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Car Culture

A Ferrari F40 com câmbio semi-automático

Não é difícil explicar o que torna a Ferrari F40 a Ferrari de todas as Ferrari: ela é um carro essencial. Por que usar uma pintura multicamadas se você pode só colocar uma camada fina a ponto de ver a trama da fibra de carbono e kevlar da carroceria e, assim, manter o carro mais leve? Pra que carpete? Pra que um painel elaborado? Pra que maçanetas e manivelas? Você só precisa de proteção contra o vento/chuva, um motor V8, dois turbos, faróis, câmbio, suspensão, rodas, pneus, três pedais e uma alavanca de câmbio. Ou nem isso.

Apesar de a F40 oficialmente ter sido feita apenas com câmbio manual de seis marchas e pedal de embreagem, houve um exemplar com caixa automatizada, que mantém a alavanca, mas dispensa o pedal de embreagem.

Este exemplar é conhecido como Ferrari F40 Valeo, por causa do nome da empresa que desenvolveu o sistema de embreagem automatizada empregado no carro. A Valeo forneceu o módulo eletrônico e o atuador, que acionava a embreagem em 100 milissegundos a partir do momento em que marcha era selecionada na alavanca. Que, claro, conservou a grelha. Na prática, esta F40 tem câmbio manual, só a embreagem é automatizada.

Como você deve saber, a Ferrari não se importa em deixar de lado alguns princípios quando um cliente muito especial faz uma solicitação especial. E foi o que aconteceu com esta F40. Agora pense por um instante: o Sultão de Brunei teve suas F40 personalizadas, mas não modificadas mecanicamente. Nigel Mansell teve sua F40 do jeito que veio da fábrica. Se o piloto da Ferrari e o maior colecionador de carros do planeta não conseguiram uma F40 modificada, quão especial é este cliente, capaz de macular uma homenagem orgânica e orgástica a toda a história da Ferrari desde a década de 1950,  o último carro  supervisionado pelo próprio Enzo Ferrari?

Alguém com o mesmo poder de Enzo Ferrari.

No caso, esse alguém era Gianni Agnelli, o todo-poderoso da Fiat nos anos 1980, que tinha tanta participação na Ferrari quanto o próprio Enzo, e viria a se tornar o sócio-majoritário após a morte do comendador, em 1988. Foi natural, portanto, que Agnelli desejasse uma das Ferrari F40.

Mas havia um problema: um acidente de carro em 1952, no qual Agnelli bateu sua perua Fiat no caminhão de um açougueiro, deixou os movimentos de sua perna esquerda comprometida pelo resto da vida. No acidente, ele sofreu sete fraturas em pontos diferentes da perna, e tomava analgésicos diariamente, além de usar uma órtese permanentemente.

Por isso, Gianni Agnelli não conseguia dirigir carros manuais com a mesma facilidade de outrora. A operação da embreagem era dificultada devido às sequelas do acidente. E a F40 só poderia ser equipada com câmbio manual.

Mas… sendo o todo-poderoso, o outro dono da bagaça toda, ele convenceu a Ferrari a encontrar uma forma de fazer uma F40 que ele pudesse dirigir. Lembre-se que àquela altura a Ferrari já sabia como fazer um câmbio semi-automático. Eles haviam desenvolvido o conceito no fim dos anos 1970, para a F1. Só não haviam colocado em prática porque faltava tecnologia.

Mas no final dos anos 1980 essa tecnologia já estava disponível e era confiável. E a Valeo sabia como fazer o negócio funcionar, porque eles haviam feito uma embreagem idêntica para a Lancia usar no Delta HT Integrale do WRC — outro carro feito sob o comando de Agnelli.

Além da embreagem, Agnelli também fez outras duas solicitações à Ferrari: a instalação de um acendedor de cigarros, e uma manopla de câmbio feita de alumínio. Como cortesia, a Ferrari ainda gravou as iniciais GA na pasta de couro que guarda a documentação do carro.

Apesar de ter feito tudo isso, Gianni Agnelli não dirigiu a F40 como você imagina. Ele vendeu o carro com apenas 600 km rodados (sim, 600 km).

Já o sistema de embreagem automática da F40 foi parar na lista de opcionais da Mondial T em 1993, o último ano do modelo. Não fez sucesso, mas abriu caminho para o que viria depois: o câmbio sequencial automatizado. Em 1995 a Ferrari instalou este câmbio em um modelo exclusivo feito para o Sultão de Brunei, a Ferrari FX e, em 1997, lançou a 355 F1, com o câmbio sequencial automatizado.

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