Tudo o que vimos no post anterior se refere à geometria fixa de um turbo. E eu acho que depois de tanta conversa vocês já perceberam o jogo de perde e ganha quando temos que escolher um turbo. Pequeno demais ele te dá ganhos em baixas rotações, mas estrangula seu motor nas faixas mais altas. Grande demais ele cria um monstro devorador de tacômetros, mas é completamente preguiçoso em baixas rotações.
Para resolver esse dilema os fabricantes criaram as turbinas de geometria variável (TGV). Em uma turbina de geometria fixa existe uma abertura em forma de bocal que se estende por quase todo o raio da voluta, e ao contrário do difusor que encontramos na voluta do compressor, este bocal transforma a energia pneumática dos gases de escape em cinética e é isso que move o rotor. Numa TGV existem lâminas móveis que executam a função de bocais. No vídeo acima podemos ver a pessoa acionando manualmente as lâminas, variando o diâmetro da abertura e consequentemente a geometria do bocal. Daí o termo geometria variável.
Nas rotações mais baixas os gases têm menos energia, então as lâminas se fecham formando bocais de menor diâmetro. Como podemos ver na imagem acima, o ângulo formado pelos boçais faz o fluxo adentrar de modo tangencial, consequentemente encontrar as lâminas do rotor num ângulo mais próximo do perpendicular. Isso gera uma grande quantidade de força aplicada. Nas rotações mais altas os vanes se abrem, aumentando o diâmetro dos bocais e tornando a entrada do fluxo mais paralela ao rotor. I
sso aumenta a capacidade e vazão da turbina. Entre esses dois pontos de ângulo máximo e mínimo, qualquer valor pode ser ajustado através do atuador. Por conta dessa flexibilidade de controle, esse tipo de turbo dispensa o uso de wastegate para o controle. Mas as TGV tinham uma aplicação restrita, normalmente a motores Diesel, pois os materiais usados para aplicações Otto têm custo alto. Bem, tinham. Pois como o Dalmo apresentou bem aqui, a Volkswagen pretende massificar a aplicação dessas turbinas.
Como alternativa às TGV para aplicação em motores Otto, os fabricantes passaram a produzir turbos com wastegates controladas eletronicamente. Essa é a grande diferença para o desempenho dos modernos motores downsized. A central de gerenciamento eletrônico do motor também faz o ajuste de abertura da válvula. Assim o fluxo e pressão de trabalho do turbocompressor são ajustados de acordo com a demanda, e não somente pela pressão de descarga do compressor, como acontece nos turbos convencionais.
Esses turbos normalmente são pequenos, se considerarmos sua geometria em relação ao deslocamento dos motores nos quais eles são instalados. Isso se deve a necessidade de respostas rápidas mesmo nas rotações mais baixas, além da produção de uma pressão significa desde o início da operação. Mas nós sabemos que turbos pequenos são restritivos para as rotações mais altas. A solução para isso é permitir que a válvula controle ativamente o fluxo. Mantendo assim a tão conhecida plataforma de torque que vemos nos gráficos de performance dos motores downsized. Abaixo vemos um gráfico que demonstra o modo de controle do turbo usado num motor TSI.
A wastegate se mantém fechada na região vermelha do gráfico, para que o turbo alcance a pressão máxima imediatamente. Na área verde a válvula se mantém aberta, visando a economia de combustível e baixas emissões, já que a demanda de potência é baixa. Na área amarela a ECU mantém o modo de controle em abertura parcial, avaliando rotação, carga, pressão de admissão e principalmente a posição do pedal do acelerador. A posição é a informação mestra, pois a sua mudança determina todo o restante. Por exemplo, se estivermos em velocidade de cruzeiro a 3.000 rotações com o pedal a 30% de abertura, a wastegate estará aberta. Mas se repentinamente você afunda o pedal da direita, a válvula se fechará imediatamente e ficará nessa posição até que a pressão máxima seja alcançada, ou até você aliviar o pedal.
Por conta do formato plano da válvula e pelo atuador pneumático, a ocorrência de flutuação quando esta se aproximava da abertura mínima criava grandes dificuldades no controle de fluxo. Então os fabricantes desenvolveram um atuador elétrico com alto torque e precisão para movimentar a wastegate décimos de milímetro sem erros. Assim a confiabilidade e controle aumentaram. Por isso temos tanto sucesso nesses novos motores turbo.
