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Project Cars Project Cars #451

Project Cars #451: as dificuldades na restauração do meu Audi 80 V6

Nobres gastadores de gasolina: voltei. Estava entretido com pepinos habituais de um quase falido dono de Audi 80, e por isso meu atraso. Peço desculpas para a turma do FlatOut e toda equipe, mas precisei focar um bom tempo no trabalho, para dar conta de pagar a infinidade de boletos que acumulam sobre minha mesa com a rubrica “pecinhas A80” ou “parcela mecânico desgraçA80”.

Então, onde paramos na ultima vez que conversamos? Ah sim, no fatídico dia que o panzer chegou aqui, em terras sulistas. Vamos lá. Estamos no pátio da Flex, na primeira semana de fevereiro, tentando entender que tipo de péssimo negócio eu havia feito.

Após o choque inicial, onde constatei que a expressão gato por lebre se aplicaria, voltei ao modo racional, e analisei friamente a situação. Muito pouco daquilo negociado havia sido de fato, cumprido. Abri o capô, havia plásticos de acabamentos quebrados, cuja reposição é praticamente impossível. Olhei o amortecedor que sustentava o capô (o mesmo capo que neste exato momento pendia, com a estrutura interna dele quebrada) preso com arame, adaptado de qualquer outro carro, sem pressão e muito mais curto que o original. Apoiei um cabo de vassoura, e comecei a análise.

Liquído do radiador na cor ferrugem, denotando um péssimo cuidado do dono anterior, capa de bateria inexistente, bateria “BaratinMineirin” legítima, de 55 amperes (a original é de 75; por que será que o malaquias usou uma de 55? Contenção de custos, talvez?), faróis presos com arame, óleo do motor no nível e óleo da caixa bem abaixo do nível. Gelei. Uma espiada nos fios no cebolão do radiador entregou a gambitech do eletro-ventilador.  Nesta hora pensei, sinceramente, em devolver a jaca pro antigo dono, mas bateu o medo de jamais receber algum valor de volta, e insisti nela. Vamos errando novamente jovem, que um dia quem sabe aprendemos, ou não.

Entrei no carro e aquele cheiro típico de carro alemão dos anos 90 me acalmou um pouco, até eu olhar os tapetes furados e puídos pelo tempo. Uma sujeira inenarrável. Pronto, acordei de novo. Em Gravataí, fazia 35 graus naquele dia, o interno dela parecia o inferno, e eu vivia um inferno mental.

Liguei-a novamente. Maldita lenta oscilante. Engatei R, um faustoso tranco na caixa, um chiado e lá vai ela dando ré, capenga. Vira o volante, as malditas rodas de tigrão, de 20 polegadas, encostam por dentro nas caixas e não deixam manobrar. Nunca na vida, amaldiçoei tanto um vendedor. Enfim, alinhei em direção ao portão. Vamos no D que na verdade é 3ª, e rumamos até Novo Hamburgo.

Mais um tranco seguido de um TLAAAAAAACK de assustar até um surdo (depois, descobriria o porquê).  Parei num posto, próximo, para abastecer, e nessa hora, vi a merda que havia me metido. Luz do ABS acesa, intermitente. Cara, algo mais pode dar errado? Sim, pode.

Tentei ligar o ar, pra refrigerar a mente e o corpo, mexe, liga, aperta botão dali, daqui, e nada do ar-condicionado funcionar. Mais um caso típico de “Ah,mas comigo funcionava, sei não que houve”.

Bom, abre teto, abre vidro, e vamos embora, derretendo. Olho pra cima, o forro do teto tremulando tipo uma bandeira em 7 de setembro. Cara, eu só pensava no que mais poderia ferrar minha paciência já que estava rodando no carro que se desenhava a perfeita materialização da praga do importado barato.

Fui rodando os próximos 50 km até São Leopoldo em terceira marcha. Liguei o rádio, opa, funcionando.  Regulei o som, o chiado se fez. Regulei o balanço para os seis alto-falantes e… voilà: somente os alto falantes do painel funcionam. Comecei a desanimar.

A 80 km/h, apesar de ser a lei, a pequena viagem foi torturante. Observei o funcionamento dela, pressão do óleo em ordem, temperatura idem. Menos mal, aparentemente o motor está saudável. Olho no odômetro, 118.700 km. Não me parecia uma quilometragem muito alta para um carro 1994. Ilusão, jovem. Ilusão descoberta naquela próxima semana.

