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Project Cars Project Cars #262

A história da minha Chevrolet Caravan V8 small block, o Project Cars #262

Era uma vez, lá num longínquo 1987, um cara chamado Paulo que comprou uma Caravan quatro-cilindros de um amigo apenas para carregar tralhas num sítio em São Gonçalo/RJ. Nada demais, nada de menos. Apenas um meio de carregar tranqueiras de sítio mesmo.

Era uma Caravan verde ouro metálico, 1976. Digamos assim que tenha sido bem usada, mas ainda inteira. Bancos separados, quatro marchas, interior preto, nada fora do original. Até mesmo o maldito carburador DFV228 estava lá, algumas vezes vazando, afogando o carro.

Estava com mais de 100.000 km rodados, e era o segundo carro de um funcionário aposentado do Banco do Brasil que tinha também um Opala Comodoro 78, igualmente quatro-cilindros, branco. Como usava pouco a Caravan, o José a vendeu pro Paulo. O Paulo tinha um Corcel 79 1.6, cinco marchas, dourado com interior monocromático que ele simplesmente amava. A Caravan era só um meio de, às vezes, carregar tralhas no sítio. Nada mais.

Por acaso o Paulo tinha um filho meio estragado, um cara assim meio empolgado demais com carros, que tinha uma inabalável paixão por seus dois Dodge Dart. Esse filho era eu, claro, este mocorongo que vos escreve. E eu não curtia nem um pouco o Corcel II. Quando a Caravan chegou na garagem, foi amor à primeira vista, ainda que com apenas quatro cilindros. Por acaso na compra da Caravan, o Paulo percebeu que havia uma trinca na longarina dianteira direita, e que antes mesmo de trazer o carro para casa, comprou uma máquina de solda simples, e reparou a tal da trinca com um amigo no quartel mesmo. A máquina de solda veio na mala da Caravan na viagem para a nova casa. A mesma máquina de solda foi usada muitas vezes depois em todos os carros e até na construção de garagens para eles.

Assim começava a bagunça. Claro que a Caravan ajudava muito na bagunça dos dois Dodges. Trazer peças grandes do ferro velho era bem tranquilo com ela, ainda que as viagens não fossem assim exatamente rápidas.

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Meu pai foi mecânico, formado pelo Senai lá nos anos 1950, ainda que não trabalhasse mais como mecânico havia muito tempo, claro que acabou sendo uma fonte de inspiração. Como o motor da Caravan estava meio cansado, tiramos ele juntos na garagem, sem muitos recursos na época. Tiramos o cabeçote para aliviar, passamos uma corda nele, soltamos do câmbio, e puxamos pra fora do cofre no feijão mesmo. Acabamos fazendo apenas uma revisão meia-boca, anéis e bronzinas novas e mais nada. Uma boa lembrança de bons momentos passados com o velho em torno dela. Nesta época eu ainda estudava e trabalhava meio expediente em oficinas diversas, e já fechava motor de carro comum sem nenhuma dificuldade.

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Em 1986, quando eu sofri um acidente com o Dart 76, as peças que usei para consertar ele vieram do ferro-velho para a oficina nela. Em 1987 estava planejando me casar, e estava com mais dois Dodge que seriam melhorados e vendidos para compra de móveis e utensílios para a nova casa. Lá para o fim do ano, eu recebi a noticia que deveria me mudar para outra cidade por conta de um emprego novo e promissor. Ia deixar de ser mecânico e virar bancário.

Nesta época eu já tinha desistido da faculdade. Em uma época sem muita perspectiva de futuro o maior movimento que podia fazer era cuidar do dia em que estava vivendo, em vez de me preocupar muito com o futuro. O novo emprego era uma oportunidade grande de ter um futuro bem mais promissor que aquele que eu tinha conseguido criar até aquele momento.

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Mas na correria da mudança, dei uma cacetada forte com a Caravan por absoluta distração ao volante. Amarrotei a frente e a lateral direita do carro. Eu estava tão feliz andando na rua, pensando na mudança, na vida nova que se aproximava que nem reparei que o trânsito subitamente tinha parado à minha frente. Para não fazer mais estrago, enfiei a frente dela na mureta do viaduto, e bati com a lateral direita na traseira de um Corcel 77 marrom de um coroa. Tinha que ser num Corcel não é mesmo? Ok, o Corcel foi fácil, pequeno estrago. Catei uma lanterna no ferro-velho, o lanterneiro da oficina onde eu trabalhava deu uma força na lata, o pintor deu um tapa na lateral e em dois ou três dias ele estava ok e rodando de novo.

Ao chegar em casa, depois da batida, contei tudo e meu velho nem se abalou, mandou vender pro ferro-velho. No ato, achei meio ruim fazer isso, no fim das contas, eu usei e estraguei, logo o mínimo que deveria fazer era consertar o melhor possível e devolver direito. Fora o coolness factor da Caravan que, mesmo com apenas quatro cilindros, era considerável, ainda mais depois de trazer os cacos para eu remendar o Dartão nos tempos difíceis de carro amarrotado. Não podia terminar assim.

