Caros gearheads com oito cilindros na veia, é hora de afiar os dardos: estamos de volta com o especial de preparação de Dodge V8, o Dart Sharpening! Na primeira parte, falamos sobre a importância de se reforçar o monobloco com os subframe connectors e sobre os sistemas de direção e de suspensão dianteira. Na segunda parte, demos uma série de dicas sobre o diferencial traseiro – entre relações e sistemas autoblocantes – e a suspensão traseira de feixes de molas.
Agora, é hora de falarmos sobre embreagens e câmbios – duas, três, quatro, cinco e seis marchas, manual e automático. Atenção, donos de Maverick e Opala (no caso deste último, os que fizeram o swap de transmissão): há muito conhecimento útil para vocês neste texto também.
Embreagem, capa seca e acionamentos
Vamos começar pela descrição básica do equipamento original: embreagem monodisco a seco, disco de 10,4” de diâmetro e um platô originalmente feito no padrão Borg and Beck, com 12 molas helicoidais e três alavancas debreadoras. Cumpre apenas a função “stock” e não vai muito além disso. É limitada em sua resistência a abusos e não tem folga de projeto suficiente para aceitar uso mais entusiástico ou aumentos notáveis de torque e potência no motor, ok?
A seta ilustra na foto o ponto onde ocorre o defeito que inutiliza a embreagem, onde o balancim que atua aliviando a tensão do platô quebra.
Como alternativa, temos o uso de embreagens mais modernas, também monodisco, mas com platô tipo diafragma, sendo a mais comum e popular delas as usadas nas picapes Chevrolet C10 até 1985, que tem diâmetro de 10”. Vale um comentário explicativo na medida em que existem padrões comuns à indústria automobilística norte-americana, que são copiados aqui nos carros que tenham origem lá. O padrão de 10” e o de 10,4” têm a mesma furação no volante do motor. Ou seja, onde cabe um platô de 10, cabe um de 10,4 “ e vice versa. Em teoria, o maior platô seria melhor, mas o menor, no nosso caso o de C10 de 10”, é tão superior pelo diafragma que supera com folga o maior mais antigo de 10.4”.
Uma vantagem adicional é que o platô de diafragma oferece a mesma pressão de trabalho no disco, mas com uma força de atuação menor. Logo, ao trocar o platô antigo pelo moderno, a primeira coisa que se nota é que o esforço de acionamento do pedal diminui estupidamente.
Diminui tanto que a mola que tem a função de deixar a embreagem original mais leve chega a superar a força necessária ao acionamento da embreagem, sendo normal em alguns carros o pedal ficar colado no fundo. A solução é simples: tanto podemos retirar esta mola que fica embaixo do painel, o que deixa o acionamento do pedal bem mais duro, até ligeiramente mais duro que o original do carro, quanto podemos simplesmente aliviar a mola, com uma aquecida simples nela com auxilio de um maçarico.
Neste último caso, devemos proceder da seguinte forma: ligamos o maçarico e colocamos nele uma chama neutra, aproximamos a chama do arame da mola, na última espira, próximo ao término da mesma, onde temos o gancho que a prende no corpo da haste do pedal. Ao verificar que a mola esquentou e o arame dela está rubro, afastar rapidamente e desligar o maçarico. Deixe a mola esfriar naturalmente ou use um spray de lubrificante tipo WD40. Cuidado para não provocar um incêndio no carro.
Esta última opção é a que usei em todos os meus carros, que estão equipados com embreagem de diafragma e apresentam o pedal ridiculamente macio, a ponto de surpreender quem tem o habito de dirigir Dodge. E isso sem sequer sacrificar o funcionamento da embreagem, que ainda é bem mais resistente a abusos que a original, e que apresenta vida útil bem maior, também.
Ao falarmos da embreagem, é legal comentar sobre a carcaça dela, também tratada por capa seca.
