no inicio dos anos 1990 enquanto o mundo se encantava com nigel mansell fazendo curvas como se tivesse trilhos sob os pneus do fw14b um engenheiro magro discreto de fala mansa e olhar atento passava despercebido por boa parte do paddock o que poucos notavam e que aquele homem de prancheta e papel milimetrado estava reescrevendo a forma como se fazia um carro de formula 1 adrian newey nao e so o projetista mais vitorioso da historia da categoria — com mais de 200 vitorias e 13 titulos de construtores em seu curriculo ele e essencialmente o ultimo grande engenheiro a moldar a f1 de ponta a ponta atravessando geraçoes e revoluçoes tecnicas com uma consistencia que desafia a propria logica da competiçao num esporte onde milissegundos definem o sucesso e ciclos de dominancia duram pouco newey nao apenas sobreviveu — ele dominou em tres decadas distintas mas para entender quem e newey e preciso mais do que listar conquistas e necessario decodificar sua filosofia examinar o traço invisivel que conecta carros tao distintos quanto o march 881 e o red bull rb19 esse traço tem nome fluidez para ele o ar nao e um obstaculo mas um aliado e um carro de corrida nao e um aglomerado de componentes mas um organismo vivo guiado pelo equilibrio entre forma e funçao as origens de um genio no mundo da formula 1 onde engenheiros se multiplicam em organogramas complexos e fluxos de dados em tempo real ditam decisoes a historia de adrian newey começa de forma quase anacronica — com papel regua e lapis — nada de simulaçoes cfd ou tunel de vento digital o jovem que se tornaria o maior projetista da historia da categoria tinha uma abordagem quase artesanal e isso nunca mudou newey nasceu em 26 de dezembro de 1958 em stratford upon avon inglaterra — a mesma cidade de william shakespeare e se o bardo ingles reinventou o teatro com palavras newey faria o mesmo com o automobilismo so que com curvas downforce e equilibrio dinamico desde cedo sua atençao ao detalhe se misturava a um interesse quase visceral por velocidade e estetica funcional ele estudou na repton school uma instituiçao tradicional britanica mas foi na universidade de southampton sob a orientaçao de grandes nomes da engenharia aeronautica que começou a consolidar sua visao sobre fluxo de ar comportamento de superficies e controle de pressao — todos principios que ele aplicaria mais tarde com maestria a f1 a escolha pela aeronautica nao foi casual newey sempre acreditou que o carro de corrida ideal e — essencialmente — um aviao invertido so que em contato constante com o solo sua tese de graduaçao foi a construçao de um tunel de vento para estudar a aerodinamica de um carro esporte algo incomum para um curso voltado a aviaçao ja ali ele deixava claro que sua mente estava voltada para onde o ar toca o chao pouco depois de se formar em 1980 newey conseguiu seu primeiro emprego no ambiente que ele mais desejava a formula 1 a oportunidade veio na fittipaldi automotive equipe fundada pelos irmaos emerson e wilson fittipaldi baseada no reino unido e tentando se manter viva apos o fim da era copersucar [caption id= attachment_384260 align= aligncenter width= 1399 ] a fittipaldi em 1980 newey nao esta na foto[/caption] o ambiente era modesto mas desafiador a estrutura limitada exigia criatividade e improviso — terreno fertil para um jovem inquieto newey foi designado para auxiliar nos estudos aerodinamicos do fittipaldi f8 projeto derivado do carro anterior criado por harvey postlethwaite empolgado ele desenvolveu um modelo em escala para testes em tunel de vento porem um erro de calculo resultou em falha estrutural o modelo quebrou sob pressao a consequencia foi imediata — demissao mas tambem foi uma liçao vital aprendi que a aerodinamica nao perdoa imprecisao diria mais tarde o episodio moldou uma obsessao que o acompanharia por toda a carreira validar cada conceito com rigor absoluto do traço a pista a precisao seria sua assinatura os primeiros traços na velocidade real apos a saida da fittipaldi newey passou por um periodo de busca e aprimoramento tecnico sem um emprego fixo imediato dedicou se a aprofundar seus conhecimentos em aerodinamica e design estrutural aplicando sua formaçao em engenharia aeronautica em projetos variados foi em 1983 que a grande oportunidade apareceu a march engineering contratou o jovem engenheiro para atuar no desenvolvimento dos carros da cart na epoca a equipe tinha presença regular tanto na formula 2 quanto na indycar seu primeiro trabalho ali foi na equipe truesports onde atuou como projetista e engenheiro do carro de bobby