Vim até em casa, com meu brother dirigindo o outro carro. Quando encostamos na garagem, fui observar o carro funcionando. A lenta ainda oscilava — menos, mas oscilava. Aquele ronco grave, que lembra esportivo de gente grande, me arrancava um sorriso, no meio de tanta coisa que eu já imaginava ser cara a resolver. Olhei detalhadamente o carro, elenquei prioridades e fui à luta.

Marquei para a segunda-feira seguinte a incursão da donzela na primeira oficina que ela entrou. O Luis Henrique, da Luis Caixas de Câmbio em São Leopoldo, aceitou pegar pra revisar corpo de válvulas e fazer alguns testes, depois de uma boa conversa onde expliquei que o ex-dono havia constatado um defeito, mas que era corpo de válvula ou solenóide. O Luis me olhou incrédulo, mas segui firme na crença. Sinceramente, eu queria acreditar.

Primeira constatação. Faltava quase 1,5 l de óleo na geringonça. Completamos, passamos no scanner e ainda acusava falha de solenóide. Levantamos a tedesca, e ali comecei a me desesperar.

Audi por baixo. Audi Por Baixo. Oficina

As fotos mostram só um pouco do que vi por baixo dela. Quando abrimos o cárter da caixa, havia um plástico perdido dentro do óleo e este já ficando marrom, mas o que chamou mais atenção mesmo foram marcas nos parafusos da caixa, alguns escorridos e de bitolas diferentes, entregando que ela havia sido no mínimo, recentemente mexida. Bom, baixamos o cárter, encontramos alguns parafusos perdidos ali dentro, e o pior, aquele flat-cable das solenóides e dos circuitos, preso com cinta-plástica. CARA, um ENFORCA-GATO DENTRO da caixa automática segurando um FIO, é pra matar.

E detalhe, o chicote velho está se esfarelando. Tive um surto psicótico nessa hora, e ao saber o preço do chicote novo, sentei e chorei de cantinho. Bom, se for pra resolver o problema, vamos pagar então. Aproveitei para analisar meu novo carro por baixo, e vi umas aberrações a mais ali. Mas me chamava a atenção, aquelas malditas rodas pegando por dentro dos pivôs de suspensão e nas torres da suspensão, e o Luiz comentando que pra queimar um câmbio com aquelas rodas, era rapidinho.

Limpeza do corpo de válvulas e um chicote novo, um dia e meio depois, recebo a ligação que derrubou mais uma vez minha manhã :

— De Boni, aqui é o Luiz. Teu Audi tá pronto.

— Opa! E aí, tudo certo? Tá andando?

— Continua igual. Tiramos as falhas, o scanner estava acusando curto pelo flat-cable ruim, limpamos o corpo de válvulas, mas o problema dela é dentro da caixa como eu te disse no começo. Eu não faço mais o câmbio desses carros, fala com o Élcio da Sinos Caixas. Mas prepara o bolso, essa tua caixa é uma m&***@ de cara. Vem aqui que conversamos.

— Ah, que m&rd@. Já chego aí.

Mil e poucos reais mais pobre, com um Audi 80 andando em 3ª marcha, levei na mecânica onde meu amigo Scalabrin trabalha, para uma revisão básica. O André, dono da oficina, levanta o carro e dá de cara com aquela gambitech máster no cebolão do ar-condicionado e já abre a matraca:

— Vini, esse teu carro tá bem maquiadinho hein! Abriram a caixa automática já, isolaram esse teu ar por que ela deve estar fervendo, e tomou uma porrada na lateral esquerda. O Luiz resolveu tua caixa?

— Não André, diz que é problema interno. Ele me recomendou o Élcio.

— O Élcio é o melhor cara pra fazer esse serviço. Mas tu sabe que é uns 6 conto pra cima essa caixa né.

— Ah, to sabendo.

— Vini, esse filtro de gasolina é diferente. Encomenda ele e traz aqui depois que a gente troca.

Ah, é claro que até o filtro de gasolina seria diferente, né. Por que um Audi 80 seria igual a um carro normal? Tirei o 80 da oficina com óleo trocado, e comecei a via-sacra pra arrumar o ar-condicionado. Não sem antes, passar num outro chegado meu, pra arrancar as rodas orbivileira dela. Se algo me irritava, e muito, dentre todas outras coisas que estavam dando erradas, com certeza as rodas imensas eram uma das principais. Fui trocar as ditas rodas. Conversa dali, conversa daqui, era óbvio que ninguém queria pegar aquelas tampas de bueiro, negociei por quatro Porsche Cup 17 na cor grafite, com pneus 17 montados. Detalhe: as rodas chegariam dali 30 ou 45 dias. O que se faz, então? Se tapa o furo com poxipol.

