Muita coisa mudou de alguns anos para cá na Mitsubishi. Se vimos o Lancer Evo dizer adeus e o Eclipse virou um SUV, por outro lado o núcleo duro da Mitsubishi segue preservado: o mundo 4×4, especialmente os de arquitetura raiz, com chassi tipo escada (ladder frame), diferencial central com bloqueio, reduzida, pneus de perfil mais alto e curso de suspensão realmente generoso.
E é exatamente isso que temos no Pajero Sport, que chegou ao Brasil neste último mês com a tarefa de continuar a missão do Pajero Dakar, que foi vendido por aqui entre 2009 e 2015. Não foi apenas uma mudança de nome, foi também de passaporte: o Dakar era fabricado na planta de Catalão (GO), já o Sport vem da Tailândia, com uma série de mudanças específicas para o nosso mercado, tanto na parte de calibração do motor quanto de suspensão – o nosso Mit apresenta uma carga de suspensão mais firme que o do sudeste asiático. Vale lembrar que em seus dois primeiros anos o Dakar também vinha da Tailândia, começando a ser produzido aqui apenas em 2011.
O SUV atrasou um bom bocado: lá fora foi lançado no segundo semestre de 2015, atendendo ao mercado asiático, australiano e inglês. De acordo com a Mitsubishi, o processo de homologação e de desenvolvimento do setup de suspensão e motor foi o maior responsável pelo prazo, mas é bem provável que a crise econômica do País tenha colaborado para esta janela tão longa. De qualquer forma, como este é um segmento com ciclo de vida de produto muito longo, não afeta tanto o produto.
Pajero Sport: preços e versões
O Pajero Sport chega em versão única, a HPE, com preço de lançamento de R$ 265.990, que em breve será atualizado para o valor de tabela de R$ 279.290. O único opcional, sem custo, é a forração da cabine em couro bege. Seu rival principal é o Toyota SW4 Diamond (R$ 274.790), mas também concorre diretamente com o Chevrolet Trailblazer (R$ 231.990).
Seu motor é o mesmo 2.4 turbodiesel da L200 Triton Sport, com 190 cv a 3.500 rpm e 43,9 kgfm a 2.500 rpm; casado a um câmbio automático de oito marchas fornecido pela Aisin – a picape utiliza outra transmissão, de cinco marchas.
Em sua faixa de preço, em teoria ele concorre também com o Land Rover Discovery Sport turbodiesel SE (R$ 264.100) e com o Volvo XC60 Momentum D5 turbodiesel (R$ 275.950), mas na prática, não. Vale lembrar que estes dois veículos, embora apresentem alguns recursos off-road, não apresentam reduzida ou diferencial central (empregam sistema de acoplamento viscoso), utilizam estrutura do tipo monobloco, curso de suspensão mais curto e trazem pneus de perfil bem mais baixo. O lado utilitário deles é substancialmente mais suave, com componentes menos superdimensionados.
É por isso que esta categoria do Pajero Sport e do SW4 é altamente específica: trata-se de cliente muito mais roots, com demandas mais extremas de uso e geralmente com ciclo de propriedade mais longo – ainda que o Mitsubishi tenha trazido um belo cardápio de recursos tecnológicos de segurança, off-road e conectividade, alguns deles exclusivos no segmento; que iremos detalhar mais adiante no texto.
Equipamentos de série: onze air bags (dois dianteiros, um para o joelho do motorista, dois laterais, seis de cortina, incluindo para a terceira fileira), ar-condicionado de duas zonas com saídas para 2ª e 3ª fileiras de bancos, central multimídia tela 7″ Apple CarPlay e AndroidAuto, teto solar, rodas de liga leve aro 18, sensores de estacionamento dianteiro e traseiro, câmera de ré, faróis em Bi-LED, banco do motorista com ajustes elétricos, controle de velocidade de cruzeiro adaptativo, assistente de condução com trailer, alerta de pontos cegos, assistente para saída em rampas e para controle de descida em ladeiras (HDC), freio de estacionamento eletrônico, sistema keyless para entrada e partida, lavadores de faróis (ausentes nas unidades de homologação fotografadas, mas presentes no modelo vendido ao público).
Cores externas: branco, preto, marrom, azul, cinza e prata.
Cores internas (couro): preto ou bege (opcional sem custo para as cores externas branco, preto, marrom e azul).
Pajero Sport: motor, transmissão, design e capacidades
O Pajero Sport utiliza o mesmo motor da L200 Triton Sport: o 4N15, um 2.4 turbodiesel com bloco e cabeçote de alumínio, injeção direta common rail com injetores piezo, taxa de compressão estática reduzida para 15,5:1 (o que permitiu o uso do bloco de alumínio, mais leve, e reduz as possibilidades de detonação) e compensada com turbo de geometria variável e duplo comando variável acionado por corrente, diâmetro de cilindro de 86 mm, curso de 105,1 mm.