rahal os dois formaram ali uma forte amizade que iria refletir na carreira de newey quase 20 anos mais tarde [caption id= attachment_384249 align= aligncenter width= 1258 ] newey e bobby rahal na truesports equipe cliente da march[/caption] seu grande projeto nessa epoca foi o march 85c de 1985 enquanto muitos concorrentes ainda priorizavam motores e chassis robustos mas relativamente rudimentares no controle do fluxo de ar e na distribuiçao de massas o 85c entregava uma aerodinamica claramente mais evoluida newey deu atençao especial ao posicionamento e ao desenho das asas que buscavam o equilibrio ideal entre downforce e arrasto a asa dianteira mais baixa e ampla gerava carga suficiente para aumentar a aderencia na dianteira permitindo entradas em curva mais agressivas a asa traseira mais elevada e ajustavel mantinha o carro firme e previsivel nas retas e curvas rapidas [caption id= attachment_384261 align= aligncenter width= 1161 ] o march 85c da penske[/caption] havia tambem a questao de distribuiçao de massas enquanto muitos carros ainda lidavam com concentraçoes de peso desbalanceadas newey conseguiu centralizar os componentes criticos reduzindo o efeito giroscopico e melhorando a resposta do carro em frenagens e mudanças rapidas de direçao — um diferencial importante em circuitos mistos tao frequentes na indycar alem disso o uso criterioso de materiais leves aliados a uma suspensao calibrada para manter o contato dos pneus com o solo mesmo em condiçoes extremas colocou o march 85c a frente em termos de estabilidade e precisao na pilotagem [caption id= attachment_384262 align= aligncenter width= 1164 ] rahal desenvolvendo o march85c em fiorano[/caption] o march 85c nao inventou a roda mas elevou o padrao tecnico da categoria ao aplicar conceitos aerodinamicos e estruturais que estavam mais associados a formula 1 e ate a engenharia aeronautica essa combinaçao de eficiencia e pragmatismo tecnico permitiu que o carro mesmo equipado com um motor judd menos potente que os rivais fosse competitivo a ponto de garantir a danny sullivan a vitoria na indy 500 de 1985 — a famosa spin and win veja o video abaixo — e a al unser o titulo da indycar daquela temporada https //www youtube com/watch v=0zgafq6kkxk o resultado rendeu a newey um convite da haas lola que estava tentando uma incursao na formula 1 e precisava de uma reviravolta tecnica para melhorar seus resultados a chegada de newey tinha como missao principal renovar o projeto do carro trazendo seu conhecimento avançado em aerodinamica e design estrutural no entanto os planos foram frustrados quando a haas lola decidiu encerrar suas operaçoes ao final daquela temporada encerrando prematuramente a oportunidade para newey mostrar seu talento naquele projeto na temporada seguinte newey retornou ao ambiente da indycar desta vez assumindo o papel de engenheiro de corrida para mario andretti na equipe newman haas racing essa posiçao permitiu que ele se aproximasse do lado operacional da corrida compreendendo ainda mais profundamente as exigencias do piloto e as nuances da dinamica do carro em pista [caption id= attachment_384263 align= aligncenter width= 1238 ] newey e andretti em 1987[/caption] foi uma experiencia importante para ampliar sua visao tecnica e estrategica ainda em agosto daquele ano newey recebeu um novo convite da march agora financiada pelo gigante imobiliario japones leyton house era sua chance de voltar a formula 1 em um projeto com potencial para grandes resultados o começo da era newey em 1987 a march engineering retornava a formula 1 depois de quase uma decada afastada sustentada por um orçamento limitado e o patrocinio emergente da japonesa leyton house a estrutura ainda era pequena e a equipe estava longe de ter os recursos das gigantes como mclaren ou ferrari para compensar isso confiou a concepçao de seu carro de 1988 a adrian newey — entao um nome promissor vindo da indycar mas ainda inedito como projetista principal na f1 era uma aposta ousada newey nunca havia projetado sozinho um carro completo de formula 1 mas foi justamente essa liberdade que permitiu o surgimento de um dos projetos mais influentes do final dos anos 1980 o march 881 foi o primeiro carro de f1 a aplicar com sucesso a filosofia de packaging aerodinamico total que newey vinha amadurecendo desde os tempos da indy [caption id= attachment_384265 align= aligncenter width= 1459 ] a march em 1988 mauricio gugelmin e ivan capelli sentados no carro newey de calça escura ao lado de capelli[/caption] o cenario tecnico da epoca era dominado pelos