Razão de compressão, eficiência e tudo sobre os mapas
Agora chegamos ao bicho papão que confunde muita gente. Os mapas de eficiência dos compressores. Esses mapas trazem informações essenciais para a escolha do turbo. Abaixo vamos detalhar cada informação e sua importância:
Razão de compressão: O eixo Y mostra a razão entre as pressões de entrada e saída do compressor. A razão de compressão mostra a quantidade de energia transferida para o ar comprimido. O cálculo é simples, divide-se a pressão de descarga pela pressão de admissão. Porém os valores devem ser absolutos, ou seja, devemos considerar a medição a partir do vácuo completo. Para explicar de forma mais simples pressão absoluta não considera o vácuo como pressão negativa.
Por exemplo, a pressão atmosférica medida de forma absoluta é de 101.325 Quilopascal, lembrem-se que a pressão atmosférica muda de acordo com a altitude, por isso consulte sempre a pressão relativa à altitude onde você vive. Então se tivermos um manômetro indicando uma pressão no coletor de 75 kPa, o valor absoluto é de 176.325 kPa. O valor da pressão de admissão depende da restrição que encontramos, mas a queda de pressão média é de 10 kPa, assim demos considerar uma pressão de admissão de 91.325 kPa. Considerando os valores que citamos aqui, vamos calcular a razão de compressão.
Vazão mássica corrigida: O eixo X mostra a vazão mássica, que é a quantidade de ar em massa que é despejada na descarga em função do tempo. Podemos encontrar a massa em gramas, quilogramas e libras. O tempo normalmente é exibido em segundos ou minutos. Mas porque a vazão é mássica e não volumétrica como é mais comum? Por conta de um princípio chamado balanço de massas. Ele diz que a massa que entra em uma determinada máquina ou processo é a mesma que deve sair, caso nada mais seja acrescentado durante o trajeto. Ou seja, a massa de ar que entra no compressor é a mesma que deve sair.
Já se considerarmos o volume que entra no compressor, ele não é o mesmo na saída, pois este é comprimido. Por exemplo se temos um volume de dois metros cúbicos sob pressão atmosférica, e comprimimos esse volume a duas atmosferas, o volume se reduzirá a um metro cúbico. Por isso a vazão mássica apresenta valores mais precisos para a análise do mapa. Além disso, os valores de vazão encontrados facilitam o ajuste da quantidade de combustível que iremos adicionar à mistura posteriormente.
Linhas de velocidade: As linhas destacadas em azul mostram a velocidade de operação do compressor. A última linha desenhada normalmente mostra o limite de velocidade recomendado para aquele rotor. Caso os pontos operacionais calculados estejam entre as linhas, a velocidade daquele ponto pode ser calculada por interpolação.
Ilhas de eficiência: Elas representam os limites de eficiência do compressor. Ela diz a quantidade de energia é transformada em calor, e calor nesse caso significa desperdício de energia, pois o objetivo do compressor é transformar a energia recebida em pressão. Quanto mais baixo for o valor apresentado menor será a eficiência do compressor e consequentemente maior será a temperatura de descarga do compressor. Para calcular a temperatura ideal, utilizamos a fórmula abaixo. Considerando a eficiência de 1 (ou 100%).
Para a temperatura real devemos considerar o valor da ilha de eficiência onde o ponto operacional se encontra. Por exemplo, o nosso ponto de operação (em azul) está numa ilha com 0,74 de eficiência, então consideramos o valor de є = 74%. Então:
Linha de surge: A linha destacada em vermelho determina a vazão mínima para uma dada razão de compressão ou se você preferir uma razão de compressão máxima para uma determinada vazão. Como já explicamos lá no começo, o surge é uma zona de instabilidade de fluxo que tende à reversão. Compressores grandes demais para a capacidade do motor ou restrições ao fluxo podem levar o compressor ao surge. Por tanto os pontos operacionais devem estar o mais distante possível da linha de surge. Quanto mais à esquerda o centro maior o risco para o compressor.
