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Car Culture

Vantablack: como funciona a “tinta” preta mais escura que existe?

Há alguns dias a BMW apresentou o conceito X6 Vantablack, um exemplar que foi pintado usando um pigmento de mesmo nome que é considerado o material mais escuro que existe. O carro parece até uma sombra no formato do crossover, como se alguém tivesse feito uma montagem no Photoshop apagando a carroceria e mantendo faróis, lanternas, grades e rodas “normais”.

Mas… como o Vantablack faz isto? Ou melhor, o que é esse tal Vantablack?

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O Vantablack é um revestimento capaz de absorver 99,96% da luz que incide sobre ele. Não se trata de uma tinta ou pigmento, mas carbono puro. O segredo não está na composição do material, mas na forma como ele é depositado sobre a superfície.

O material foi desenvolvido pelo Laboratório Nacional de Física do Reino Unido em 2006, e consiste em uma “floresta” de nanotubos de carbono, cultivada sobre uma superfície usando um processo chamado deposição de vapor químico. Em uma câmara selada de baixa pressão, o gás carbônico é aquecido a uma temperatura de 400°C. Então, o carbono puro começa a se depositar sobre a superfície desejada (ou substrato).

O resultado é uma camada de nanotubos de carbono alinhados verticalmente – aliás, é isto que significa “VANTA”: vertically aligned nanotubes array. “Black”, obviamente, você já sabe o que quer dizer. Os nanotubos são verdadeiramente minúsculos, medindo 20 nanômetros (cerca de 3.500 vezes mais finos que um fio de cabelo) por algo entre 14 e 50 mícrons. Um nanômetro, para se ter ideia, corresponde a 0.001 mícron.

Vantablack em um microscópio, ampliado em mais de 4.000x

A NASA já havia desenvolvido um material similar anos antes, porém ele só podia ser criado a temperaturas de pelo menos 750°C. Como precisa de uma temperatura mais baixa para ser feito, o Vantablack é mais vantajoso em termos de custo, pois pode ser aplicado sobre materiais menos resistentes ao calor.

E como ele funciona? É relativamente simples: por conta da cor e do arranjo dos nanotubos de carbono, a maior parte da luz que atinge um material coberto pelo Vantablack fica “presa” – os fótons (partículas de luz) não refletem, como ocorre com a maioria dos materiais. Como já dissemos, cerca de 99,96% da luz é absorvida pelo Vantablack. Os 0,04% restantes se dissipam em forma de calor.

Com isto, uma vez que determinada superfície é revestida com Vantablack, perdemos qualquer noção de profundidade ao observá-la – ela fica parecendo uma massa preta totalmente uniforme. Se você está tendo problemas para visualizar esta descrição, dê uma olhada na foto abaixo. Trata-se de uma folha de alumínio toda amassada, mas a parte que recebeu o Vantablack não possui qualquer tipo de dobra, vinco ou irregularidade. Talvez você consiga enxergar se prestar muita atenção, e se houver luz o suficiente. Mas, na maioria das vezes, o material coberto com Vantablack poderia ser confundido com uma sombra.

As aplicações para tal material são inúmeras, e muitas delas têm a ver com a exploração espacial. Por exemplo, o Vantablack pode ser utilizado para absorver luz indesejada e impedir que ela seja captada por telescópios, aumentando sua eficiência. Ele também pode ser usado para melhorar a eficiência de câmeras com infravermelho; aumentar a capacidade de absorção de calor de painéis solares; e até mesmo ser usado para esconder aviões de radares – os nanotubos de carbono são capazes de absorver também radiação não visível, como as micro-ondas usadas em radares.

Atualmente a marca Vantablack pertence a uma empresa britânica chamada Surrey NanoSystems LTD. O Vantablack começou a ser vendido em 2014 e, de lá para cá, a Surrey criou variações do Vantablack mais acessíveis e fáceis de aplicar usando um arranjo aleatório de nanotubos de carbono (em vez do arranjo vertical). Existe até mesmo uma tinta em spray que, embora não seja feita à base de nanotubos, produz efeito semelhante, sendo também feita à base de carbono. É bem provável que esta tenha sido a versão do Vantablack utilizada no o BMW X6, pois não seria viável submeter os painéis da carroceria a temperaturas tão elevadas.

Agora, por mais que isto tudo pareça extraordinário, saiba que na natureza existe ao menos um exemplo de fenômeno análogo ao Vantablack. Você conhece as aves-do-paraíso?

Nativas principalmente da Ásia e da Oceania, as aves-do-paraíso são um conjunto de cerca de 40 espécies de pássaros que, em comum, têm um dismorfismo sexual muito acentuado (machos e fêmeas são bem diferentes), sendo que o macho é dono de uma plumagem muito mais exuberante e colorida.

Esta decoração tem um papel importante na reprodução: para disputar as fêmeas, os machos fazem uma dança e posicionam suas penas de modo a adquirir um formato maior e mais chamativo. E, entre as aves-do-paraíso, há uma delas que parece pintada de Vantablack.

Trata-se do parotia whanesi, espécie que foi descoberta em 1906 e atualmente está em perigo de extinção, com menos de 10.000 adultos existentes. O que diferencia o parotia whanesi de outras aves-do-paraíso é sua plumagem preta que parece não refletir qualquer tipo de luz. Isto se dá pelo formato dos filamentos das penas – eles são alinhados verticalmente, como os nanotubos do Vantablack, e com isto conseguem absorver 99% da luz, dependendo do ângulo.

O mais interessante é que, no ritual de acasalamento, o parotia whanesi deixa esta característica especialmente evidente. Exibindo-se para uma fêmea, o macho abre as penas em volta do pescoço e as asas em uma silhueta oblonga. As peanas do peito e das laterais da cabeça do pássaro são azuis e cintilantes, e formam uma espécie de “carinha sorridente” sobre um fundo absurdamente preto, no qual o restante do pássaro “desaparece”. Note que de forma quase tão eficiente quanto o Vantablack criado pelo homem.