motores turbo que entregavam ate 1000 cv em classificaçao mas com peso extra resposta tardia e complexidade termica com a iminente proibiçao desses motores para 1989 algumas equipes apostaram cedo nos aspirados de 3 5 litros a march foi uma delas usando o judd cv v8 um motor leve e compacto mas com potencia visivelmente inferior aos turbos isso significava que o 881 precisaria vencer o deficit de força com eficiencia — principalmente aerodinamica e e ai que entra o ponto chave [caption id= attachment_384266 align= aligncenter width= 2560 ] o march 881[/caption] o march 881 foi o primeiro carro da f1 moderna a usar o bico elevado sobre a asa dianteira liberando o plano inferior da asa a ideia nao era visual era funcional permitir maior fluxo de ar para baixo do assoalho otimizando o efeito solo mesmo com a proibiçao das saias moveis banidas desde 1983 ao levantar o nariz newey criou um canal natural que alimentava o difusor traseiro com mais volume e velocidade de ar — antecipando conceitos que so se tornariam padrao na f1 com a benetton e a tyrrell no começo dos anos 1990 alem disso os sidepods eram curtos e bem integrados a celula de sobrevivencia newey se preocupou em manter o centro de gravidade baixo os volumes compactos e o fluxo de ar limpo o carro tinha uma silhueta limpa e baixa que cortava o ar com pouca resistencia e boa estabilidade [caption id= attachment_384267 align= aligncenter width= 2560 ] march 881[/caption] o chassi monocoque de fibra de carbono era simples mas rigido a suspensao usava braços duplos sobrepostos e amortecedores montados internamente — padrao para a epoca mas com geometria bem trabalhada para garantir boa aderencia mecanica mesmo com menos carga aerodinamica como o carro era mais leve que os turbo e com menor consumo permitia tanques menores pneus mais duraveis e setups menos agressivos — vantagens reais em corridas longas o carro lembre se era impulsionado pelo v8 judd cv aspirado — enfrentando o campo majoritariamente turboalimentado incluindo as mclaren mp4/4 com o honda v6 que venceria 15 das 16 corridas naquele ano o march 881 era nitidamente mais fraco em potencia cerca de 600 cv contra ate 900 dos turbos em classificaçao mas compensava com baixo arrasto boa eficiencia em curvas e estabilidade geral — caracteristicas raras entre os carros fora das equipes de ponta o march 881 estreou no gp do brasil de 1988 e imediatamente chamou atençao pelo equilibrio e pela velocidade de curva ivan capelli e mauricio gugelmin tinham um carro limitado em potencia mas surpreendentemente eficaz em pistas de media e alta velocidade o ponto alto veio no gp do japao capelli ultrapassou alain prost — sim um mclaren honda turbo — na pista sem precisar de estrategia ou erro foi a primeira vez em 1988 que um carro aspirado passou um turbo em ritmo puro na volta seguinte senna recuperou a posiçao com mais potencia de reta mas o recado estava dado o projeto de newey funcionava e funcionava a duras penas a march/leyton house nao tinha tunel de vento em tempo integral nem cfd a maior parte do desenvolvimento aerodinamico foi feita em escala reduzida em tuneis alugados e os dados eram tratados a mao newey era o primeiro a chegar e o ultimo a sair relatos da epoca contam que ele dormia em um sofa nos fundos da oficina em bicester quando os prazos apertavam o carro foi entregue a pista quase no limite do prazo mas com todos os principios que ele acreditava leveza eficiencia fluidez a comparaçao com os padroes da epoca e clara enquanto os grandes ainda apostavam em soluçoes de força bruta — motores mais potentes asas mais largas pneus mais largos — o 881 foi um projeto equilibrado que extraiu o maximo possivel dos poucos recursos que equipe dispunha ao fim da temporada a march terminou em 6º lugar no mundial de construtores a frente de equipes com orçamentos maiores e motores turbo — um resultado promissor afinal a partir da temporada seguinte os motores foram banidos e a formula 1 voltaria a usar motores aspirados [caption id= attachment_384258 align= aligncenter width= 1200 ] newey em um dos tuneis alugados pela march[/caption] em 1989 a equipe foi renomeada oficialmente como leyton house march refletindo a mudança no comando da equipe agora com o patrocinador japones a expectativa era alta — especialmente depois que gugelmin chegou em terceiro com o 881 no brasil [caption id= attachment_384268 align= aligncenter width= 1156 ] gugelmin em jacarepagua 1989[/caption] a estreia com o carro da temporada anterior contudo era um prenuncio dos problemas que a equipe enfrentaria o 