No caso de uso normal, ou de veiculo original, claro que a original que veio no veiculo atende plenamente. Mas e se você for um entusiasta por drag race e usar o carro frequentemente em provas de arrancada?
Vale considerar com entusiasmo a aquisição de uma capa seca do tipo scattershield (a imagem abaixo é ilustrativa, mostra o equipamento instalado num V8 de ‘Vette C2), que em caso de explosão ou outra falha catastrófica qualquer do sistema de embreagem, os detritos metálicos explodidos com força descomunal ficam contidos dentro dela e não ocorrerão danos extras ao veiculo, ao condutor ou a outras pessoas e veículos próximos.
Um ponto muito legal do uso do scattershied: como a parte traseira dele é completamente plana, podemos refurar e usar câmbios com flange diferente da original sem maiores dificuldades.
Temos ainda outras opções de embreagem para usos mais radicais, desde sistemas simples ainda monodiscos importados como os das marcas Hayes, Centerforce e outros, alguns que contam com sistemas de contrapesos no diafragma do platô – que aumentam a capacidade de tração da embreagem mesmo em situações mais extremas –, ou ainda outros sistemas com discos com revestimentos cerametalicos. A escolha sempre vai recair sobre o que se desejar do veiculo, deixando sempre claro que, para uso urbano, em motores sem preparações muito elaboradas, o sistema destinado as C10 de diafragma com disco de 10 polegadas vai atender com folga o que se pretende.
Câmbio manual de três marchas
Originalmente o câmbio manual dos Dodge V8 nacionais é uma caixa de marchas Clark, de três ou de quatro marchas, do modelo 260T ou 260F, que tem resistência mecânica que atende com folga ao que se desejar do veiculo original e que ainda vem a atender com tranquilidade preparações até bem pesadas.
No caso do três marchas original, com relações 2,67:1 em primeira, 1,66:1 em segunda e 1:1 em terceira, que poderíamos classificar como um cambio do tipo close ratio, com as relações numéricas das marchas relativamente mais próximas, temos uma única opção, por acaso muito rara e difícil de se conseguir, que era o cambio original das picapes D100, que tinham as relações das marchas bem mais abertas: um câmbio wide ratio, com primeira 3,15:1, segunda 1,90:1 e terceira 1:1. Vale comentar que a caixa da D100 tem exatamente as mesmas relações que saíam nas C10 de três marchas e nas F100 V8 com apenas três marchas também.
Mas qual o lance das marchas abertas ou fechadas, o que ganhamos ou perdemos?
Vamos verificar que, no caso de um Dart absolutamente original três marchas com pneus originais 185/70 R14 ou outro equivalente em medida e altura, com o diferencial original Braseixos 3,15:1 ou mesmo com o dana 44 3,07:1, teríamos uma primeira marcha que permitiria ao veiculo uma velocidade máxima de aproximadamente 70 km/h, 120 em segunda e cerca de 170 em terceira.
Fica fácil de ver que a primeira, relativamente longa, era até adequada para uma saída suave do veiculo, mas se pudéssemos escolher outra algo mais curta, no caso a das D100, ainda que o veiculo atingisse menor velocidade máxima em primeira, no caso que ficaria próxima a 59 km/h, a saída ou pulo do veiculo seria algo mais vigoroso. A segunda mais curta também reduziria a máxima desta marcha de 120 para 104 km/h, mas esta velocidade também seria atingida mais rapidamente. A redução máxima em primeira cairia do valor original de 8,41:1 (no caso a redução do diferencial, que é de 3,15:1 vezes a redução em primeira marcha, que é de 2,67:1) para 9,92:1 (3,15:1 da primeira marcha vezes a redução de 3,15:1 do diferencial). Este estudo é interessante na medida em que demonstra como uma simples troca de relações faz com que se tenha mais torque disponível nas rodas motrizes.
