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Car Culture

Afinal, de onde veio esse Uno gigante?

Parece um Uno gigante, não é mesmo? Ou talvez uma Elba levantada. Especialmente com essas rodas, que lembram as rodas de liga leve usadas pela perua da Fiat em 1986, quando ela foi lançada por aqui. Mas aí você chega à dianteira, olha o capô, o conjunto óptico, o para-brisa… depois repara que as janelas são grandes demais para uma Elba e continua intrigado. Que p*** é essa?

Eu respondo: um Rayton Fissore Magnum 4×4.

Não ajuda muito, né? Que cazzo é Rayton? Fissore, igual o DKW? Magnum é por causa do motor? Vamos por partes, já diria o mecânico de Peugeot.

 

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Rayton-Fissore é o nome d empresa fundada em 1976 por Fernanda Fissore, filha de Bernardo Fissore, um dos fundadores da Fissore original; e por seu marido, Giulio Malvino. Os dois queriam queriam seguir no ramo das carrozzerie de forma independente da Fissore.

Com os laços de família, os primeiros trabalhos da Rayton-Fissore foram modificações de carroceria para outras fabricantes, mais especificamente Fiat, Alfa Romeo e SEAT. Esta última foi o ponto de origem do Rayton-Fissore Magnum.

Nos anos 1980, a Rayton-Fissore contratou Tom Tjaarda para reestilizar o Fiat Ritmo/SEAT Ritmo para os espanhóis, e deste projeto nasceu o SEAT Ronda, um dos primeiros passos da SEAT na direção dos projetos autorais — até então a SEAT produzia modelos Fiat sob licença na Espanha. O carro foi um grande sucesso local, vendendo mais de 175.000 unidades entre 1982 e 1986.

Após completar o Ronda, a Rayton-Fissore decidiu lançar um projeto autoral. A ideia era produzir um utilitário para oferecer às forças policiais e militares de todo o mundo. Eles usariam como base um chassi Iveco com o motor turbodiesel do furgão Daily. O projeto acabou engavetado, mas deu origem a um outro carro que pretendia competir com o Range Rover: o Rayton-Fissore Magnum.

Usando partes do chassi Iveco combinadas a uma estrutura tubular de perfil quadrado, eles desenvolveram uma derivação fechada daquele utilitário, com algumas linhas mais elegantes que as de um “jipinho para o deserto”. Vários componentes vieram de outros carros: o conjunto óptico combinava faróis do Lancia Trevi e lanternas traseiras do Citroën BX, enquanto as maçanetas eram as mesmas do Lancia Delta.

O design do interior era simples e, como o exterior, abusava das linhas retas, mas era harmônico e bem resolvido, e o acabamento incluía couro italiano e madeira no painel.

Além do motor turbodiesel da Iveco, o Magnum também podia vir com um quatro-cilindros Fiat de dois litros e 138 cv, ou um V6 Alfa Romeo de 2,5 litros e 160 cv. Em qualquer caso, o câmbio era manual de cinco marchas e levava a força para as quatro rodas.

O Magnum foi atualizado em 1988 e ganhou, além de uma nova grade dianteira, de visual mais limpo e agora com faróis de Fiat Regata combinados aos piscas de Fiat Uno — o que deu a ele a cara de “Unão” que o deixou famoso por aqui. Além disso, ele ganhou novos motores – incluindo um seis-cilindros BMW de 3,4 litros, o M30 usado no Série 6 E24, capaz de entregar até 210 cv.

Naquele mesmo ano ele passou a ser vendido nos Estados Unidos, rebatizado como Rayton Fissore Laforza. No casola forza era proveniente de um V8 Ford igual ao utilizado no SUV Explorer, de 187 cv. O maior peso do motor 5.0 exigiu modificações na estrutura, com travessas reforçadas, e a adoção de uma caixa automática de cinco marchas com reduzida. Pequenas modificações estéticas na dianteira foram promovidas, e os revestimentos de porta e console central foram redesenhados para o modelo americano.

Na Europa ele foi vendido basicamente às forças policiais municipais da Itália — o que levaria a uma suspeita de envolvimento em lavagem de dinheiro público, que era desviado para os cofres do partido Democrazia Cristiana, uma espécie de centrão italiano. Nos EUA, contudo, ele foi mais bem-sucedido, mas ainda longe de ser um veículo de grande volume de vendas. Feito artesanalmente, o Laforza era um SUV caro e que só sobreviveu devido ao grande potencial do mercado americano — foram feitas pouco mais de 6.000 unidades, a maioria nos EUA.

As atualizações no projeto foram poucas: em 1995, foi adotado o motor 5.0 com injeção sequencial do Ford Mustang GT, além do V8 de 5,8 litros usado nas picapes F-Series – este último, com a opção por um supercharger Kenne Bell, que levava sua potência aos 320 cv. Já em 1999, um V8 de seis litros da Chevrolet, que podia ser aspirado (325 cv) ou sobrealimentado por um compressor Eaton (455 cv), e transmissão automática de quatro marchas (também com reduzida) passou a integrar a linha, que foi extinta em 2003.

Sim, extinta em 2003, o que é intrigante. Como um a Rayton Fissore seguiu produzindo o Magnum/Laforza até 20 anos atrás?

Isso, porque além de ser um projeto ultrapassado, o SUV não surgiu em um ambiente muito saudável, do ponto de vista administrativo: sua fabricante declarou falência em 1989 e transferiu todo seu patrimônio ao empresário Gregorio Maggiali. Este, por sua vez, foi preso por lavagem de dinheiro em 1991, devolvendo o controle da companhia a Fernanda Fissore e Giulio Malvino em 1992. O próprio Malvino foi processado, ainda naquele ano, por sonegação de impostos e outros crimes fiscais, situação que o forçou a abandonar a Rayton Fissore em 1997. A empresa foi, então, parar nas mãos de um grupo de investidores chamado Laforza Automobiles, que cuidou da produção do Magnum até o encerramento das atividades, em 2003.

 

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