881 foi usado porque o desenvolvimento do carro de 1989 estava atrasado — ele so estreou na terceira etapa mas os acertos finais so ficaram prontos para a quinta corrida do ano ainda assim ele tinha problemas de arrefecimento e eletronica que minavam sua confiabilidade como resultado a equipe marcou so tres pontos ao longo da temporada — os tres pontos de gugelmin no gp do brasil a leyton house terminou em 13º no mundial de construtores uma queda brutal em relaçao ao ano anterior a pressao interna cresceu e newey passou a sofrer com ingerencia direta de akira akagi dono da leyton house que cobrava desempenho imediato e desprezava as limitaçoes de estrutura da equipe essa tensao culminaria em 1990 com o gp da frança quando capelli quase venceu com o cg901 depois de liderar a maior parte da prova com seu modesto leyton house cg901 seguido por mauricio gugelmin em segundo os dois pilotos haviam ficado fora da etapa anterior no mexico por nao terem conseguido se classificar para a prova uma mudança no pacote aerodinamico o asfalto novo de paul ricard e os 1 100 metros da mistral permitiram a equipe extrair o maximo do projeto de newey [caption id= attachment_384269 align= aligncenter width= 1024 ] capelli a frente de prost na frança[/caption] gugelmin fora ultrapassado por prost e acabou abandonando em terceiro por problemas no motor enquanto capelli resistiu ate o final mas nao sem perder a liderança para o frances que venceu em casa newey apesar do pacote otimizado ja estava demitido e assistiu a corrida em casa no dia seguinte ele teria um novo começo os carros de outro mundo na manha de segunda feira 9 de julho de 1990 apenas algumas horas apos alain prost subir ao podio em paul ricard adrian newey atravessava a porta da williams em didcot sem que ninguem na equipe de p&d soubesse de sua chegada chris saunders engenheiro veterano da equipe desde 1986 contou ao site the race que a chegada de newey foi uma surpresa entrei na sala e adrian estava sentado na minha cadeira patrick [head] nao avisou ninguem que ele viria a primeira reaçao foi quase comica eu disse ‘ah entao voce e o fugitivo da leyton house’ acho que isso nao caiu muito bem a primeira vista mas logo nos tornamos bons amigos newey ainda remoia o fato de nao ter podido acompanhar in loco a performance espetacular de seu cg901 no sul da frança mas nao havia tempo para lamentaçoes na williams ele encontraria recursos liberdade criativa e em breve um novo tunel de vento em escala 50% sendo construido nos fundos da fabrica um projeto gerenciado por saunders [caption id= attachment_384270 align= aligncenter width= 1190 ] newey e patrick head na williams em 1991[/caption] a chegada de newey foi um catalisador o tunel finalizado em 1991 transformaria a capacidade de desenvolvimento da williams nao e coincidencia que tenhamos atropelado todo mundo com o fw14 e o 14b o tunel era excelente desde o inicio e adrian soube explora lo como ninguem relembra saunders geoff willis futuro diretor tecnico da honda e da red bull foi outro nome recrutado nos meses seguintes — nao diretamente por newey como muitos pensam mas por sugestao de saunders que conhecia willis desde os tempos do national physical laboratory onde ambos haviam trabalhado em projetos de aerodinamica para a mclaren de john barnard newey por sua vez logo impos seu estilo intenso e detalhista que impressionava — e as vezes irritava brian o’rourke gerente de compositos chegou a considera lo um charlatao por sua abordagem ousada e pouco ortodoxa aos materiais mas newey logo demonstraria que sua intuiçao aerodinamica era fora do comum ele conseguia enxergar o caminho do ar na cabeça e a unica forma de explicar diz saunders era uma enxurrada de desenhos saindo do papel em ritmo alucinante [caption id= attachment_384272 align= aligncenter width= 1179 ] newey na reuniao da williams em 1991 no gp de san marino[/caption] o novo tunel permitia um nivel de refinamento que outras equipes simplesmente nao conseguiam atingir faziamos dezenas de variaçoes dos endplates dianteiros cada um com cortes angulos e larguras diferentes era possivel desenvolver o carro quilo a quilo e o adrian adorava isso o fw14 de 1991 foi o primeiro carro da williams com a assinatura completa de adrian newey o chassi de fibra de carbono era mais rigido e leve que tudo o que a equipe ja tinha feito e a aerodinamica ja mostrava o que viria a ser a marca registrada de newey linhas limpas bico elevado laterais estreitas e cada centimetro pensado para fazer o ar trabalhar a favor do desempenho [caption id= attachment_384273 