Em números: 190 cv a 3.500 rpm e 43,9 kgfm a 2.500 rpm. Zero a 100 km/h na casa de 12 s. Consumo declarado: 8,9 km/l em regime urbano e 11,7 km/l rodoviário, médio de 10,3 km/l.
O sistema de transmissão conta com câmbio automático de oito marchas (com aletas atrás do volante para trocas manuais), diferencial central, reduzida de 2,56:1 e botão para blocar 100% o eixo traseiro. O seletor apresenta os modos: 4×2, 4×4, 4×4 lock, 4×4 lock + reduzida – o motorista pode rodar com tração 4×4 no asfalto normalmente e alterná-la com o modo 4×2 a até 100 km/h.
O Pajero Sport buscou trazer mais refino e status, integrando o estribo e os flares de para-lama à própria carroceria (note como isso resultou em para-lamas musculosos, acentuados pelos vincos da linha de cintura), apresentando um design de dianteira um pouco mais automotivo e com uma série de detalhes e vincos na carroceria para gerar pequenos vórtices para reduzir o arrasto aerodinâmico, o que ajuda na redução de ruído e de acúmulo de poeira. Contudo, como o Toyota SW4 e o TrailBlazer, o Pajero Sport é um tipo de veículo que possui muita força no mercado do sudeste asiático e na Índia e isso acaba sendo transparecendo na grande porção de cromados em todos os elementos externos, especialmente na face do veículo.
O ponto polêmico é, sem dúvida, a traseira. Nas lanternas, uns comparam a olhos sangrando, outros à boca de um ventríloquo, e a tampa traseira trouxe uma preocupação que os donos de Fit conhecem bem: excesso de exposição pelo curtíssima protuberância do para-choque, o que pode aumentar bastante o custo de um reparo de um toque na traseira. Por outro lado, o acesso ao compartimento de bagagens é nada menos que excelente por conta dela.
Por baixo dessas linhas mais refinadas, temos uma pegada old school no conceito estrutural e de suspensão: chassi do tipo ladder frame com seção hidroformada do tipo “box”, tradição nos utilitários de marcas japonesas e que o mercado americano passou a adotar em massa recentemente, abrindo mão do antigo perfil aberto em “C”. Suspensão duplo A na dianteira e eixo rígido do tipo three-link na traseira (barra Panhard mais dois localizadores longitudinais), pneus mistos Toyo A32 Open Country 265/60 R18. Capacidades: altura livre do solo 21,8 cm, ângulo de entrada 30º, ângulo de saída 24,2º, inclinação lateral máxima 45º, capacidade de submersão de 70 cm.
Cabine: sem invenções criativas
Em contraste às linhas arrojadas da dianteira e especialmente da traseira, a cabine do Pajero Sport joga uma partida mais conservadora. Há algo de Pajero Dakar nas formas básicas, incluindo o estilo das saídas de ar central ou a cobertura bicolor do painel, mas a arquitetura ficou mais moderna, integrando o console central ao painel e apresentando elementos como a tela do sistema de infotainment e os controles de ventilação bem embutidos. É um design conservador em essência, exatamente como o de seus concorrentes de segmento Toyota SW4 e Chevrolet Trailblazer. Dos três, o da Pajero Sport é o que nos passou a melhor impressão de requinte e qualidade de execução.
Sem a alavanca do freio de mão, que passa a ser eletrônico, a tecla seletora do modo de tração e de terreno ganharam destaque e o porta-copos central ficou mais encorpado – e uma curiosidade: o interior do porta-objetos central traz uma tomada 110V com padrão de tomada brasileiro.
A qualidade dos materiais de revestimento é melhor que em seu par de projeto L200 Triton Sport, apresentando mais superfícies emborrachadas e mais frisos e contornos de acabamento. Detalhes como os apoios soft touch embutidos na lateral do console para evitar batidas de joelho são típicos de um projeto pensado para o uso no fora-de-estrada.
A ergonomia de direção é clássica de SUV com chassi: posição de direção naturalmente alta, com todo o conjunto elevado – assoalho, coluna de direção, alavanca de câmbio. A coluna de direção oferece uma boa amplitude de ajustes. Só não me pergunte por que o botão de partida fica à esquerda do volante: será que havia algum fã da Porsche no projeto deste veículo?
A cabine fica muito bem iluminada com o opcional de couro claro combinado ao teto solar elétrico de série, uma exclusividade entre seus rivais diretos.
