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Car Culture

Como o Fusca chegou ao Brasil?

Não é à toa que hoje, dia 20 de janeiro, comemoramos o Dia Nacional do Fusca. O brasileiro é tão ligado ao modelo que não se contentou apenas com o Dia Mundial do Fusca, comemorado no dia 22 de junho, e logo tratou de fazer um dia para celebrar a existência do Fusca no Brasil. Nem poderia ser diferente. Mesmo depois de quase 70 anos desde sua chegada, não há alguém que não tenha uma história com ele.

Mas como ele chegou ao Brasil? Bem.. depende do tipo de chegada que você quer saber. Quando o primeiro Fusca foi trazido ao Brasil, ou quando ele começou a ser vendido no Brasil?

Os Fuscas mais antigos dos Brasil são anteriores à produção local. O mais antigo deles é um exemplar de 1946 que foi encontrado há pouco menos de dez anos em Taubaté/SP.  O carro, infelizmente, foi modificado ao estilo “speedster”, sem portas nem capota, para ser usado em atrações tipo “Parede da Morte”. A modificação, contudo, é tão antiga quanto o carro: foi feita em 1948 ainda na Alemanha e, por isso, tem seu valor histórico. Três anos depois, em 1951, o carro foi trazido ao Brasil pelo alemão que fazia o show em seu país de origem e ficou aqui, sendo usado em apresentações até os anos 1970.

Foto: André Beldi

O que aconteceu com o carro entre os anos 1970 e 2016 é incerto. O carro foi encontrado em um terreno de Taubaté por seu atual proprietário, André Beldi, que percebeu o potencial histórico do modelo quando viu o logotipo antigo da Volkswagen no carro — o VW circunscrito pela engrenagem, usado entre 1939 e 1945. Ao pesquisar o chassi do carro, descobriu ser um exemplar da primeira leva de Fuscas, feitos durante a intervenção britânica na atual cidade de Wolfsburg, sede da fábrica do “KdF Wagen”.

Após arrematar o Fusca, André pensou em transferir a mecânica para uma carroceria da mesma época, mas em certo ponto acabou conseguindo contato com a família do alemão que trouxe o carro ao Brasil, e conheceu os detalhes da história do carro. Assim, ele decidiu restaurá-lo com base nas modificações feitas em 1948 — com direito à cor e letreiro pintado na época.

Outro candidato a primeiro Fusca do Brasil é o modelo 1949 de Jorge Cirne, que já apareceu por aqui no FlatOut Classics & Street. O modelo é o segundo mais antigo do Brasil, mas é o mais antigo ainda em sua forma original — embora tenha sido restaurado.

Jorge encontrou o motor do carro anunciado no Mercado Livre e reparou que tratava-se de um motor 1100, mais antigo que os oferecidos no Brasil. Ao questionar o vendedor, soube que o motor havia sido retirado de um Fusca 1949 — o qual o vendedor se recusava a vender junto do motor. Um ano depois, contudo, o carro foi anunciado e, apesar do péssimo estado de conservação, Cirne comprou o carro e iniciou um processo de restauração que levou três anos e incluiu até mesmo o garimpo de peças na Alemanha.

Jorge e seu Fusca 1949, o mais antigo do Brasil ainda original | Flatout Classics

Diferentemente do Fusca 1946, a história deste exemplar de 1949 nunca foi documentada, então não se sabe quando exatamente ele chegou ao país — se foi ainda novo ou se foi trazido posteriormente. O que se sabe é que, pelo código do chassi, ele foi construído entre dezembro de 1948 e janeiro de 1949. É por isso, também, que não se sabe qual dos dois chegou antes ao Brasil. Há registros de outros dois Fusca 1949 no país, um de julho e outro de outubro daquele ano — mais novos que o de Cirne, portanto —, contudo, a localização e o estado atual dos carros são desconhecidos.

O que temos de concreto sobre a chegada do Fusca ao Brasil, portanto é apenas o início de sua fabricação — nenhum jornal, por exemplo, anunciou ou noticiou o Volkswagen antes de 1950. A primeira menção aparece somente em 20 de abril de 1950, quando o próprio Heinz Nordoff, então chefão da Volkswagen, veio ao Brasil reunir-se com a diretoria da Brasmotor e anunciar a fabricação do Fusca em São Paulo.

Recorde do jornal Correio Paulistano de 29/04/1950

Se Nordoff e a “Braz-Motor” já estavam celebrando a chegada do Fusca ao Brasil em abril de 1950, esta história, sem dúvida, começou um pouco antes.

Há algumas versões da história, mas a que foi oficializada pela Volkswagen nos anos 1980, conta que José Bastos Thompson, então diretor da Brasmotor, ficou interessado pelo Fusca ao ver uma notícia sobre a reconstrução da fábrica alemã pela ocupação britânica.