align= aligncenter width= 1057 ] o fw14 de 1991 note o bico e a asa dianteira semelhantes aos usados no march 881 tres anos antes[/caption] o tunel de vento novo de didcot virou a segunda casa do engenheiro ingles e a obsessao dele por pequenos ganhos aerodinamicos virou rotina asas endplates difusores tudo era mexido testado ajustado sob a carenagem o motor renault rs3 — um v10 a 67° 3 5 litros com 700 cv a 13 000 rpm era menos brutal que o v12 da honda mas era mais leve e progressivo o que permitia desenhar uma traseira mais eficiente em termos aerodinamicos o cambio sequencial era uma joia moderna para a epoca mas meio temperamental trocas por paddles no volante seis marchas sistema eletro hidraulico mansell com aquele estilo de pilotar como se estivesse fugindo de um incendio nao ajudava os componentes a durarem muito era rapido mas instavel justamente por isso o fw14 nao foi campeao a estreia foi promissora mas cheia de pequenos problemas [caption id= attachment_384271 align= aligncenter width= 1175 ] newey williams e mansell[/caption] quando o carro engrenou na metade da temporada era tarde demais senna ja tinha feito a liçao de casa com seu mclaren ainda assim a williams botou medo com mansell levando cinco das 10 ultimas corridas da temporada e patrese conquistando mais duas foram sete vitorias das quais tres tiveram o outro carro da equipe em segundo nas retas o motor renault fazia seu trabalho nas curvas a assinatura de newey aparecia equilibrio absurdo traseira plantada entrada de curva precisa o fw14 era claramente o melhor carro da segunda metade do campeonato mas nao deu tempo senna ja tinha embalado tres vitorias nas tres primeiras corridas e somado pontos em quase todas as outras — foi campeao com sobra quem olhava com atençao contudo sabia que o jogo estava virando o fw14 era so o começo ao longo do inverno de 1991 para 1992 newey e head sabiam exatamente o que precisavam fazer manter o que funcionava e corrigir o que quebrava o fw14b foi isso — e mais um pouco a suspensao ativa que vinha sendo testada discretamente desde 1987 finalmente ficou confiavel com sensores monitorando altura rolagem e aceleraçao o carro mantinha o assoalho colado no chao em qualquer situaçao o controle de traçao evitava as escorregadas na saida das curvas e o cambio — agora sem os chiliques do ano anterior — completava o pacote [caption id= attachment_384275 align= aligncenter width= 1024 ] o fw14b de 1992 para diferencia lo do fw14 repare o suporte dos push rods na dianteira[/caption] resultado o fw14b de 1992 virou um monstro ganhou 10 de 16 corridas com mansell que foi campeao com cinco etapas de antecedencia — o maior dominio ate entao na f1 moderna patrese ainda levou mais uma vitoria e a williams fez dobradinha no campeonato de construtores com folga o carro era tao bom que nem foi preciso usar seu sucessor naquela temporada tanto o fw15 quanto o fw15b acabaram se tornando carros de desenvolvimento e para a temporada de 1993 a williams estreou o fw15c ele era mais do que uma evoluçao do fw14b era a materializaçao do que a formula 1 poderia ser se ninguem freasse os engenheiros adrian newey levou o conceito da suspensao ativa para outro patamar — agora interligada ao cambio semiautomatico ao controle de traçao ao abs e ate a um sistema de aceleraçao drive by wire o carro sabia o que estava acontecendo em cada roda em tempo real e ajustava tudo altura da suspensao rigidez pressao de frenagem entrega de torque era um robo com forma de carro de corrida com alain prost voltando da aposentadoria a williams tinha o pacote completo o carro mais avançado do grid o motor renault v10 mais eficiente e o piloto mais cerebral da historia da f1 prost nao precisava de agressividade — precisava de um carro previsivel e confiavel e foi exatamente isso que newey deu a ele resultado sete vitorias e o tetracampeonato de prost damon hill seu companheiro de equipe ainda venceu outras tres e quase tirou o vice de senna a williams ganhou 10 das 16 etapas — e so nao venceu mais porque senna decidiu fazer magica com um carro que parecia de outra era a mclaren mp4/8 era boa… mas analogica ron dennis tinha convencido a ford a fornecer motores — mas eram unidades clientes defasadas em relaçao aos motores fornecidos para a benetton mesmo assim senna extraiu o impossivel venceu cinco corridas incluindo o gp da europa em donington park na inglaterra com aquela primeira volta que impressiona ate hoje senna estava inconformado brigava com dennis com a ford com a fia e com a williams queria estar naquele carro