Olá a todos! Aqui é o Leonardo Contesini, editor do FlatOut e porta-voz deste que é o mais novo participante do Project Cars: um Chevette L 1979 com 86.600 km e praticamente todo original de fábrica.
Como bem sabemos, um carro não-restaurado pode ser mais valioso que um carro totalmente refeito no capricho. O motivo é evidente: toda a história do veículo está ali, evidenciada pela pátina, pelos riscos e marcas de uso. E foi exatamente isso o que atraiu o atual proprietário do carro, cujo nome iremos preservar a seu pedido.
O Chevette foi comprado novo por um vizinho de condomínio em 5 novembro de 1979, que o manteve em uso rotineiro até alguns meses atrás, quando deixou de dirigir. Era o segundo carro de uma dupla de quatro rodas, e usado apenas em alguns fins de semana quando o homem precisava ir à Baixada Santista. O outro carro era um Fusca dos anos 1970, usado no dia-a-dia.
Esse uso esporádico do Chevette permitiu que ele estivesse sempre pronto para bater a chave e sair por aí, ao mesmo tempo que, por ser um carro estradeiro, sua quilometragem não fosse elevada como a de um carro usado diariamente. É por isso que ele registra pouco mais de 86.500 km em seu hodômetro. Quase nada para um carro de 40 anos.
À primeira vista ficamos céticos quanto à quilometragem exata do carro. Seria possível que um carro de 1979 tivesse rodado apenas 86.505 km? Parecia improvável, porém ao considerar que o trajeto de ida e volta entre o condomínio e a cidade de Santos/SP tinha por volta de 170 km, estamos falando de aproximadamente 500 viagens dessa em 36 anos (o homem deixou de usar o carro em 2016), ou 13 viagens por ano. O número bate com a rotina do antigo proprietário.
Não repare a sujeira, o carro chegou assim
A primeira revisão do carro confirmou que a quilometragem é original: os pedais ainda usam as capas originais, com borrachas pouco desgastadas. Os bancos usam o tecido original, embora um pouco puído no encosto do motorista. O volante é original e não tem marcas de desgaste. As cinco rodas têm a data de produção: três delas em 10 de julho de 1979, duas em 11 de julho do mesmo ano.
O estepe, aliás, ainda calça o pneu Goodyear G8 165.13 da época — provavelmente original; não cheguei a pesquisar sobre isso. Além disso, o carro está calçado em quatro pneus aparentemente novos pela preservação da banda de rodagem, porém a data de produção indica que eles foram feitos na 4ª semana de 2000. Mais uma evidência da quilometragem original.
Mas a revisão mecânica revelou ainda mais detalhes surpreendentes: o carburador DFV jamais foi desmontado. O radiador ainda é o mesmo que os funcionários da GM instalaram em 1979 e a pintura azul do motor ainda resiste bravamente.
A evidência final foi encontrada ao retirar um pouco da mistura de óleo e poeira que cobre os amortecedores: eram igualmente originais — uma pena que precisarão ser substituídos. Diante destas evidências chegamos à conclusão de que esta é, sem dúvidas, a quilometragem original do carro.
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Agora, você deve ter notado que os faróis não são originais do modelo 1979, nem seus para-choques e borrachões e muito menos os arcos cromados nos para-lamas. A essa altura você talvez pense que a alteração tenha sido feita devido a algum acidente ou algo do tipo, mas ela se deve justamente ao fato de o carro ter sido usado regularmente. Explico: primeiro constatamos que não houve alteração na dianteira do carro. Depois, vale lembrar que este carro vinha equipado com os faróis “sealed beam”, os populares “silibim” ou “silibrim”. Eram faróis que não usavam lâmpadas intercambiáveis, e por isso precisavam ser trocados inteiros.
Na época era o que havia de melhor, mas no início dos anos 1980 os fabricantes adotaram o sistema “bi-iodo” que usavam lâmpadas separadas do projetor. Tudo o que você precisava era comprar as molduras plásticas dos modelos 1981/1982 e os faróis mais modernos para gerar uma bela economia. Não era como em 2017, quando temos componentes fabricados de acordo com as especificações originais e um código do consumidor que obriga o fornecimento de peças de reposição por dez anos após o fim da produção. Provavelmente a opção mais viável — e mais conveniente para o proprietário — foi o “facelift”.
Com os borrachões e para-choques foi a mesma situação. O Chevette não teve proteção na lateral até 1981. Foi somente naquele ano que a Chevrolet atualizou o carro com borrachões e para-choques mais largos. Assim, sendo um carro contemporâneo de uso regular, se você quisesse proteger portas e laterais do seu carro, a solução mais prática eram os borrachões do modelo mais recente produzido na época. Sem contar que seu Chevette 1979 ficava com o visual três anos mais novo por uns poucos trocados. Era algo a se considerar em meados dos anos 1980, não?
Como se não bastassem, o carro ainda veio com alguns bônus: todas as etiquetas de fábrica coladas onde deveriam estar (na parte interna do capô e na carcaça da lanterna traseira direita. O porta-luvas armazenou o manual original, o guia de manutenção, o certificado de garantia da bateria Prestolite (também não sei se original) e, melhor ainda, a nota fiscal do carro.
O rádio é um toca-fitas TKR, infelizmente não-original do carro, porém um acessório comum na época. Outro acessório não-original porém comum eram os faróis auxiliares instalados atrás da grade frontal, semelhantes aos do Chevette GP daquele mesmo ano.
Diante desse nível de originalidade, os proprietários cogitam a hipótese de não restaurá-lo, apenas fazer a revisão geral, substituir buchas, borrachas, retentores, flexíveis e afins — todos ressecados, talvez por serem originais —, bem como amortecedores e pneus. As rodas deverão ser repintadas, bem como alguns pontos de corrosão característicos dos Chevette (sob as borrachas dos vidros basculantes traseiros, apenas). No mais, o exemplar deverá ser conservado com sua história preservada, algo que certamente atribuirá um valor maior a ele.
No próximo capítulo veremos o processo de substituição dos componentes e mais algumas fotos desta preciosidade. Até lá!
Por Leonardo Contesini, Project Cars #450