O nome HKS é um dos mais importantes da cena aftermarket japonesa. Além de ser fornecedora de alguns dos componentes de preparação melhor conceituados do mercado, eles possuem tradição em diferentes categorias de automobilismo, da arrancada ao time attack, e alguns de seus carros se tornaram ícones duradouros.
Um bom exemplo são os Skyline de arrancada que a HKS fez nos anos 1990 e 2000, que muitos aqui ficaram conhecendo graças a Gran Turismo – e alguns foram pegos desprevenidos, sem saber que aqueles carros simplesmente não foram feitos para fazer curvas. Aconteceu comigo…
De todo modo, os R32 e R33 de arrancada estão longe de serem os únicos Skyline especiais que a HKS fez naquela época. Mais precisamente, em 1993, quando a preparadora apresentou o HKS Zero-R. Embora fosse baseado no GT-R R32, o famoso Godzilla, o Zero-R era encarado pela HKS como um carro distinto – ao ponto de a empresa dar início ao processo de homologação do Zero-R como HKS, e não um Nissan, incluindo sua própria sequência de números de chassi — não muito diferente do que a RUF faz com os Porsche na Alemanha.
Havia motivos para que a HKS enxergasse o Zero-R como um produto próprio. Embora ele fosse instantaneamente reconhecível como um Skyline GT-R R32, havia uma quantidade considerável de modificações que modificavam a personalidade do carro.
Para começar, o motor. O seis-em-linha RB26DETT trocava o sistema biturbo por um único turbocompressor, em um dos primeiros kits do tipo desenvolvidos para o GT-R por uma preparadora; e tinha o deslocamento ampliado de 2.568 para 2.688 cm³ (de 2,6 litros para 2,7 litros, arredondando) através de um aumento no diâmetro dos cilindros de 86 mm para 88 mm, enquanto o curso dos pistões permanecia em 73,7 mm. O motor também recebia componentes internos forjados, de fabricação própria; comandos de admissão e escape feitos sob medida; e uma ECU própria. O resultado era um salto de 280 cv e 36,9 kgfm para pelo menos 450 cv e 50 kgfm de torque, segundo a própria HKS.
O sistema de tração integral ATTESA ganhava um sistema de controle de tração com calibragem exclusiva, e o carro ainda ganhava um sistema de suspensão com amortecedores ajustáveis do tipo coilover.
Os para-lamas alargados davam espaço suficiente para as rodas de 18×9 polegadas, calçadas com pneus 245/40 – medidas conservadoras hoje em dia, mas bastante ousadas em 1993.
A carroceria perdia os emblemas da Nissan, e tinha novos para-choques. O dianteiro tinha enormes faróis auxiliares redondos, que davam ao Zero-R ares de carro de rali (com um pouco de imaginação, claro). O traseiro era embutido nos para-lamas e mudava sensivelmente a postura do carro – a traseira parecia mais arrebitada e imponente. O para-choque em si era volumoso, pois escondia os abafadores do sistema de escape feito sob medida, deixando apenas as ponteiras de fora. O coletor, na verdade, era tão grande que obrigou a HKS a realocar o tanque de combustível, que foi parar no lugar dos bancos traseiros – sim, o HKS Zero-R é um dois-lugares, apenas.
O plano da HKS era fazer dez exemplares do Zero-R, mas foram feitos apenas quatro – depois disto, o projeto foi cancelado, sem muita explicação, em algum momento entre 1995 e 1997. Já havia até material promocional, incluindo um catálogo e vídeos de apresentação tipicamente noventistas.
De acordo com Dino Dalle Carbonare, do Speedhunters – que teve a chance de ir até o Japão há alguns anos e conferir de perto o exemplar do Zero-R em posse da HKS –, a razão para o cancelamento foi burocrática e econômica. Na hora de registrar os carros como modelos HKS, e não Nissan, a preparadora esbarrou na necessidade de fazer novos crash tests (algo que não seria necessário caso os carros fossem considerados exemplares modificados do Skyline). Sem a intenção de voltar atrás na denominação dos carros, a HKS simplesmente desistiu de seguir em frente.
A HKS guardou um dos carros para si, vendeu outros dois para clientes no Japão, e enviou o quarto Zero-R para o Sultão do Brunei – que provavelmente nunca sequer deu uma voltinha pelo quarteirão com seu exemplar.
Nos parece um tanto improvável que uma empresa grande e bem estabelecida como a HKS tenha se descuidado a ponto de “esquecer” a necessidade dos crash tests – deve haver algo mais nesta história. Uma possibilidade é que, com o estabelecimento do Japan NCAP, que começou a realizar crash tests no Japão a partir de 1995, a legislação para segurança automotiva no Japão tenha mudado, e a HKS tenha de fato sido pega de surpresa com a obrigatoriedade dos crash tests. Dino afirma que o custo unitário de cada exemplar saltou para mais de ¥ 13.000.000 com as despesas com testes de colisão, e isto acabou com a lucratividade do Zero-R. É claro que isto jamais foi confirmado de forma oficial pela HKS, e talvez nunca seja.
De todo modo, vamos avançar alguns anos no tempo. Em 2005, a HKS anunciou que estava revivendo o projeto – porém, para evitar novos imprevistos, os carros continuariam sendo, oficialmente, exemplares do GT-R R32.
E eles também eram diferentes tecnicamente. Segundo a preparadora, embora 450 cv fossem um bom número em 1995, os tempos já haviam mudado. Por isso, o novo Zero-R recebeu um motor RB28DETT, de 2,8 litros, e tornou a ser sobrealimentado por dois turbocompressores. O motor também foi equipado com um sistema de comando variável que não estava presente no Zero-R original.
Com isto, a potência passou de 450 cv para 600 cv – e, de acordo com a HKS, isto lhe rendeu um comportamento mais linear, com mais torque em baixa e capacidade para atingir os 300 km/h. O Zero-R renascido também foi equipado com alguns componentes NISMO, como suspensão e freios; e com peças do Skyline GT-R R34, como o banco do motorista e o sistema de transmissão – que, segundo a HKS, é mais robusto que no R32.
Acredita-se que a HKS tenha feito, enfim, os dez exemplares do Zero-R desde o início, mas esta informação nunca foi confirmada por eles. O que se sabe: em janeiro de 2019, o exemplar número 3 foi leiloado pela agência BH Auctions durante o Tokyo Auto Salon. Com pouco mais de 48.000 km marcados no hodômetro e restaurado com perfeição pela HKS, o Zero-R foi arrematado por ¥ 16.200.000 – o equivalente a mais de R$ 590.000 em conversão direta.