No final do ano passado, circulou pela internet um vídeo de uma misteriosa e silenciosa LaFerrari sendo testada em Fiorano. À primeira vista o motivo parecia óbvio: trata-se do motor V6 turbo que a Scuderia vai usar na temporada de 2014 da Fórmula 1. Dilema resolvido, próxima pergunta.
Não tão rápido, camarada. Parece que pode haver muito mais segredos por trás dessa mula camuflada do que poderíamos imaginar.
Por muito tempo a Fórmula 1 foi o laboratório das novas tecnologias automotivas, mas nos últimos anos, em busca de mais competitividade combinada à redução dos custos o regulamento passou a adotar restrições orçamentárias, que resultaram também na proibição de testes privados e no congelamento dos motores, algo que limitou o desenvolvimento dos carros e suas tecnologias.
Enquanto isso, o regulamento mais permissivo das corridas de endurance permitiu que os fabricantes investissem pesado em suas equipes de fábrica, sendo o caso mais notável o da Audi e seus motores TDI e os híbridos e-tron, que faturaram nada menos do que 12 das últimas 14 edições das 24 Horas de Le Mans e os títulos das duas temporadas do novo Campeonato Mundial de Endurance (WEC).
Para 2014, o novo regulamento do WEC para 2014 aboliu o limite de deslocamento e potência para os motores e aumentou o boost máximo de motores sobrealimentados — o que significa que você pode fazer um protótipo com motor V6 turbo de 1,6 litro e sistema de recuperação de energia, exatamente como o novo powertrain da Fórmula 1.
Na prática, o novo regulamento do WEC se tornou uma enorme brecha no regulamento da F1, e isso pode ter motivado a Ferrari a voltar às corridas de endurance. Nos anos 1960 e 1970, a escuderia compartilhava tecnologias e motores entre os protótipos e os monopostos. Com a restrição dos testes da F1, ter um protótipo de Le Mans com o mesmo powertrain permitiria que a Ferrari fizesse testes ilimitados de resistência e rendimento do motor para aplicar os resultados na Fórmula 1. A Mercedes, por exemplo, está desenvolvendo seu motor usando meio chassi de F1 com ventiladores nos sidepods e apoiado em um dinamômetro em laboratório para simular os circuitos da temporada.
Ao longo do ano passado, houve vários boatos sobre o retorno da Ferrari a Le Mans, e Luca di Montezemolo, afirmou na festa de natal da marca que, apesar de ver a 458 GT vencendo corridas no WEC, ele gostaria de ver um carro da Ferrari na categoria de topo, a LMP1, mas não confirmou que há um projeto em andamento
Na semana passada, o protótipo misterioso do vídeo foi flagrado novamente em testes (as fotos que ilustram o post), mas desta vez em Mugello. As fotos mostram o carro em vários ângulos, e em nenhum deles o protótipo se parece com algo capaz de disputar (e vencer) a categoria LMP1 do WEC, embora exista a possibilidade de se tratar de uma fase bem inicial do carro.
Mas isso vai mesmo acontecer? O diretor de automobilismo da marca, Antonello Coletta, quando questionado sobre a volta da Ferrari a Le Mans, deu uma resposta bem evasiva: “Não podemos dizer que a Ferrari vai voltar à LMP1, mas também não podemos dizer que a Ferrari não vai voltar à LMP1. Também não se pode dizer se a nossa visão é para 2015, 2016 ou para mais tarde“.
Isso tudo nos leva a uma segunda hipótese sobre tudo isso: talvez a Ferrari não pretenda realmente participar do WEC e tenha apenas criado todos esses boatos para desenvolver o motor de F1 livremente. Especialmente quando se pensa no longo prazo mencionado por Coletta e nas queixas da Ferrari sobre a liberdade de testes que a Honda terá ao longo deste ano antes de equipar os McLaren em 2015.
Claro, tudo isso é apenas uma suposição. Pode ser ainda que a Ferrari pretenda realmente voltar ao endurance também procurando uma forma de desenvolver tecnologias híbridas para seus futuros carros de rua, como está fazendo a Porsche — e claro, sem deixar o desenvolvimento do powertrain da F1 de lado.
Independentemente do que ela esteja fazendo com este protótipo misterioso, tudo o que se falou dele até agora são meras especulações, e parece que não conheceremos a verdade tão cedo — ao menos não antes da temporada de 2016 do WEC.