Sabe qual é um dos lances mais bacanas do automobilismo? A forma como, em determinado momento, alguém sempre pensa em um desafio maior. É claro que, com as velocidades cada vez maiores e a questão ambiental, o regulamento fica cada vez mais restrito em termos de potência e emissões de poluentes — o que, para muita gente, acaba matando um pouco da emoção e do tesão de assistir a uma corrida de automóveis, mas isso não importa nesse momento.
Dizem que o automobilismo começou assim que foi fabricado o segundo carro da história, certo? Pois a partir daí, o que se viu por décadas a fio foi uma busca constante pelo desafio. Se não, como você acha que surgiu a ideia de acelerar na terra, no gelo e na lama, e não apenas no asfalto? De colocar um monte de carros para correr ao longo de 24 horas? De construir um circuito absurdo como Nürburgring Nordschleife, com seus mais de 20 km e 73 curvas?
Aliás, isto não vale apenas para o automobilismo, e sim para as corridas em geral. E a gente está dizendo isto porque, aparentemente, há uma maneira de transformar o desafio das corridas de moto ainda maior: colocando sidecars nelas. Acredite: é loucura!
Os sidecars são uma das categorias do Tourist Trophy da Ilha de Man, sobre o qual até já falamos aqui. É uma corrida perigosíssima, que acontece todos os anos desde 1907 (parando apenas durante as duas Guerras Mundiais) e só não foi extinta por sua tradição e por causa dos próprios moradores da ilha, que veem o evento como parte de sua cultura e peça essencial na economia do lugar.
O circuito de rua se chama Snaefell Mountain Course e tem 60,73 km de extensão, mais de 200 curvas, muitas irregularidades no piso e trechos estreitos, com residências na beira do asfalto. Em média, dois pilotos morrem por ano no Tourist Trophy.
A verdade é que esse negócio de “mais insano” ou “menos insano” é relativo. Fica difícil dizer que há algo mais absurdo que chegar a 300 km/h no guidão de uma moto em Manx, contornando curvas e inclinando para os lados a uma velocidade inacreditável. No entanto, é óbvio que uma moto com um sidecar certamente torna as coisas mais difíceis em diversos aspectos.
Ainda que, teoricamente, um sidecar ajude na estabilidade de uma moto (afinal, é uma roda a mais), a verdade é que, em uma corrida, as coisas ficam mais complicadas para o piloto. Isto porque o piloto de um sidecar é, na prática, um lastro móvel, inclinando o corpo e influenciando toda a inércia nas curvas.
Toda a distribuição de peso do veículo é alterada a cada movimento do co-piloto — aliás, ele está ali unicamente para isso —, e existem motivos técnicos para que isto seja algo bom em um curva de alta, mas a verdade é que há diversos fatores que aumentam o desafio: a altura do co-piloto modifica o centro de gravidade da moto; seu tempo de reação em uma curva, por menor que seja, não é imediato; e a própria assimetria do conjunto moto + sidecar acabam tornando a pilotagem um processo muito mais complexo.
No fim das contas, só conseguimos imaginar as corridas de sidecars como algo que existe simplesmente pelo desafio — “pilotar uma moto sozinho é fácil… quero ver em dupla!”, alguém deve ter pensado. Ou não. De qualquer forma, as coisas ficam bem feias quando rola um acidente:
Vendo esta insanidade toda, fica até meio difícil acreditar na origem bem mais pacata dos sidecars. Diz-se que eles nasceram na França, em 1893. Um jornal havia oferecido um prêmio a quem inventasse a melhor maneira de levar um passageiro em uma bicicleta. Um homem chamado M. Bertoux foi o vencedor com a ideia do sidecar — um assento extra, com carenagem e uma roda, preso à bike pela lateral. A patente, no entanto, data de 1903, e pertence a um britânico chamado W. J. Graham, que começou a produzir sidecars em série naquele ano.
Com o passar do tempo, os sidecars foram evoluindo — as fabricantes desenvolveram sistemas articulados, com amortecedores e molas, que tornavam o rodar mais suave e confortável tanto para o piloto da moto quanto para o passageiro do sidecar. Aliás, entre estas fabricantes está a Jaguar, que foi fundada em 1922 como Swallow Sidecar Company.
Os sidecars foram até usados por exércitos de diversos países durante as duas Guerras Mundiais — enquanto o piloto fazia seu trabalho, outro soldado armado ia no sidecar. Na maioria dos casos, o sidecar era equipado com um diferencial, melhorando sua capacidade off-road.
Agora, existe outro tipo de sidecar que você talvez não conheça. É este aqui:
Isto é um sidecar, drink que leva conhaque, triple sec (uma espécie de licor de laranja) e suco de limão, servido em uma taça sem gelo.
As primeiras receitas do sidecar datam do fim da Primeira Guerra Mundial e, segundo a lenda, o drink tem este nome exatamente por que era o favorito dos soldados que pilotavam motos equipadas com sidecars. Por razões óbvias, no entanto não recomendamos o consumo do sidecar antes de pilotar um sidecar. Beleza?