No caso, como temos um valor próximo a 40 kgfm de torque bruto no motor, ao invés de multiplicarmos ele por apenas 8,41, que seria bom para termos disponíveis nas rodas algo como 336 kgfm, passaríamos a multiplicar este mesmo torque por 9,92. Então passamos a ter 397 kgfm disponíveis em primeira marcha, o que deixa o carro um pouco mais forte em acelerações em primeira marcha. Um acréscimo de praticamente 18%, sem mudar consideravelmente muito mais coisas no veiculo ou ter que fazer concessões radicais à dirigibilidade.
No caso, a única complicação é o fato de se ter um único cambio plug and play a atender este caso e o outro disponível, que é o da C10, não se aplica diretamente, na medida em que o primário da C10 é cerca de 3 centímetros mais curto que o do Dodge, deixando a ponta do mesmo solta, sem apoio, dentro da bucha guia do volante motor. Claro, tão ruim quanto a ponta do eixo primário ficar solta é o fato de que o estriado do cambio de Chevy é bem mais curto e apenas metade do entalhado ficará no disco, gerando um estresse enorme nas estrias – há a mesma quantidade de torque a se transmitir, mas com apenas metade da área de contato entre o entalhado do disco de embreagem e o entalhado do eixo primário. Neste caso, além da desmontagem completa do câmbio da C10, que é diferente do Dart, teríamos de mexer com solda para emendar a ponta do primário do dodge no da C10, ainda que ambos tenham o mesmo padrão de entalhado para o disco de embreagem.
Um comentário pertinente é que não é possível, por exemplo, trocar apenas a primeira marcha: o trem intermediário de engrenagens, popularmente conhecido como carretel, é fixo, não desmontável, de modo que temos que trocar o carretel, eixo primário e engrenagens de primeira e segunda marchas. A terceira marcha não possui engrenagens, na medida que é feita ligando diretamente o primário ao secundário, deixando o carretel livre de acionamento.
Câmbio manual de quatro marchas
Aqui a situação é mais animadora. Os Clark 260F têm quatro jogos de relações disponíveis e vamos perceber, de novo, que o original do Dart 4 marchas é o mais close ratio de todos, com a primeira repetindo a relação do três marchas em 2,67:1. Temos mais 3 conjuntos para esta marcha. O primeiro mais próximo dos Dodge é o do Maverick V8, com primeira 2,99:1, depois temos um câmbio que foi usado nas primeiras C10 de 4 marchas, extremamente raro, que inclusive não conta mais com peças de reposição, que tem a primeira 3,65:1 e, por fim, o mais comum de todos, que é usado nas C20/D10/D20 e F1000, com primeira 4,22:1. Este é o mais wide de todos eles. Já usei e adaptei todas estas relações e, no caso dos Dodge V8, a mais legal de todas me pareceu ser a primeira com 3,65:1, que por acaso inclusive eu tenho no meu Dart 1976 com motor 360. Eu usei um câmbio de Chevrolet obviamente, e alonguei o primário para poder usar todo o sistema original sem nenhuma modificação.
Este câmbio da imagem acima eu fiz para o meu Dart 1970 sedan de duas portas (carroceria que originalmente não foi vendida no Brasil). É um cambio padrão 260F, no caso de uma C20, que eu cortei o primário e emendei uma ponta de outro câmbio de Dodge, para não ter que mexer em mais nada, usando apenas uma capa seca Lakewood para casá-lo no 426 que vai pro cofre. Esta foi a forma que escolhi para fazer o projeto. O cone traseiro que está nele é de F1000 mesmo, sendo que como ainda vou fazer algumas medições e testar compatibilidades, posso ainda trocar a rabeta por uma de C20 se na última hora, quando for montar o carro, isso me facilitar a vida. Alguns parágrafos mais à frente, comentários e fotos das rabetas e suas implicações.