Linha de estrangulamento: Também conhecida como choke line ou Stonewall line, é a linha que determina o limite de vazão do compressor. Esse limite se deve à resistência ao escoamento que é oferecido pelas paredes da voluta. Quanto maior a velocidade maior a resistência. Então a pressão deve ser elevada (ou seja, a quantidade de energia transferida) para que a vazão aumente. Porém há um limite para o escoamento em que mesmo aumentando a quantidade de energia transferida a velocidade não aumenta. Este é o limite de escoamento sônico.
Observem no mapa a linha de vazão se estende até um ponto, acima dela as linhas de velocidade do compressor continuam a crescer, mas a vazão (e consequentemente a velocidade do fluxo) não aumenta. Então se não há aumento de vazão não há aumento de potência para o motor. Fazer o compressor operar próximo ao limite de vazão só traz riscos, pois o rotor sofre com uma grande força centrífuga, a eficiência de compressão cai devido ao atrito do ar com as lâminas.
Calculando os pontos de operação
Agora pegamos as agulhas, velas, caldeirão, asa de morcego, perna de sapo, olho de lesma, jogamos num caldeirão, riscamos umas linhas no chão, dizemos uns feitiços vodu. E voilà, temos o turbo correto para os nossos motores. Bom, escolher um turbo é um pouco mais trabalhoso, mas ao menos você não vai ter que aprender magia negra. Pois como dizia o pica-pau. Vodu é pra jacu!
Para que possamos determinar qual turbo melhor atende as nossas necessidades, antes de qualquer coisa temos que ser realistas e crus quanto ao uso do projeto. Se tivermos um projeto de uso diário, que enfrenta o trânsito das cidades e eventualmente pega a estrada num feriado onde se preza por boas respostas até as faixas medianas e até a economia de combustível. Ou se queremos um carro misto, que vá andar em provas para a diversão de quem está atrás do volante. Há ainda os serious business, dedicados exclusivamente às pistas, a uma categoria específica. Temos que dar grande peso a essa questão, pois a base de todo esse trabalho é a satisfação de quem aperta o pedal direito.
Como em qualquer cálculo numérico nós vamos precisar dos dados de entrada. E estes muitas vezes também precisam de cálculos preliminares. Então vou listar aqui o que precisamos:
- Rotação máxima do motor (rpm);
- Deslocamento do motor (normalmente encontrado em litros, divida por mil para encontrar o valor em m3);
- A potência desejada (CV);
- O torque original do motor e a rotação na qual ele ocorre (N.m);
- Temperatura e pressão do local onde normalmente o veículo será usado. (Converta o valor de mmHg para kPa divida o valor encontrado por 7,5 e para transformar as escalas de temperatura de Celcius para Kelvin, some 273,15 ao valor encontrado);
Tendo estes dados precisamos dos seguintes cálculos preliminares:
- Temperatura de admissão do motor (K);
A temperatura de admissão influencia diretamente a temperatura de descarga. Então ela é essencial para o cálculo de vazão para a turbina. Caso seu projeto não tenha um intercooler, a temperatura de admissão será muito próxima da temperatura de descarga do compressor. O cálculo dessa temperatura pode ser feito através da fórmula apresentada no item ilhas de eficiência mais acima. Mas para que tenhamos um ponto de partida mais fácil. A faixa de temperatura da descarga e um compressor centrífugo fica entre 75° C e 170°C. Com um trocador de calor (intercooler) essa faixa cai, e a queda vai depender da capacidade e eficiência do trocador, mas os valores podem variar entre 42°C e 80°C. Lembrando que os valores devem ser lançados na escala Kelvin.
- Eficiência volumétrica do motor (є);
Devido a restrições de escoamento o cilindro nunca tem seu volume totalmente preenchido durante a aspiração natural. E essa deficiência é medida pela relação entre o valor ideal e o real de preenchimento do cilindro. Como alguns de vocês devem saber, o pico de torque de um motor naturalmente aspirado ocorre no momento em que o motor tem sua maior pressão dentro do cilindro.
A eficiência volumétrica dos motores varia de acordo com o perfil de comando, geometria dos dutos, coletores, quantidade e diâmetro das válvulas. São muitos fatores, mas os valores típicos encontrados são os seguintes. De 80% a 89% para motores com duas válvulas por cilindro e de 90% a 99% para motores com quatro válvulas por cilindro, ambos em condição OEM.
Caso você seja “chato” e queira saber qual é a eficiência máxima do seu motor (eu sei cara, chutar números não é nada agradável nesses casos). Vamos fazer umas continhas aqui para descobrir o valor real.