se voce me der esse carro eu ganho com uma mao so dizia para quem quisesse ouvir e ele estava certo ao fim da temporada prost se aposentou de novo deixando a vaga que senna tanto queria e senna finalmente foi para a williams em 1994 so que ai a fia mudou tudo suspensao ativa controle de traçao freios abs cambio automatizado tudo banido o fw16 ainda era baseado no mesmo projeto eletronico do fw15c mas agora estava amputado a suspensao era rigida demais o entre eixos longo o comportamento de frenagem erratico o carro instavel o jornalista flavio gomes ao questionar senna sobre o carro nos testes pre temporada em 1994 ouviu do brasileiro um desabafo que resume a historia na minha vez cag*ram o carro senna se queixava da traseira nervosa do equilibrio no limite da dificuldade para manter a temperatura dos pneus nas duas primeiras corridas foi pole com margem absurda mas abandonou em ambas nao era so azar ele estava pilotando no limite absoluto de um carro que ainda nao estava compreendido e entao veio imola [caption id= attachment_384280 align= aligncenter width= 1176 ] senna em interlagos pela ultima vez[/caption] senna liderava a corrida com mais de 10 carros de vantagem em apenas seis voltas tentando abrir o suficiente para nao sofrer com a benetton de schumacher no pit stop mas na curva tamburello uma modificaçao na coluna de direçao — feita as pressas a pedido de senna mas sem o devido rigor tecnico — o deixou sem controle do carro que passou reto e atingiu o muro de frente foi o fim de uma era e o fim de senna [caption id= attachment_384281 align= aligncenter width= 1000 ] senna e o fw16 em imola[/caption] newey ficou devastado admitiu que o fw16 era mal resolvido passou anos com o peso do acidente nas costas — especialmente pelo processo judicial que o governo italiano abriu contra ele patrick head frank williams e outros dois engenheiros da equipe — e ainda sente que teve parte da culpa pelo acidente a coluna de direçao do fw16 havia sido modificada as pressas por pedido de senna mas com engenharia de improviso nao foi culpa de uma so pessoa mas sim do ambiente pressao para vencer tempo escasso carro instavel o tipo de situaçao que newey repudiava mesmo com o luto e os problemas do fw16 a williams ainda tinha força para brigar newey trabalhou no fw17 que levou hill ao vice em 1995 e estava no centro do desenvolvimento do fw18 — aquele que levaria damon ao titulo no ano seguinte mas a relaçao com frank williams e patrick head foi se desgastando newey queria autonomia total era o tipo de engenheiro que nao negociava com comites frank via newey como insubstituivel mas nao o tratava como tal patrick head ainda era o chefe tecnico formal da equipe mesmo que na pratica newey ja fosse o cerebro por tras de todos os carros desde o fw14 a gota d’agua veio quando frank recusou um pedido de newey a promoçao como diretor tecnico foi entao que ron dennis entrou em cena ron sempre teve faro para talento e estava reestruturando a mclaren depois de anos sem titulos tinha o apoio da mercedes que estava de volta como fornecedora oficial de motores e de marlboro que queria resultados ron ofereceu a newey exatamente o que ele queria controle total sobre o carro liberdade tecnica e uma estrutura pronta para vencer newey topou — mas so poderia começar em 1997 a mclaren de newey quando adrian chegou a woking em 1997 o mp4/12 ja estava basicamente pronto mesmo assim ele impos sua filosofia onde pode — suspensao distribuiçao de massas entrada de ar aerodinamica da traseira e funcionou a mclaren voltou a vencer ja na estreia — com david coulthard em melbourne seu primeiro projeto na equipe veio no ano seguinte o mp4/13 um monstro de eficiencia aerodinamica leve com entre eixos perfeito distribuiçao de peso cirurgica e aquele motor mercedes v10 que berrava como se estivesse gargarejando pregos era o carro mais rapido do grid — e de longe [caption id= attachment_384284 align= aligncenter width= 1600 ] o mp4/13[/caption] mika hakkinen brilhou nao era midiatico como schumacher mas tinha braço e confiança absoluta no carro foram oito vitorias e o titulo de 1998 em 1999 mesmo com menos confiabilidade hakkinen foi bicampeao e adrian newey estava no topo do mundo pela terceira equipe diferente ele havia transformado engenharia em titulo mas a inquietaçao nao parava em 2001 a ferrari começou a dominar com schumacher e rory byrne a mclaren patinava em desenvolvimento newey assinou um contrato com a jaguar racing liderada por bobby rahal com quem trabalhou na indy durante os anos 1980 mas ron dennis conseguiu