Os alemães são conhecidos por seu capricho e sua precisão, e não é diferente no mundo dos carros — não se fala em “engenharia alemã” o tempo todo à toa. E também não nos referimos apenas às fabricantes de automóveis, mas também às preparadoras (ainda que, dependendo da extensão das modificações, algumas preparadoras se tornem fabricantes, como a Ruf). Sabendo disso, decidimos perguntar: qual é a preparadora alemã mais fodástica de todas?
Nossa sugestão, só para começar a brincadeira, foi a AC Schnitzer, especializada em BMW, Mini e Land Rover. Obviamente, vocês deram várias outras sugestões bacanas. Vamos conferir algumas delas agora, sem esquecer que esta é só a primeira parte!
Hartge
A Hartge surgiu em 1971, quando os irmãos Herbert e Rolf Hartge, que eram competidores nas categorias de turismo alemãs da época, decidiram levar sua experiência nas pistas para os carros de rua. Enquanto seus BMW 2002 preparados competiam em subidas de montanha e ralis, sua oficina em Merzig, no oeste da Alemanha, preparava os carros de rua com deslocamento ampliado, carburadores maiores, comandos mais agressivos e suspensão preparada, entre outras melhorias. Em 1974, a Hartge mudou-se para a cidade vizinha de Beckingen, onde permanece até hoje.
Hoje em dia, a Hartge concentra suas modificações nos sistemas eletrônicos dos carros, reprogramando a central eletrônica para extrair mais potência de qualquer motor da linha atual da BMW e, quando necessário, alterando componentes mecânicos para adequar-se à nova cavalaria.
No entanto, antigamente a preparação era muito mais mecânica: aumentava-se o deslocamento dos motores; trocava-se cabeçotes, pistões, bielas e sistemas de injeção, e o resultado era quase sempre surpreendente — o Série 6 acima, por exemplo, teve o deslocamento ampliado de 3,2 para 3,5 litros e, de 197 cv, passou a entregar 290 cv. Nada mau, hein?
Desde 1985 a Hartge é considerada não apenas uma preparadora, mas também uma fabricante de automóveis. Sendo assim, você pode ir até lá a pé e sair com um BMW Hartge novinho em folha.
Oettinger
Mini-aula de alemão: quando não se deseja ou não se pode usar o trema (ä, ö, ü) ao escrever uma palavra, coloca-se a letra “e” à frente da vogal. Nürburgring, por exemplo, vira Nuerburgring (como está escrito no endereço do site oficial do circuito).
É por isso que a preparadora fundada pelo alemão Michael Öttinger em 1951 se chama Oettinger — para tornar mais fácil a escrita e pronúncia em outros idiomas. No entanto, ao ser fundada, a Oettinger se chamava Okrasa, que era uma sigla para Oettinger KraftfahrtechnischeSpezial Anstalt, ou “Oettinger Componentes Automotivos Especiais”. Você já deve ter ouvido falar no kit Okrasa para o Fusca, que transformava o besouro em um verdadeiro demônio:
Os kits eram conhecidos como TS-1200 e TSV-1300/30. O primeiro consistia em novos cabeçotes (mais baixos para aumentar a taxa de compressão de 6:1 para 7,5:1) e um par de carburadores Solex 32PBIC, os mesmos usados no Porsche 356 na época; além de opcionais como filtro de ar Fram e radiador de óleo, este desenvolvido pela própria Okrasa.
O famoso fusca Okrasa de Luiz Salomão, o Saloma
O TSV-1300/30 era o mais popular e mais completo, pois além de oferecer todos os itens do primeiro kit, também vinha com um novo virabrequim, feito de cromo-molibdênio e desenhado para aumentar o curso dos pistões de 64 para 69,5 mm. O resultado era um aumento no deslocamento para 1.295 cm³, ou 1,3 litro, que aumentava a potência de 36 para 48 cv. Pode não parecer muito, mas a gente está falando de um Fusca. Quem já guiou um Fusca fuçado sabe a diferença que 10 ou 15 cv fazem (freios maiores e suspensão preparada também ajudam, claro).
O caso é que hoje a Okrasa se chama Oettinger Sportsystems e, apesar do novo nome, eles continuam especialistas em modificar os carros da VW. Sua especialidade é o motor TSI da Volks. Nas versões mais potentes, o 2.0 turbo passa a entregar 400 cv graças a um turbocompressor maior, uma reprogramação na ECU e à troca de alguns componentes internos.