Montei, de imediato, quatro BBS de 15 polegadas, com pneus novinhos pra me livrar das Orbi20, e quando chegassem as Cup, trocaria elas de imediato. Mas, como seria para negociar posteriormente, teria que abraçar o que a casa oferecia.

Não gostei. Mesmo. Mas é o que a casa oferecia. Odiei na verdade....

Não sei se odiava mais as 20, ou as BBS. Cara, nada tava dando certo. BBS dourada? Aí arrebenta o caboclo né. Coloquei o Audi no elevador, removi as quatro tampas de bueiro e… mais uma surpresa: pinças pintadas de rosa. Cara, rosa? Por que rosa?

Cara, pinça rosa não!!!!!

Motivo de risadas e piadas dentro da oficina. Perguntaram se queriam que retocasse. Não preciso dizer que mandei à m**** meio mundo. “Pinta de prata essa bagaça!”

Outra pequena surpresa: molas cortadas. Ah, mas é claro: MOLAS CORTADAS, que espetáculo. Minha lista do Mercado Livre estava ficando mais longa que discurso de gago.

Montamos as BBS, balanceamos, e bora lá, encontrar uma auto elétrica disposta a arrumar o ar-condicionado. Levei no meu conhecido, o Ulysses, da Aircompany em São Leopoldo. Olhou por cima, viu aqueles fios estranhos e eu já esperando uma patada e um corridão da oficina, ele largou:

— Tu tens as peças dela? Ali, aquele sensor do radiador é comum a linha VW. Barbada. Esse compressor tu consegue trocar o rolamento e recondicionar ele, tenho um cara aqui que faz pra mim. Só a mão de obra é chata, mas se tu não quiseres, não precisa fazer agora. Esse carro tá funcionando o condicionador, só que isolaram algo na central pra ele não disparar. Eu vou ver o que faço, se não resolver, sei quem resolve.

Eu ainda não havia futricado em fóruns, mas o que mais ouvi é “cara, é problema, esse carro é o cão”, “meu, pior que isso só Marea”, “Audi antigo é f****, tu tá lascado, ninguém pega pra arrumar”, e confesso galerinha, é realmente curioso o espanto do pessoal ao receber uma jaca dessas em oficina.

O que fiz então? Deixei o Audi lá, levemente aliviado porque meu amigo resolveria mais essa bronca pra mim, num final de tarde de sexta-feira, uma semana após comprar o carro. Detalhe importante: dos cinco dias úteis da semana, quatro dias passou ele ficou parado. Isso nunca é um bom sinal. Passei o final de semana entretido em fóruns e lendo a pasta de notas que vieram junto com ela, com um garrafão de vinho aberto e o Mercado Livre como distração. Numa dessas notas, meu olho puxa a quilometragem da entrada do serviço: KM ATUAL: 163.274. Opa! Paraê, paraê, peralá. CENTOESESSENTAETRESMILQUILÔMETROS? Mas não era 118.000?

Bah, que decepção. Nesse momento, todas as pecinhas que havia encomendado, por um detalhe não foram canceladas.

Coisa de dono chato, mandei vir tapetes novos, um Gecko, as chaves reserva com iluminação noturna, amortecedor de capô, manual do rádio que faltava, filtro de gasolina, capas de plástico que consegui encontrar, porta documentos de couro personalizado e outras quinquilharias que iriam embelezar a criança. E descobri, nessas noites procurando soluções para o panzer em fóruns, um site para ver com vista explodida toda linha VAG. Altamente útil, junto com o brother Felipe Barbosa de Portugal, um amigo Alfisti, que me salvou de pagar quatro rins ou mais em peças. Aos chegados que tiverem interesse em trazer peças de fora, por preço justo, sem ter dor de cabeça ou problemas, falem com esse cara. Mesmo. Vale muito a pena.

Flatout SEMPRE presente!!!!

Lá estava eu com pecinhas de acabamento e quinquilharias chegando, em um carro que não estava querendo sair da oficina. Bom, comprei o que achava que devia naquele final de semana regado a vinho, e deixei chegar a segunda-feira.

Três da tarde da segunda-feira, dia 13/02. Liga o João, da oficina do ar-condicionado:

— Seu Vinicius, tudo bem, aqui é o João. Você tem como dar uma passadinha aqui na oficina? O Ulysses quer falar com você.