persuadir newey a permanecer na mclaren resultando em uma disputa legal que foi resolvida com a permanencia de newey em woking mas ja nao era o mesmo as tensoes internas escalaram newey queria uma abordagem mais inovadora nos designs enquanto a direçao da mclaren optava por estrategias mais conservadoras essa divergencia culminou no projeto do mp4 18 um projeto radical de adrian newey para a temporada de 2003 concebido como um carro a frente de seu tempo ele tinha dimensoes ultracompactas aerodinamica agressiva e arrefecimento minimalista — tudo em nome da maxima eficiencia [caption id= attachment_384285 align= aligncenter width= 1062 ] o mp4 18 com kimi raikkonen[/caption] essa ambiçao virou contra a propria equipe o carro era instavel superaquecia constantemente quebrava com frequencia e jamais completou uma simulaçao de corrida apesar de prometer desempenho revolucionario nunca chegou a disputar um unico grande premio tornando se um dos maiores fracassos tecnicos da historia recente da formula 1 newey ficou tao desanimado que cogitou deixar a formula 1 ao final de 2003 a formula 1 passava a se tornar mais corporativa mais orientada por cfd simulaçoes em computador e newey ainda preferia o modelo classico desenhar a mao testar no tunel de vento confiar no feeling do piloto os computadores estavam tirando a intuiçao da equaçao era hora de mudar enquanto isso a jaguar racing que havia feito a proposta a newey fora colocada a venda no final da temporada de 2004 e arrematada por dietrich mateschitz criador dos energeticos red bull a compra da jaguar era parte de uma estrategia da red bull em associar seu nome aos esportes em diversas modalidades a formula 1 foi uma delas em 2005 a jaguar se tornava a red bull racing ao final daquela temporada adrian newey anunciou que deixaria a mclaren para se juntar a red bull racing a partir de fevereiro de 2006 a decisao foi influenciada por uma oferta financeira significativa da red bull que a mclaren optou por nao igualar adrian newey te da asas a decisao de newey nao foi uma simples troca de time foi uma guinada completa de rumo em vez de seguir no topo com uma estrutura consolidada aceitou o desafio de pegar uma equipe do meio do pelotao e fazer tudo do zero quando chegou a milton keynes o cenario era promissor no papel mas escasso na pratica a red bull tinha dinheiro sim tinha um dono disposto a investir pesado e bancar riscos mas nao tinha carro vencedor nem organizaçao interna de equipe campea newey começou reestruturando processos laboratorio aerodinamico contratando talentos [caption id= attachment_384286 align= aligncenter width= 1569 ] o red bul rb3[/caption] o primeiro carro 100% newey foi o rb3 de 2007 — ainda pouco confiavel e com motor renault que substituia os ferrari do ano anterior david coulthard era o veterano mark webber o novato e o carro… quebrava quebrava muito mas mostrava potencial era um projeto que estava encontrando seu caminho o ponto de virada real veio com o rb5 de 2009 foi quando newey ja com estrutura sob seu controle pode aplicar toda sua filosofia com a nova geraçao de regulamentos aerodinamicos [caption id= attachment_384287 align= aligncenter width= 1020 ] vettel webber e o rb5[/caption] enquanto ross brawn dominava o inicio do campeonato com o difusor duplo a red bull optou por um caminho diferente nada de difusor duplo no começo mas sim um carro com uma base aerodinamica absurdamente eficiente o rb5 era limpo fluido preciso — e sebastian vettel ainda um garoto de 21 anos era o encaixe perfeito a primeira vitoria veio logo em xangai com direito a dobradinha era so o começo entre 2010 e 2013 newey foi simplesmente intocavel os carros da red bull nao so venciam eles davam a impressao de que estavam jogando outro jogo o rb6 de 2010 tinha o melhor chassi o rb7 de 2011 parecia colado no chao usando o escapamento soprado com perfeiçao o rb8 mesmo com proibiçoes tecnicas manteve a vantagem o rb9… bom esse fez o que quis no segundo semestre de 2013 foram nove vitorias seguidas para vettel nove [caption id= attachment_384289 align= aligncenter width= 1728 ] o rb9[/caption] o tetracampeonato de vettel e da red bull era um dominio que nao se via desde a ferrari de schumacher mas agora feito com inteligencia aerodinamica pura sem o peso politico da scuderia e com uma equipe que seis anos antes era vista como piada o fim da era dos motores v8 trouxe tempos dificeis a red bull começou a sentir o peso de um motor renault defasado frente aos mercedes hibridos newey se afastou do dia a dia em 2015 focando em projetos paralelos