A Companhia Distribuidora Geral Brasmotor, a empresa fora fundada em São Bernardo do Campo pelo boliviano Hugo Miguel Etchenique em 1945. Quando Schultz-Wenk veio ao Brasil, em 1949, a Brasmotor já montava modelos utilitários da Chrysler no Brasil em regime CKD, em um galpão na rua Marechal Deodoro, em São Bernardo do Campo/SP. Thompson era o responsável pela operação da fábrica.

Thompson tinha contato com o então presidente da Chrysler, Cecil B. Thomas, que veio ao Brasil em junho de 1949 para inaugurar a fábrica da Brasmotor em São Bernardo do Campo/SP.  Durante os eventos da inauguração, Thompson teria convencido Thomas de que o Volkswagen poderia ser um bom complemento aos modelos Chrysler no Brasil. E segundo esta versão da história, Thomas convenceu Nordhoff de que o Brasil seria um bom local para instalar uma fábrica da Volkswagen.

Cecil Thomas cumprimenta Miguel Calmón, da Brasmotor sob os olhares de Etchenique e Thompson. Foto do acervo de Alexander Gromow

Há uma outra versão que coloca na história um outro personagem: Friedrich Wilhelm Schultz-Wenk, um alemão que conhecera Nordhoff em Wolfsburg e decidiu emigrar para o Brasil. Nordhoff teria pedido a Schultz-Wenk para estudar a viabilidade de se vender Fuscas na América do Sul.

Aqui as versões se encontram: Nordhoff havia ido à Argentina estudar a viabilidade da fábrica da Volkswagen por lá, mas ao saber do interesse da Brasmotor em produzir o Fusca no Brasil, entrou em contato com Schultz-Wenk e desembarcou por aqui na segunda metade de 1949.

No site Auto Entusiastas, Carlo Gancia conta que Nordhoff ofereceu a Schultz-Wenk a representação da Volkswagen na América do Sul, e que isso aconteceu em sua visita a São Paulo em 1950, contudo, Nordhoff já estava reunido com o pessoal da Brasmotor e a fábrica já estava anunciada em abril de 1950. Aparentemente, o convite aconteceu no ano anterior.

Schultz-Wenk, Nordhoff e Etchenique em 1949. Foto do acervo de Alexander Gromow

O fato é que Schultz-Wenk acabou se tornando o diretor da Volkswagen no Brasil já a partir de 1950, e tinha como primeiro desafio vender no Brasil dominado pelos grandes carros americanos, um carro popular alemão ainda associado à Alemanha que acabara de ser derrotada na Segunda Guerra.

As primeiras unidades chegaram ainda em 1950 — os primeiros anúncios em jornais datam de dezembro de 1950 (abaixo). Consta que foram trazidas 30 unidades do Fusca pelo porto de Santos, a um preço curiosamente elevado, considerando se tratar de um carro popular. Os carros foram vendidos quase imediatamente e, já em 1951, a Brasmotor começou a receber os carros desmontados para a montagem e venda local, enquanto Schultz-Wenk tratava de estabelecer a rede de concessionários.

Anúncio no Diário de Notícias de 15/12/1950

Como eram totalmente importados, os carros precisavam de compensação: Schultz-Wenk comprava máquinas agrícolas no Brasil e as exportava para a Alemanha, conseguindo assim trazer os conjuntos desmontados do Fusca e da Kombi. A montagem, diferentemente do que pode parecer, era praticamente um processo de fabricação, pois a carroceria era soldada e pintada no Brasill, e os motores e acabamento interno eram montados nas instalações da Brasmotor.

Em 1953, a Volkswagen chegava oficialmente ao Brasil — de início, instalada em um galpão alugado no Ipiranga, em São Paulo. Novamente, as peças chegavam importadas da Alemanha e eram montadas no Brasil. Cerca de 2.300 unidades do Fusca e quase 560 exemplares da Kombi foram fabricados desta forma. Esta fase não durou muito, contudo. Diante do sucesso do Fusca, logo a VW viu que precisava de uma fábrica de verdade para ele. Com os incentivos de desenvolvimento do governo de Juscelino Kubitschek, a Volkswagen iniciou, em 1956, a construção de sua nova fábrica às margens da rodovia Anchieta, em São Bernardo do Campo/SP.

O primeiro prédio ficou pronto em 1957 (a chamada Ala II) e dele saiu o primeiro Volkswagen nacional: uma Kombi, produzida em 2 de setembro daquele mesmo ano. A fábrica, contudo, só seria inaugurada oficialmente em 18 de novembro de 1959, quando o Fusca foi finalmente nacionalizado, tornando-se legalmente um carro brasileiro.


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