A Porsche respeita a tradição do 911 o máximo que pode, mas o tempo é implacável e traz mudanças inevitáveis. Sendo assim, é admirável que que o nine-eleven tenha levado 30 anos para sofrer sua primeira reestilização verdadeiramente profunda (993, lançado em 1993) e mais oito anos para abandonar o monobloco original e o motor arrefecido a ar (996, lançado em 1998). O primeiro Porsche 911 com tração integral – fora o supercarro 959, de 1986, que na prática era um 911 cheio de modificações – veio em 1999 e agora, na atual geração, o motor naturalmente aspirado dá sinais de que está prestes a desaparecer.
Quase como um contraponto ao parágrafo anterior, o primeiro Porsche 911 com motor sobrealimentado começou a ser oferecido relativamente cedo: em 1976, 13 anos depois do lançamento, ainda na primeira geração. As fabricantes estavam começando a enxergar a capacidade dos turbocompressores de aumentar a potência do motor de forma eficiente e rápida, e a Porsche foi uma das primeiras. Então, ao mesmo tempo em que respeitam a tradição do 911, os engenheiros de Stuttgart não têm medo de experimentar tecnologias de vanguarda.
Levando isto em conta, era questão de tempo até a questão de tempo até que a Porsche decidisse adotar a sobrealimentação em toda a linha 911, do Carrera básico ao insano GT2 RS. A indústria já deu passos enormes para tornar os motores turbinados confiáveis, econômicos e duráveis e desenvolveu tecnologias para minimizar o turbo lag. Sem os turbos, não haveria um motor que pudesse ter 700 cv e entregá-lo da forma necessária para que o GT2 RS fosse capaz de percorrer Nürburgring em 6 minutos e 47 segundos.
O Porsche 911 GT3 RS é, atualmente, o único herói da resistência neste aspecto. Até agora ele era movido por um flat-six de quatro litros que, sem qualquer tipo de indução forçada, entregava 500 cv a 8.250 rpm e 46,9 mkgf de torque a 6.000 rpm, acoplado à transmissão PDK de dupla embreagem e levava a força para as rodas traseiras.
Na noite de ontem, porém, a Porsche revelou o novo 911 GT3 RS. Ele continua sendo movido por um flat-six naturalmente aspirado de quatro litros, mas agora ele entrega 520 cv a 8.250 rpm e 47,9 mkgf de torque a 6.000 rpm. O câmbio ainda é o PDK de sete marchas (todos esperavam pela adição do câmbio manual à lista de opções), e isto pode ser encarado como um sinal de que o pedal de embreagem não vai ter vez na próxima geração, que ao que tudo indica também adotará os turbocompressores. Por enquanto, porém, podemos ficar babando no motor naturalmente aspirado mais potente já colocado em um 911.
Mas chega de analisar o carro mercadologica e filosoficamente: vamos colocar a mão na graxa. O Porsche 911 GT3 RS 2019 agora é capaz de ir de zero a 100 km/h em 3,2 segundos, o que é 0,2 segundo mais rápido que o atual GT3 “não-RS” com câmbio PDK, e 0,1 segundo mais rápido que o 911 GT3 RS anterior. A velocidade máxima é de 312 km/h.
O boxer de seis cilindros tem camisas de cilindro revestidas a plasma para menor atrito, virabrequim e bielas mais rígidos, novo trem de válvulas e cabeçotes que dispensam os tuchos hidráulicos. O motor respira ar fresco pelas aberturas nos para-lamas traseiros e, de acordo com a Porsche, tem parentesco muito próximo com os motores usados pelo 911 de competição. A transmissão PDK passou por uma recalibragem exclusiva para o novo motor.
Como no GT3 2018, as faces dianteira e traseira agora são feitas de poliuretano, e suas formas foram ligeiramente redesenhadas. As entradas de ar na dianteira agora são maiores e têm uma moldura preta, e o spoiler do tipo lip na base do para-choque também cresceu. Atrás, a asa traseira aparentemente ficou mais elevada e continua operando em conjunto com um spoiler na tampa de fibra de carbono.