— Sim, sobre o que seria? Meu carro está pronto?

— Pois é, o Ulysses quer falar com você pessoalmente. Tem como vir agora?

— Estou indo. Obrigado.

Cheguei,  o cara com cara de desânimo olhando pro Audi, capô aberto e as mangueiras conectadas no sistema. Perguntei:

— E aí? Funcionou?

— Sim, funciona. Acima de 3.000 rpm. Mas o fluxo de ar dentro da cabine não é muito forte, pode ser que algo esteja entupido. Desse módulo não sei o que pode ser, devem ter mexido em alguma coisa, e o módulo não libera abaixo de 3.000 rpm. Falei com um chegado, o Gerson da Flesch Car, ele pode pegar teu carro ainda hoje. Tu levas lá? Nem vou te cobrar nada além do gás e filtro da cabine. Troquei filtro, instalei o cebolão correto, está armando certo o eletro-ventilador, usei o mesmo do Santana 2.0 e desfiz as emendas que tu tinhas no chicote. Mas tem que levar lá pra saber o que é pra poder funcionar.

Pensei comigo: o que fizeram com esse negócio? Mas vamos lá, até a Flesch Car. Meia hora mais tarde encosto na outra oficina, o quarto lugar em menos de uma semana com o carro. Pedi para olharem o vidro do motorista, que já não funcionava mais, os alto-falantes que não funcionavam na traseira, e esse “pequeno” detalhe do ar-condicionado. Perguntei para o sr. Gerson, um alemão gente fina que me atendeu lá, mais ou menos quanto tempo demoraria. Nós te ligamos quando ficar pronto.

Ok. Peguei um Uber e fui embora, sentindo que essa parte seria. Dia 23/02,recebi a ligação que meu carro estava parcialmente pronto. Ué, como assim parcialmente? Vamos por partes então, assíduos leitores.

— Opa sr. Vinicius, tudo bem? Resolvemos o problema no seu ar-condicionado, tivemos que isolar um comando da central, e tornar o acionamento dele direto pelo comando do ar-condicionado com uma caixa nova de relés para o perfeito funcionamento.

— Como assim?

— Mexeram na central desse carro, mas não compensa arrumar, da forma que fizemos, está funcionando e seu carro está funcionando perfeitamente. Ele estava com algumas enjambrações no acionamento do eletroventilador, que corrigimos. Mas os seus alto-falantes não estão funcionando, o que você quer fazer?

— Vamos trocar, então.

— Não, seus alto-falantes têm módulo de potência integrado, se for trocar, precisamos montar um módulo de força, pois o rádio não tem saída amplificada. O amplificador é o próprio alto-falante. Quer trocar o som inteiro do carro?

Altofalantes reformados. Sim. Olha o módulo na traseira deles...Coisas de alemães (2) Altofalantes reformados. Sim. Olha o módulo na traseira deles...Coisas de alemães (1)

— (Um minuto de silêncio. Xingamento mental ao antigo dono, mais um minuto de silêncio) Ok, Gerson. Vamos consertar esses módulos, é possível? Aproveita e troca os cones dos falantes também, ok?

-Ok. Avisamos quando ficar pronto. Sem previsão no momento.

Sai dali, mais alguns milreais mais pobre, mas com o ar-condicionado funcionando. Olhei para a traseira dela, forros desmanchados, tudo solto no porta-malas. Ok, em breve montarei. Vai nessa, filho…

Pensei comigo: Bom, vou ao Elcio para ver sobre a manutenção da caixa. Sim, fui no dia seguinte, 24/02. Cheguei pomposamente na oficina, e ainda com uma vã esperança que pudesse ser algo fácil, porque a esperança é a ultima que morre. Conversei com o sr. Elcio, da Sinos Caixas, uma das melhores oficinas para caixas automáticas que conheço, e ele foi franco e sincero como todo bom alemão.

— Olha, não parece ser problema eletrônico, mas traga ela dia 06/03, que vou fazer os testes e lhe dar o diagnóstico. Tem cara de ser problema de pistão, mas vamos ver com calma, sem ficar no chute.

— E tu, acha que é o que, Elcio? Acabei de comprar esse carro, o dono anterior falou que trocou o óleo e ela deixou de funcionar, mas as vezes volta a funcionar.

— Olha… ou ela funciona ou não funciona. Se ele trocou o óleo e parou, tua caixa deu adeus. Se foi isso mesmo, não tem outro diagnóstico. Mas vou fazer os testes e te aviso. Traz dia 03.

