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Car Culture

Carroll Shelby e seu martelo de resolver problemas

Sabe a cena em que Carroll Shelby libera Ken Miles para ir além dos 7.000 rpm “like hell” em “Ford vs. Ferrari”? Aquilo não aconteceu de verdade, infelizmente. Teria sido uma história e tanto para o anedotário de Carroll Shelby, Ken Miles e a batalha das 24 Horas.

A cena foi inspirada pelo título do livro que serviu de inspiração para o próprio filme — sim, uma cobra mordendo o próprio rabo. Escrito por A.J. Blaime, “Go Like Hell” conta em detalhes toda a história do desafio da Ford à Ferrari em Le Mans sob o ponto de vista de Enzo Ferrari e, principalmente, Carroll Shelby.

O livro também traz uma passagem curiosa, que aparentemente também serviu de inspiração para essa cena: Shelby indo até a beira da pista interagindo com Ken Miles foi algo que realmente aconteceu, mas não em Daytona. E em vez de dar uma autorização, ele decidiu intimidar seus pilotos.

Foi nas 12 Horas de Sebring de 1966. Ken Miles e Dan Gurney estavam em seus respectivos GT40 brigando pela liderança acirradamente, a ponto de colocar a corrida da Ford em risco por baterem um no outro. Shelby tentou se comunicar com a dupla, que havia sido claramente instruída a não disputar posições entre si. A Ford precisava desesperadamente terminar aquela corrida — e precisava terminar muito bem.

Isso, porque aquela foi a primeira corrida do ano, uma prova que a Ford queria usar para provar que poderia superar a Ferrari. E àquela altura eles já haviam gasto um caminhão de dinheiro no projeto — que entrava em seu terceiro ano. O GT40 havia se mostrado um carro muito inconsistente e 1966 foi quando o próprio Henry Ford II deu um ultimato a todos os envolvidos. Assim, Shelby foi claro com Miles e Gurney: terminem a corrida e voltem inteiros.

Só que logo no começo Dan Gurney teve problemas na largada e perdeu quase um minuto. É claro que ele acelerou o que pôde; ele precisava chegar na frente. Só que Ken Miles estava no caminho, e Ken Miles era… bem, era Ken Miles. Gurney assumiu a ponta, mas Miles ficou forçando o colega americano para o desespero de Shelby — que já tinha o coração fraco. Imagine a situação do pobre homem…

A certa altura, depois de tentar insistentemente fazer Miles recuar e se manter em segundo, Shelby sacou um martelo de roda e foi até a beira da pista gritar com Miles, com o martelo em punho (aos 14:14 do vídeo abaixo). Talvez por conhecer o histórico de Shelby com martelos, Miles recuou e terminou a corrida como o chefe havia mandado.

Você lembra desse histórico pelo filme: logo no início, em Riverside, Ken Miles martela a tampa do porta-malas do Shelby Cobra para atender o regulamento da corrida, que previa um espaço de uma valise no porta-malas dos carros. Como o compartimento não fechava, para não ser desclassificado, Miles resolveu o problema de espaço com umas marteladas.

Essa cena também é uma licença poética: quem fez isso foi Carroll Shelby, e não foi em Riverside, mas em  Le Mans, na edição de 1964. A regra era a mesma: os carros esporte precisavam ter lugar para uma valise no porta-malas. E os Cobra Roadsters não passaram nesse teste. Shelby então sacou seu martelo e com algumas porradas resolveu o problema e teve os carros liberados.

Hoje a Superformance, que tem os direitos de replicar o Cobra, faz carrocerias com este “espaço” extra para a valise, em uma referência história das mais legais já feitas.

Ford vs. Ferrari: o indomável Ken Miles e sua vida dedicada à missão “impossível”

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