Vamos partir de um motor quatro cilindros de aspiração natural com duas válvulas para admissão e duas para escape. Ele desloca 1998,8 cm³ e tem torque máximo de 187,8 N.m a 4250 rpm. Mas por que precisamos do pico de torque e da rotação na qual ele acontece? É simples gafanhoto. O pico de torque é o momento de maior força do motor e isso se deve a maior pressão dentro do cilindro como consequência da maior eficiência de preenchimento, a eficiência volumétrica. Então é este ponto que devemos calcular.
Vamos começar encontrando a potência do motor para o pico de torque:
Com a potência em mãos, agora precisamos do consumo específico indicado. Também conhecido como indicated fuel specific consuption, esse fator indica a quantidade de combustível consumido por hora para gerar uma quantidade de potência específica. E também é um dado preliminar necessário para encontrarmos os pontos operacionais do compressor. Para sabermos o seu valor vamos precisar estimar a eficiência térmica do motor. Esta nos diz o quanto da energia química do combustível é transformada em trabalho. Motores de ciclo Otto modernos naturalmente aspirados têm uma eficiência próxima de 0,31. Além da eficiência precisamos também do poder calorífico inferior (lower heating value), que é a quantidade de energia química contida no combustível. Os valores para os combustíveis mais comuns são, 7,69 kW/kg para o Etanol, 12 kW/kg para a Gasolina e os mesmos 12 kW/kg para o Diesel. Então:
Tendo o consumo específico, podemos agora calcular a vazão mássica. Pois a massa de combustível tem dependência direta da massa de ar admitida. E essa relação pode ser medida através da razão ar combustível. Vejam abaixo a tabela de relações para cada combustível.
A relação ar combustível normalmente aplicada pelos fabricantes para a máxima potência é de 0,85. Então para o nosso cálculo consideraremos esse valor de Lambda e a gasolina como combustível. Sendo assim:
Sabendo a vazão mássica podemos encontrar a vazão volumétrica utilizando a densidade do ar. Como o ar admitido pelo motor sofre aquecimento, consideraremos uma temperatura de admissão de 40°C e pressão nesse caso. Então:
Agora precisamos saber a vazão volumétrica máxima para esse motor. Para isso devemos considerar a eficiência volumétrica máxima teórica como 100%. Além disso, temos que determinar se o nosso motor é dois ou quatro tempos, pois a quantidade de revoluções para completar o ciclo influencia nos cálculos. Lembrando que o motor quatro tempos gira duas vezes a cada ciclo, enquanto os dois tempos gira apenas uma vez. Assim para um motor 4T n= 2 e para um 2T n= 1. Então:
Agora com as duas vazões em mãos, finalmente podemos chegar à eficiência volumétrica indicada. Basta dividir a vazão indicada pela máxima.
Assim temos o valor muito próximo da eficiência real do motor em questão.
Mas vocês devem estar se perguntando. Pra que tantos cálculos, só pra encontrar a eficiência de um motor? Eu sei pessoal que são muitas informações. Mas elas são essenciais quando queremos dados apurados para um projeto. E o que estamos fazendo aqui é um exercício de raciocínio para entender que a escolha de um turbo não é uma coisa simples, baseada somente em poucas informações. Para vocês terem uma ideia do quão complicado é determinar a performance vamos direto aos casos mais extremos.
Peguem o seu balde de pipoca e dediquem quase duas horas de seu tempo para assistir a esse programa épico feito pelo Chanel 4. Peço desculpas aos que não entendem o inglês. Não achei uma versão dublada, ou ao menos legendada. Mas não deixem de assistir, pois o programa trata da saga da Cosworth em desenvolver um motor sobrealimentado para a Lola Hass na F1. O chefe Barata já havia feito uma bela matéria sobre esses dois vídeos. E eu os trago aqui de volta para mostrar um pequeno detalhe que me chamou muito a atenção.
Por favor, vão até os 11:46 minutos, onde o engenheiro de testes da a partida no motor. O narrador fala sobre as características do motor e logo em seguida ressalta o plenum de admissão gigante, que serve para equalizar a distribuição de ar entre os cilindros. Ele segue falando sobre o coletor de escape que é sintonizado, para que os pulsos de escape sejam aproveitados também. Ele continua, até que aos 13:57 minutos Alan Morris reaparece informando números aos seu assistente, que anota tudo em uma planilha. Os valores podem parecer aleatórios, mas são registros de cada variável do motor.