Fui pra casa, inconsolável. Naquele final de semana, estava dividido. Desmanchar ou não? Vender?Encostar? Quanto mais olhava fóruns, mais via que tinha entrado numa enrascada. A caixa 01N é reconhecida pela fragilidade, igual às 01M da linha VW Passat/Audi A3. São de montagem melindrosa, e a má fama recorrente vem devido a falhas de montagem que simplesmente condenam o serviço em poucos kms. Elas usam radiador de óleo integrado ao radiador principal, qualquer falha de refrigeração do carro mistura óleo da caixa com água e fundem novamente sem avisar o motorista.

Outro grande problema, é o custo das peças. Existem duas linhas de peças: uma que alguns importadores trazem dos EUA, mas são peças de segunda linha, com um custo um pouco mais baixo do que as peças da primeira linha, que vêm direto da Polônia ou Bulgária, peças originais de reposição daquelas caixas naturalmente complicadas. Um dos problemas são os pistões internos, que fragilizam com o aquecimento, e quebram, perdendo pressão e fazendo seu carro deixar de engatar o D quando quente.

Outro problema recorrente é a fita que interliga as solenóides, facilmente estraga na troca de óleo, e começa a acusar falha nas solenóides, deixando o carro estranho, dando trancos. Ah, além disso, folgas nas trizetas são recorrentes, e o corpo de válvulas, se teu carro tem mais de 150 mil km, vai apresentar problema. Não me pergunte o motivo, eles apresentam desgaste acentuado acima dessa km, também te deixando a pé, sem motivo aparente. E cuidado, MUITO cuidado com a porcaria do sensor da capa seca. Ele é um FDP daqueles que te deixam adoecer de raiva por um motivo singelo: Ele resseca, quebra um contato, e simplesmente teu carro NUNCA MAIS liga. Barbada de incomodar quando se mexe na caixa. É o mesmo sensor de rotação do virabrequim. Exatamente o mesmo.

Cogitei a idéia da troca para manual, com o Tola Soares. Ele tinha um conjunto de caixa com pedaleira completa, e não era caro. Tola é um cara que manja pra caramba dessas lasanhas, e é outro grande amigo que fiz nesse mundo de iniciação audeira. Conversei com ele, minha opção seria mandar o carro pra SP, montar lá e descer depois. Economicamente era inviável, teria que contratar cegonha pra levar até SP, plataforma em SP e de lá, depois de pronto, voltar pra cá. Uns R$ 6.500, calculei. Então, comentei com o mecânico aqui, que me ajuda com meus projetos.

— DeBoni, travecar essa Audi pra manual é uma mão de obra do c4r4lh8. Não dá, vai ficar uns quatro meses rolando aqui na oficina, tem que desmanchar painel e um monte de coisa, vai dá uma mão de obra e vai ficar tão caro quanto arrumar a caixa automática.

— Mas quanto? Uns cinco mil?

— Talvez mais, por que não sei dos sensores e outras adaptações. Eu prefiro não fazer. Leva no Elcio, zera essa caixa e vai ter carro pra mais 20 anos.

— Tá bem.

Restava-me aceitar a opinião, já que outros conhecidos que sei que poderiam me ajudar a fazer, simplesmente acharam loucura e preferiam picar o carro pra vender em peças, o que, novamente me soava como uma opção possível. Esse é aquele exato momento que tu se lembra daquela maldita frase, do importado barato ou do “comprarei um XXXX e guardarei o resto para a manutenção”. Essa conta nunca fecha, mesmo. Não fecha, por que a variável sempre é mais complexa. Vamos tomar, por exemplo, o Audi 80.

Importado, e com algumas peças em comum a linha VW. Supondo que compraste reservando R$ 10.000 para a manutenção, a primeira dor de barriga que a caixa lhe der, irá lhe consumir no mínimo, seus 70% dessa reserva tática. Isso eu digo caso embarque em um automático, que é uns 90% dos exemplares bons ou medianos a venda, por preço entre R$ 12.000 e R$ 20.000. Se tiver a iluminação de achar um manual, em bom estado, além de ser mais caro que isso, também terá coisa a fazer, e jogo, que será no motor e sensores, e novamente, terá seus 80 ou 90% dessa economia drenada.

