Ontem (20) a Mercedes-Benz anunciou a versão do SLC – seu roadster compacto que, até dezembro de 2015, se chamava Mercedes SLK. Ele já teve seus dias de glória na segunda metade dos anos 90, quando ainda era novidade e foi muito elogiado pela imprensa por seu desenho e seu comportamento dinâmico; e nos anos 2000, com o incrível SLK 55 AMG – que tinha um V8 naturalmente aspirado de 400 cv na versão Black Series. Mas nos últimos anos, em meio à oferta de outros Mercedes conversíveis, o SLK/SLC ficou meio apagado na linha da marca, e por isso seu fim não é exatamente uma surpresa.
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Fizemos ontem um post especial com a trajetória do Mercedes-Benz SLK, do início ao fim. Hoje, porém, vamos abordar uma página menos conhecida na história do Roadster: a vez em que ele se transformou em um esportivo norte-americano. Mesmo que continuasse sendo fabricado na Alemanha.
Talvez você lembre que, em 1998, a Daimler AG, dona da Mercedes-Benz, fundiu-se à Chrysler para formar a DaimlerChrysler. Na prática, a Chrysler foi comprada pela Daimler, e as duas companhias compartilharam recursos técnicos e financeiros ao longo de quase dez anos – incluindo, por exemplo, alguns componentes Mercedes-Benz na plataforma LX da Chrysler, usada no sedã 300C e também nos Dodge Charger e Challenger.
No caso da plataforma LX, o envolvimento da Daimler foi mínimo – a maior parte do desenvolvimento foi levada a cabo pela Chrysler nos EUA. Em 2004, porém, a foi lançado no mercado norte-americano um carro que, em essência, era um Mercedes-Benz reaproveitado: o Chrysler Crossfire.
O Chrysler Crossfire foi mostrado pela primeira vez como conceito, no Salão de Detroit de 2001, desenhado por Eric Stoddard – que anos mais tarde foi contratado pela Hyundai Kia e projetou o primeiro Genesis Coupe.
O Crossfire era um cupê de visual no mínimo intrigante: suas proporções e as formas gerais eram definitivamente contemporâneas, mas havia alguns elementos retrô, como o capô longo; o para-brisa bipartido (inspirado pelos carros dos anos 50); as saídas de ar nos para-lamas dianteiros; e a traseira fastback, que era um aceno a modelos da década de 1930, com perfil arredondado e para-lamas destacados em relação à porção central da carroceria.
No geral, o Crossfire conceitual era um carro criativo, que não passava incólume aos que o viram no estande da Chrysler em Detroit. E era exatamente esta a intenção, de acordo com a fabricante: na época, o projetista Joe Dehner disse que o conceito foi criado para provocar as pessoas e causar uma impressão, fosse ela boa ou ruim. “Queremos polarizar o nosso público – queremos que as pessoas o amem ou o odeiem”.
Neste aspecto, o Chrysler Crossfire podia ser considerado um carro de imagem, ou halo car – um produto criado para chamar a atenção das pessoas para a marca. Mesmo que estas pessoas não tivessem interesse em colocá-lo na garagem – elas poderiam se interessar pelos modelos mais convencionais expostos no showroom da concessionária. E um carro com esta missão não pode mesmo ser “normal” demais.
Àquela altura, a Chrysler já preparava a versão de produção do Crossfire, que foi apresentada no Salão de Los Angeles de 2002 e começou a ser fabricada em 2004 na em Ösnabruck, na Alemanha.
O Crossfire produzido em série era uma transcrição quase 100% fiel do conceito, exceto pela dianteira – que ganhou faróis horizontais e formas mais conservadoras, além de perder o para-brisa bipartido, que era uma de suas características visuais mais marcantes.
Outro aspecto curioso do Crossfire era sua plataforma. Quando a Mercedes-Benz começou a desenvolver a segunda geração do SLK, a R171, em meados dos anos 2000, a plataforma da primeira geração (R170) foi cedida à Chrysler para o desenvolvimento do Crossfire. Como resultado, ele aproveitou cerca de 80% dos componentes mecânicos do SLK. Isto incluía a suspensão, com braços triangulares sobrepostos na dianteira e eixo traseiro multilink, o motor V6 de 3,2 litros M112, de 3,2 litros, e o câmbio automático 5G-Tronic. Havia, também, a opção por uma caixa manual de seis marchas.
O V6 era oferecido em duas versões: naturalmente aspirado, com 218 cv e 31,6 mkgf de torque, e supercharged de 335 cv e 42,8 mkgf de torque – esta última, com números virtualmente idênticos aos do Mercedes SLK32 AMG, que usava o mesmo conjunto mecânico.
Usado no Crossfire SRT-6, o motor sobrealimentado era capaz de levá-lo de zero a 100 km/h em 4,8 segundos, com máxima de 250 km (limitada eletronicamente). O Crossfire naturalmente aspirado, que tinha o mesmo motor do SLK 320 R170, ia de zero a 100 km/h em 6,4 segundos quando equipado com câmbio manual, e também tinha a velocidade máxima limitada em 250 km/h.
Inicialmente oferecido como cupê, em 2005 o Chrysler Crossfire começou a ser vendido também como roadster, tanto nas versões naturalmente aspiradas (Base e Limited) quanto na supercharged (SRT-6). Mas o carro não durou muito mais tempo.
Inicialmente concebido para dar destaque à parceria entre Daimler e Chrysler, o Crossfire tinha um visual marcante e o bom desempenho herdado do Mercedes-Benz SLK, especialmente quando equipado com supercharger. Os que gostavam dele também elogiavam a combinação de visual norte-americano com qualidade alemã de construção e acabamento.
Acontece que ele chegou na hora errada: pouco depois de seu lançamento, a Chrysler começou a sentir os efeitos da crise global que abateu a indústria no fim da década passada, chegando a seu auge em 2009. Em 2007 a DaimlerChrysler anunciou a venda da maior parte das ações da gigante norte-americana, dando início a um processo de reestruturação que, entre outras medidas, resultou no fim do Chrysler Crossfire.