Aos 14:30 minutos o narrador começa a descrever cada anotação, carga do motor, pressão de blow by, pressão de escape (contrapressão), temperatura de admissão e exatamente aos 15:03 ele diz o tempo que cada gota de combustível leva para cair na correte de ar 4,92 milissegundos. Essa é a informação que eu gostaria que vocês observassem. Ela era essencial para que eles determinassem o consumo específico de combustível desse motor. Então pessoal, vejam o quanto os dados precisos são importantes. Claro que não chegaremos a esse caso, mas ele serve para que vocês tenham a noção da real importância desses cálculos.
Como eu não poderia deixar passar, acima está a segunda parte do vídeo. Quando o novo motor está pronto e o controle eletrônico é a grande cereja desse bolo tecnológico.
Bem, voltando à escolha do turbo em si. Agora que temos todos os dados preliminares podemos encontrar cada ponto operacional do compressor. Para chegarmos a estes valores existem diversos modelos de cálculo, com maior ou menor precisão. Mas para evitar que o entendimento seja prejudicado eu prefiro optar pela solução simples, que tenha uma boa aproximação dos resultados mais precisos. Para as mentes mais curiosas ou que já sejam iniciadas no mundo das turbomáquinas eu aconselho uma lida neste livro.
O primeiro ponto que devemos encontrar é o que determina o limite operacional do motor. A partir deste ponto determinaremos todos os outros assim como podemos observar se o turbo é pequeno demais para as nossas necessidades. Como estamos lidando com um motor que será sobrealimentado, não podemos considerar o valor exato de CEI que encontramos para o motor OEM. O CEI deve ter seu valor acrescido de 45 a 50% devido a mudança de combustível e a necessidade de combustível extra para afastar o risco de pré detonação, assim passamos do valor de 0,252 kg/kWh para 0,378 kg/kWh. Vamos colocar nosso alvo de potência em 250 cavalos, que convertidos equivalem a 186,4 kW. Além disso, também consideraremos que nosso combustível passou a ser o Etanol e que o sistema possui um intercooler com eficiência 0,76, por isso a temperatura cai dos 424,15K para 348,15K. Dessa forma:
Tendo a vazão mássica do primeiro ponto, agora temos que encontrar a pressão absoluta necessária para o motor alcançar a potência que desejamos. A forma mais simples de calcular e que nos permite uma boa aproximação dos valores reais é lançar mão da fórmula dos gases ideais, e ajustarmos esta as nossas necessidades. Assim:
Observem que o número de mols n foi substituído pela vazão mássica ṁ, que acontecem em função do tempo. Essa escolha se torna correta quando usamos no divisor uma variável que também existe em função do tempo, a velocidade angular (RPM), assim o tempo sai da equação tornando o valor de pressão instantâneo.
Agora vamos calcular a razão de compressão para finalmente plotar o dado no mapa. Vamos considerar que há uma restrição de 10 kPa e que estamos ao nível do mar. Então a pressão de admissão será de 91,32 kPa. Dessa forma a razão de compressão é de:
Ok agora sabemos que o compressor atende a vazão máxima. Mas e o restante da faixa de operação? Afinal de contas ninguém vai andar o tempo todo cortando giro. Vamos definir então um ponto a cada mil rotações até chegarmos ao limite inferior de 2500 RPM, sendo que os três primeiros corresponderão à faixa controlada pela wastegate mantendo a mesma pressão de trabalho. Mais uma vez, nos basearemos na equação de Clapeyron. Nesse caso uma variável em função do tempo é inserida somente no dividendo, para que a massa instantânea se transforme em vazão. Dessa forma temos:
Observem que a temperatura de descarga cai para o segundo ponto. Isso se deve ao deslocamento deste para uma área com maior eficiência de compressão. Plotando o segundo ponto no mapa já podemos traçar a linha de interpolação entre eles. E agora vamos ao terceiro ponto:
O quarto ponto nos leva a quase metade da faixa de rotações e obviamente nesse ponto a nossa pressão começa a cair. Na verdade estamos em ascendência, pois o cálculo é feito de trás pra frente. Assim temos que recalcular a razão de compressão e posteriormente a vazão. Vamos considerar que a partir desse ponto a razão de compressão caia linearmente com taxa de 0,1. Ou seja, para este quarto ponto a taxa de compressão é 1,47.
