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Car Culture História

Cizeta V16T: o supercarro fracassado mais impressionante já feito

Não é raro ver pequenas companhias surgindo no universo dos supercarros, normalmente fundadas por gente já envolvida com eles, procurando dar corpo a uma ideia nova. Raros são os casos de sucesso (a Pagani é um exemplo, Koenigsegg outro). Mas só por que um supercarro se torna um fracasso monumental, não significa que ele seja ruim, ou não mereça ser admirado — e, entre os fracassos, talvez o Cizeta V16T seja o mais admirável deles.

A história da Cizeta começou em meados da década de 1980, quando o engenheiro automotivo Claudio Zampolli imaginou um supercarro com motor de dezesseis cilindros. Zampolli tinha uma concessionária de Ferrari e também uma oficina especializada em supercarros — ele não era exatamente um iniciante no assunto. Faltava a ele um investidor.

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Este entrou, literalmente, pela porta da garagem. Era o compositor e produtor musical italiano Giorgio Moroder, famoso por compor a trilha sonora de Scarface (1983). Moroder levou seu Lamborghini Countach para uma revisão na oficina de Zampolli e os dois decidiram fundar uma fabricante de supercarros usando as ideias de Zampolli e os recursos financeiros de Moroder.

O nome escolhido foi Cizeta-Moroder, usando as iniciais de Zampolli pronunciadas em italiano (“c” = ci, “z” = zeta) e o sobrenome de Moroder. O único produto lançado pela companhia até hoje foi o V16T.

Como o nome denuncia, o motor é um V16 — sim, duas bancadas de oito cilindros em V, lado a lado. O T, contudo, não significa “turbo” — seria loucura demais. Na verdade, significa “tranversal”. Um V16 montado na transversal… pensando bem, é uma loucura ainda maior.

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Mas a posição transversal não é a única coisa incomum neste motor. O V16 desloca 5.995 cm³ e, na verdade, pode ser entendido como dois motores V8 compactos usinados em um mesmo bloco com virabrequins separados, e ligados ao câmbio através de uma caixa de sincronização.

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Por isso a transmissão manual ZF de cinco marchas fica entre os dois, em posição longitudinal. Além disso, o motor é reclinado em 10 graus para ajudar a reduzir o centro de gravidade do carro. Se você quer saber como ele ronca, veja isto. Digno da loucura mecânica que o produz:

Os “dois motores” e a transmissão formam o desenho de um “T” — outra razão para a letra no nome do carro. O conjunto entregava 560 cv a 8.000 rpm e 55,1 mkgf — uma boa vantagem sobre o Lamborghini Countach (455 cv) e a Ferrari F40 (478 cv), os supercarros que eram referência em 1988, ano em que o primeiro protótipo ficou pronto.

Além do motor diferente de tudo o que veio antes (ou depois), o supercarro da Cizeta tinha estrutura tubular de aço e carroceria de alumínio, suspensão com braços sobrepostos do tipo duplo-A na dianteira e na traseira e freios com discos Brembo de 305 mm de diâmetro e pinças de quatro pistões nas quatro rodas.

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Os supercarros da Lamborghini na época e o V16T têm uma coisa em comum: eles foram projetados pelo designer italiano Marcello Gandini, do estúdio Bertone. Gandini desenhou o Countach no início da década de 70 como sucessor do Miura e, em 1985, começou a trabalhar no sucessor do Countach — o Diablo, que seria lançado em 1990.

Só que, no meio do caminho, a Lamborghini foi adquirida pela Chrysler — mais precisamente, em 1987. Quando Gandini mostrou seu projeto para o Diablo aos executivos da companhia, a nova administração aprovou os desenhos, mas achou que certos elementos eram agressivos demais, e o modelo final trouxe algumas alterações significativas em relação à ideia original de Gandini.

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Seria loucura dizer que os dois não se parecem

O projetista não ficou nada satisfeito com aquilo que considerou uma diluição do seu trabalho, e tratou de procurar uma fabricante de supercarros para vender o projeto original. Esta fabricante acabou sendo a Cizeta — o que significa que, de certo modo, o Diablo é o V16T que deu certo — ou que o V16T é o carro que o Diablo poderia ter sido.

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Esteticamente, o V16T parece um Diablo mutante ou alienígena: a identidade visual dos dois modelos é bastante semelhante, mas o V16T tem entradas de ar na lateral (que lembram a Ferrari Testarossa) e quatro faróis escamoteáveis. Além disso, ele é um absurdamente largo por causa do V16 transversal — a alternativa era fazer um carro extremamente longo, o que o tornaria ainda mais estranho.

E tem mais: os dois acabaram competindo diretamente, porque o Lamborghini foi lançado em 1990 e o Cizeta chegou ao mercado um ano depois. Àquela altura, Giorgio Moroder já havia saído da companhia, e os carros foram comercializados apenas como Cizeta V16T. Dizem que, além da contribuição financeira, Moroder também desenhou o logo da Cizeta.

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Agora, dizer que ambos competiram não é o mesmo que dizer que a briga foi acirrada, porque não foi. O fabricante declarava que o V16T era mais rápido do que o Diablo, levando 4,5 segundos para ir de 0 a 100 km/h com velocidade máxima de 328 km/h e o interior era bem acabado, confortável e trazia recursos que os Lamborghini não tinham. Contudo, custava US$ 649 mil (R$ 1,4 milhão) — o dobro do preço de um Diablo — e lhe faltava o peso de um nome como Lamborghini. Além disso, a Cizeta não conseguiu homologá-lo para rodar nos EUA, o que significava um mercado a menos para o V16T. E um mercado bem importante para um supercarro, diga-se.

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Sendo assim, as encomendas ficaram bem aquém do que Zampolli previa — embora tivesse capacidade para produzir um carro por semana, a fábrica só fez oito carros entre 1991 e 1995, além de um protótipo. Depois disso, há registros de outras três encomendas entre 1999 e 2003 — dois cupês e um conversível único, que custou US$ 849 mil (R$ 1,9 milhão), o Fenice TTJ Spyder.

A Cizeta original faliu pouco depois do fim da produção do V16T original. Desde então, Zampolli se mudou para a Califórnia, nos EUA, e abriu a Cizeta Automobili USA. Além de ser uma oficina de supercarros, a Cizeta USA ainda produzia o V16T sob encomenda até 2011. O preço é um mistério, mas segundo o site da fabricante, que foi atualizado pela última vez em 2001, o modelo partia de US$ 800 mil, ou R$ 1,77 milhão — isso há 13 anos!

Então, da próxima vez que você sair para comprar um supercarro de 16 cilindros, saiba que o Bugatti Veyron não é sua única opção!