Um aspecto interessante é que tanto os câmbios dos Dodge, dos Maverick e este antigo de C10 4 marchas, usam rolamentos menores. Logo, a troca das engrenagens nas carcaças originais é tranquila de se fazer. O cambio mais wide ratio de todos tem rolamentos maiores, que obrigam ou a usinagem das carcaças originais dos Dodges para os rolamentos maiores ou a troca das carcaças junto com o resto das engrenagens. Claro que o mais legal de tudo é por os rolamentos maiores, que resistem melhor ao uso severo que vai ser imposto ao conjunto.
O eixo primário dos veículos Ford tem 18 centímetros e é o mais próximo ao tamanho dos Dodge, ainda que tenha o entalhado diferente. No caso das F1000 3600 a álcool, o entalhado é mais fino. Nas F1000 4 cilindros a álcool, além de mais fino usa uma estria métrica, que não tem nenhum disco comercial que sirva nos Dodge V8, de modo que se você tropeçar num câmbio raro desses, o corte do eixo primário e a emenda de uma ponta nova nele proveniente de um câmbio de Dart é obrigatória.
Os câmbios de F1000 a diesel são com o entalhado do primário bem mais grosso, também incompatível, e requerem corte e troca da ponta do primário. Resumindo, se você conseguir um câmbio de F1000 3600, OK, pode usar o disco de embreagem original para este câmbio com um primário original e modificação na bucha do volante apenas, mais platô de C10. Os demais câmbios de Ford não vão ser possíveis de ser usados sem corte e solda. Os de C20 tem o mesmo entalhado, mas por serem mais curtos, o jeito é cortar e soldar também.
O câmbio que aparece na foto é um 260F de F1000, com uma rabeta original de Dodge que foi usada com sucesso num Maverick que era 4 cilindros e que ganhou um 5.0 HO com EFI. Depois o dono do Maverick acabou comprando uma transmissão T5, que no caso do Ford é plug and play, e eu peguei este câmbio de volta.
No caso de um carro feito do zero ou com propósito dedicado à arrancada, pode comprar uma capa seca Lakewood mais rasa, que é exatamente para usar câmbio Chevy em um Dodge. Existe pronta nos EUA, part number Quick time #RM 6070, que permite casar um motor Dodge bloco pequeno com uma transmissão originalmente Chevrolet, como as Clark 260F de C10 ou C20. Custa a bagatela de 640 dólares no site da Lakewood, o que torna a compra bem cara para nós aqui no Brasil.
Outro ponto muito legal de se comentar é que o trambulador do Dodge, que é extremamente semelhante aos usados nos Maverick V8, ambos já bem difíceis de se conseguir peças de reposição, podem ser trocados por outro conjunto. No caso é necessário usar outra parte traseira, o cone traseiro do câmbio 260F das F1000. Tem uma superfície que pode ser furada para usar o calço original do câmbio do Dodge, usa o cabo do velocímetro do mesmo lado e sentido de rotação e as engrenagens de aferição do velocímetro são compatíveis, o que facilita muito a adaptação.
No topo disso, os trambuladores das F1000 e D10/20 são muito positivos no caso de adaptar em um Dodge que originalmente tivesse banco inteiriço na frente. Por ter a alavanca saindo coisa de mais de 20 centimetros mais a frente que o trambulador original do Dodge, não é preciso mexer no banco.
As marchas acabam sendo engatadas com muito mais facilidade, e as famosas folgas que inevitavelmente acabam ocorrendo no sistema original não ocorrerão mais. E são disponíveis novos, o que facilita muito a manutenção. Também são muito mais fáceis de substituir, e por serem presos por apenas dois parafusos por cima da carcaça, facilitam muito instalar e retirar o cambio. Outro ponto muito legal de se comentar sobre os câmbios de picape é que os interruptores da luz de ré são incorporados diretamente à tampa lateral do cambio e acionados pela âncora selecionadora de acionamento direto da engrenagem de ré. O sensor é facilmente encontrável à venda.