Os bancos são um dos pontos altos da cabine, pois fazem um trabalho de ergonomia muito bom para o fora de estrada e para viagens longas. Os apoios laterais ficaram mais generosos ao mesmo tempo em que são largos (algo importante para o perfil do comprador desta categoria), sua espuma é feita de dupla camada com diferentes densidades (algo como os pillow top de algumas camas) e, por fim, há ajustes elétricos para o motorista. O couro nos bancos foi aplicado com rugas propositais na seção central, um elemento de estilo que nos lembrou alguns carros de luxo da década de 80 e 90 – como o imortal Lexus LS400.
A vida atrás é muito boa, com bastante espaço para os joelhos. Os bancos traseiros das duas fileiras possuem ajuste de inclinação no encosto, há saídas de ar-condicionado nas laterais do teto para ambas as fileiras e mesmo controle de ventilação independente (mas não de temperatura). Há duas tomadas USB e uma de 12V para a segunda fileira de bancos.
Acessar a terceira fileira é bem fácil, bastando puxar uma alavanca no encosto do banco da segunda fileira: o banco dá uma cambalhota pra frente e permite o pleno acesso à última fila. A terceira fileira tem um espaço modesto, como em todos os veículos de sete lugares, mas é suficiente.
O porta-malas apresenta um bom espaço de carga: no modo para cinco passageiros, cabem 571 litros até os vidros e 971 litros até o teto, e 1.731 litros com ambas as fileiras rebatidas (note que o assoalho fica plano), virando quase uma van de carga.
Como anda o Pajero Sport?
Nosso test-drive foi de aproximadamente 300 km. Saímos de um hotel em Mogi-Guaçu em direção ao percurso off-road do Velo Città e, de lá, partimos para mais de 1.500 m acima do nível do mar no Pico do Gavião, na divisa com Minas Gerais – uma mistura de rodovia, off-road de nível um pouco mais puxado e um fora de estrada mais leve, que ficou particularmente intenso pela velocidade média que mantivemos neste trecho!
Começando pela rodovia. Todos os turbodiesel dessa categoria possuem uma relação de peso-potência bem parecida: o Toyota SW4 carrega 11,81 kg para cada cavalo (2.130 kg, 177 cv), o Pajero Sport fica no meio, com 11,02 kg/cv (2.095 kg, 190 cv) e o Trailblazer é o mais bem disposto com uma vantagem sutil, 10,82 kg/cv (2.164 kg, 200 cv). Na prática, é uma relação peso-potência próxima à de um Onix Activ 1.4 automático, mas atenção: a relação entre a massa e o torque é semelhante à de um Golf 1.4 TSi.
Isso se traduz da seguinte forma: para a rodovia, ultrapassagens acontecem com segurança, mas não com vigor inspirador ou abundância de disposição – por isso, pegue leve no arrojo em rodovias de pista simples. A força realmente faz mais diferença em velocidades mais baixas. O isolamento acústico do Pajero Sport em relação ao ambiente é muito bom, mas o ronco do motor turbodiesel se faz presente especialmente em carga plena, ainda que as vibrações estejam muito bem isoladas.
O câmbio de oito marchas – um dos principais diferenciais em relação aos seus rivais diretos, com câmbio de seis marchas – está muito bem mapeado tanto para a rodovia quanto para o fora-de-estrada, de forma que é difícil você sentir necessidade de operá-lo manualmente. O veículo roda solto na rodovia, e interpreta bem a necessidade de reduções, amarrando a transmissão nos trechos de fora de estrada.
Os freios estão bem dimensionados para a aplicação – em frenagens fortes emergenciais você vai sentir um pouco de movimentação vertical de nariz, mas isso faz parte de veículos deste conceito mais utilitário. Curso longo de suspensão, carga de molas relativamente macia e estabilizadora um pouco mais firme para conter a rolagem, mas não a ponto de comprometer o desempenho no fora-de-estrada. Tudo é uma questão de compromisso.
Em termos de segurança veicular e conveniência, este é o único SUV entre seus concorrentes diretos que apresenta controle de velocidade de cruzeiro adaptativo (uma mão na roda para viagens extremamente longas), sistema de frenagem emergencial autônoma (funciona até 180 km/h) e o sistema de prevenção de aceleração involuntária. Ele também traz assistente de condução com trailers para prevenir efeito de serpenteamento (capacidade de carga: 3.100 kg com carretinha com freio e 750 kg sem freio) e alerta de pontos cegos com aviso sonoro e visual.