como o aston martin valkyrie mas nunca abandonou de fato a red bull quando max verstappen subiu em 2016 newey viu que havia ali um novo prodigio alguem com o talento bruto de senna a agressividade de schumacher e a confiança que ele proprio buscava em seus pilotos começou entao o proximo capitulo — aquele que em 2021 levaria a quebra do dominio da mercedes e em 2022 2023 iniciaria outra sequencia historica agora sob novo regulamento tecnico a partir de 2016 com max verstappen e a experiencia acumulada nas frustraçoes do periodo hibrido inicial adrian newey voltou a mergulhar mais fundo no desenvolvimento dos carros ainda que nao estivesse diariamente no tunel de vento ou supervisionando cada detalhe sua influencia era total no conceito aerodinamico e nas decisoes estrategicas do time o rb13 e o rb14 ainda carregavam limitaçoes do motor renault mas o chassi ja era elogiado pelo equilibrio e pelo comportamento em curvas de alta o que faltava era potencia e confiabilidade o verdadeiro ponto de virada veio com a transiçao para os motores honda em 2019 mais do que uma troca de fornecedor foi uma renovaçao de fe tecnica a cultura japonesa de obsessao por detalhe casou com o perfeccionismo de newey o rb15 ja nasceu forte mas foi com o rb16b — evoluçao direta do rb16 de 2020 — que a red bull finalmente emparelhou com a mercedes a batalha com lewis hamilton em 2021 se tornou um epico moderno vencido na ultima volta do ultimo gp em abu dhabi [caption id= attachment_384294 align= aligncenter width= 1607 ] o rb16b[/caption] o carro de 2021 era a culminaçao de anos de refinamento em torno de um conceito de chassi curto eficiente em curvas com um rake acentuado a inclinaçao entre eixo dianteiro e traseiro que maximizava o difusor e a pressao aerodinamica traseira era em essencia uma reinterpretaçao moderna das ideias que newey ja havia explorado em carros como o fw14b so que agora com o apoio de dados digitais simulaçoes de cfd e bancos de dados infinitamente mais robustos mas foi com o novo regulamento de 2022 que newey mais uma vez mostrou por que e considerado o maior projetista da historia da f1 enquanto equipes como mercedes tentavam filosofias extremas como o conceito zero pod newey apostou num caminho que conciliava downforce gerado por efeito solo com estabilidade aerodinamica nas freadas e curvas de baixa o rb18 de 2022 foi um golpe de mestre dominante confiavel e equilibrado venceu 17 das 22 etapas do campeonato e o rb19 de 2023 levou esse conceito a perfeiçao venceu 21 gps em 22 algo sem precedentes com max verstappen quebrando recordes atras de recordes [caption id= attachment_384293 align= aligncenter width= 2560 ] o rb19[/caption] mesmo com as limitaçoes do teto orçamentario e as puniçoes recebidas em 2022 a red bull de newey mostrou um dominio tecnico absoluto o carro nao era apenas rapido era versatil vencia em pistas de alta baixa com asfalto liso ou ondulado sob calor ou frio e mesmo quando surgiam duvidas — como em singapura 2023 onde nao venceu — a recuperaçao era imediata [caption id= attachment_384292 align= aligncenter width= 1280 ] rb20 o ultimo de newey na red bull[/caption] newey — agora proximo dos 65 anos — parecia ter reencontrado a juventude criativa ao lado de verstappen e de uma equipe tecnica que entendia sua linguagem como poucas outras antes em abril de 2024 no entanto veio o anuncio adrian newey trocaria a red bull pela aston martin em 2025 o ciclo estava mais uma vez se encerrando mas como em todas as fases da sua carreira newey nao para seu legado segue se construindo — nao so nos recordes que ajudou a bater mas no modo como reconfigurou a formula 1 em quatro decadas diferentes sempre partindo do mesmo principio a aerodinamica como arte e o carro como extensao da mente do engenheiro enquanto a f1 caminha para uma nova era resta saber se ainda havera espaço para genios como ele que impoem a força da personalidade em seus projetos — e mudam a historia ao fazer isso
SEJA UM MEMBRO DA
FAMÍLIA FLATOUT!

Ao ser um assinante, você ganha acesso irrestrito a um conteúdo verdadeiro e aprofundado. Nada de jornalismo genérico e sensacionalista. Vale a pena? Clique aqui e confira os testemunhos dos assinantes, amostras livres e os benefícios extras que você poderá desfrutar ao ser um FlatOuter!
PARA LER MAIS, CADASTRE-SE OU ASSINE O FLATOUT E TENHA ACESSO LIVRE A TODO CONTEÚDO DO SITE!
JÁ POSSUI CADASTRO OU É ASSINANTE DO FLATOUT?
Este é um conteúdo restrito: pode ser uma matéria só para assinantes, pode ser porque você já atingiu o limite de matérias gratuitas neste mês.