Por alguma razão, algumas memórias ficam gravadas com mais força na nossa mente. Por exemplo, lembro com clareza do dia em que, esperando minha vez em um consultório de dentista, folheava alguma revista automotiva e vi um anúncio do então recém-lançado Fiat Brava. Era setembro de 1999 – ou seja, vinte anos atrás. O tempo passa, mesmo.
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Eu tinha apenas oito anos de idade, mas já gostava de carros e pensava neles o tempo todo. A foto principal da propaganda era um 3/4 de traseira – e acho que foi isto que me pegou. A traseira curta, alta, de aspecto robusto, com aquelas lanternas divididas em três, me conquistou ali mesmo. Até hoje considero que este é o melhor ângulo do Fiat Brava.
Para mim, todo Brava tinha jeito de esportivo. A dianteira (a mesma do Marea, de quem o Brava era o hatchback) era longa e baixa, com faróis largos, horizontais, e uma grande entrada de ar no para-choque. A postura do carro parecia mais assentada aos meus olhos de criança acostumada com o Fusquinha 1979 na garagem de casa, e as linhas limpas e arrojadas me faziam perceber o cuidado que a Fiat teve com a aerodinâmica do Brava, ainda que naquela época eu nem sequer entendesse direito o significado da palavra “aerodinâmica”.
Acho que é por isso que, até hoje, tenho certo apreço pelo Fiat Brava. Especialmente por sua versão mais potente, o Brava HGT, que é um hot hatch meio esquecido pelos brasileiros.
Veja bem: tanto a versão básica SX quanto a intermediária ELX usavam um motor 1.6 16v igual ao do Fiat Palio da época, exceto que com apenas 99 cv, enquanto o compacto dispunha de 106 cv. Tudo por uma questão de tributos – a potência inferior a 100 cv permitia ao Brava ser vendido por um preço mais competitivo. Foi assim com as primeiras 600 unidades produzidas. Depois disto, porém, o Brava recuperou os 7 cv perdidos.
A versão HGT, contudo, era movida por um motor 1.8 16v de 132 cv a 6.500 rpm e 16,7 kgfm de torque. Eram 5 cv a menos que o Fiat Tipo Sedicivalvole (que, tecnicamente, é o antecessor do Brava HGT), que tinha um motor 2.0 16v de 137 cv. Seu desempenho, de acordo com os dados da fabricante, é bem semelhante – zero a 100 km/h em 9,5 segundos, com máxima de 200 km/h. O Sedicivalvole precisava de 9,8 segundos para chegar aos 100 km/h, e tinha velocidade máxima de 206 km/h.
Contudo, talvez por seu visual mais mundano, ele meio que passa – o Brava HGT era muito parecido com os outros Brava, salvo pelo desenho das rodas (de 15 polegadas, com generosos pneus 195/55); pelo pequeno spoiler na tampa do porta-malas, e pela grade dianteira, que tinha acabamento cinza, e não da cor da carroceria. O interior também era muito parecido com o que se via nas outras versões, com o revestimento dos bancos igual ao do Fiat Marea Turbo e quadro de instrumentos com fundo branco. A suspensão também era mais firme que nos outros Brava.
Apesar do desempenho superior e das características que o colocavam à parte do restante da linha, o Brava HGT não conseguiu a mesma fama que outros hatches esportivos da Fiat no Brasil. Contudo, caso a receita europeia tivesse sido seguida, as coisas poderiam ter sido diferentes.
Na Europa, a versão HGT podia ser encontrada apenas na versão de duas portas, chamada Fiat Bravo – que, como já dissemos outras vezes, até chegou a ser considerada para o Brasil.
O grande trunfo estava debaixo do capô, que usava uma versão de dois litros (1.998 cm³) do motor Fivetech, de cinco cilindros em linha, com. Entre 1995 e 1999, o Fiat Bravo HGT dispunha de 147 cv a 6.100 rpm e 19 kgfm de torque a 4.500 rpm. Com câmbio de cinco marchas, o hot hatch ia de zero a 100 km/h em 8,5 segundos. Em 1999, o motor passou a entregar 155 cv a 6.500 rpm, enquanto o torque permaneceu o mesmo, porém com pico a baixas 3.750 rpm.
Se você assistiu o episódio do FlatOut Midnight a respeito de um dos três Fiat Brava com motor 2.4 Fivetech que existem no Brasil – três protótipos, feitos pela própria fabricante entre 2000 e 2002 –, deve saber que a Fiat brincava com a ideia de colocar o cinco-cilindros no hatchback.
A inspiração foi o próprio Fiat Bravo HGT italiano, mas o plano inicial era colocar o motor 2.0 turbo usado no Marea, com 182 cv – o motor 2.4 foi instalado por sugestão do saudoso jornalista Roberto Nasse. Ainda que tivesse 160 cv (22 cv a menos que o motor turbo), o Brava 2.4 poderia ter sido a versão mais potente à venda no planeta. Mas o projeto acabou abortado, presumivelmente por questões de custo – e para que ele não competisse com o próprio Marea de cinco cilindros.
Com qualquer motor de cinco cilindros, fosse turbo ou naturalmente aspirado, de dois ou 2,4 litros, o Brava HGT que nunca existiu poderia ter sido um carro bem mais empolgante. E talvez não tivesse acabado esquecido pelos entusiastas.
Dizemos mais: caso o Brava HGT fosse mais potente, talvez o atual Fiat Argo HGT – que é movido por um motor 1.8 EtorQ de 139 cv – tivesse mais apelo. Mas, infelizmente, agora só podemos especular.