No Brasil, a Oettinger oferece um pacote que aumenta a potência do motor 1.4 TSI, encontrado no Golf , de 140 cv para 170 cv; e outro para o Jetta, que eleva a potência do 2.0 TSI de 211 cv para 250 cv. No caso do Golf, o tempo de aceleração até os 100 km/h baixa de 8,4 s para 8,1 s, enquanto o Jetta passa a acelerar até os 100 km/h em 6,8 segundos. Além disso, são oferecidas alterações estéticas (novas rodas de 19 polegadas, body kit com splitter frontal, difusor traseiro e aerofólio) e um novo sistema de escape. Se quiser, você também pode comprar um Golf ou um Jetta novos, já com as modificações da Oettinger.
Lorinser
Você certamente conhece a AMG e a Brabus (vamos falar dela daqui a pouco), mas já ouviu falar na Lorinser? Bem, talvez já, mas é menos provável. A Lorinser foi fundada pelo mecânico Erwin Lorinser no dia 1º de março de 1930, como uma oficina independente. Com o passar dos anos, no entanto, a companhia começou a se especializar nos veículos da Mercedes-Benz.
Foi natural que a Lorinser se tornasse uma oficina exclusiva para os modelos com a estrela no capô. Mais ainda, que passasse a não apenas consertar e reparar carros, mas também a melhorá-los. Assim, em 1976, foi fundada a Lorinser Sports Service, que tornou-se uma companhia independente em 1981.
Além de modificações estéticas, as preparações da Lorinser são focadas em amentar a potência dos motores na medida certa, trocando coletores de admissão e escape, por exemplo. O foco principal eram mudanças na suspensão e nos freios, itens de acabamento e a instalação de kits aerodinâmicos. A verdade é que são um tanto escassas as informações a respeito dos kits mais antigos da Lorinser. Por outro lado, dá uma olhada nestas fotos que encontramos, mostrando alguns clientes satisfeitos:
John Watson, Alain Prost, Walter Röhrl e Nigel Mansell ao lado de seus Mercedes Lorinser
Com o passar dos anos, a Lorinser ficou mais radical: o Lorinser S550, de 2006, tinha um V8 com nova ECU, coletores de escape e admissão menos restritivos e diversas melhorias na transmissão e no câmbio. A potência aumentava de 387 cv para 430 cv. Hoje, a Lorinser oferece kits para praticamente todos os modelos da Mercedes-Benz, e também para os minicarros da Smart.
Brabus
Na década de 1970, um jovem chamado Bodo Buschmann era um jovem apaixonado pela Porsche — e filho do dono de uma concessionária Mercedes-Benz em Bottrop, no oeste da Alemanha. Ajudando o pai no negócio, Bodo sempre estacionava seu 911 ao lado do Mercedes dele. Só que o velho não gostava muito da situação, e um dia perdeu a cabeça, dizendo que o rapaz só poderia estacionar na frente da concessionária quando seu carro também fosse um Mercedes-Benz.
Bodo comprou um Mercedes-Benz e, mais do que isto, decidiu modificá-lo, pois achava o W116 — primeira geração do Classe S e topo de linha da marca — careta demais. E pior: era mais lento que o 911.
As modificações ficaram tão bacanas que Bodo Buschman decidiu transformar aquilo em um negócio. Depois de convencer seu pai a deixá-lo usar parte da oficina, ele só precisava de um sócio — algo exigido pelo governo alemão para o tipo de empresa que ele queria abrir. E ele logo encontrou um: seu amigo de universidade Klaus Brackman.
O nome da empresa, Brabus GmbH, surgiu da união da primeira sílaba dos sobrenomes de ambos (Brackman e Buschmann), mas Brackman logo foi “demitido” — ele não tinha interesse em continuar no negócio e só cedeu seu nome para ajudar o amigo.
O primeiro grande sucesso da Brabus foi a geração seguinte do Classe S, a W126. Com um VV12 de seis litros e 300 cv a 5.000 rpm e 46,4 mkgf de torque a 3.750 rpm, o carro chegava aos 100 km/h em 6,8 segundos. A partir daí, a Brabus foi desenvolvendo outros kits, para outros modelos. Hoje, sua reputação é a de uma das preparadoras mais insanas do mercado.