No percurso off-road do Velo Città, cheio de rampas, ladeiras, obstáculos específicos para transferências de peso cruzadas como caixas de ovos, rochas e rampas inclinadas lateralmente e alguns trechos submersos, o Pajero Sport mostra por que esta categoria de veículo existe e tem tanta força em locais com geografia castigada, como a região Centro-Oeste do Brasil. O Mit transpõe estes obstáculos sem vacilar, sem dar fim de curso de suspensão, sem ruídos estruturais, sem a necessidade de se preocupar se o para-choque dianteiro ou traseiro irão pegar ou se a roda irá entrar em contato com o piso – estes dois últimos pontos, o calcanhar de aquiles dos Land Rover e Range Rover desta fase mais conceitual. E, claro, conta com pneus mistos, que podem não ser grande coisa para o fã de Camel Trophy, mas que te permitem transpor trechos de barro de considerável severidade.
As programações off-road realmente facilitam muito a vida. Para se manter competitivo no mercado, é fundamental incorporar uma série de recursos tanto de segurança veicular ativa quanto de assistentes para o off-road – quem já desceu uma ladeira íngreme de barro escorregadio com um jipe ou um SUV à moda antiga, sem nenhuma assistência, sabe o quão arriscado isso pode ser.
Uma vez no modo 4×4, você tem acesso a quatro programas por um seletor no console central: Gravel (cascalho), Snow & Mud (neve e lama), Sand (areia) e Rock (rochas). Eles alteram o mapeamento do acelerador, do controle de tração e de estabilidade, da transmissão e dos freios para que o motorista obtenha o máximo de tração e controle de trajetória (evitando deslizamentos na diagonal), sendo que no modo Sand há uma preocupação adicional com o destracionamento para prevenir que o veículo encalhe com o peito no solo e no modo Rock os freios operam mais do que o normal, tanto para travar a roda no ar (para não perder tração) quanto para ajudar o motorista a controlar a inclinação do veículo e as transferências de carga cruzadas.
Em todos você consegue utilizar a reduzida, que requer uma parada total do veículo para alternância do modo. Em casos ainda mais extremos você pode bloquear o eixo traseiro, ficando 50-50 para cada lado fixo.
O Pajero Sport traz o Hill Descent Control (HDC), o assistente de descida em ladeiras, uma ajuda muito útil para descidas escorregadias e extremamente íngremes. Ele funciona entre 2 e 20 km/h a partir de 5% de inclinação. Algo interessante: a velocidade da descida você não controle por botões ou aletas, mas sim pelo pedal do acelerador e do freio, muito mais natural.
Boa parte do percurso, contudo, foi feito num off-road mais leve, de piso de chão batido, lama seca ou de cascalho. E nisso apenas confirmamos que o veículo aguenta abuso. É preciso um capricho que beira a estupidez para você começar a trabalhar com o fim de curso de suspensão. E a carroceria está muito bem instalada sobre o chassi, com coxins maiores que na Pajero Dakar e diversos tipos de borracha para absorção.
Depois destes quase 300 km de test-drive quase sem pausas, o cansaço aos ocupantes foi muito baixo. Crédito ao bom trabalho de suspensão, aos bancos e ao isolamento acústico.
Bottom line
O fato é que um veículo como o Pajero Sport não é para todos. Em sua faixa de preço de R$ 280 mil, o público fã de SUVs turbodiesel que mora nos grandes centros e que raramente vê uma estrada de terra obviamente verá mais sentido no Land Rover Discovery Sport turbodiesel SE (R$ 264.100) ou no Volvo XC60 Momentum D5 turbodiesel (R$ 275.950), que citamos no começo desta matéria. São veículos mais sofisticados, que performam melhor no asfalto e que trazem mais status na porta do restaurante.
O Mitsubishi, bem como os seus rivais SW4 e Trailblazer, é muito mais orientado para uma aplicação que contém uma presença de uso off-road maior. É para quem realmente vai lidar com um off-road mais escorregadio e acidentado, ocasionalmente ficar com três ou duas rodas suspensas, topar com caminhos com barro a dar na canela ou que precisa ter a segurança de contar com uma manutenção menos complexa e com maior disponibilidade. Ou mesmo para o perfil de uso do parágrafo acima, mas com um tipo de cliente mais conservador ou com ciclo de propriedade mais longo.
Em relação ao seus rivais diretos, o Mit chegou muito bem armado. Embora seu preço esteja beirando o topo da cadeia alimentar, ele traz mais recursos de conforto, de segurança e de off-road que o SW4, ainda que não tenha o mesmo vigor do Trailblazer – que é um veículo mais modesto, por outro lado. Se há um ponto a ser criticado, sem dúvida é em relação ao design da traseira, que me parece uma indecisão da marca: este é um veículo para um público conservador, com pegada roots. Não me parece o segmento apropriado para investir numa traseira conceitual que dividiu a opinião pública a ponto de ofuscar alguns de seus predicados.
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