O para-choque é novo, e agora conta com um difusor na parte inferior do carro. As saias laterais também ficaram mais generosas, e elementos como as aletas ao lado do para-choque dianteiro e respiros nos para-lamas permaneceram no lugar. Já o capô de fibra de carbono ganhou dutos NACA para ajudar no arrefecimento dos freios sem aumentar o arrasto aerodinâmico.
Como resultado, a 200 km/h o 911 GT3 RS produz o dobro de downforce em relação ao GT3. No mais, a receita com foco na redução de peso foi mantida: vidros traseiros mais finos, revestimentos laterais internos mais leves com tiras de tecido no lugar das maçanetas, isolamento acústico reduzido e banco traseiro ausente – seu lugar é ocupado por uma gaiola de proteção pintada na cor do carro. O interior ainda tem bancos concha de fibra de carbono e um volante revestido em Alcantara com 360 mm de diâmetro e marca das “12 horas” amarela.
A suspensão recebeu novas molas auxiliares na dianteira e na traseira. Como de costume, os ângulos de cambagem e cáster, a altura em relação ao solo e as barras estabilizadoras são ajustáveis, e as buchas do tipo ball joint permitem uma precisão muito maior do que as buchas de borracha ou PU convencionais. O sistema de suspensão ajustável ativa PASM, os suportes do motor ativos, o sistema de esterçamento das rodas traseiras (que foi recalibrado) e o diferencial traseiro com blocante variável de até 100% e vetorização de torque são itens de série.
O 911 GT3 RS usa rodas forjadas de 20×9,5 com pneus de medidas 265/35 na dianteira e 21×12,5 polegadas com pneus 325/30 na traseira (pode pegar seu queixo no chão, agora). Os pneus, como já esperávamos, foram desenvolvidos especificamente para o modelo e, de acordo com a Porsche, possuem uma área de contato com o solo significativamente maior do que no GT3 “não-RS”. A Porsche não diz quais são os pneus, mas as fotos de divulgação dão a letra: Michelin Pilot Sport Cup 2. De série, atrás das rodas estão abrigados freios com discos de ferro fundido na dianteira e na traseira, com 380 mm de diâmetro nas quatro rodas (sim, nas quatro rodas). Aos mais hardcore, um jogo com discos de carbono-cerâmica com 410 mm de diâmetro na frente e 390 mm atrás será disponibilizado como opcional. A fabricante diz que eles pesam 50% menos que os freios de ferro.
Falando em redução de peso: como de costume, a Porsche oferece o pacote Weissach para eliminar mais alguns kg. Equipado com ele, o 911 GT3 RS adota barras estabilizadoras, teto, acabamento do volante e aletas no volante feitos de fibra de carbono, diminuindo aproximadamente 13 kg na balança. É possível também optar por rodas de magnésio forjado que pesam cerca de 11,5 kg menos. A Porsche não menciona o peso do carro sem estes opcionais – com eles, o peso do carro seco é de atléticos 1.430 kg. É possível encomendar o Porsche 911 GT3 RS a partir de agora, e as entregas nos EUA começam no segundo semestre de 2018. O preço parte de US$ 187 mil (R$ 600 mil em conversão direta). O Weissach Package custa outros US$ 18 mil (cerca de R$ 58.000) e as rodas somam mais US$ 13.000 (R$ 42.000) – futuramente elas poderão ser encomendadas à parte.
Achou caro? Não espere que ele seja vendido no Brasil por menos de R$ 900 mil, como foi com o GT3 RS anterior na época do lançamento, em 2015. Hoje ele é encontrado por, em média, R$ 1,5 milhão nas lojas especializadas. Novamente, não espere que seja diferente com o novo GT3 RS. E ainda existe a possibilidade fortíssima de ele ser o último de sua espécie com motor naturalmente aspirado, o que leva seu potencial de valorização ainda mais longe.