O automobilismo é um esporte perigoso, sim — toda e qualquer visita a um autódromo é imprevisível e uma tragédia pode estar esperando para acontecer. Prevenção é sempre importante e equipamentos de segurança são fundamentais. O ideal é nunca precisar contar com eles, mas uma hora ou outra você acaba realizando um teste prático.
Circula pelas redes sociais e sites um vídeo que mostra o que acontece quando se divide a pista com gente irresponsável — para dizer o mínimo. Por que o que aconteceu com o piloto Darren Langevelt em uma corrida regional no Reino Unido não tem outra explicação se não a imprudência e o egoísmo do cara ao volante do Porsche 968 que estava à frente de seu Renault Clio Cup 172.
Felizmente o Renault Clio era todo modificado e preparado para as pistas, com gaiola de proteção, cintos de competição e bancos concha. Por esta razão, o habitáculo ficou protegido enquanto a dianteira virou uma massa de metal retorcido. Mas o que aconteceu, então?
Por um bom tempo o Renault Clio perseguiu o Porsche bem de perto, e não foram poucas as oportunidades que ele teve para ultrapassar. Contudo, defendendo sua posição com unhas e dentes o dito piloto do Porsche não perdeu uma oportunidade de costurar a pista e trancar a passagem do Clio algumas vezes — como se o circuito de Cadwell Park, conhecido como “mini-Nürburgring”, já não fosse estreito e traiçoeiro o bastante.
Em determinado momento, suas ações fazem com que um Lotus Elise saia da pista (por volta de 1:22 no vídeo), mas é a partir dos 1:35 que começa o espetáculo principal de estupidez: ao tentar uma ultrapassagem por dentro em uma curva à direita, o Clio é empurrado sem cerimônia pelo cara no Porsche 968. E o pior: a curva acaba, começa a reta e no meio do gramado está o muro da reta dos boxes.
As palavras de Langevelt descrevendo o que passou por sua cabeça no momento em que o piloto do Porsche o empurrou com o carro impressionam?
Quando percebi que aquilo ia virar um incidente, a primeira coisa que pensei foi ‘minha esposa vai me matar se eu bater hoje. Aí, quando me dei conta de que era só um passageiro indo direto para o impacto, e que ia doer… pensei nos meus filhos.”
Relembrando o acidente, Langevelt elogia a empresa que construiu seu carro, mas também diz que deve sua vida ao HANS.
HANS é a sigla em inglês para Head and Neck Support (“Suporte para Cabeça e Pescoço”), e ele faz exatamente isto: dá suporte à cabeça e ao pescoço para que, no caso de uma desaceleração extrema e repentina (no caso de uma colisão em alta velocidade), sejam evitadas fraturas basilares como as que mataram Senna e Roland Ratzenberger no mesmo fim de semana.
Feito de fibra de carbono para ser leve e resistente, o HANS consiste em um suporte em forma de U que fica atrás da cabeça e preso ao capacete por duas âncoras em cada lado, mais dois braços que avançam sobre os músculos peitorais. Além de evitar que a cabeça chicoteie com violência, o HANS transmite a energia do impacto para o tórax, que é muito mais resistente do que o pescoço.
Como você deve ter visto no post da nossa coluna Doctor Gas sobre o acidente de Dale Earnhardt, da NASCAR, o HANS foi inventado na década de 1980 mas demorou quase duas décadas para que ele fosse aceito pela maioria dos pilotos, que o julgavam desconfortável e diziam que ele obstruía a visão e poderia causar mais acidentes. Depois da morte de Dale Earnhardt em 2001, porém, a NASCAR não demorou a torná-lo obrigatório e, dois anos depois, a FIA seguiu os passos e tornou o HANS obrigatório também na Fórmula 1.
Dizem que você não se dá conta da importância dos equipamentos de segurança até precisar deles. E Langevelt, o piloto do Clio, diz que deve sua vida ao HANS — e que sequer cogita a possibilidade de entrar na pista de novo sem um protetor cervical. “Se você está se preparando para correr sem um destes, você não está nem um pouco preparado”.
O HANS é caro — nos EUA, o preço de um protetor profissional chega perto dos mil dólares. No Brasil, fica entre R$ 2.500 e R$ 3.500, e você ainda precisa de um capacete compatível e de cintos de quatro, cinco ou seis pontos. Contudo, é preciso lembrar que ele salva vidas — o próprio Langevelt provavelmente não estaria sentado ao lado de seu Clio (que era conhecido como “Silver Shit”) todo destruído, contando como foi seu acidente, se não fosse pelo HANS.