 

A futura esposa anuiu, e fizemos a coisa certa, um dos dois Dodge foi vendido para comprar as peças, o outro pagou a mão-de-obra. E vamos nessa. Ainda sobraram dois outros Dodge, os meus de verdade, bem inteiros e legais na garagem. Com o novo emprego essa grana da venda dos carros para comprar mobilia não faria mais tanta falta.

Assim, durante o mês de dezembro de 1987 e janeiro de 1988 consertei a Caravan o melhor que pude e desta forma, no dia em que me mudei para Sorocaba/SP, para tomar posse no banco, a Caravan voltou para meu pai completamente consertada. O motor sim, mesmo depois da retífica meia-boca continuava fraco, mas isso era um detalhe que eu iria resolver logo mais ali na frente.

Em Sorocaba, logo arrumei uma casa que tinha uma garagem aceitável. Rapidamente comprei um motor 250, diferencial Dana 30, e um radiador de seis-cilindros.

Em casa mesmo desmontei tudo e refiz a Caravan com o 4100. Pronto, agora as viagens ao ferro-velho eram bem mais rápidas. Muito legal foi fazer tudo em casa, só, numa boa. A transformação de um carro meio anêmico em outro estimulante de guiar assim do nada, num dia tinha só 90 cv, no outro quase 150. Rápido e sem guerra, o carro mudou da água pro vinho. Fiz várias viagens com ela de Sorocaba ao Rio, e com o 4100 era muito, mas muito mais fácil de viajar mesmo. Claro, o velho viu a Caravan, chegou até a dirigir com o 4100, mas nem assim queria largar o Corcel.

No natal de 1988, recebi de presente um envelope do meu pai. Era o DUT da Caravan, assinado e preenchido para transferir para o meu nome. Apenas como temporização, em 1988 um carro 1976 ainda era bem desejável e a Caravan tinha um valor de mercado, digamos, não irrisório, nada desprezível.

Bom, naquele longínquo 1988, nada era mais legal que aquela caravan 4100. As rodas Titânio Vênus foram todas conseguidas em ferro velho, época boa que as coisas legais existiam e eram fáceis de conseguir.

Mas sempre que eu abria o cofre, mesmo com o 4100 eu via que ali cabia um V8. Mas eu não queria um V8 Ford ou Dodge ali, queria um Chevy V8, de bloco pequeno.

Ainda mais porque os outros colegas dela de garagem, aí embaixo, eram V8 e já que um era, todos deveriam ser também!

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Eu sabia que na Alemanha nos anos 1970 teve um Opel qualquer de tamanho comparável ao Opala que tinha um small-block debaixo do capô. Só isso. Sequer sabia detalhes do carro ou do motor, que era um 327.

Só que eu não moarava mais no Rio, e em Sampa as coisas eram diferentes. No novo emprego, com muito mais tempo e muito mais grana, pude me dedicar a explorar a nova cidade. Rapidamente a garagem ficou mais habitada. Novos moradores chegaram. Um deles era um Impala 63 cupê que tinha um 283. Um dia esse 283 saiu para ver as modas na rua mas quem voltou pra ele foi 350. E em dezembro de 1989, assim meio que do nada eu voltei por Rio.

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Legal lembrar que eu me mudei para Sorocaba dirigindo meu Dart 76, depois de quinze dias voltei de ônibus e levei o RT e 15 dias depois voltei de ônibus e levei a Caravan para Sampa. Meu pai já estava aposentado, não usava mais ela, e na verdade nem queria mais ver a Caravan na garagem dele. O Corcel ainda estava com ele, era bem mais leve e fácil de guiar e a Caravan ficava sempre largada. Mas na hora de voltar foi algo mais difícil. Tive que pedir ajuda aos universitários… a Caravan está bem atrás do cavalo mecânico e nas fotos é fácil ver que as rodas Titânio Vênus já não mais estavam nela, quebrei dois numa catada de meio fio que rolou por pura bobeira, mas nem teve muita crise, um jogo de Cruz de Malta foi colocado nela sem nenhuma demora após a quebra das Titânio.

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Com a chegada do ano novo (1990) e com mudanças políticas, viajar para o exterior, trazer coisas e importar peças e componentes pelo Correio ficava muito mais fácil. Neste meio tempo, apareceu mais um small block Chevy e mais outro small block e eu decidi que um deles iria para a Caravan.

Na viagem de 1990, a primeira das várias que fiz aos EUA, trouxe muitas peças para os dois motores. Em 1990 ainda comecei a me preparar para a grande troca de motor, e em 1991, querendo um pouco mais de grana para viajar, retirei o 4100 da caravan, testei um 283 nela e, com um pouco de grana, viajei e trouxe mais um monte de coisas legais.

 

Na volta da viagem, consumei o mal feito e começou a saga da Caravan V8. Algo que contarei nos próximos posts!

Por Alexandre Garcia, Project Cars #262

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