Os fãs de muscle cars estão entre os entusiastas mais apaixonados que existem — e, de fato, há algo fascinante nestas máquinas americanas com seus gorgolejantes e torcudos motores V8. E alguns são verdadeiros ícones, como o Camaro Yenko, o Ford Mustang Boss e os “aero cars” da Mopar. E uma bela seleção destes ícones foi leiloada em setembro pela polícia federal dos EUA.
A razão: por mais sensacionais que sejam, estes carros foram adquiridos com dinheiro sujo, amealhado por meio de um engenhoso esquema de propina.
O ex-dono dos carros se chama David Nicoll, que os comprou com o sangue de outras pessoas — ou quase isto: Nicoll foi presidente de uma empresa chamada Biodiagnostic Laboratory Services (BLS), em New Jersey. Ele subornava médicos para encaminhar pacientes a seu laboratório para realizar exames de sangue desnecessários, e cobrava dos planos de saúde por isso.
Ao longo de sete anos, durante os quais coordenou pessoalmente o esquema de propina, Nicoll recebeu aproximadamente US$ 33 milhões (R$ 79,8 milhões), enquanto a BLS faturou cerca de US$ 100 milhões (R$ 242 milhões). Nicoll não fazia questão de esconder o quanto ganhava, gastando o dinheiro em casas noturnas, bilhetes para jogos, um apartamento para uma “amiga” (no valor de US$ 700 mil, ou R$ 1,7 milhão) e, claro, carros.
David Nicoll foi preso em abril de 2013 e, em julho declarou-se culpado por propina. Agora, ele pode ser condenado a uma pena de 17 a 22 anos de prisão, além de ter sua coleção de carros apreendida e leiloada pela polícia federal americana.
Nicoll gastou cerca de US$ 5 milhões (ou R$ 12,1 milhões) em sua coleção de automóveis e, ainda que tenha comprado algumas Ferrari, sua maior paixão eram muscle cars americanos. Mas ele não saiu comprando todos os muscle cars que apareciam — Nicoll limitou-se a uma seleção de algumas das versões mais desejadas de modelos das três grandes de Detroit: Ford, Chevrolet e Chrysler.
Não tem a ver com quantidade, e sim qualidade: a lista inclui um dois Ford Mustang (um Shelby GT500 1967 e um Boss 429 1970), quatro Chevrolet (um Camaro, um Chevelle e um Nova, todos da Yenko, e um Chevelle 1970) e um Plymouth Superbird 1970.
Os carros foram vendidos em um leilão presencial que aconteceu no dia 12 de setembro em Lodi, New Jersey e, segundo a companhia de leilões A.J. Willner, acumularam ao todo quase US$ 2,5 milhões em lances. Vamos dar uma olhada nos carros que foram arrematados e seus valores.
Ford Mustang Shelby GT500 1967
US$ 170 mil (R$ 411 mil)
Dotado de um V8 de sete litros (428 pol³), dois carburadores de corpo quádruplo e 360 cv, o Shelby GT500 1967 era capaz de chegar aos 100 km/h em 6,2 segundos e virar o quarto-de-milha em 14,6 segundos.
Ford Mustang Boss 429 1970
US$ 265 mil (R$ 641 mil)
Mustang Boss 429: uma série limitada de 500 unidades do Mustang, criada pela Ford em 1969 para poder homologar seu novo motor para a Nascar. Com base no big block 385, a Ford criou um monstro de sete litros com carburador quádruplo Holley e potência declarada de 380 cv. Contudo, é razoável dizer que a potência real ficava na casa dos 500 cv. Em 1970, mais 499 unidades foram feitas.
Chevrolet Camaro Yenko S/C 1969
US$ 315 mil (R$ 762 mil)
Este é um dos 201 Camaro Yenko construídos por Don Yenko em 1969 — último ano do Camaro que ensinou a Chevrolet que o melhor era colocar o maior motor possível no Camaro. Você pode ler toda a história neste especial.
Chevrolet Chevelle Yenko 1969
US$ 237 mil (R$ 573 mil)
Além do Camaro, Don Yenko também aplicou seu tratamento a outros modelos da Chevrolet. Este Chevelle Yenko 1969 é um do 99 existentes, e aparentemente rodou apenas 28 mil km (18 mil milhas) antes da apreensão.
Chevrolet Nova Yenko 1969
US$ 400 mil (R$ 968 mil)
Contudo, este é o mais raro dos Yenko: a concessionária/preparadora só fez 37 Chevrolet Nova com motor V8 427 em 1969. Por esta razão, ele também foi o mais caro do trio.
Plymouth Hemi Superbird 1970
US$ 575 mil (R$ 1,39 milhão)
Um letígimo “aero car” da Mopar, criado para competir na Nascar (ao lado de seu irmão, o Dodge Charger Daytona). A dianteira em forma de cunha e a exagerada asa traseira lhe rendeu o apelido, e eles eram tão superiores à concorrência que venceram praticamente todas as provas em 1969 e 1970. A organização mudou as regras em 1971, e os aero cars foram impedidos de competir. Cerca de 3.000 unidades foram construídas para homologação.
Além destes, outros três carros que faziam parte da coleção acabaram não indo parar nas manchetes, mas também são impressionantes: um Chevrolet Chevelle 1970 vermelho conversível, que foi arrematado por US$ 70 mil (R$ 169 mil — uma pechincha se comparado aos outros carros), um Chevelle 1970 preto e um Hemi Cuda 1970 que, mesmo desmontado e sem pintura, recebeu a martelada por US$ 375,5 mil (R$ 908 mil).
O julgamento de David Nicoll acontecerá no fim do ano, em dezembro — e, até lá, ele provavelmente não terá tempo de dizer um último adeus a seus carros, que a esta altura já devem estar em suas novas casas — ainda bem.
[ Fotos: A.J. Willner / Sugestão de Rafael Brusque Toporowicz ]