Não é para menos: dizem que seus motores V12 biturbo com mais de 800 cv e 100 mkgf de torque (sendo modestos) são capazes de girar a terra ao contrário. Leia a história completa da Brabus aqui!
Dauer
Pensamos em não incluir a Dauer nesta lista por uma razão simples: seus carros preparados não eram modelos de rua cujos donos queriam uma dose extra de pimenta, e sim carros de corrida convertidos para uso nas ruas. No entanto, como algumas preparadoras já citadas por nós (e por vocês) começaram nas pistas, nos demos ao luxo de abrir uma exceção. Até porque a Dauer não escolheu qualquer carro para usar como base — eles já foram direto para o insano Porsche 962.
A Dauer foi uma equipe de corrida fundada em 1987 pelo ex-piloto alemão Jochen Dauer. No entanto, com resultados pouco expressivos naquele fim de década, a Dauer decidiu mudar o foco nos anos 1990.
Aproveitando que a Porsche começou a ceder seus antigos 962 de competição para empresas que desejassem transformá-los em carros de rua, a Dauer logo tratou de garantir sua parte e decidiu transformá-lo em um superesportivo ainda mais rápido que o carro de corrida original.
O carro utilizava o mesmo flat-6 de três litros biturbo que havia ajudado o 962C em suas vitórias. Os cabeçotes refrigerados a água estavam lá, bem como os dois turbocompressores Kühnle. A maior diferença era a ausência dos restritores de potência que limitavam a potência do carro de corrida a 650 cv – no modelo de rua, eram 730 cv. Somos caras flexíveis — se a Dauer preparou o 962 de corrida para as ruas, podemos encontrar um lugar nesta lista para ela.
O chamado Dauer 962 Le Mans (óbvia homenagem à corrida que transformou o 962 em um mito) foi apresentado no Salão de Frankfurt de 1993. Quase que imediatamente, a Porsche procurou a Dauer a fim de propor uma parceria e colocar o carro de volta às pistas.
Mas não parou por aí: e negócio deu relativamente certo e permitiu que, em 1997, Jochen Dauer comprasse os direitos sobre o nome e todo o ferramental que restada da Bugatti, que havia pedido falência naquele ano. Com isto, em 2001 a Dauer apresentou uma versão ligeiramente atualizada do EB110, o antecessor do Veyron, que teve cinco unidades produzidas.
Koenig
Não, a Koenig não tem nada a ver com os amortecedores König ou os hipercarros suecos da Koenigggsssegggggggg: trata-se de uma preparadora alemã fundada em 1974, que ficou famosa por modificar aqueles carros que, de acordo com alguns de seus admiradores, são perfeitos: as Ferrari.
O primeiro kit da Koenig foi disponibilizado para a Ferrari 365 GT4 BB, que era dotada de um flat-12 de 4,4 litros e 344 cv. Seu modelo mais famoso, no entanto, veio nos anos 1980 — quando a Koenig já era reconhecida como uma fabricante de automóveis: a Koenig Competition, baseada na Ferrari Testarossa.
Além do kit aerodinâmico exagerado, típico da década de oitenta, a Koenig Competition recebeu não um, mas dois turbos em seu flat-12. Assim, o motor de 4,9 litros que entregava 396 cv e 49,9 mkgf de torque, passou a entregar 700 cv e 70,3 mkgf de torque — recebendo, é claro, outras melhorias: novo sistema de escape, sistemas de lubrificação e arrefecimento otimizados, um par de intercoolers e sistema de injeção retrabalhado.
Achou 700 cv pouco? Ainda era possível optar pelo kit Evolution que, com mais pressão nos turbos, fazia com que o flat-12 entregasse 1.000 cv e 95,8 mkgf — potência no nível dos hipercarros atuais. Visualmente, o carro mudava bastante, e perdia os faróis escamoteáveis (em alguns casos) e ganhava novas entradas de ar, para-lamas alargados e enormes aparatos aerodinâmicos — receita que foi também utilizada carros de outras marcas como Porsche, Jaguar e Lamborghini.
A Testarossa, no entanto, é o modelo mais famoso e bem sucedido da preparadora — teve 12 unidades produzidas. Hoje em dia, a companhia se foca em reprogramações de ECU e sistemas de escape feito sob medida para carros de diversas marcas, mas é dos exagerados esportivos dos anos 1980 qu e todos lembram ao falar da Koenig.