Vale comentar, no entanto, que o local de instalação do calço do câmbio muda, ficando mais à frente e relativamente mais alto no caso do da F1000. O da C20 é mais amigável. Fica bem óbvio que em nenhum dos dois é plug and play: vai ter fabricação envolvida e é um trabalho a ser feito com atenção, ou vamos ter problemas na hora de terminar a adaptação. No caso de usar de C20, vale tentar usar o calço original do Dodge e no de F1000, fazer um suporte pela frente da travessa do câmbio usando outro calço. Que com a relativa dificuldade e custo fora a dificuldade de trocar o original do Dodge, fica atraente usar outro calço, até mesmo o da C20 original na rabeta de C20.
Cinco e seis marchas!
Claro que tem ainda a questão de eventualmente se instalar um cambio de cinco marchas nos dodges: tem como, é possível, mas sempre vamos esbarrar em inúmeras dificuldades basicamente porque na época do projeto do carro não existia isso como opção. Todas as caixas de marchas eram com 3 ou 4 marchas apenas, e após o pacote de engrenagem todas as carcaças ficavam bem estreitas. O assoalho do Dodge e o sistema da travessa do câmbio torna bem mais difícil mexer com isso.
Lá no primeiro capitulo eu escrevi sobre subframe connectors, e no caso eles têm tudo a ver com o papo, por facilitarem enormemente a confecção de outra travessa para o cambio, sem comprometer a integridade e rigidez do monobloco, permitindo mesmo que a gente retrabalhe a travessa original e mesmo a mude de lugar, corte o assoalho e remodele o túnel da transmissão. Sempre lembrando que esta travessa original, além do câmbio tem função estrutural de ancorar o alojamento traseiro das barras de torção. Logo cortar e deixar as pontas soltas não é uma boa opção.
De cara, teríamos os câmbios das Dakota V6 que têm o mesmo bolt pattern dos V8 318, usam embreagem compatível com o volante dos 318, acionamento de embreagem hidráulico, que se resolve facilmente instalando um cilindro mestre acionado pelo pedal de embreagem e se não me engano ainda têm a parte do entalhado traseiro do secundário compatível com o dos Clark 260. Contudo, não há ponto para ligar cabo de velocímetro, o que obriga o uso de um velocímetro eletrônico.
Outra opção seria as caixas Clark 2205/2215 das picapes Chevrolet de 5 marchas, que são pequenas e facilmente adaptáveis, mas ainda sim têm uma boa dose de fabricação envolvida. Nelas, de novo, compensaria usar a capa seca Lakewood para adaptação. Outras opções disponíveis seriam câmbios Borg Warner T5, importados, que são até bastante populares nos EUA para uso em Dodges, e os T56 de seis marchas (foto acima), que equipam, com pequenas variações, uma série de muscle cars atuais, como o Camaro Z28, Mustang Shelby GT500 e mesmo o Dodge Viper. Em todos temos muita fabricação envolvida e nada é plug and play. E claro, ainda tem o precinho de tudo importado com o dólar no valor ridículo que está.
Câmbios automáticos
Os automáticos são um capitulo à parte aqui no Brasil por serem raros, não muito populares, mas existem e valem algumas linhas a respeito. Uma ideia importante a se considerar é que tudo o que eu escrevo sobre automático daqui em diante é como uma linha de informação geral, na medida em que o conhecimento acerca do assunto é relativamente pouco difundido aqui no Brasil e poucos mecânicos dominam realmente bem o assunto. Ou seja, seguindo o caminho da transmissão automática, antes de qualquer coisa deve se ter em mãos um mecânico realmente competente que saiba o que e como fazer, fora ter familiaridade com cambio automático e suas diversas modificações.
O câmbio original usado nos nossos Darts era o Torqueflite A904LA, sendo que nos últimos modelos produzidos havia uma opção bem legal do mesmo câmbio com bloqueio de conversor de torque, que deixava o carro na última marcha como se fosse um carro manual, sem nenhum deslizamento normal de ocorrer no conversor de torque do câmbio automático. Vale comentar que este recurso, conhecido como lock up torque converter, normalmente não é usado em veículos com motores preparados por conta do desgaste acelerado da pista de fricção interna do conversor onde é feito o travamento do mesmo.