Motores desses carros são indestrutíveis, mas, vale a pena a troca de todas mangueiras, limpeza de radiador, troca do trocador de calor do óleo do motor,  troca de todos sensores por idade, que apesar de serem resistentes para caramba, a idade é implacável com os conectores. Guarde-os de reserva emergencial. Outro bom conselho, é abrir o cárter, trocar a junta, conferir estado do pescador e das bronzinas. São baratas, vale a pena trocar caso o motor seja um high mileage igual ao meu, que passou dos 200.000. Não que seja um problema, mas prevenção nesse caso economiza uma retífica que larga de R$ 7.000 ou R$ 8.000 sem fazer força. Outra coisa interessante a se fazer, nas 80 V6, é trocar a junta do cabeçote e conferir os tubos de água. Esses tubos, não raras vezes estão podres, ou apodrecendo discretamente, e caso ela ferva, vai ferver o câmbio junto, e aí já viu né?

Geralmente,  e é quase certo, que elas já tiveram problemas de cabeçote. A melhor junta, neste caso, é VICTOR REINZ. Não economize, pois juntas boas te poupam retrabalho de mão de obra. Tive algumas boas dicas, do Gunther Meyer, outro louco como eu, que tem um Audi 80 também em obras e a menos de 100 km daqui. Veja só: elas nunca quebram sozinhas, sempre acabam unindo seus proprietários!

O Gunther também sofreu com elétrica desses carros, que, como de praxe, passaram na mão de vários “entendidos” e acabaram tornando a casa da mãe joana o negócio. Restou para nós, corajosos e loucos, mais loucos que corajosos, botar a mão na massa e tentar rodar com essas sauerkrauts.

Mas voltando ao assunto, mesmo que tenha guardado uma reserva, digamos de 50% do valor pago no carro, a chance, real, de gastar em pouco tempo é alta mesmo. Existem as exceções que são aqueles modelos que trocam de mão de entusiasta para entusiasta, só que não é esse o ponto agora. Falo do cara normal, que tem uma grana pra comprar um carro, seus R$ 20.000 ou R$ 30.000 e opta por comprar uma manga dessas. O cálculo inicial é 50% pro carro e 50% pra reserva, mas o que acontece sempre no fim é 70% pro carro e 30% pra reserva tática.

Na maioria das vezes, é um pesadelo se avizinhando, se não tiver um pouco de conhecimento, gente que te conheça pelos carros diferentes que já comprou ou arrumou, bons contatos e um cartão de crédito ou um fluxo de caixa justo pra poder ir arrumando.

Meu exemplo. Comprei um carro pra uso diário, o que acho que é onde a maioria da galera se enquadra. Não tinha metade do valor que imaginei gastar até agora nela, fui pego completamente de surpresa, mas tinha, digamos, os 50% do valor que paguei nela guardado como reserva, o que ajudou de inicio. A maioria da turma aqui, talvez não tenha tempo, lugares ou pessoas capacitadas de imediato para resolver o problema, levando a parar o carro para poder se dedicar durante o final de semana. E se não tiver outro meio de se locomover, o problema toma uma proporção gigante.

Por que aí o fator psicológico joga contra, demais. Já ouvi inúmeras vezes a historia do cara que comprou um antigo pra restaurar, e se desgostou no meio da restauração. Demora, empaca, vai dinheiro, você não vê resultado, empaca, vai dinheiro, e o tesão vai virando decepção e quando vê, vende pela menor ou qualquer oferta que aparecer. Não é?

Esse é o problema que terá quando comprar um importado barato, no entusiasmo de realizar um sonho, quando na verdade o sonho deveria esperar mais para ser realizado, talvez pelo exemplar não estar num ponto de conservação que permita o uso diário, talvez pela falta de conhecimento de determinadas peculiaridades do veículo ou pelo mais agravante, dependência do veiculo e dinheiro necessário para manutenções.

Eu não estou querendo jogar um balde de água fria na empolgação de vários aqui que vão ler, mas quero abrir os olhos para evitarem que passem pelos dissabores que estou vivenciando. Sério, não tem nada mais chato, mais constrangedor, que chegar mês, sair mês, e teu carro estar parado porque uma peça não serviu, um sensor não funcionou, um calço de motor não existe, a furação das rodas não casa com as rodas que tanto desejaste e por aí segue…

E de um mero probleminha cheguei a uma conta que soma quase o valor que paguei pelo carro, já contando o inevitável conserto da transmissão. Restava-me esperar então a chegada do dia 6 para deixar o carro aos aos cuidados do quinto mecânico que ela visitava nesse período de menos de um mês. Legal não?  Legal é o que vai vir pela frente, em seis meses de despesas, pesquisas, mais compras e mais descobertas.

Até breve!

Por Vinicius de Boni, Project Cars #451

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