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Carros Antigos História

Spyker 60 HP: conheça o primeiro 4×4 com motor a combustão da história

Responda rápido: qual foi o primeiro carro com tração nas quatro rodas já feito? Se você é um cara informado, está com a resposta na ponta da língua – foi o Lohner-Porsche, projetado e construído por Ferdinand Porsche em 1901. O Lohner-Porsche é frequentemente citado como o primeiro 4×4 do planeta e, apesar de ter quase 120 anos de idade, ele trazia uma configuração bastante atual: quatro motores elétricos, um em cada roda, com baterias e um gerador a gasolina.

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Mas o conceito do Lohner-Porsche está apenas começando a ser explorado em massa pela indústria automotiva, em superesportivos elétricos e estudos de mobilidade alternativa. Ao longo dos séculos, a evolução dos 4×4 aconteceu de forma distinta, com os jipes criados na década de 1940 – veículos mais tradicionais, com motor a combustão, câmbio e diferenciais.

“E qual foi o primeiro carro a trazer esta configuração?”, talvez você se pergunte. E a resposta é uma só: o Spyker 60 HP, de 1903.

Talvez você lembre da holandesa Spyker por seus esportivos exóticos, de fabricação artesanal, com design ousado e motor V8 Audi. Eles são conhecidos pelo estilo moderno por fora e retrô por dentro, repleto de couro e joalheria – e detalhes inusitados como o mecanismo exposto do trambulador. A Spyker quase foi à falência em 2015, recuperando-se a duras penas e retornando à fabricação de automóveis com a ajuda de alguns investidores.

Mas a atual Spyker, que foi fundada em 1999, não tem relação com a companhia original, estabelecida em 1880 e extinta em 1926 – exceto pelo nome e pelo emblema, sobre os quais comprou os direitos. A antiga Spyker começou como uma fabricante de carruagens, fundada pelos irmãos  Hendrik e Jacobus Spijker, de Amsterdã. Seu trabalho era tão bom que, em 1898, a Spyker recebeu da família real holandesa a encomenda para construir uma carruagem folheada a ouro. A chamada Golden Koets é utilizada até hoje em cerimônias reais. Não muito tempo depois, a Spyker começou a fabricar automóveis, realizando uma migração comum naquela época.

Os primeiros carros da Spyker, datados de 1900, não eram muito diferentes de diversos outros modelos fabricados no início do século 20 – “calhambeques” com para-lamas destacados, faróis a querosene e motores de dois cilindros  opostoscom potência entre 3 e 5 cv. Dois anos depois, em 1902, a Spyker introduziu seu primeiro modelo com motor arrefecido a água, com 6 cv. Nos anos seguintes, carros com motores maiores, de quatro cilindros e potência entre 14 e 20 cv, começaram a ser fabricados. Eles tinham como característica marcante o radiador perfeitamente circular – que é a melhor forma de identificar um Spyker da época.

Eles não eram velozes, mas eram suficientes para necessidades básicas de transporte diário. No entanto, como você já deve saber, no momento em que surgiram os carros, surgiram também as corridas de carro. E a Spyker não ficou de fora.

Em 1903 foi anunciada uma grande corrida de longa duração, a ser realizada nas estradas que ligavam Paris, na França, a Madrid, na Espanha. A Spyker contratou um novo engenheiro, o belga Joseph Valentin Laviolette, para a equipe – e ele seria o principal responsável por projetar um esportivo que fosse capaz de vencer aquela corrida: o Spyker 60 HP.

Como seu nome diz, o Spyker 60 HP tinha 60 cv – e um motor de seis cilindros em linha. É amplamente aceito que o motor, que deslocava 8,7 litros (8.676 cm³, mais precisamente) foi o primeiro com esta configuração a ser colocado em um automóvel. Com diâmetro e curso de 120×128 mm, duas válvulas por cilindro e comando no bloco, o motor era gigantesco e não girava muito, mas era mais potente do que qualquer outro disponível na época.

Como se não bastasse o pioneirismo dos seis cilindros em linha, o Spyker 60 HP também foi o primeiro carro do mundo com tração nas quatro rodas e um sistema de transmissão convencional. O motor era ligado a um câmbio manual de quatro marchas que, por sua vez, era ligado às rodas por três diferenciais: um dianteiro, um central e um traseiro. Não muito diferente do que se vê hoje em dia.

Ah, vale lembrar: o Spyker 60 HP também é considerado o primeiro automóvel com freios nas quatro rodas – algo que era considerado desnecessário para uso nas ruas. Mas é fácil entender o motivo: nos primeiros anos do século 20, ainda era comum que os carros tivessem freios apenas nas rodas motrizes. Como as quatro rodas do Spyker 60 HP eram motrizes… ele ganhou freios em todas elas.

É claro que, com tamanha inovação, o carro levou bastante tempo para ficar pronto – e assim, a Spyker não conseguiu terminá-lo a tempo da corrida, que estava marcada para o mês de maio de 1903. O Spyker 60 HP só ficou pronto em dezembro, a tempo de um evento de apresentação no Salão de Paris. Meses depois, ele foi exposto no Palácio de Cristal, em Londres, no Reino Unido.

O Spyker 60 HP não correu entre Paris e Madrid, mas participou de outros eventos por alguns anos antes de ser guardado em um dos depósitos da Spyker, onde ficou até 1926.

Naquele meio tempo, o motor seis-cilindros da Spyker começou a ser usado por outras fabricantes, como a Darracq e a Ford. Da mesma forma, logo os freios nas quatro rodas foram adotados em massa pela indústria. O que levou um pouco mais para ocorrer foi a adoção da tração nas quatro rodas para uso civil. Nos EUA, a americana Nash começou a produzir veículos de tração nas quatro rodas para uso do exército dos Estados Unidos durante a Primeira Guerra Mundial.

A própria Spyker, no período entre 1914 e 1918, deixou de lado a produção de automóveis para dedicar-se aos equipamentos bélicos, incluindo aviões de combate. Foi nesta época que a empresa adotou o emblema que é usado pela Spyker atual, com o motor radial e a hélice de um avião, e o slogan Nulla tenaci invia est via – algo como “Para os persistentes, nenhum caminho é impossível” em tradução livre.

Pouco depois da Primeira Guerra, a Spyker voltou a fabricar automóveis – incluindo o esportivo Spyker C1 Aerocoque, que foi um dos primeiros automóveis a demonstrar preocupação com a aerodinâmica da carroceria; e também o Syker C4 30/40 HP, que tinha perfil em forma de gota e um seis-em-linha Maybach de 5,7 litros. Mas, como era comum entre as fabricantes de carros naquele período, a Spyker começou a sofrer com problemas financeiros, sendo obrigada a pedir falência e leiloar todo o seu patrimônio em 1926. Incluindo o 60 HP.

O carro ficou desaparecido por décadas antes de, em 2003, ser trazido de volta aos olhos do público e restaurado. Sua estreia aconteceu no Concours D’Elegance Pebble Beach daquele ano e, depois, o carro foi levado para o Stichting Nationaal Automobielmuseum, na cidade de Wassenaar, Holanda.