Se você tem um carro original e quiser mantê-lo automático e ainda ter mais performance, a modificação mais simples e eficaz é por um shift improver kit, também chamado de transpak. Na verdade é apenas uma forma de reprogramar o câmbio original de modo que as trocas de marchas ficam mais firmes e positivas, sem contudo serem ásperas. Este tipo de acessório, um kit vendido pela maioria dos fabricantes de peças para câmbios automáticos como Trans Go, B&M e TCI se destinam a aplicações variadas, podendo ser simplesmente instalados em um cambio usado, em bom estado, e o resultado é sentido imediatamente. Já fiz instalação de alguns em diversos carros automáticos, originais e com algumas modificações, e o resultado é no mínimo muito recompensador!
Se a opção for por um motor fortemente preparado, de uma forma genérica podemos comentar que o mínimo a ser feito, além de uma remontagem completa, normalmente feita por algum expert em transmissões automáticas, onde serão instalados discos, cintas e demais componentes de desgaste de maior robustez e indicados ao uso para alto desempenho, temos que contemplar a troca do conversor de torque por outro com velocidade de stall maior que a original.
Velocidade de stall é a máxima rotação possível do motor atingir com o veiculo parado, freado, travado com o câmbio engrenado em Drive (ou em primeira marcha, no caso de um kit para conversão de trocas automatizadas para apenas manuais) ao ser completamente acelerado. Normalmente em um carro original o valor da velocidade de estol é de 2.000 rpm. Um conversor de maior velocidade de estol, associado com um motor que teve seu comando de válvulas original trocado por outro visando ganho de potencia em rotações mais altas que as originalmente encontradas no veiculo vai permitir subidas de giro mais rápidas e consequentemente maior ganho de desempenho. É algo inevitável sempre que venhamos a pensar em cambio automático e motor preparado em que se tenha alterado os pontos de torque e potencia máxima do motor a rotações mais altas.
Outra coisa bem legal de se comentar são corpos de válvulas com padrão reverso e trocas manuais. Alguns corpos de válvulas deixam o cambio funcionando exclusivamente no modo manual, ou seja, você tem que selecionar primeira, segunda e terceira manualmente, e isso é desejável em competição. No caso do padrão reverso, a vantagem é que ao invés de sair de N e ter que ir para a primeira lá atrás e ir voltando para evoluir as marchas, a rota fica mais curta. Se o padrão é reverso, sai de N para 1, depois 2 e por fim 3, se errar e passar direto, vai pra terceira, não para neutro, como seria no original.
Outra coisa muito legal em transmissão automática é o trans brake. Imagine que você vá arrancar forte com seu carro. Subir os giros em neutro e jogar a Drive não é uma opção boa, causa um desgaste absurdo no cambio, cintas e discos fora o risco de quebra do câmbio em si, causando uma explosão da carcaça. Este procedimento inclusive é proibido em provas de arrancada nos EUA desde os anos 60.
Engatar Drive ou primeira, acelerar o carro freado para ele ganhar giro e carregar câmbio também não é legal, porque vai pre-carregar a suspensão traseira e deformar os feixes, ao soltar o freio você perde tração.
O trans brake é um dispositivo elétrico que atua um solenoide que permite que, ao engatar em primeira, este dispositivo engata junto a ré. Você tem o carro travado na linha de largada, acelera fortemente e carrega o conversor. Na luz verde você libera o transbrake e toda a energia é transmitida ao diferencial e à suspensão traseira, que choca os pneus e você sai o mais fortemente possível. No inicio era algo exótico e inacessível. Hoje qualquer carro de drag automático mais sério usa. Se for considerar fazer um carro com tração traseira e cambio automático qualquer, considere seriamente esta opção.
