Outro terror para o dono de Escort conversível ocorre quando o sistema começa a apresentar vazamentos. Se a capota perdeu força e o nível do óleo hidráulico baixou no reservatório do pequeno motor, ou então barulhos iguais aos de uma “bisnaga vazia de ketchup pressionada” são ouvidos, pode ter certeza que algo está errado e há problemas à vista. Chego a rir com a bizarra e verdadeira comparação do barulho!
O sistema é composto por um pequeno motor posicionado na lateral esquerda do porta-malas, dois pistões hidráulicos posicionados um em cada lateral do carro, na altura dos passageiros do banco traseiro; interligando o sistema, um par de mangueiras para cada pistão. O acionamento se dá por um botão no console central perto do câmbio.
Apesar de ser um carro relativamente moderno, já é grande a lista de peças difíceis de serem repostas, até mesmo no mercado de peças paralelas. O pistão da capota é uma delas. Em meados de 2009, um dos meus pistões começou a vazar e acabei tendo que recorrer às auto peças usadas, onde este item também é raro de ser encontrado.
Por sorte, encontrei um par em bom estado e o problema foi solucionado. Até hoje não encontrei loja especializada na manutenção destes pistões. Creio que oficinas especializadas em manutenção hidráulica de retro-escavadeiras ou BobCat podem ser a solução, apesar de serem maquinários de uso pesado, com equipamentos muito maiores que os pequenos pistões da capota do Escort.
ESTRUTURA/LONGARINAS
O Escort Mk4 fechado já é um carro de estrutura frágil. O conversível tem essa característica agravada porque sua carroceria sofre mais. A cargo de comparação, é como provocar torção em uma caixa de sapato com e sem a tampa. Sem a tampa, a caixa torce muito mais que com o reforço da tampa. Tomada as devidas proporções, no conversível acontece a mesma coisa. Suas longarinas não foram corretamente dimensionadas para aguentar nosso solo lunar e o conjunto motriz dos Escort. Se com o motor CHT 1.6 elas já racham, com o torcudo motor AP 1.8s a chance disto ocorrer é bastante ampliada.
Fui ¨premiado¨ com um carro que já tinha as longarinas ressoldadas e que voltaram a rachar. A solda foi refeita com todo cuidado e o carro foi realinhado, inclusive resolvendo o problema de desalinhamento da roda esquerda/eixo dianteiro em relação à caixa de roda.
Com estes serviços feitos, a solução para a não ocorrência novamente do problema foi a instalação de uma barra de amarração regulável superior, fabricada pela Imohr, unindo as duas torres da suspensão dianteira. Esta barra trouxe um reforço estrutural necessário para que as longarinas não se rompessem mais. Como nem tudo são flores, a barra dava conflito com a mangueira do respiro de óleo da tampa do cabeçote do motor 2.0. Convivi com essa incompatibilidade até a intervenção feita no motor em 2014 quando solucionamos alterando a saída do respiro na tampa.
Não só a estrutura do carro foi beneficiada com a instalação da barra. Houve grande melhoria na dirigibilidade. O Escort Mk4 possui tendência a sair de frente nas curvas e este problema foi completamente sanado, tornando-se um carro mais firme, preciso e, como se popularmente diz: ¨na mão¨.
BASE DA BATERIA/FERRUGEM
Outro problema crônico dos Escorts, seja Mk3, Mk4, Mk5 e Mk7, é o aparecimento de ferrugem e consequente vazamento de água para dentro da cabine por baixo dos locais onde ficam posicionadas a bateria e a caixa de fusíveisno compartimento do motor. Há provavelmente uma falha de projeto do automóvel na qual a água se acumula sob estes elementos e não é drenada. Com o tempo, a ferrugem toma conta e motorista e passageiro passam a sentir pingos de água sobre as pernas, tanto com o carro transitando na chuva quanto após sua lavagem.
Felizmente tive este problema apenas do lado da bateria, onde foi encontrado um rombo no local ao ser realizada a primeira reforma em 2009. O problema foi solucionado com a remoção do metal contaminado pela ferrugem e a colocação de nova chapa com caimento para o lado do motor. Acima da chapa, optou-se por aplicar uma camada de impermeabilizante emborrachado além de se instalar uma nova base para fixação da bateria.
Aproveitei e providencieia vedação de toda a base da caixa de fusíveis a fim de evitar futura entrada de água por este local.
LOUCO VARRIDO?
Quem lê este primeiro post deve pensar que sou louco, que deveria ter vendido o carro e partido para outro, mas a obstinação e o desafio de recuperá-lo e deixá-lo como novo sempre se sobrepuseram aos problemas e às dificuldades, muitas vezes desanimadores. Tudo, absolutamente tudo, desencadeou uma absurda aprendizagem. E nada disso teria sido possível sem as dicas e ajuda dos amigos de clube.
Chega de falar de problemas! No próximo post irei falar sobre a primeira reforma (vocês devem estar pensando porque diabos eu falo primeira reforma, mas logo saberão o porquê). Também falarei sobre melhorias e upgrades que fiz no carro e orgulhosamente denomino de ¨Licenças Poéticas¨, termo muito utilizado pelo meu amigo Átalo. Entre estes itens estão: Bancos Recaro (não disponíveis na linha 89/90), reformados com o tecido original do ano do carro, 5ª marcha alongada, melhoria na eficiência do ar-condicionado e pequenos detalhes sutis como iluminação sob os pés do motorista e do carona, iluminação sob as portas, além de começar a falar sobre a opção pelo abandono do carburador e escolha de uma injeção eletrônica programável. Até o próximo post!
Por Régis Vasconcellos, Project Cars #177