A temperatura de admissão aumenta porque saímos da ilha de maior eficiência. Observem também que a eficiência volumétrica do motor caiu. Isso é normal, pois a capacidade de “respirar” do motor é mais baixa que no pico de torque. Vamos ao quinto ponto:
Encerramos a plotagem dos pontos de operação e o quinto ponto ficou pouco antes da linha de surge. Esse ponto combinado à distância do primeiro em relação à linha de choke mostra que o compressor escolhido é grande demais para o nosso motor. Por isso é recomendável procurar outro menor. Provavelmente um modelo abaixo do dono deste mapa que analisamos.
Caso você seja como esse cara aqui e não queira calcular tudo que foi dito acima, a Borgwarner disponibiliza uma página para você inserir os dados e encontrar os pontos. Ele até plota os pontos nos mapas da Borgwarner é claro.
Novas tecnologias dos turbos
Além das TGV que são parte de uma tecnologia já solidificada o que podemos esperar para o futuro dos turbos? A F1 como sempre é a precursora do que veremos nas ruas. E nisso eu estou falando dos turbos híbridos com sistema de recuperação de energia térmica. Este sistema associado à recuperação cinética já usada nos modelos atuais permitirá não só ganhos em eficiência como também em redução do lag. A magneti Marelli apresentou em 2014 o modelo de turbo que seria utilizado naquela temporada, onde o motor elétrico se integrava ao eixo entre a turbina e o gerador.
Em 2015 a Mercedes – Benz trouxe uma inovação para esta filosofia. O eixo do turbo foi ainda mais alongado. Dessa forma a turbina foi posicionada atrás do motor e o compressor à frente e entre as bancadas de cabeçote ficou a unidade de recuperação de energia térmica. Essa inovação trouxe grandes ganhos em distribuição de peso e aerodinâmica.
Mas a grande surpresa ficou por conta da McLaren e seu motor Honda RA615H. Esse motor era mais compacto em relação aos outros e declarado mais potente que alguns rivais. Só que o mais estranho nele é que, o compressor não era visível. A partir desse ponto jornalistas especializados, engenheiros e claro inúmeros espectadores começaram a especular sobre as características daquele turbocompressor. E grande parte das teorias convergiu para um ponto.
Uma turbina radial combinada a um compressor axial. Esse tipo de compressor é o mesmo usado em turbinas de aviões a jato, onde diversos rotores são combinados comprimindo e elevando a pressão do ar gradualmente. Da mesma forma que o compressor radial, essa elevação ocorre pela transformação de energia cinética em pneumática. Observem o gráfico abaixo para entender o funcionamento de um compressor desse tipo.
Vejam que a velocidade aumenta e diminui a cada estágio, enquanto a pressão (e consequentemente a temperatura) aumenta constantemente. O design mais compacto trouxe ganhos para a Mclaren da mesma forma que a Mercedes os obteve. Mas há outras vantagens possíveis ainda. Como o controle do volume de ar admitido pela utilização de estatores variáveis. Como eles temos um compressor de geometria variável, que funciona da mesma forma que a turbina analisada mais acima. Outra vantagem é a menor inércia rotativa do conjunto, já que este tem um raio menor que um compressor radial. Tudo isso se reflete num menor tempo de resposta do turbo.
Mas como no mundo real não existem somente vantagens. A quantidade de partes móveis aumenta a complexidade do compressor, o que o deixa mais suscetível a quebras. O maior comprimento do eixo aumenta a quantidade de mancais para a sua suportação. Por esse motivo esse tipo de turbo não é muito comum.
Bom pessoal, vamos ficando por aqui nesse curtíssimo papo! Sério peço desculpas a vocês pelo texto tão longo. Mas o assunto realmente merecia ser esmiuçado pela relevância do turbo para os dias de hoje. Além disso, grande parte dos conceitos que vimos aqui servem como base para os outros meios de sobrealimentação. Que por falar neles o próximo papo dedicaremos aos superchargers e compressores centrífugos. Prometo ser mais sucinto no assunto, a não ser que vocês tenham gostado dessa dose cavalar de informações. Então até o próximo encontro!