No caso de câmbios automáticos valem outros comentários e considerações adicionais. Primeiro, câmbios automáticos consomem potência do motor para funcionar. Possuem mecanismos hidráulicos que são alimentados por uma bomba de óleo tocada diretamente pela carcaça do conversor, que é rigidamente acoplada ao virabrequim. Nem todas as caixas são iguais e no caso dos Dart teríamos duas opções hidráulicas imediatas, a Torqueflite A904LA e a 727 LA.
A 904 é a original deles e a 727 não tivemos aqui, se destinando a serviço pesado ou veículos de transporte. Se você quiser trocar a 904 pela 727, OK, mas entenda que ela por ser maior e mais robusta, vai consumir ainda mais potência que a 904. Os 904 usados aqui no Brasil todos são close ratio, a primeira é 2,45:1 a segunda 1,45:1 e a terceira 1:1. Nos EUA em 1980 os câmbios tiveram as relações modificadas para ficarem mais wide e a primeira desceu para 2,74:1, a segunda 1,54:1 e a terceira ficou nos mesmos 1:1.
Uma outra opção é um cambio GM chamado Powerglide (foto acima). Este câmbio tem apenas duas marchas e um conversor que pode ser bem trabalhado e modificado. Em casos de carros mais leves – no cenário dos EUA, o Dart é um carro leve –, o Powerglide funciona muito bem. É necessária uma capa seca tipo ultrabell, de segurança, que adapte o corpo da Powerglide ao motor A/LA e isto implica em pegar a carcaça original da Powerglide e serrar fora o sino original. A grande vantagem dele é a quase infinita disponibilidade de peças de performance que permitem fazer um cambio muito eficiente e praticamente indestrutível. Mas é sempre bom ter em mente, isto é algo inerente a competição, coisa séria de verdade, não se faz isso para carro de rua de uso normal. Evidentemente existe o mesmo mecanismo de transbrake a ser usado na Powerglide também. As Powerglides são close ratio e normalmente têm relação de primeira marcha de 1,61:1 ou excepcionalmente 1,84:1. Segunda sempre 1:1.
Na linha Dodge temos alguns câmbios automáticos mais modernos que tem originalmente uma quarta marcha tipo overdrive que facilita muito a vida de quem os quiser usar, aproveitando um diferencial mais curto para ajudar no pulo, sem ter que abrir mão do conforto de rodar em estrada com uma relação final aceitável. A 904 com Overdrive se chama A500 e a versão da 727 se chama A518.
Lembro aqui que tivemos nas Dakota V8 e Grand Cherokee transmissões automáticas com overdrive e bloqueio de conversor. Vale lembrar que são câmbios eletrônicos, 42RE, 44RE e 46RE, que não funcionam sem o computador que controla a injeção e o câmbio ao mesmo tempo, de modo que uma tentativa de adaptar sem maiores envolvimentos de eletrônica vai resultar em fracasso.
Existe uma possibilidade de se botar um ultrabell numa transmissão GM 4L60E, a que tivemos nas nossas Blazer V6 automáticas, que inclusive valem muito pouco por aqui. Existe um kit da Trans-go especifico para estes câmbios que permitem que ainda que sendo eletrônicos, possam ser convertidos para uso hidráulico simples, com as marchas trocadas inclusive manualmente. E claro, teriam também opção de transbrake. Não existe ainda, que eu saiba, um kit como o da Trangs GO para a 4L60E que se aplique numa caixa Dodge eletrônica.
Para fechar o assunto, vale lembrar que as caixas eletrônicas citadas e a 4L60E necessitam de modificações no túnel e na travessa da transmissão.
No próximo capitulo desta nossa série: motor original e dicas, truques e quebra galhos de como fazer seu motor funcionar melhor, ser menos sujeito a desgastes e ter um sistema de lubrificação bem mais legal que o original. Até lá!